segunda-feira, janeiro 29

MULHERES VI

Os últimos tempos têm sido pejados de processos judiciais mediatizados. São arguidos aos montes trazendo para a ribalta, justa ou injustamente, gestores, politicos e equiparados. Por entre todas as desconfianças acerca de uma eventual conspiração contra o regime democrático a cena não é prometedora de futuros radiosos. Dou por mim a pensar que todos os arguidos conhecidos nos últimos tempos são do género masculino. Sei que as mulheres são minoritárias nos lugares de topo. Mas se existisse paridade na ocupação desses lugares será que o número de arguidos seria o mesmo? Não creio. Há algo de errado na relação do género masculino com o poder.

MULHERES V

A terra e o corpo eram o mundo possível; a terra penetrava os poros, tisnava a pele, sujava as feridas; a terra cantava sob a correria dos pés descalços; a terra e os corpos entoavam as canções de embalar e de trabalho, da eira ao arado, do varejo ao rabisco; olhava as mulheres como se fossem rainhas que um dia haviam de dançar mil danças rodopiando nos braços do seu par; via-as sempre a dançar em seus sorrisos e suas gritas; as mulheres do tempo de as ver somente com uma admiração que me vinha de dentro. Não sabia nada delas mas via-as e amava-as como se fossem a terra que segurava as minhas raízes ao chão da vida. [4/2/2008] - Na imagem Nuvens, pintura de Teresa Dias Coelho-.

domingo, janeiro 28

PALPITES XXXVII

Winston Churchill disse que "a democracia é o pior dos regimes, à excepção de todos os outros". Em democracia todos votam em liberdade. Uma grande conquista da comunidade sobre os horrores da tirania. Mas é preciso cultivar a liberdade de escolha. Uma questão fulcral do nosso tempo, afinal de sempre: até que ponto a democracia é capaz de resistir aos seus inimigos, mesmo aos que fingem defendê-la? Os usurpadores das suas virtualidades estão entre nós. Usam o voto livre como escudo para melhor a combater em beneficio de interesses obscuros.

sábado, janeiro 27

MULHERES IV

Fotografia de família – a minha avó paterna. Ressonâncias de outros tempos com gente povoando os caminhos e as casas habitadas em comum com suas regras horários lugares marcados uma luta pela sobrevivência é assim que me soam as ressonâncias de outros tempos. Nela as mulheres ocupam no meu imaginário o centro do mundo. O ponto cardeal em torno do qual volteiam todos os devaneios. Desfilam pela minha memória os seus rostos, vozes e cheiros. Na família tradicional que era (e é) a minha, as mulheres parece que nunca desertam dos seus deveres, nunca morrem, permanecem no centro da vida, lugar da vida, origem da vida. Se tivesse sido iluminado pelo dom de uma qualquer arte dedicar-lhes-ia um monumento, uma obra-prima, um prolongado aplauso. [24/2/2008]

sexta-feira, janeiro 26

Shostakovich 7th Symphony - 27 janeiro 1944 - o cerco a Leninegrado é levantado

PALPITES XXXVI

Sejamos claros acerca da crise política na Madeira. O que está no subtexto das intervenções de todos os interventores politicos, ou opinadores encartados, é de como inaugurar e fazer perdurar uma governação alternativa ao PSD na Madeira. Como derrubar uma oligarquia enraizada vai para 50 anos por via pacífica conforme as regras da democracia?

quinta-feira, janeiro 25

ANTÓNIO SÉRGIO

Ontem com o Secretário de Estado da Segurança Social, Gabriel Bastos, na Cerimónia de entrega do Prémio António Sérgio, certamente num momento em que atuava o Fernando Tordo ou o Paulo de Carvalho (magníficos!). No topo do salão da Voz do Operário reluz a inscrição: "Trabalhadores, Uni-vos". Que vivam!

quarta-feira, janeiro 24

PALPITES XXXV

A partir de ontem, com o conhecimento das listas do PS às legislativas de 10 de março, o jogo virou. PNS deixou de ser para a direita um perigoso esquerdista, passando a ser, simplesmente, o lider do PS. Nada mau para PNS.

terça-feira, janeiro 23

MULHERES III

O PS apresenta 10 mulheres (em 22) como cabeças de lista às eleições legislativas de 10 de março. Notável!

