terça-feira, dezembro 20

DOIS ANOS (FIM DE CELEBRAÇÃO)

Posted by Picasa O autor emHistórias Para Serem Contadas”, de Osvaldo Dragún. Quantos anos!

“Les positions cyniques et réalistes permettent de trancher et de mépriser. Les autres obligent à comprendre. D´où le prestige des premières sur les intellectuels.”

Albert Camus
“Carnets – III” - Cahier nº VII (Mars 1951/Juillet 1954)
Gallimard

segunda-feira, dezembro 19

DOIS ANOS - " TARDE "

Posted by Picasa “TARDE” – Fotografia de Hélder Gonçalves (*)

Dois anos. Passam depressa, ou devagar, conforme se ocupa o palco ou a plateia. Na plateia dois anos são uma eternidade. Uma parte do meu mundo passou a ser esta espécie de conversa a sós com os outros.

No dia 19 de Dezembro de 2003 criei o absorto por acaso. Dei aqueles três passos que nos indicam e, de repente, fui confrontado com a sua existência. Não tinha nada preparado para o preencher. Nem o título.

Inventei tudo naqueles minutos seguintes. Absorto. Veio daquele lugar onde devem estar guardadas as memórias mais fundas.

Uma janela com vista para a rua onde a vida se rebola. Um meio de encetar novos conhecimentos. Um estímulo para forjar e tornar a ideia disponível. Um guião não escrito de uma economia não mercantil de ideias e de afectos.

Um tempo de espera que se transforma em objecto de prazer. Um sorriso, um bom dia, um olá, um tudo bem, um aperto de mão aos amigos, que não vejo, estejam perto ou longe. Um corpo suspenso no tempo que acena, crente, ao futuro.

Um acto puro de espiritualidade cúmplice em homenagem aos amigos solidários, às dádivas por amor e aos encontros inesperados. O prazer de escrever palavras e projectar imagens. Um modelo simples e directo de comunicar.

A atracção de novos olhares e a descoberta de um novo mundo. Sem obrigações nem obediências a grupos, castas, congregações ou partidos. O espaço da liberdade individual possível em busca da beleza e do cumprimento da justiça.

O relativo assumido contra o absoluto. A luta contra o silêncio do medo. A luta da indignação contra o terror da mentira e do ódio. A verdade soprando segredos ao vento. A solidariedade com os que nos amam, retribuindo o seu amor. A defesa do direito a sonhar e, subtilmente, sobreviver.

(*) Em homenagem ao Hélder Gonçalves que me cedeu as primeiras fotografias de autor como esta bela "tarde", a segunda postada, e uma das mais pesquisadas.

SEGUNDO ANIVERSÁRIO

Posted by Picasa O autor na claridade do sul

Segundo aniversário. O absorto começou assim. Com esta linha programática que se mantém actual.

Vai entrar no terceiro ano de vida com os olhos no futuro.

domingo, dezembro 18

DEZ PALAVRAS

Posted by Picasa Fotografia de Angèle

“Réponse à la question sur mes dix mots préférés: “Le monde, la douleur, la terre, la mère, les hommes, le désert, l´honneur, la misère, l´été, la mer.””

Albert Camus

“Carnets – III” - Cahier nº VII (Mars 1951/Juillet 1954)
Gallimard

O TEMPO

Posted by Picasa Fotografia de Angèle

O ar frio amanheceu quase como uma surpresa
Após os meses de aragens secas e desapontadas

Assim o tempo nos baste para apreciar o tempo
Que nos sobra de tanta agrura de rugas e raivas


Lisboa, 10 de Novembro de 2005

sábado, dezembro 17

Crónica de Uma Fidelidade (5)

Posted by Picasa Fotografia daqui

O ano de 1976 foi recheado de batalhas políticas tendo ocorrido, como já descrevi, eleições legislativas (Abril), Presidenciais (Verão) e Autárquicas (Dezembro). Perdemo-las todas o que não admira, vistas a esta distância, pois, excepto nas presidenciais, o MES não fez verdadeiras campanhas para angariar votos mas antes, tão só, para esclarecer o eleitorado.

