segunda-feira, outubro 24

A Rua


“Rua” – Maria Helena Vieira da Silva – [1953 gouache on board - 39 x 31 cm - Galerie Jeanne Bucher, Paris] Collection dr. Georges Jaeger

A rua era uma linha recta nascida de meus olhos.
Olhava-a da minha janela predilecta
e ela mudava de lugar a cada novo olhado.

A rua olhada de frente era uma linha recta.
Olhada de lado se perdia na esquina
e o êxtase imaculado era subir descalço ao telhado.

Do alto eu ganhava a liberdade de olhar o mundo.
Olhada de cima a linha recta era uma rua
e a descoberta era que havia uma curva ao fundo.

Lisboa, 25 de Agosto de 2005

O 18 de Brumário da CGTP, PCP e BE


O Juramento dos Horácios - Jacques-Louis David, 1784 [Musée du Louvre, Paris] Image from Cgfa

O 18 de Brumário da CGTP, PCP e BE

Estou, por uma vez, no essencial, de acordo com o que João César das Neves escreve, hoje, no DN com o título em epígrafe.

Ler, na íntegra, no IR AO FUNDO E VOLTAR.

HOMENAGEM À LINHA EDITORIAL DO "EXPRESSO"


"FUCK YOU!" (Grace Slick, 1967)

Em 1967 não era época de eleições livres em Portugal. O Estado Novo organizava um arremedo de eleições mas que tinham essa característica única de já se saberem os resultados antes de votar. Eram mesmo enviadas às redacções, na véspera das eleições, as notícias com os resultados que haviam de ser publicadas após os mesmos serem conhecidos. Um bocado como a direita, e certos sectores da esquerda, estão a fazer agora com o Prof. Cavaco.

Suponho que o “Expresso” por exemplo, já deve ter a notícia a publicar na edição do sábado imediatamente a seguir ao dia 15 de Janeiro de 2006. Se quiserem eu edito aqui uma versão dessa notícia e vão ver se andará muito longe da verdadeira. Também havia sempre um presidente da comissão de honra das candidaturas da UN (União Nacional) e depois da ANP (Acção Nacional Popular). Agora é o General Ramalho Eanes que é apresentado como presidente da comissão de honra da candidatura do Prof. Cavaco, uma grande novidade, com excepção do facto de já o ter sido na candidatura do mesmo Prof. Cavaco em 1995.

Pelas minhas contas, nos tempos mais recentes, eleições assim só em 1965, 1969 e 1973, todas para a Assembleia Nacional instituição de que falou, recentemente, o Prof. Cavaco. As últimas eleições Presidenciais às quais não concorreu o Prof. Cavaco, com um desfecho tão imprevisível, para o Expresso e para o Dr. Joaquim Aguiar, tiveram lugar em Outubro de 1972.

O Prof. Cavaco já devia estar em Inglaterra, depois do susto que lhe preguei, e as eleições presidenciais foram ganhas pelo saudoso Almirante Américo Thomás (com Th) que também concorreu sozinho pois o Manuel Alegre devia estar para fora, em Argel, e o Dr. Soares estava, se não erro, a “passar férias” em S. Tomé e Príncipe ou andaria por Paris a criar o PS que só tem contribuído para a desgraça da Pátria portuguesa.

O Jerónimo acho que andava a afinar máquinas e o Louçã devia andar no liceu a pregar o Trotskysmo. (O pai dele já devia ser Almiramte).

Infelizmente, em 1972, ainda não havia o “Expresso” para dar a notícia e explicar que o Almirante Thomás era quase tão velho como o Dr. Soares e representava o fim de um ciclo e que ninguém quis, à semelhança do que se passa na actualidade, ser candidato e que se o Prof. Cavaco, que é um jovem economista moderno e promissor, além de hirto e seco, quis fazer esse sacrifício, honra seja feita, é de aproveitar.

O Dr. Soares é acusado de ser um candidato, à semelhança do Almirante Thomás, de fim de regime, que só o Prof. Cavaco, se for eleito, salvará. Só espero que depois não tenham de chamar o Dr. Soares, de novo, para resolver as embrulhadas todas que o Prof. Cavaco vai criar e nunca mais saímos disto pois o Dr. Soares não é eterno.