segunda-feira, janeiro 22

PALPITES XXXIV

As ditaduras afastam os povos da responsabilidade da tomada das decisões. Lembro-me do discurso da falta de maturidade do povo para votar. Quanto menos for chamado a pronunciar-se acerca das grandes questões nacionais, em particular, as escolhas de governo, mais o povo se sentirá afastado dos desígnios da democracia. Confiar? Desconfiar? O povo desconfia. Terá razão? O populismo espreita. Delegamos o poder através do voto. Será que nos vão devolver o poder, em tempo útil, para escolhermos de novo? Uma só partícula de poder a cada um de nós. Mas o suficiente para que nos sintamos reconfortados por termos influenciado as escolhas que comprometem toda a comunidade. Não é o tempo oportuno? Mas se não escolhermos a participação popular, mesmo quando a mesma parece excessiva, estamos a abrir o caminho aos populistas. Os populistas fingem que usam o poder para servir o povo mas servem-se dele para alcançar os seus objectivos particulares.

sábado, janeiro 20

SACANAGEM

PALPITES XXXIII

Num dos dias desta semana frequentei uma urgência hospitalar do SNS, em Lisboa, durante umas largas horas. Não como utente, mas como acompanhante. É impressionante, ao contrário de muitas notícias postas a correr, a organização e capacidade de resposta que testemunhei. Atendimento correto sem atropelos, pessoal maioritáriamente jovem atento e empenhado. Espero que um dia se faça a história do SNS deste periodo de notícias alarmantes.

PALPITES XXXII

A guerra geral deixou de ser uma inevitável impossibilidade. Passou a ser uma possibilidade real. Em plena disputa eleitoral na qual os partidos apresentam seus programas e esgrimem argumentos, não se ouve uma palavra acerca da guerra.

quinta-feira, janeiro 18

MULHERES II

Todos sabem o que vai acontecer. As mulheres são maioritárias na sociedade. É certo que nem todas as maiorias geram diferenças de qualidade. Muito menos garantem a conquista do poder. Mas no caso das mulheres, no mundo ocidental, há um detalhe decisivo: o fenómeno crescente da feminização do trabalho. Vai longe o tempo heróico das utopias feministas que, em Portugal, foram protagonizadas por Maria Veleda ou Carolina Beatriz Ângelo. As mulheres são já maioritárias num conjunto alargado de profissões e exercem uma forte influência social. Toda a gente sabe quais são essas profissões. Com quotas, ou sem quotas, hoje, é a sociedade que “empurra” as mulheres para a ocupação de lugares no topo das instâncias de decisão política. Este movimento, salvo qualquer cataclismo imprevisível, é irreversível. As mulheres vão ocupar o poder. Não é por serem mulheres nem sequer por serem mais ou menos competentes que os homens. Não é por uma questão de beleza física ou de sedução mediática. Pois se a maioria do eleitorado é constituído por mulheres … É por encarnarem uma forma diferente de olhar os problemas da sociedade. É por abrirem um espaço vital para a esperança na reabilitação da política. (Na foto a minha mãe em jovem).

terça-feira, janeiro 16

MULHERES - I

A propósito da chegada, em boa hora, à agenda politica do tema da igualdade de género, ou seja, da posição das mulheres nas nossas sociedades (em todos os seus diversos modos e facetas), deixo uma série de posts versando o tema. A luta é antiga e deixo a homenagem a MARIA VELEDA - notável combatente republicana dos primórdios da luta pelos direitos das mulheres. Nascida na minha cidade e freguesia - Faro, São Pedro, 26 de fevereiro de 1871.

segunda-feira, janeiro 15

PALPITES XXXI

Outro dos pontos que os democratas têm que cuidar neste periodo é o das guerras. Nós estamos, geograficamente, muito longe do epicentro das guerras que se travam na Europa. Os portugueses vêem a guerra como realidade distante. Assistimos às cenas de guerras no sofá. Não há portugueses vivos que tenham sofrido os efeitos da guerra à porta de suas casas. Mas pertencemos à Europa a todos os títulos e compete-nos, por pertença, dever e interesse tomar posição. Logo espera-se que os partidos se prenunciem, de forma clara, acerca das guerras. De momento ouve-se um profundo silêncio.

domingo, janeiro 14

PALPITES XXX

Ser democrata é ser capaz de tolerar as ideias dos adversários, combatê-las sem receio do debate e confronto democrático. Neste periodo eleitoral dois dos temas que deveriam ser preocupação de todos: estado social e imposto progressivo, duas das maiores conquistas do século XX, nos países europeus e na América do Norte. Com suas diferenças e modelações são peças fundamentais para combater as desigualdades.

sexta-feira, janeiro 12

CONTRA A PENA DE MORTE!

Em Lisboa, nos arrabaldes de Belém, o Duque de Aveiro e alguns membros da família dos Távoras foram publicamente executados, em 13 de Janeiro de 1759, por estarem implicados no atentado contra o rei D. José. A sentença foi aplicada de uma forma tão brutal e selvagem que foi muito criticada pela opinião pública internacional. Na gravura vê-se o patíbulo com os condenados a serem sentenciados e os seus carrascos; magistrados com as suas varas encarnadas e tropas de infantaria, com os seus tradicionais uniformes brancos com granadeiros de gorro de pele à direita da bandeira regimental, assim como de tropas de artilharia com os seus uniformes azuis. A legenda da gravura enumera os condenados.

