sábado, maio 3

Politica - 16

Coisas simples: a esquerda, ou como se diz no politicamente correto, o centro esquerda, ganhou as eleições legislativas no Canadá e na Austrália. Dois grandes países com democracias consolidadas sinalizam o caminho para uma aliança politica anti fascista, no politicamente correto, anti autoritária e anti populista. Haja esperança!

Maio.

"Erro de uma psicologia de pormenor. Os homens que se procuram, que se analisam. Para nos conhecermos bem, temos que nos afirmar. A psicologia é acção - não reflexão sobre si próprio. Definimo-nos ao longo da vida. Conhecermo-nos perfeitamente, é morrer. [pág.34]. As filosofias valem aquilo que valem os filósofos. Maior é o homem, mais a filosofia é verdadeira. [pág. 36]. Combate trágico do mundo sofredor. Futilidade do problema da imortalidade. Aquilo que nos interessa, é de facto o nosso destino. Mas não "depois", "antes". [pág. 37]. Regra lógica. O singular tem valor de universal. -ilógica: o trágico é contraditório. -prática: um homem inteligente em certo plano pode ser um imbecil noutros. [pág. 37]. Os casais: o homem tenta brilhar diante de terceiros. A mulher imediatamente: "Mas tu também…", e tenta diminui-lo, torná-lo solidário da sua mediocridade. [pág. 41]. Mulheres na rua. A besta arrebatada do desejo que trazemos enroscada na cavidade dos rins e que se agita com uma suavidade estranha." [pág. 43]. Extractos, Albert Camus in "Cadernos" (1962-Editions Gallimard), Colecção Miniatura das Edições "Livros do Brasil", Caderno nº1 (Maio de 1935/Setembro de 1937).

sexta-feira, maio 2

Politica - 15

Todos os partidos de poder forçam as suas margens para alcançar o poder. Somente as ditaduras não têm margens para forçar, pelo menos reconhecidas como tal. Em democracia o exercicio do poder está delimitado pela lei, fiscalizado por diversas instituições, dependente do voto popular. Forçar as margens tem estes limites que algumas lideranças populistas desafiam. Por vezes vencem quebrando margens e limites. As ditaduras não são resquícios do passado. O maior desafio dos democratas é vencer, respeitando margens e limites. Por vezes perdem corrompidos pelo poder.

quinta-feira, maio 1

Dia de Maio

Hoje é dia de Maio, dizia-se no campo de meus avós, tão longe no tempo, tão perto na memória. Hoje passam 48 anos sobre a data em que se desfizeram muitas dúvidas acerca da natureza da revolução de Abril. Por toda a parte ressoaram os passos de milhões de manifestantes. Num repente um povo submisso parecia ter-se transformado num povo rebelde. Mas as revoluções só sobrevivem naqueles breves momentos de fusão em que tudo parece ser possível. Torga, apesar do seu cepticismo, vigilantemente crítico, escrevia, pouco tempo depois, no seu Diário: “Aveiro, 9 de Junho de 1974 – A caminho da Costa Nova, com a sensação de que os barcos navegam no meio dos milheirais.” E, ainda antes, a propósito das suas incursões pela política: “Coimbra, 1 de Junho de 1974 – Discurso num comício socialista. Ainda hei-de escrever meia dúzia de linhas a propósito da situação trágico-cómica de um poeta em bicos de pés num estrado cívico, a esforçar-se por estar à altura da sua reputação e ao mesmo tempo a saber que ninguém o ouve.” Jorge de Sena, na América, escreveu em 2 de Maio de 1974 o poema “Com que então libertos, hein?...”: “Falemos de política, / discutamos de política, escrevamos de política, /vivamos quotidianamente o regressar da política à posse de cada um /essa coisa de cada um que era tratada como propriedade do paizinho. /Tenhamos sempre presente que, em política, os paizinhos/ tendem sempre a durar quase cinquenta anos pelos menos. /E aprendamos que, em política, a arte maior é a de exigir a lua/ não para tê-la ou ficar numa fúria por não tê-la, / mas como ponto de partida para ganhar-se, do compromisso, /uma boa lâmpada de sala, que ilumine a todos. (…) As fotografias, a preto e branco, sobreviveram 51 anos tal como alguns de nós que nelas se podem rever. Eu continuei no quartel, como tantos outros, vigilantes, mas hoje arrependo-me de não ter saído à rua num dia assim. QUE VIVA O 1º DE MAIO!