(E a propósito de Generais e Almirantes lembrei-me daquela jovem artista americana que, em 1967, tomou a liberdade de exibir um gesto de desencanto perante a situação da vida dela e porventura da política na América, pois havia a guerra do Vietnam, face á qual o Dr. Soares havia de ser contra e o Prof. Cavaco a favor, e que achei que ilustrava a preceito o que eu sinto a respeito da linha editorial do “Expresso” mesmo com o saudoso arquitecto Saraiva de partida.)

domingo, outubro 23

ESQUECIMENTO ...


“Olhando o Gilão” – Fotografia de Hélder Gonçalves

“Trinta anos.
A primeira faculdade do homem é o esquecimento. Mas é justo dizer que esquece mesmo o bem que fez.”

Albert Camus

Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).

(Fragmento, certamente, escrito a 7 de Novembro de 1943 dia do 30º aniversário de Camus. Por essa data Camus começou a trabalhar, como leitor, na “Gallimard”. Em simultâneo inicia a colaboração com a redacção do jornal da resistência “Combat” que acabara de mudar a sua redacção de Lyon para Paris. Pouco tempo depois assume a direcção do jornal. No meio de tantas recordações do meu empenhamento político, por coincidência, 30 anos atrás, entre despedidas de amigos, desilusões e esperanças, o teor daquele fragmento, na sua simplicidade, apesar de todas as lutas, é um lúcido apelo à concórdia entre os homens.)

Eu sinto um frio por dentro


Paula Rego - Monkey hypnotising a Chicken, 1982

Eu sinto um frio por dentro
Quando estremece o mundo
Ou alguém morre ou cai doente
O corpo desfalece e vai ao fundo
Quanto mais amadurece a vida
Em mim mais me entristeço
Lendo a mesma página lida
Se instala a dúvida se me mereço
Olho e revejo desfilar a gente
Que me amou e que se me deu
Receio receber a dor finalmente
Que se recebe e diz ela morreu
Não quero saber da angústia
Que me toma e subo a estrada
Devagar imaginando a busca
Final em que se perde a alma
Eu sinto um frio por dentro
Eu sinto o que não se ouve
Nem mesmo uivar o vento
E o que acontece eu já soube

Lisboa, 15 de Outubro de 2005

sexta-feira, outubro 21

ESTABILIDADE


Scarlett Johansson

Estabilidade foi a palavra mais usada por Cavaco Silva na sua declaração como candidato presidencial. Julgo não errar se disser que não usou uma única vez as palavras liberdade e justiça. Muito menos as palavras igualdade e equidade. E ainda muito menos, nem nunca usará, a palavra beleza.

Na sua linguagem de político, que se afirma o seu contrário, estabilidade significa não perturbar a acção reformista do governo socialista em funções.

Mas vamos chamar “os bois pelos nomes”. A palavra estabilidade na boca de Cavaco é um instrumento táctico para neutralizar a ideia, subjacente à sua candidatura, de se constituir como pólo aglutinador de uma alternativa de governo de direita.

Na verdade o que todos estão a pensar é que Cavaco, caso venha a ganhar as presidenciais, se assumirá, por acção ou omissão, como oposição de direita ao governo socialista.

Desiludam-se os que pensam, beatificamente, que o melhor Presidente para o governo de Sócrates será Cavaco pois, para a sua estratégia presidencial, Sócrates é um “idiota útil” que executa a componente dura das políticas de estabilização orçamental e as facetas impopulares das reformas do estado.

Após essa obra meritória, digo-o sem ironia, “Cavaco Presidente” agradecerá, grandiloquente, dando lugar a um governo do PSD dirigido, quase certamente, por Manuela Ferreira Leite.

A proclamada estabilidade soçobrará no momento julgado mais oportuno para derrubar o governo socialista. O derrube ocorrerá antes do fim do seu mandato, caso acorram factos excepcionais que o justifiquem, pois Cavaco, como qualquer outro Presidente, nunca descartará o exercício desse poder constitucional.

Em alternativa, caso chegue ao fim do mandato, o governo socialista carregará a cruz de ter sacrificado os “direitos adquiridos” que os portugueses deverão agradecer ao Prof. Cavaco e que este não deixará de lembrar, a toda a hora, através da afirmação da natureza social-democrata da sua ideologia.