PALPITES XXIX

Ouvi ontem por acaso alguém recordar que o PPM, em 2019, se coligou com o partido da extrema direita nas europeias. Fiz uma pesquisa rápida para confirmar o que já não me lembrava. Nada contra as coligações que são legitimas. Estranha é a coligação que o PSD agora criou integrando o PPM. Que sentirão os democratas republicanos que militam no PSD!

terça-feira, janeiro 9

NO ANIVERSÁRIO DA MORTE DO MEU PAI DIMAS

Por aqueles dias da primavera de 1958 o meu pai perdeu o medo. Pegou-me pela mão e levou-me a ver a passagem por Faro de Humberto Delgado. Estávamos em plena campanha presidencial. Pela primeira vez, desde o imediato pós guerra, o poder de Salazar tremia. Delgado era destemido, até à beira da loucura, segundo os seus detractores. A sua candidatura forçou à desistência de Arlindo Vicente, candidato apoiado pelo Partido Comunista. Humberto Delgado fez-se ao caminho e arrastou multidões até às urnas. Eu também lá estive pela mão do meu pai. Seguimos de Faro para Olhão onde a recepção foi apoteótica. Nunca hei-de esquecer a mão quente de meu pai apertando a minha. Eu não sabia ainda o significado da palavra fascismo. Mais tarde Humberto Delgado foi assassinado pelos esbirros da PIDE. Os assassinos morreram na cama. É revoltante. Tenho medo de sentir esta sensação de revolta perante a tolerância da democracia. Mas a tolerância, afinal, nunca é excessiva. Aprendi isso com o meu pai. Era um comerciante honrado. Morreu no dia 9 de Janeiro de 1992.

domingo, janeiro 7

PALPITES XXVIII

Ainda no rescaldo do dia de hoje que assinalou o inicio da campanha eleitoral - Congresso do PS, apresentação da AD - na bolha mediática, alguns apontamentos pessoais. É a primeira vez que um lider do PS é nascido no pós 25 de abril. PNS deve ter votado pela primeira vez em eleições nos anos 90, enquanto eu votei em todas as eleições desde 74 (e mesmos antes, nas farsas eleitorais pós 65). Votei sempre no PS, exceto enquanto existiu o MES e foi às urnas. Não conheço PNS, nem de perto nem de longe, nunca o vi ao vivo, tenho dele vagas impressões, que não evitam que aprecie a sua vontade de fazer diferente. O PS, e o seu lider, enquanto forem o alvo de todas as atenções, debates e conversas, terão bastas possibilidades de vencer eleições. A notoriedade é a chave do sucesso eleitoral, desde que os que se apresentam a votos não façam grossas asneiras e apresentem, de forma clara, e decente, as suas ideias. A direita, que tem entre os seus pessoas decentes, tem muitos mais obstáculos no caminho - desde logo o populismo mais desbragado - do que a esquerda de que o PS é, e será, a principal força, e referência, para a maioria dos portugueses.

PALPITES XXVII

Tenho a perceção que o PS ultrapassou de forma muito positiva esta transição politica, com unidade interna e discurso positivo. O encerramento do Congresso foi marcado pela intervenção de encerramento de PNS. Gostei. Sempre encarei a sua candidatura à liderança como a que melhor servirá, no próximo futuro, as causas que são sintetizadas por uma velha tríade: liberdade, igualdade, fraternidade. E sempre pensei que PNS seria o melhor lider do PS, previsivelmente, como lider da oposição. Hoje através das suas palavras apontou alguns caminhos interessantes muito me surpreendendo no conjunto da intervenção e, particularmente, na parte inicial ao dar ênfase à questão da cooperação, no sentido amplo. Pode ter iniciado um caminho que leve o PS a ganhar as eleições. Não sei o que acontecerá no dia 10 de março mas, em qualquer caso, pode ganhar nos Açores (4 fev) o que seria um bom indício.