Lembro-me, como se fora hoje, como os candidatos do MES retorquiam à curiosidade dos cidadãos com um pedido de participação desinteressada no acto cívico de votar sem pedir o voto no próprio partido que propagandeavam. Esta é, aliás, uma das facetas mais curiosas da acção politica do MES visível na própria propaganda que nunca ostentou a figura de qualquer dos seus dirigentes.

Ler na íntegra no IR AO FUNDO E VOLTAR

NOBEL DA LITERATURA - 2005

Tem ecoado, em Portugal, um silêncio ruidoso acerca de Harold Pinter e do seu discurso na cerimónia da atribuição do Nobel da Literatura - 2005.

JAPÃO

Posted by Picasa Roland Barthes “L´empire des signes” – Seuil – Setembro de 2005.

sexta-feira, dezembro 16

SOARES, O POLÍTICO

Posted by Picasa Assistindo, hoje, ao debate entre Mário Soares e Francisco Louçã, o mais interessante de todos, até ao momento, lembrei-me do que escrevi, um ano atrás, aquando da cerimónia dos 80 anos de Mário Soares. Transcrevo esse post, a título excepcional, pois o desempenho de Soares confirma e sublinha tudo o que então escrevi.

“Pensei não escrever nada acerca dele. Todos escrevem, nestas efemérides, mesmo que as personagens não lhes interessem para coisa nenhuma.Um dia, só pode ter sido no ano de 1969, fui com o Xico Chaves e a Helena Moura e mais alguém, que já não me lembro quem, falar com o Soares à sede da CEUD. O Xico Chaves, que vive no Brasil e não sei que é feito, é que teve a ideia.

Ficamos à espera numa sala um tempo e apareceu-nos um Soares imponente com aquele ar triunfante mesmo quando está na mó de baixo. A conversa foi curta e inconclusiva pois, pelo menos eu, não estava virado, à época, para a social-democracia ou para o socialismo democrático.

O Soares impressionava mas era demasiado pouco estimulante para o nosso desejo de mudança. Sentia-me melhor na CDE. E assim foi. No início dos anos 80 tudo mudou. Passei a apoiar todas as iniciativas do Soares e, desde o início, a sua “impensável” primeira candidatura presidencial que havia de sair vencedora.

Na sequência da extinção do MES, com um grupo de ex-militantes deste movimento, no qual se incluía o Ferro Rodrigues, ingressei, em 1986, no PS depois de ter sido candidato independente nas eleições legislativas de 1985 nas quais só faltou ser açoitado pelo povo nas ruas. Deve ter sido o pior resultado de sempre do PS.

A partir de 1985 Mário Soares, para mim, passou a ser fixe. Até hoje. Agora já não entro nestas festas de aniversário, mesmo de inscrição livre, porque me aborrecem a maior parte dos convivas e desconfio das palmadas nas costas.O que me interessa é o hino à vida e à intervenção cívica de que Mário Soares é um exemplo. Parabéns.”

QUANDO SE EXCITAM

Posted by Picasa Fotografia de José Marafona

Procura guardá-las, poeta,
por muito que sejam poucas as coisas que podem ser detidas.
As visões do teu erotismo.
Mete-as, meio escondidas, nas tuas frases.
Procura segurá-las, poeta,
quando se excitam na tua mente,
à noite ou no esplendor do meio-dia.

C. Kavafis

Tradução de Joaquim M. Magalhães
e Nikos Pratsinis – Relógio d´Água

quinta-feira, dezembro 15

PARA A DEDICAÇÃO DE UM HOMEM

Posted by Picasa Fotografia de Carlos Pinheiro in Olhares

Terrível é o homem em quem o senhor
desmaiou o olhar furtivo de searas
ou reclinou a cabeça
ou aquele disposto a virar decisivamente a esquina
Não há conspiração de folhas que recolha
a sua despedida. Nem ombro para o seu ombro
quando caminha pela tarde acima
A morte é a grande palavra desse homem
não há outra que o diga a ele próprio
É terrível ter o destino
da onda anónima morta na praia

Ruy Belo

Aquele Grande Rio Eufrates

A REFORMA É TOTAL

Posted by Picasa Natalie Wood & Steve McQueen - Paramount studio photo (by William Claxton) for the advertising of the movie "Love With The Proper Sranger" (1962)

“Se se crê no valor moral, crê-se em toda a moral incluindo a moral sexual. A reforma é total.”