Cavaco não garante a estabilidade governativa pela razão simples que não resistirá às pressões para intervir nas funções do governo. Quanto mais for o candidato único da direita menos margem de manobra terá para prosseguir um magistério independente que se constitua como fautor de estabilidade.

Não garante, por outro lado, a estabilidade do PSD pois minará a liderança de Marques Mendes em favor de uma liderança alternativa que possa vir a garantir a consagração da velha máxima, nunca antes alcançada pela direita, uma maioria, um governo, um presidente. E Marques Mendes é demasiado fraco para garantir um futuro governo social-democrata forte.

A palavra estabilidade, na boca de Cavaco é, em linguagem política, um instrumento táctico e não um desígnio estratégico. Em linguagem popular é uma pura mentira.

Só vale a pena a estabilidade com LIBERDADE, JUSTIÇA E BELEZA. Cavaco não encarnará nunca, de forma autêntica, estes valores. Não é por nada, não é capaz!

Sobre a Juventude


Fotografia de Angèle

“Há um momento em que a juventude se perde. É o momento em que os seres se perdem. E é preciso saber aceitar. Mas esse momento é duro.”

Albert Camus

Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).

Bom Gosto


Uma nova obra prima de Margarida Delgado
no sabor a sal

CORAGEM


Che Guevara - Fotografia daqui

One of the most famous photographs of the 60's (and maybe of all times). It was taken in Cuba by Alberto Korda and was later the main theme of a documentary by Pedro Chaskel, "A Photo Turns Around The World". Guevara was captured and murdered in Bolivia, on October 1967

Devo avisar que nada me move, a título pessoal, contra o Prof. Cavaco Silva apesar de ter sido, seguramente, o primeiro português que o afrontou, politica e fisicamente, nos longínquos idos de um combate estudantil que fez história. Percebi as suas fraquezas que as rugas não apagaram nem a apresentação da candidatura presidencial, de ontem, esconde.

Ainda para mais Cavaco é meu conterrâneo, o seu perfil físico e humano, seco e hirto, está presente no meu imaginário desde a infância. Muitos homens do campo algarvio, pequenos agricultores, comerciantes, pescadores, trabalhadores, com os quais convivi, ostentavam o mesmo tipo físico, a mesma fisionomia, o mesmo carácter ao qual, na gíria, sempre se apelidou, com bonomia, de manhoso.

Nada que não se encaixe, com perfeição, no perfil da maioria dos portugueses. Somos uma espécie de “chicos espertos” a meio caminho entre o sacana e o sonso. Há-os em todas as famílias políticas e em todos os extractos sociais e profissionais. Não me refiro, em exclusivo, ao dito cujo pois à direita e à esquerda, entre políticos e empresários, gente da alta e da baixa, é uma espécie que está plenamente credenciada.

Por vezes, a espécie a que me refiro, associa a estas características a do puro sacana nacional, tão bem descrito por Sena no seu genial poema “No País dos sacanas”. Ele concentra, no seu ser mais profundo, o medo pânico ao contraditório, um desvelado apego à ordem natural das coisas, o desprezo pela prática da compaixão e um verdadeiro alheamento das coisas do espírito.

Por mais que se contorçam em espasmos de leitura e em aceitação de conselhos sábios estes homens e mulheres podem ser democratas, quando todos são democratas, mas preencheriam o perfil dos tiranos se a nação lhes solicitasse, em desespero, o favor de tomar em mãos os destinos da Pátria em perigo.

Quando se escolhe um Presidente, um pormenor ou um detalhe, absolutamente insignificantes, podem fazer toda a diferença. É uma questão de estilo? De idade? De experiência? De competência? De carácter? De tradição? De política? É de tudo isto um pouco.

Nas presidenciais escolhe-se, acima de tudo, a personalidade. É a escolha política mais pura de todas as escolhas. A minha escolha é a mais politicamente incorrecta do momento. Aquela que, paradoxalmente, está contra a corrente e é disso que eu gosto: Mário Soares. Sabem porquê? Entre muitas outras razões pela CORAGEM que Soares tem e Cavaco, apesar de hirto e seco, não tem.