sábado, janeiro 6

ALBERT CAMUS - 6 JANEIRO 1960

Le 6 janvier 1960, une foule d´anonymes et quelques amis se retrouvent devant la grande maison de Lourmarin où le corps d´Albert Camus a été transporté dans la nuit. Quatre villageois portent le cercueil que suivent son épouse, son frère Lucien, René Char, Jules Roy, Emmanuel Roblès, Louis Guilloux, Gaston Gallimard et quelques amis moins connu, parmi lesquels les jeunes footballeurs du village. Le cortège avance lentement dans cette journée un peut froide et atone de ce « pays solennel et austère – malgré sa beauté bouleversante ». Devant le caveau, Francine Camus jette une rose sur le cercueil. Le maire prononce une courte allocution et le silence n´est troublé que par le bruit de la terre sue le bois de la bière. L´heure est de recueillement. Les communiqués officiels, les télégrammes affluent. Tous unanimes dans l´hommage et l´affliction conjugués. Les temps ont changé, et ils sont nombreux, les détracteurs d´hier qui saluent aujourd´hui la disparition de celui aux côtés duquel ils avaient obstinément refusé de marcher. Celui qui, au terme de tant d´attaques et de malveillance, avait choisi de s´enfermer dans un douloureux silence. Les premiers tirs étaient venus de gauche, et plus particulièrement du parti communiste qui ne pardonnait pas à cet ex-compagnon de route de prendre du recul, de regarder en face certaines réalités. De dire l´intolérable : le stalinisme, les camps, les idéaux mis au pas par des tyrans de l´histoire. In Les Derniers Jours de la vie d´Albert Camus, José Lenzini, Actes Sud

PALPITES XXVI

Os partidos são o pilar central dos regimes democráticos pelo que não admira que o PS busque afirmar-se, como partido estruturante do regime, através do seu congresso, apresentando um novo lider. Neste caso excecional, em véspera de eleições legislativas, após a decapitação da sua liderança. Outra é a questão de saber das razões profundas dessa decapitação. Estranho é, por outro lado, que o PSD, outro partido pilar da democracia portuguesa, abdique de se apresentar autonomamente, suscitando a crição de uma coligação com dois partidos relíquias da nossa história democrática (tal como o PCP tem feito desde há muito). Curioso fenómeno este de o partido do poder cessante (PS) se assumir, autonomamente, rejuvenescido na liderança, e o partido incumbente (PSD) surgir, como se fora o partido do poder cessante, por detrás de uma ténue cortina coligacional. Tudo é possível mas auguro que os dois partidos chave do regime democrático - PS e PSD - serão capazes de honrar a sua tradição de partidos democráticos.

quinta-feira, janeiro 4

PALPITES XXV

Este ano, politicamente falando, vai ser insuportável. Mas que remédio, suportá-lo! Eleições, eleições, eleições! As eleições livres são uma conquista fundamental do 25 de abril. A fonte de Belém hoje no Expresso, no qual espreitei, começa a preparar a opinião pública para a instabilidade provável à saída das eleições de 10 de março. Com novas eleições, após a provável derrota de Montenegro (sem maioria), sua queda e posterior substituição. Belém fica de mãos atadas a partir do meio de 2025, pelo que terá de jogar todo o jogo até lá, ou seja, colocar uma maioria de direita no poder. Belém perdeu o norte por mais que se queira contemporizar. Ou seja perdeu o apoio dos portugueses de bom gosto e bom senso. Adiante.

quarta-feira, janeiro 3

PELO ANIVERSÁRIO DA MORTE DE ALBERT CAMUS

1960 – No dia 3 de Janeiro, Camus parte da sua casa de Lourmarin, onde havia passado o fim de ano, de regresso a Paris, no Facel Vega conduzido por Michel Gallimard. Francine Camus fizera a viagem de comboio na qual deveria ter sido acompanhada por Camus; no dia seguinte, no prosseguimento da viagem, o carro despista-se, numa longa recta, em Villeblevin, perto de Montereau, embatendo num plátano, provocando a morte imediata de Camus e, cinco dias mais tarde, a de Michel Gallimard. Na pasta de couro de Camus, encontrava-se, além de diversos objectos pessoais, o manuscrito de Le Premier Homme, cento e quarenta e quatro páginas que sua mulher Francine haveria de dactilografar e sua filha, Catherine, fixaria em texto, publicado pela Gallimard, na primavera de 1994. Albert Camus está sepultado em Lourmarin.

terça-feira, janeiro 2

PALPITES XXIV

Neste tempo que é o nosso é imperioso defender o modelo onde impere a liberdade e a democracia representativa. O adquirido das lutas de antanho dirá pouco às novas gerações. Sempre será assim pelo que é necessário criar novos desafios e encontrar novos caminhos para corresponder às aspirações razoáveis de todas e todos. Nestes desafios do presente, eleições várias incluidas, o mais, e melhor, que temos de fazer é sermos fiéis aos nosso valores cumprindo nosso ideal. Por mim vou continuar a trabalhar um tempo mais e guardar outro tempo do meu futuro para escrever, dando testemunho. Veremos. Votos de Bom Ano de 2024!