quarta-feira, abril 30

Apagão

Apagão em dia de aniversário. Os pobres que trabalham sofrem mais. A campanha eleitoral empolga a indecisão. As empresas centrais na área da energia foram, faz tempo, privatizadas. A economia substituiu absolutamente o pensamento estratégico. Pensar tornou-se um luxo.

segunda-feira, abril 28

Aniversário

Um dia a mais, um novo dia, igual e diferente, nasci neste dia do calendário num ano distante. Sempre me revejo nos meus, por pertença e amor. Ao colo de minha mãe.

sábado, abril 26

Politica - 14

Coisas simples: o Papa Francisco morreu. O funeral realizou-se hoje. Inédito todos os três mais altos dirigentes do Estado português terem ido, em simultâneo, ao funeral, em Roma. O luto decretado pelo Vaticano dura 9 dias e começou hoje. Em Portugal começou ontem, dia 25 de abril. Toda a manobra de intimidação politica culminou com a surtida dos fascistas às portas da manifestação popular. Não tenhamos medo!

sexta-feira, abril 25

Memórias breves - 8

Como sempre acontece, ontem telefonou-me o António Dias. Aquela madrugada deixou-nos uma marca profunda. Diz ele que descendo com a coluna de Santarém, após muitas esperas e voltas, terá alguém da coluna, dando pela nossa presença, perguntado quem éramos. Somos da EPAM, respondemos. "Ah então os padeiros também estão metidos!" E terei concluido com um "vamos a isto!", e seguimos a coluna na direção da baixa da cidade. Estávamos fisicamente próximos do herói maior daquele dia: Salgueiro Maia e não sabiamos.

quinta-feira, abril 24

Memórias breves - 7

Na véspera do 51º aniversário do 25 de Abril tentei lembrar-me, uma vez mais, dos passos que terei dado nesse dia distante. Era uma 4ª feira. Basta consultar o calendário. Estava no tropa e devo ter frequentado, nesse dia, o quartel do Campo Grande. O chamado, na gíria, 2º Grupo (de Companhias de Administração Militar). Um dia mais tarde o Leite Pereira contou-me que, estando lá colocado, viu a minha ficha de suspeito quando ela lá chegou antecedendo o meu ingresso. Uma notícia nova acerca de uma rotina da época. Fervilhavam os boatos. Sabia que um golpe estava preparado para o dia seguinte. A fonte era credível. Acreditei. Fiz por acreditar. Temi um banho de sangue. Pensei nos meus pais. No meu irmão. Na minha namorada. Mas julgo que mantive a descrição. Como já contei, outras vezes, avisei os amigos civis mais íntimos. Organizei-me com os amigos militares que se haviam tornado conjurados. Não imaginava o que viria a passar-se após a arrancada da operação, um golpe militar, tornado revolução pela adesão popular. Um daqueles raros momentos de fusão que mudam o curso da história. Curto e fulminante.(Fotografia de Alfredo Cunha)