(As imagens que integram estes posts serão, por vezes, aparentemente dissonantes dos textos mas isso é uma liberdade que me ofereço a mim próprio.)

quinta-feira, outubro 20

O ESTATUTO DOS DOCENTES


Apresentando INSÓNIA

“Uma rápida passagem pelo sítio da FENPROF deixa claro que os sindicatos dos professores estão mais contra o Governo do que a favor do ensino. E estão contra o Governo de uma forma absolutamente obtusa.”

A LER NO INSÓNIA

ÍTACA


Leonardo da Vinci - La Belle Ferronniere - Louvre, Paris

Quando saíres a caminho da ida para Ítaca,
faz votos para que seja longo o caminho,
cheio de aventuras, cheio de conhecimentos.
Os Lestrígones e os Ciclopes,
o zangado Poséidon não temas,
coisas assim no teu caminho não acharás nunca,
se o teu pensamento permanecer elevado, se emoção
requintada o teu espírito e o teu corpo tocar.
Os Lestrígones e os Ciclopes,
o selvagem Poséidon não encontrarás,
se com eles não carregares na tua alma,
se a tua alma não os colocar à tua frente.

Faz votos para que seja longo o caminho.
Para que sejam muitas as manhãs de verão
nas quais com que contentamento, com que alegria
entrarás em portos vistos pela primeira vez;
para que páres em feitorias fenícias,
e para que adquiras as boas compras
coisas de nácar e coral, de âmbar e de ébano,
e essências de prazer de qualquer espécie,
quanto mais abundantes puderes essências de prazer;
para que vás a muitas cidades egípcias,
para que aprendas e aprendas com os letrados.

Deves ter sempre Ítaca na tua mente.
A chegada ali é o teu destino.
mas não apresses em nada a tua viagem.
É melhor durar muitos anos;
e já velho fundeares na ilha,
rico do que ganhaste no caminho,
sem esperares que dê Ítaca riquezas.

Ítaca deu-te a bela viagem.
Sem Ítaca não terias saído do caminho.
Mas já não tem para te dar.

E se um tanto pobre a encontrares, Ítaca não te enganou.
Sábio como te tornaste, com tanta experiência,
já hás-de de compreender o que significam Ítacas.

[1911]

Konstandinos Kavafis

In “Os Poemas” – Tradução de Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratsinis - Relógio d´Água, Julho de 2005. (Nesta publicação é dada a conhecer a última tradução credível, em língua portuguesa, da poesia de Kavakis).

Aqui deixo o poema Ítaca e o acesso ao mesmo na sua língua original e também traduzido noutras línguas.

Paquistão - 49.739 mortos, 74.000 feridos e 3 milhões de desalojados


Fotografia do Pakistan Times

Reproduzo, no IR AO FUNDO E VOLTAR, na íntegra, o "despacho" da LUSA acerca da situação que persiste após o sismo no Paquistão.

Sismo: ONU vive "pior pesadelo logístico" de sempre no Paquistão

Segundo a ONU, cerca de três milhões de pessoas estão desalojadas desde o sismo que, de acordo com um balanço hoje divulgado pelo chefe de operações de auxílio, general Farooq Ahmad Khan, fez 49.739 mortos e 74.000 feridos.

"O sismo, que abalou três países, torna-se pior a cada dia que passa, à medida que surge a necessidade de auxílio", disse Egeland.

Espera-se ajuda, em particular, do "grande império do bem" a um dos países aliados mais importantes na guerra do Iraque!

WILMA O FURACÃO MAIS FORTE


A LER NO NEW YORK ON TIME

"Wilma é o furacão mais intenso já registrado no Atlântico, categoria cinco, a mais forte. Não se sabe ainda onde o olho do furacão vai bater em terra firme, mas todo o Caribe, de Cuba e a Flórida à costa do México e da América Central, está em alerta, com previsão de chuvas torrenciais.