Albert Camus
Caderno n.º 5 (Continuação) – 1948 – 1951. Tradução de António Ramos Rosa. Edição “Livros do Brasil”. (A partir de “Carnets II”, 1964, Éditions Gallimard).

Upside-down

Posted by Picasa Fotografia de Baciar in Xupacabras

Estava a ver o debate entre Soares e Alegre. A certa altura começou a fazer-me lembrar um debate a sério. Hoje, Cavaco, falsamente surpreso, sentencia: o debate foi duro e azedo. Foi, finalmente, um debate. O pessoal já não está é habituado. Um debate quer-se mole e doce?

Compreendo a ideia de carregar o ónus do azedume e da dureza para a esquerda. O ónus da crispação, da inimizade, da falta de lealdade e da mentira são empurrados para a esquerda e apagados como valores que a direita pratica sob o manto diáfano de uma certa interpretação do cristianismo.

Mas a vida como é para a maioria das pessoas? Mole e doce? As aberturas dos telejornais do que falam? De factos moles e doces? A doença e a solidão, o que são? O desemprego e a fome, não existem? As angústias com as demoras da justiça, são uma fantasia? A luta política pelo poder, um passeio na avenida da liberdade?

Lembrei-me dos dez (10) anos da governação de Cavaco: duros e azedos, em particular, na segunda metade! A hipocrisia de Cavaco não é uma criação das circunstâncias, é uma faceta da sua personalidade. A sua táctica é tão velha quanto a política: desfocar as virtudes dos adversários deslocando para eles os seus próprios defeitos.

O HOMEM DO LEME

Posted by Picasa O Homem do Leme

In KITANDA

quarta-feira, dezembro 14

JANE BIRKIN

Posted by Picasa Fotografia daqui

14 décembre 1946/Naissance de Jane Birkin

In Terres de femmes

" Douro - Património Mundial"

Posted by Picasa Douro Património Mundial: quatro anos depois, está tudo na mesma

“Quatro anos depois da classificação do Douro como Património Mundial, a região poderá receber uma advertência da UNESCO porque continuam a proliferar as lixeiras e as más construções, não estando sequer delimitada com a sinalização rodoviária apropriada.”

Esta notícia seria para rir, não fora para chorar. Durante quatro anos não fizeram NADA. Dá para entender muita coisa que se passa em Portugal. Mesmo o que acontece a muitos daqueles que fazem coisas. Vejam as datas. A Região do Douro foi declarada Património Mundial numa data coincidente com as eleições autárquicas de 2001 que originaram a queda do governo socialista de Guterres.

Todas as estruturas e acções, destinadas a honrar a decisão da UNESCO, de classificar o Douro como Património Mundial, foram desmanteladas ou não foram implementadas, durante os governos do PSD/PP. Os responsáveis pela gestão deste processo de desmazelo total e absoluto vão ser investigados? Estiveram a vencer alguma remuneração, de qualquer espécie? E os autarcas? Ninguém se apercebeu que esta é uma das poucas regiões do país que pode ser um pólo estruturado e pujante do turismo nacional? Quem são os verdadeiros responsáveis?

Eis aqui uma vergonha nacional! Será que não vai acontecer nada? Oh da guarda!

Veja aqui e aqui e aqui

A VERDADE

Posted by Picasa Imagem Daqui

A palavra Verdade tem surgido, nos últimos tempos, em evidência. Teodora Cardoso titula “A Verdade” o seu artigo, de hoje, no “Jornal de Negócios”. Harold Pinter centrou no tema da verdade o seu discurso da cerimónia do Nobel da Literatura.

Contra a mentira contrapõe-se a verdade. A propósito do discurso e postura de Cavaco impõe-se, de facto, repor a verdade da herança da sua governação de dez anos – um terço da nossa vida democrática, pós 25 de Abril de 1974.