segunda-feira, janeiro 1

PALPITES XXIII

Hoje é dia de Ano Novo que sempre foi importante na minha relação com o tempo. Surge-me na memória o "Golpe de Beja", tentativa de sublevação militar, destinada a derrubar a ditadura, realizado de 31 de dezembro para 1 de janeiro de 1962. Nessa madrugada regressava de casa de meus avós maternos, de Santo Estêvão, Tavira, para Faro, e era visivel a atividade policial, fora do vulgar, pois alguns dos sublevados do golpe frustado fugiram para sul. Hoje por hoje, dentro das fronteiras, decorrem exercícios politicos cujos contornos são dificeis de entender. Julgo que só muito mais tarde se fará luz sobre as razões das manobras politicas que levaram à antecipação de eleições legislativas. Certamente os lobbys ligados aos negócios de Estado terão tido forte influência. A ver!

sábado, dezembro 30

MEMÓRIA DE UMA DITADURA

“Ano Terrível: designação dada ao ano de 1937. Correspondeu à fase mais sinistra do Grande Terror estaliniano: execução de Riutine, segundo Grande Processo de Moscovo (Piatakov, Radek, Serebryakov, Muralov e Sokolnikov – exceptuando Radek, todos foram executados), suicídio de Serguei Ordjonikidze, prisão de Bukharine (que será executado no ano seguinte), execução (sem julgamento) do economista e teórico do comunismo Preobrajensky, assim como a execução do Marechal Tukhatchevsky (e de outros sete notáveis chefes militares, todos eles generais). Por outro lado prosseguiu a “vingança” de Estaline contra Trotsky: o assassínio de Serguei Sedov (filho mais novo) e da execução de Aleksandra Sokolvskaia ( a sua primeira esposa) também ocorreram, neste mesmo ano. No entanto não se pode ignorar o facto de o ano de 1938 não ter sido melhor: execução de Bukharine, Rykov e Krestinsky; e assassínio de Lev Sedov, filho mais velho de Trotsky, em Fevereiro.” In “Bukharine, Minha Paixão” de Anna Larina Bukharina, tradução do notável comunista Ludgero Pinto Basto - “Glossário” - página 419 - (organizado e escrito por Alberto Freire), Edições Terramar

quinta-feira, dezembro 28

IR À RUA

A rua é uma instituição urbana. Os meus antepassados próximos, de origem rural, conheciam mal este conceito. O advento da sociedade urbana atribuiu um estatuto especial a “ir ao campo”. Mas, durante séculos, para os rurais o grande dia era o da feira que os levava a “ir à cidade”. A geração dos “babby-boomers”, de que faço parte, experimentou a fase final desta contradição. Lembro-me da impressão que me causou o filme de Renoir, “Passeio ao Campo”. Lembro-me dos meus passeios ao monte dos meus avós maternos que, ainda nos anos 70, não tinham energia eléctrica em casa tendo assistido, impotentes, à instalação, mesmo ao pé da porta, de dois postes que suportavam a linha que fornecia a energia a Tavira mas não os alimentava a eles. Senti o encanto da grande urbe de Lisboa ainda mal tinha resolvido a contradição “cidade/campo”. Nos primeiros dias, após a minha chegada definitiva a Lisboa, caminhei a pé pela Baixa, calcorreei as ruas dos bairros da Estrela, Campo de Ourique e da Lapa. Até que os pés aguentassem. Só. Fiz a carreira do eléctrico 28 dos Prazeres à Graça e da Graça aos Prazeres. Lindas as palavras que identificam estes dois bairros de Lisboa. Caminhar pelas ruas da cidade de Lisboa era uma alegria. A partir de certo momento tornou-se uma aventura e um risco. Não pelo trânsito nem sequer pela delinquência que, em Lisboa, sempre foi uma brincadeira de crianças se comparada com outras urbes da Europa ou das Américas. Mas porque em certas esquinas, à noite, nas saídas tardias das tertúlias ou das actividades associativas (subversivas?), surgiam vozes cavas e anónimas que pronunciavam o nosso nome em tom ameaçador. Porque ao caminhar pela rua surgiam interpelações ameaçadoras de desconhecidos que nos acotovelavam. Porque o regresso a casa, à noite, tinha de ser cuidadosamente preparado prevendo a arremetida que nos levaria ao hospital ou à prisão. Muitas destas caminhadas fi-las acompanhado pelo Eduardo Ferro Rodrigues. Nunca nos deixamos intimidar mas estávamos longe de prever como seria possível que, nos tempos da democracia, pela qual lutamos a vida toda, ressurgirem as mesmas ameaças à liberdade revestidas de novas e mais subtis formas. Ir à rua, para mim, sempre foi um verdadeiro exercício de liberdade. Como sabemos “ir à rua” pode ser até uma manifestação espontânea, ou organizada, de protesto. Mas há quanto tempo não vamos à rua? Em tempo: ir às urnas, em democracia, também é um salutar exercício de liberdade!