terça-feira, abril 22

Memórias breves - 6

Não me lembro do nascer do dia. Andávamos na rua à procura de entender se era mesmo verdade. Com o António Cavalheiro Dias e o João Mário Anjos percorri a cidade, de lés a lés, atrás da coluna de Salgueiro Maia, olhando cada esquina e movimento, com uma atenção fulminante, não fosse falhar tudo outra vez. Não me lembro de ter visto nascer o dia. Naquela noite não houve madrugada. Os telefones devem ter começado a tocar a partir de determinada hora: “Olha parece que houve um golpe militar!”, “dizem que há tropa na rua!”. A minha preocupação era telefonar a meus pais. No quartel pude fazê-lo já a manhã tinha despontado. Que alegria. Afinal não era um golpe dos ultras! Era um golpe militar mesmo daqueles com que sonharam Humberto Delgado e tantos que morreram sem conhecerem a cor da liberdade. 48 anos de ditadura é muito tempo! Que pena não poder ver os sonhadores da liberdade nesse dia. Observar a comoção nos seus rostos e ouvir as suas primeiras palavras. Mas não me lembro do despontar daquela madrugada. Ouço os sons, cheiro os cheiros, vejo os camaradas de armas, o povo a passar defronte do quartel, bandeiras desfraldadas ao vento, as vozes enrouquecidas e as lágrimas a cair-lhes pelas faces, mas não me lembro do despontar do dia 25 de Abril de 1974. Mas o que interessa é que estava lá. E vencemos! (Fotografia de Alfredo Cunha).

segunda-feira, abril 21

Francisco - não tenhamos medo

Seria de esperar este festival de hipocrisia pela morte de Francisco, de todos os tipos, impressionando a pura hipocrisia, caldeada de ignorância, à hipocrisia politica mostrando os inimigos fidagais das ideias de Francisco, tecendo loas às suas virtudes. Os protofascistas, como sempre despodurados, mostram as suas garras através de votos de pesar. O expoente máximo é Trump mas podemos-lhe juntar Milei, Putin e um cortejo de aspirantes a ditadores, senão mesmo já ditadores, em exercício. O penúltimo livro que li foi "Esperança", uma autobiografia de Francisco, e dessa leitura confirmei a ideia que havia formado acerca do homem e do poltico que, afinal, no exercicio das funções eclesiásticas ele foi: um revolucionário, do lado do progresso, no nosso tempo. Como ele tanto gostava de dizer, não tenhamos medo, não tenhamos medo...

Francisco - dobram os sinos

"56. Enquanto os lucros de poucos crescem exponencialmente, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz. Tal desequilíbrio provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso, negam o direito de controlo dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras. Além disso, a dívida e os respetivos juros afastam os países das possibilidades viáveis da sua economia, e os cidadãos do seu real poder de compra. A tudo isto vem juntar-se uma corrupção ramificada e uma evasão fiscal egoísta, que assumiram dimensões mundiais. A ambição do poder e do ter não conhece limites. Neste sistema que tende a devorar tudo para aumentar os benefícios, qualquer realidade que seja frágil, como o meio ambiente, fica indefesa perante aos interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta." In EXORTAÇÃO APOSTÓLICA - EVANGELII GAUDIUM DO PAPA FRANCISCO - 24 de novembro de 2013

domingo, abril 20

Memórias breves - 5

A fita do tempo da madrugada de 25 de abril: 07H20/ As forças in[imigas] estão a ser comandadas Brig. Reis que vai col[una] Romeiras. Vão ocupar embocaduras Terreiro [do] Paço com forças RI1. O Brig. Junqueira dos Reis era o 2º Comandante do Governo Militar de Lisboa e comandava a força da ordem pública do GML. A minha memória dizia-me que tudo se tinha passado mais cedo na madrugada. Assisti ao vivo, com António Dias, à marcha das duas colunas que se haviam de enfrentar. Uma extraordinária coincidência no tempo e no espaço. (Fotografia de Alfredo Cunha).

sábado, abril 19

Politica - 13

“A administração das coisas e a direcção dos homens haviam-lhe ensinado muito, mas sobretudo, aparentemente, que uma pessoa sabia pouco das coisas.” Albert Camus, in Primeiro Homem.