(…) O que Cavaco Silva nos legou reduziu-se, porém, à expansão dos regimes especiais, ao reforço da rigidez e da incapacidade de gestão e inovação e sobretudo a um aumento dos encargos com a função pública que se cifrou em 90,4 % no triénio 1989/91, 50 pontos percentuais acima da subida da taxa de inflação no mesmo período, estrategicamente centrado no ano em que obteve a sua segunda maioria absoluta. É certo que os governos Guterres, embora com um menor contributo quantitativo, não fizeram melhor. Mas pelo menos devemos a António Guterres não vir apresentar-se-nos como o detentor da verdade nas áreas em que errou.

Cavaco Silva tem agora razão quando diz que, sem crescimento económico, não se resolverão os problemas do emprego ou do orçamento. É, contudo, à miopia com que dirigiu uma fase ímpar de crescimento que devemos as dificuldades actuais. Que a solução destas em período de crise exige maiores sacrifícios, durante mais tempo, também não oferece dúvidas. Que Cavaco detenha agora a verdade que tão completamente lhe escapou enquanto primeiro-ministro, isso sim oferece as maiores dúvidas. (…)


In “Jornal de Negócios” – 14/12/2005

Artigo, na íntegra, aqui e IR AO FUNDO E VOLTAR

CAMUS - "CARNETS III"

Posted by Picasa “Celui qui a conçu ce qui est grand, doit aussi le vivre.”
Nietzshe
(Epígrafe do “Carnets III, de Albert Camus – Mars 1951 – Décembre 1959)

Embora tardiamente, como sempre, comprei a edição francesa embora somente os volumes II e III dos “Carnets” (o volume I encontra-se esgotado). Mas o volume III era, para mim, o mais importante.

A versão original é composta pelo Volume I – editado em 1962, Volume II - editado em 1964 e Volume III - editado em 1989, com os títulos e abrangendo os períodos que se indicam:

Carnets I, 1935-1942, Gallimard, 1962 (Blanche); Carnets II, Janvier 1942-Mars 1951, Gallimard, 1964 (Blanche); Carnets III, Mars 1951-Décembre 1959, Gallimard, 1989 (Blanche).

Qualquer destes “Carnets” se desdobra em diversos “Cadernos”. O “Carnets III” compreende os Cadernos VII, VIII e IX, escritos desde 1951 até Janeiro de 1960 (data da morte de Camus).

A minha leitura destes últimos três cadernos, publicados em 1989, tinha sido parcial, por outras fontes que não o original, pois nunca foram traduzidos em português.

As transcrições que tenho feito, têm origem nas leituras integrais, de juventude e releituras contemporâneas, dos “Cadernos” I a VI, da edição portuguesa, da "Livros do Brasil", abrangendo o período de 1935 a 1951.

Eis a oportunidade de uma primeira leitura, integral, da edição original do “Carnets III” e, posteriormente, ir dando notícias de alguns dos meus sublinhados.

Resta a estranheza por, desde os anos 60, nunca ter sido realizada qualquer reedição desta obra e, ainda mais, o facto, do tomo III dos “Carnets” nunca ter sido traduzido em Portugal.

Na verdade este facto não nos deverá causar espanto pois somos uma província distante do centro da Europa civilizada e assim nos comprazemos a continuar – na graça do senhor!

SOB O CÉU AZUL

Posted by Picasa Fotografia de Angèle

O céu sempre azul era
O meu teto infinito ali
À mão luziam estrelas

Incandescentes longas
As noites que eu senti

O céu sempre azul vi
Rodear o horizonte lá
Onde o olhar alcança

De prazeres e carícias
Que melhor tempo há?

Criança do meu lugar
Amado ao sul receei
O passo a medo dado

Mãos prudentes além
De mim me tomaram

Nas suas mãos d´ouro
Sob o céu azul luziam
Quais espaços infinitos

Incandescentes puras
As noites que eu vivi

Lisboa, 31 de Janeiro de 2005

terça-feira, dezembro 13

EXPLICO ALGUMAS COISAS

Posted by Picasa Imagem Daqui

"E numa certa manhã tudo ardia,
numa manhã o fogo
saltava da terra
devorando os seres,
e ardia,
havia pólvora,
e sangue.
Bandidos com aviões e mouros,
bandidos com anéis nos dedos e duquesas,
bandidos com frades negros e suas bendições
vinham pelo céu matar crianças,
e o sangue delas escorria pelas ruas
sem ruído algum, corria como sangue de criança.