terça-feira, dezembro 26

PALPITES XXII

O PR está fragilizado. O assunto que despatou essa fragilidade tem ressonâncias à revolução cultural de Mao. Os pais denunciavam os filhos, os filhos denunciavam os pais. O assunto é mais grave do que a correria das notícias do momento permitem, vai ao fundo das relações da vida em sociedade, conforme os nossos padrões. Ao mesmo tempo entrámos em campanha eleitoral. O socialismo moderno em Portugal criou e deu corpo a duas utopias convencionais: o acesso universal e gratuito à educação e à saúde. Digam o que disserem são projetos concebidos, criados e concretizados por governos socialistas. Não é coisa pouca antes pelo contrário. No dia 10 de março é só escolher...

domingo, dezembro 24

NATAL

Da esquerda para a direita: o meu irmão Dimas de flor na lapela. O meu pai Dimas, vestido a rigor, de fato e gravata. Minha mãe, Tolentina, de fina camisa branca. A avó, Maria da Conceição, já doente, austera no seu vestido preto. A tia Lucília, uma beleza cinéfila, brilha à luz quente que envolve o Algarve de todas as estações. O mais pequeno, eu próprio, circunspecto, talvez, pela contrariedade do traje.// Natal. A minha tia Lucília. Irmã mais nova de meu pai. Nascida em 1917. Os fragmentos de suas memórias sempre me surpreenderam. A primeira mulher que me beijou chamada às pressas para ajudar no meu nascimento. Uma mulher linda que se desprendia ao encontro dos outros. Nesta fotografia sou o sobrevivente do grupo que mostra uma família feliz.

sexta-feira, dezembro 22

POLÍTICA

Em vésperas de Natal a direita política está com uma fome desvairada, a direita económica nem tanto. Para mim a direita política são todas as forças, organizadas em partidos, à direita do PS. Não sou capaz de afastar de mim o interesse acerca da política, esse interesse vem de muito longe, quando adolescente, discutia com o meu tio Ventura, homem do Estado Novo, coisas da política, sempre de candeias às avessas. Hoje por hoje, tanto tempo passado, espero não ter que vir a discutir coisas da política com algum familiar adepto dos ideais neo-fascistas (o termo é mesmo este, mais tarde voltarei ao assunto). Em qualquer caso a política, ao contrário de todas as aparências, é uma atividade nobre.

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS) - 4

O meu interesse por esta fotografia vem de longe e reside no facto do pano de fundo ter sido desenhado, em parte, com os pés. Queríamos fazer transbordar o símbolo do seu círculo fechado, subvertê-lo, criar uma imagem de movimento, mostrar um partido como lugar de caminhada e de encontro, o lugar de todas as utopias.

quinta-feira, dezembro 21

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS) - 3

O MES foi, no seu âmago, um partido da esquerda radical, mais do que um partido esquerdista, lidando mal com alinhamentos ideológicos mesmo aquando da sua deriva marxista-leninista, reconheçamo-lo, uma mera proclamação artificial e dolorosamente patética. O MES foi um esboço de casa comum na qual se acolheram cidadãos desalinhados – livres de compromissos com o antigo regime - que aspiravam combater as brutais desigualdades e iniquas misérias herdadas do “Estado Novo”.

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS) - 2

Foi longo o período de gestação do MES, ainda mais se medido à velocidade vertiginosa dos acontecimentos pós 25 de abril de 1974, sendo o seu I Congresso realizado somente cerca de oito meses após o dia 25 de abril. Naquele contexto oito meses era uma eternidade … Este processo, trespassado por lutas e debates, teve muitos e ilustres protagonistas oriundos de diversos sectores da oposição à ditadura. Muito já foi escrito, estudado e debatido acerca da ditadura, seus protagonistas e processos (apesar de alguns, nos quais me incluo, acharem que foi pouco).

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS)

Por estes dias de solstício de inverno (21 de dezembro) passa mais um aniversário do I Congresso do MES, realizado a 21 e 22 de dezembro de 1974. Para quem não saiba, por razões da usura do tempo, trata-se de um pequeno partido político criado, de facto, imediatamente antes do 25 de abril de 1974. Foi, no entanto, formalizado somente após a restauração das liberdades, em data imprecisa no plano burocrático, mas precisa no plano político, a meu ver, na manifestação do 1º de maio de 1974, em Lisboa, através da inscrição da sua sigla – ainda sem símbolo - num pano que muitas generosas mãos arvoraram. (A imagem neste caso é a do pano de fundo das sessões do Congresso realizado na Aula Magna da Cidade Universitária, em Lisboa.)

terça-feira, dezembro 19

20 ANOS

No dia 19 dezembro de 2003, pelas 16,20h, foi criado este blog com a seguinte frase: "Estreia absoluta. Um lugar de comunicação. Experiência para a primeira impressão dos outros. Uma primeira audição para inicio de trabalho." Eram tempos em que a chamada blogosfera usufruia de grandes audiências, ao contrário do que acontece hoje.