Ao mesmo tempo, anuncia-se que este último mês de setembro foi o mais quente jamais registrado no planeta desde que as temperaturas começaram a ser medidas. Nos Estados Unidos, apesar dos furacões, este setembro foi o mais quente e mais seco jamais registrado."

quarta-feira, outubro 19

DE KENNEDY A SOARES


A Biography of John F. Kennedy: The 35th President of the United States

Esta era a campanha que me apetecia fazer. Apetece-nos muita coisa, não é? Mas, assim por assim, como vamos entrar, a sério, na pré-campanha presidencial em Portugal aviso a navegação que vou, sem compromissos de espécie nenhuma, em plena liberdade, apoiar a candidatura de Mário Soares.

Os amigos que estão a apoiar outras candidaturas não levem a mal algumas palavras, porventura, mais contundentes, desabrimentos variados, desabafos, “bocas”, mas isto de eleger um presidente não é brincadeira nenhuma.

Eu apoio o mais velho em nome dos valores mais jovens.

TURISMHOTEL


Lisboa – Fotografia de Angèle

A revista TURISMHOTEL do grupo Editel, dirigida ao trade turístico, na edição de Setembro, destaca, por sua iniciativa própria, o artigo “O Seu a Seu Dono”, publicado no “Semanário Económico”, disponível no IR AO FUNDO E VOLTAR.

Ao seu director Russo Cabrita, a quem não falta a memória, os meus agradecimentos e parabéns pela persistência na sua actividade editorial e qualidade das publicações que dirige.

O GRITO DO SILÊNCIO


Paula Rego – “Salazar”

“um povo corrompido que atinge a liberdade
tem a maior dificuldade em mantê-la”.

Maquiavel

Como te calas, poesia, longamente
deixando-me em silêncio dentro de ti.
Tenho esperado amargurado e triste
por um sinal que faças, despertando,
e nada vem dizer-me do que penso e vivo
na solidão do longe em tempo ou espaço,
onde a tua voz lembrava ou distinguia
memórias ou ideias que o vivido já
lançava como luz no não-vivido ainda,
ou no que dia a dia em terra nos transforma.
Eu sei porque te calas. Não é só
que os anos vão passando e nos despindo
de quanto se imagina ou vai julgando
que importa à ciência vácua de pesar-se
nessa balança de palavras tuas
o não pensado acerca de experiências
tão sem-valia no existir sem ti.
Ah não é só. Inquieta-te outra coisa
como um terror além da solidão.
Tu calas-te de angústia. Aquele país
em que nasceste, e sempre tu quiseste
como teu mundo, ainda que no mundo
sempre hás pensado mais que em mundo teu,
se despedaça: os gritos e estalidos
de um povo e um lar abrindo-se em chagas
de irreparáveis ódios e desastres
(quando tanto sonhas-te vê-los livres,
fraternamente em lutas por destinos
tão desde sempre merecidos na desgraça
de ser-se uma nação sempre dos outros),
atingem-te na face, nos ouvidos,
cobrem-te os olhos de visões sangrentas,
e cruzam na tua boca mãos diversas
que tão contrárias tudo calam. Como
hás-de falar da simples vida humana,
ou do viver-se só do amor perdido?
Mas como hás-de de cantar (cantaste outrora)
de uma revolta agora a desfazer-se
em lutas suicidas que condenas?
Mas que hás-de condenar que não pareça
traição aquilo mesmo que aguardavas?
E que aguardavas tu nessa ilusão
de que uma paz é quanto prevalece,
se se abrem de uma vez as portas todas
a mais que à liberdade, a quanto é fúria cega,
ou é sonhar-se negramente a vida
como revolução dos impossíveis?
Eu sei que não tens medo. Mas, perplexa,
recusas misturar-te a uma desordem
em que todos se perdem. Todavia,
é teu dever gritar além os gritos.
Ao menos grita o teu protesto agudo.
O grito do silêncio que te amarra.
A liberdade, a paz, a ordem necessária
a que um país resista ao próprio mal
que leva no seu sangue secular.
Grita por isso a voz do teu silêncio.
Não pela História que as nações inventam.
Mas pelo povo que se esquece inteiro
de que viver-se povo e ser-se povo é mais
que apenas desejar-se morte e sombras,
em nome seja do que for. Ah grita:
importa pouco se te escuta alguém,
no redemoinho tenso da surdez danada.
Porque há-de haver quem ouça, ainda há-de haver
quem ouça. E pouco a pouco pode ser
que o ter ouvido seja como as águas sobem,
cobrindo tudo num cansaço enorme
por essas mesmas águas consumido.
Que as águas venham límpidas, lavando
este veneno antigo do fascismo vil
que nos pensou desordem quando livres fôssemos.
Que as águas venham para a terra seca
em séculos de glória e mesquinhez,
e em décadas de medo e de vergonha.
Tão seca há-de bebê-las. E a verdura
virá de verde recobri-la toda
(como à maldade como somos duros
de tanto ter bebido sangue humano),
trazendo sobre si aquele mundo
em que mesmo dos ódios se construa a casa
para um só povo que dos ódios faça
o espaço e o tempo de existir tranquilo,
com toda a raiva de viver que sempre
fez que viver nos fosse sendo a vida.