Chacais que seriam alvo de desprezo de outros chacais,
pedras que o cardo seco morderia
e cuspiria, víboras que as próprias víboras abominariam!

Face a face com vocês vi o sangue
da Espanha erguer-se
para afogá-los em uma onda
de orgulho e de facas!

Generais
traidores:
vejam minha casa morta,
vejam a Espanha alquebrada:
de todas as casas sai um metal
que arde,
em vez de flores,
mas de cada oco da Espanha
a Espanha emerge
e de cada criança morta sai um rifle
com olhos,
e de cada crime nascem balas
que um dia encontrarão o caminho
do coração de vocês.

E vocês me perguntarão:
por que os poemas dele
não falam de sonhos, e de folhas
e dos grandes vulcões de sua terra natal.

Venham e vejam o sangue nas ruas,
venham e vejamo sangue nas ruas,
venham e vejam o sangue nas ruas!"

Pablo Neruda

(Excerto do poema “Explico Algunas cosas” de Pablo Neruda, citado por Harold Pinter na Conferência de atribuição do Prémio Nobel da Literatura – tradução retirada daqui.)

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Explico algunas cosas

Preguntaréis: ¿Y dónde están las lilas?
¿Y la metafísica cubierta de amapolas?
¿Y la lluvia que a menudo golpeaba
sus palabras llenándolas
de agujeros y pájaros?

Os voy a contar todo lo que me pasa.
Yo vivía en un barrio
de Madrid, con campanas,
con relojes, con árboles.
Desde allí se veía
el rostro seco de Castilla
como un océano de cuero.
Mi casa era llamada
la casa de las flores, porque por todas partes
estallaban geranios: era
una bella casa
con perros y chiquillos.

Raúl, ¿te acuerdas?
¿Te acuerdas, Rafael?
Federico, ¿te acuerdas
debajo de la tierra,
te acuerdas de mi casa con balcones en donde
la luz de junio ahogaba flores en tu boca?
¡Hermano, hermano!

Todo
eran grandes voces, sal de mercaderías,
aglomeraciones de pan palpitante,
mercados de mi barrio de Argüelles con su estatua
como un tintero pálido entre las merluzas:
el aceite llegaba a las cucharas,
un profundo latido
de pies y manos llenaba las calles,
metros, litros, esencia
aguda de la vida,
pescados hacinados,
contextura de techos con sol frío en el cual
la flecha se fatiga,
delirante marfil fino de las patatas,
tomates repetidos hasta el mar.

Y una mañana todo estaba ardiendo
y una mañana las hogueras
salían de la tierra
devorando seres,
y desde entonces fuego,
pólvora desde entonces, y desde entonces
sangre.
Bandidos con aviones y con moros,
bandidos con sortijas y duquesas,
bandidos con frailes negros bendiciendo
venían por el cielo a matar niños,
y por las calles la sangre de los niños
corría simplemente, como sangre de niños.

¡Chacales que el chacal rechazaría,
piedras que el cardo seco mordería escupiendo,
víboras que las víboras odiarían!

¡Frente a vosotros he visto la sangre
de España levantarse
para ahogaros en una sola ola
de orgullo y de cuchillos!

Generales
traidores:
mirad mi casa muerta,
mirad España rota:
pero de cada casa muerta sale metal ardiendo
en vez de flores,
pero de cada hueco de España
sale España,
pero de cada niño muerto sale un fusil con ojos,
pero de cada crimen nacen balas
que os hallarán un día el sitio
del corazón.

Preguntaréis: ¿por qué su poesía
no nos habla del sueño, de las hojas,
de los grandes volcanes de su país natal?

¡Venid a ver la sangre por las calles,
venid a verla sangre por las calles,
venid a ver la sangre por las calles!

Pablo Neruda
De España en el corazón