sexta-feira, abril 18

Memórias breves - 4

No dia 24 de Abril fomos contactados no quartel por um colega do curso de oficiais milicianos. As últimas dúvidas quase se tinham dissipado. A acção militar ia ser desencadeada na próxima madrugada. Fui a casa do Eduardo Ferro Rodrigues, meu amigo de juventude e de todas as militâncias, na Travessa do Ferreiro, para o avisar de que alguma coisa (o golpe) se iria passar nessa noite. Era fim da tarde. A RTP transmitia um jogo do Sporting, com um clube da Alemanha de Leste, para uma eliminatória das competições europeias de futebol. Deixei o recado e pus-me a caminho. Tudo era imprevisivel na hora de mais uma tentativa de derrubar a ditadura. (Fotografia de Alfredo Cunha).

quinta-feira, abril 17

Memórias breves - 3

Greve dos CTT s com manifestação. Estava no quartel. Lembro-me de nos terem reunido e de um oficial superior encetar a tarefa impossível de ordenar a um oficial miliciano (ou oficiais) que comandasse a força destinada a reprimir a manifestação. Começou por uma ponta na qual, por acaso, se haviam posicionado o João Mário Anjos e o Carlos Marvão. Não sei já qual foi o primeiro a recusar a ordem mas indagado o segundo, que também recusou, o oficial resolveu suspender a diligência. Logo a seguir, na terceira posição estava eu próprio. Nos dias 25 e 26 de Junho de 1974 foi concretizada a prisão dos dois oficiais rebeldes que seguiram para a prisão da Trafaria. Foi duro e penoso. O João Mário era intrépido e corajoso nos limites. (Cartaz de Robin Fior).

quarta-feira, abril 16

João Cravinho - RIP

Da esquerda para a direita: João Cravinho, Raul Pinheiro Henriques, Filomena Aguilar Ferro Rodrigues, Francisco Soares, José Manuel Galvão Teles, César Oliveira, Edilberto Moço. Atrás, à direita, Luísa Pedroso Lima e, à direita, no primeiro plano, Diomar Santos. (No almoço de extinção do MES)

terça-feira, abril 15

Memórias breves - II

Um episódio da tropa em Mafra que me ensinou como é preciso ter cuidado com as aparências. Um dia, pela manhã, na parada, o Major, Comandante da Companhia, que tinha na conta de um militarão, aproximou a sua boca ao meu ouvido e, em voz ciciada, avisou-me de que estava na lista dos «subversivos». Ouvi, estremeci e calei. Não o conhecia. Era, na verdade, um oficial discreto que cumpria com os seus deveres. Eu cumpria com os meus. Nada o obrigava a correr o risco de me avisar. A ficha da PIDE acompanhou-me sempre. Este episódio ajudou-me a aprender como é difícil, no mundo dos homens, ajuizar acerca da natureza do seu carácter e dos valores que os movem na sua relação com os outros. Nunca mais esqueci a nobreza do gesto do major que tomei à conta de generosidade.

segunda-feira, abril 14

Memórias breves - I

Nós não sabiamos o que iria acontecer, qual a solução para a queda da ditadura. Na verdade somente nos interessava soprar o lume da revolta. Pôr fim à guerra que arrastaria, quase inevitavemente, o fim do regime. Um dia em Mafra, a cumprir a instrução militar, soube que um jovem capitão do quadro que ali vira à pouco a instruir, morrera. Lembro-me do choque e ainda hoje recordo a sua figura. Uma galeria interminável de memórias da miséria da guerra com suas vitimas inocentes.

quinta-feira, abril 10

Politica - 12

Coisas simples: os revolucionários do nosso tempo, com Trump à cabeça, avançam contra a ordem estabelecida tendo em vista a sua destruição. Quem diria? O que está a acontecer não é um episódio fugaz, mas uma tendência em continuidade. "Liberdade, liberdade, tem cuidado que te matam". Jorge de Sena