domingo, dezembro 17

PALPITES XXI

De ontem para hoje, 16 e 17 dezembro de 2023, mudou a liderança do PS. Acontece através de escolhas eleitorais, neste caso internas a um partido, o que é um acontecimento próprio da democracia politica. A defesa da democracia faz-se exercendo a democracia. No caso tendo em vista a escolha de um lider partidário. Não conheço pessoalmente o lider eleito. Mas a minha filiação no PS é antiga e imune a estados de alma acerca da personalidade dos lideres. Esta eleição sublinha um aspeto muito interessante da vida politica nacional. Um partido é apeado do governo após a queda do seu lider. Promove a eleição de um novo. De súbito, no pleito eleitoral nacional, o partido do governo apeado surge com um lider novo, a novidade, invertendo os papéis na relação com o lider do partido incumbente. Ainda para mais o lider novo do partido "velho" denota uma personalidade disruptiva pelo menos no discurso. Aconteceu assim quase sempre, se bem me lembro, como nos casos de Sampaio, Ferro, Sá Carneiro ...

sexta-feira, dezembro 15

15 dezembro 74

Uma efeméride respeitante ao MES: Em vésperas do I Congresso, numa longa carta, de 15 de Dezembro de 1974, que me enviou de Moçambique, Luís Salgado de Matos adverte: "...rezo aos meus santinhos para que não façam cisões - sobretudo a cisão na confusão. Corre-se mais o risco da grupuscularização sem dogma que da social democratização derrapante: não defendo a síntese da carne e do peixe (...) mas julgo que é um risco grave cortar o pano sem ver o tecido. Cisão, a haver - pelo que se pode desenhar - afastará o social democratismo (...) mas reduzirá o MES ao nível do grupinho necessariamente sectário mas sem um conjunto rígido de princípios (que costuma ser a safa destes grupinhos)." Sábias palavras...

quarta-feira, dezembro 13

PALPITES XX

O Estado Social é uma grande conquista das sociedades ocidentais (e não só) impulsionado pelo movimento socialista e sindical, com forte salto e expressão no pós guerra (1945). Pelas razões históricas conhecidas, Portugal não acompanhou esse movimento senão após 1974. O acesso generalizado à educação, aos cuidados de saúde e à segurança social, são as pedras angulares do Estado Social, conquistas do movimento socialista e sindical, após o 25 de abril. Não é uma pequena coisa mas o cerne do modelo social dominante no nosso país. Quem melhor o defende? Os próprios beneficiários que aceitam o papel do Estado, o imposto progressivo, o voto livre, o modelo político da democracia representativa. Não há Estado social sem democracia, ou seja, liberdade de escolha a todos os níveis da sociedade. Qualquer cedência a derivas autoritárias, mesmo quando aparentam a defesa de um Estado forte, é um risco de queda na desordem da arbitrariedade dos vendedores de ilusões.

segunda-feira, dezembro 11

PALPITES XIX

As elites económicas têm muita influência na formação da opinião pública e na conformação das politicas. A falta de vigor dos movimentos sociais reivindicativos, que transparece da presente acalmia, favorece a influência das elites económicas. Não parece plausivel uma evolução gradualista na presente vida politica nacional. Se assim não for será surpreendente. O próprio calendário eleitoral foi subvertido por iniciativa presidencial que antevê uma fragmentação partidária. Mesmo agora se antecipam as eleições regionais nos Açores para uma sucessão de eleições - 4 janeiro, 10 março e 8 junho (1 semestre/três eleições). Um dia mais tarde se fará a história das razões profundas desta inversão de calendário.