Jorge de Sena

Santa Bárbara, 19/10/75
(aniversário de um dia sangrento da história portuguesa)

In “40 Anos de Servidão” “Poemas Políticos e Afins "
(1972-1977) - Moraes Editores


(Um longo poema, no dia do 30º aniversário em que foi
escrito, pois um espaço público destes que mais pode ser
senão para dar a conhecer o que é tão raro ter-se
disponível à mesa dos telejornais e das bancas dos jornais.
Além do mais é, para mim, uma gota de água transparente
na reconciliação com a história que, nos dias
em que foi dado à luz este poema, tão extremados
estavam os campos nos quais, afinal, haviam simplesmente
portugueses que, na sua maioria, lutavam para restaurar
a dignidade de um povo e de um país que tinham sido
humilhados, e se deixaram humilhar, quantas vezes,
pelo fascismo. Isso mesmo o fascismo de Salazar
cuja triste memória tantos, ainda hoje, tentam
empurrar para debaixo do tapete.)



terça-feira, outubro 18

PORTUGAL ENTRE OS MENOS CORRUPTOS


ACABOU DE "CAIR" O "DESPACHO" DA LUSA QUE, NA ÍNTEGRA, REPRODUZO. APÓS TER OUVIDO A NOTÍCIA DE QUE KATIA GUERREIRO - A MÉDICA FADISTA - VAI SER MANDATÁRIA DA JUVENTUDE DO FUTURO CANDIDATO PRESIDENCIAL, NÃO RESISTI A REPRODUZIR O DITO "DESPACHO" QUE NOS ANUNCIA QUE, AFINAL, AO CONTRÁRIO DE TODA A PROPAGANDA, OPINIÃO, DITO CORRENTE, CONVICÇÃO, CERTEZA, JURA E CONJECTURA, PORTUGAL ESTÁ ENTRE OS PAÍSES MENOS CORRUPTOS DO MUNDO. ORA BOLAS CAVACO! COMEÇO A ACHAR QUE O PAÍS, DE FACTO, NÃO PRECISA DE TI.


Corrupção: "Muito grave" em 70 países, Portugal entre os menos corruptos

Lisboa, 18 Out (Lusa) – Setenta países têm um "problema muito grave de corrupção", segundo o Índice 2005 de Percepção da Corrupção, hoje divulgado pela organização não-governamental Transparency International, que coloca Portugal entre os 30 países menos corruptos do mundo.


O índice, elaborado anualmente pela organização com base na avaliação da percepção de corrupção por empresários e analistas, aponta como mais corruptos de um conjunto de 159 países o Chade e o Bangladesh, que obtiveram 1,7 pontos numa escala de 10, em que o valor máximo corresponde ao menor grau de corrupção.

Portugal, o 26/o mais transparente, subiu um lugar em relação a 2004, obtendo este ano 6,5 pontos na avaliação feita por nove fontes, entre as quais o Fórum Económico Mundial e o Centro de Pesquisa dos Mercados Mundiais.

Os membros da União Europeia (UE) mais bem classificados são a Finlândia (2/o lugar), Dinamarca (4), Suécia (6), Áustria (10), Holanda e Reino Unido (11), Luxemburgo (13), Alemanha (16), França (18), Bélgica e Irlanda (19), Espanha (23) e Malta (25).