domingo, dezembro 10

CAMUS, 10 DEZEMBRO 1957

Quando soube da atribuição do Prémio Nobel “pela sua importante obra literária, que foca com penetrante seriedade os problemas que se colocam nos nossos dias à consciência dos homems”, Albert Camus escrevu nos Cadernos: “Prémio Nobel: estranho sentimento de desânimo e melancolia. Aos vinte anos, pobre e nu, conheci a verdadeira fama”. Camus afirmou então que o Prémio deveria ter sido atribuido a André Malraux e manifestou dúvidas acerca da sua própria capacidade e força criadora que sempre o atormentaram. Após o anúncio da atribuição do Nobel sujeitou-se a ataques odiosos, que o não deixaram indiferente e comentou: “Assustado com aquilo que me acontece e que não pedi. E, para cúmulo, ataques tão infames que o coração se me aperta.”(Cadernos). Mas Camus, segundo todos os testemunhos, não podia, nem queria, recusar o Prémio. Telefonou, de imediato, à mãe, que sempre viveu na Argélia, como que a agradecer à sua origem a honra que lhe tinha batido à porta. Escreveu a Jean Grenier, o seu professor e mentor intelectual : “(…) quando recebi a notícia, o meu primeiro pensamento foi, depois de minha mãe, dirigido ao senhor. Sem o senhor, sem essa mão efectuosa que estendeu à criança pobre que eu era, sem a sua instrução e o seu exemplo nada disto tinha acontecido.” (citado a partir de Roger Quilliot). René Char, um amigo de todas as horas, não cabia em si de contente e manifesta esse contentamento de várias formas incluindo um artigo publicado, logo em 26 de Outubro de 1957, no Figaro littéraire, intitulado “Je veux parler d’ un ami”. No ínicio de Dezembro de 1957 Camus partiu com a mulher, Francine, para Estocolmo e, em todas as suas aparições em público, tinha a consciência que devia estar preparado para ser atacado a propósito da sua discrição a respeito do conflicto na Argélia que estava no auge. Albert Camus, a 10 de Dezembro de 1957, recebeu das mãos do Rei Gustavo VI da Suécia o diploma e, no banquete que se seguiu, proferiu o seu discurso de agradecimento. Logo num dos dias seguintes escreveu a Jean Grenier descrevendo, de forma sintética, o que sentia: “A corrida acaba, o touro está morto, ou quase.”

sexta-feira, dezembro 8

Com Parlamento dissolvido, Marcelo não pode ser alvo de processos (in Expresso)

LIBERALIDADES

É paradoxal a situação atual dos dois responsáveis politicos da área da saúde - Marta Temido e Lacerda Sales - que no periodo da pandemia assumiram a primeira linha do combate, nos limites da tragédia, à pandemia Covid 19. Pouco tempo passado já se desvaneceu da memória coletiva a relevância do seu papel nesse periodo trágico, do papel determinante que desempenharam, e de sua coragem pessoal e politica. Hoje, ao que parece, a partir de uma liberalidade ao mais alto nível, estão a assistir a que os seus nomes sejam arrastados na lama. O meu abraço.

terça-feira, dezembro 5

PALPITES VIII

Marcelo perdeu o chão. No mesmo dia da publicação do artigo de Cavaco, Marcelo falou ao país. O assunto de que tratou na sua comunicação não é de Estado. Trata-se de uma sua eventual intervenção, ou de alguém por si, destinada a facilitar o acesso a um tratamento médico no SNS, por sinal caro. Nada sei acerca do assunto e dos seus meandros, somente do que se fala na comunicação social. Venho aqui a propósito de algo que me chocou muito na prédica de Marcelo: a forma como, no final, destratou o filho, entregando-o ao juízo da opinião pública e, eventualmnte, da justiça. Aconteça o que acontecer, fiel aos princípios que professo, um filho é uma preciosidade que se defende sempre, sejam quais forem as circunstâncias, até ao fim.

segunda-feira, dezembro 4

UM MENTIROSO COMPULSIVO

Quando Cavaco fala ou escreve algo para o público é sinal de que temos a esquerda no poder, no caso português, pasme-se, os socialistas a solo, caso raro, mesmo único, na Europa. Logo me apetece, conhecendo a criatura, escrever também algo pois a conheço de tempos idos, e de todos os tempos, mesmo de muito antes de ter emergido na politica. É de perfil autoritário, embora democrata, com uma falha de caráter na relação com a verdade. Estou a ser simpático ...

domingo, dezembro 3

PALPITES VII

Além de inúmeras desvantagens quais as vantagens do PS passar à oposição? Olhar as politicas públicas do lado de fora, permitindo-lhe exercitar a crítica, forjando a renovação de um ideário e programa progressistas/reformistas, testando, ao mesmo tempo, a capacidade de uma nova liderança; reposicionar-se para recuperar em próximas eleições o terreno perdido após o desgaste de muitos anos de governo (europeias, autárquicas, presidenciais); promover um processo de formação de quadros politicos dramaticamente abondonado nos últimos muitos anos. Dir-me-ão: e o poder? Respondo: de nada serve o poder se não soubermos o que fazer com ele!

sábado, dezembro 2

PALPITES VI

Ao abordar, discutindo em família, as alternativas partidárias tendo em vista as próximas eleições (e são muitas!), suscitam-se as questões mais relevantes a ter em conta na sociedade na qual nos integramos, de forma simples: paz civil, igualdade, emprego. Por outras palavras: preservar a integração internacional, desde logo na UE, assegurar a segurança, travar as desigualdades económicas e sociais, desde logo através de impostos progressivos, criar empregos cada vez mais qualificados e melhor remunerados. Estes poderiam ser os únicos pontos de um programa político progressista. O PS e o PSD asseguram a fidelidae ao essencial deste programa. Como fazer para prevenir as derivas anarco capitalistas (IL) e radical populistas (C)?