Portugal está atrás destes, mas classifica-se à frente de dois dos quinze países da UE pré-alargamento - Itália (40/o lugar) e Grécia (47) - e de nove dos dez novos membros - Estónia (27), Eslovénia (31), Chipre (37), Hungria (40) Lituânia (44), República Checa e Eslováquia (47), Letónia (51) e Polónia, o mais corrupto dos países europeus, que se classifica em 70/0 lugar.

Destes, merecem "nota negativa" (abaixo de cinco pontos) a Lituânia, a República Checa, a Grécia, a Eslováquia, a Letónia e a Polónia.

E quatro - Finlândia, Dinamarca, Suécia e Áustria - integram o grupo dos "dez mais" transparentes: Islândia, Finlândia, Nova Zelândia, Dinamarca, Singapura, Suécia, Suíça, Noruega, Austrália e Áustria.

Mais de dois terços dos países da lista têm nota negativa, mas os casos qualificados de "muito graves" pela organização são 70 e correspondem aos países que obtiveram menos de três pontos na avaliação feita.

Entre eles figuram, além de Moçambique e Angola, países como a Índia, a Argentina, a Rússia, a Indonésia, o Paquistão, o Afeganistão e o Iraque.

No fundo da lista estão o Bangladesh e o Chade, como uma nota de 1,7 pontos, seguindo-se o Haiti, Birmânia e Turquemenistão, com 1,8 pontos, a Costa do Marfim, Guiné Equatorial e Nigéria, com 1.9 pontos, e Angola, com 2 pontos.

Para a organização, o índice "testemunha o duplo fardo da corrupção e da pobreza carregado pelos países menos desenvolvidos do mundo": "A corrupção é a principal causa da pobreza e, ao mesmo tempo, o maior obstáculo à sua eliminação", disse Peter Eigen, presidente da Transparency International.

No comunicado que acompanha a divulgação do relatório, a organização refere que todos os 19 países que beneficiaram de perdões parciais da sua dívida ao abrigo da Iniciativa para os Países Altamente Endividados do FMI e do Banco Mundial, obtiveram uma pontuação de quatro ou menos pontos, que corresponde a "níveis graves ou muito graves de corrupção".

O texto refere, por outro lado, que se registaram "progressos assinaláveis" no último ano na Estónia, França, Hong Kong, Japão, Jordânia, Cazaquistão, Nigéria, Qatar, Taiwan e Turquia.

Em contrapartida, sofreram retrocessos ao nível da corrupção países como o Brasil, que passou do 59/o lugar em 2004 para o 62/o, Moçambique (do 90/o para o 97/o), Angola (do 133/o para o 151/o), e ainda Rússia, Costa Rica, Gabão, Nepal, Papuásia Nova-Guiné, Seicheles, Sri Lanka, Suriname, Trinidade e Tobago e Uruguai.


MDR.
Lusa/fim


(Os sublinhados são meus e as minhas desculpas pela imensidão do post mas já sei que a comunicação social vai tornar esta notícia, provavelmente, noutra notícia...).

CARLO E SOPFIA


Carlo Ponti e Sophia Loren (1966)

Uma imagem extraordinária de ternura (ou pura pose?) de duas figuras marcantes do cinema europeu de duas décadas. A ligação perfeita entre a capacidade de produzir e de seduzir!

Espanha - El inaplazable reto del "made in Spain"


Continuando a reflexão acerca da situação espanhola no âmbito da tecnologia, ciência e inovação, o "El País", de hoje, aprofunda o seu diagnóstico implacável.

"España es un 20% menos rica por la falta de inversión en I+DEl - conjunto de las empresas privadas 'tira' de la investigación mucho menos que la media de los países de la Unión Europea.

El salto adelante que propone el Gobierno sólo tendrá éxito si la empresa privada abandona su tibieza investigadora y acompaña a los poderes públicos en ese esfuerzo extraordinario. España precisa, desde luego, de una mayor y mejor financiación pública, pero, sobre todo, de una cultura empresarial de compromiso con la investigación aplicada.

El fútbol goza de mayor relevancia social en España que la ciência

La mayoría de los ejecutivos no ve en la Universidad un motor de desarrollo económico

La tibieza investigadora de la empresa privada obliga al sector público a cargar con el esfuerzo”.

Ler texto integral no IR AO FUNDO E VOLTAR.