domingo, março 21

DIA MUNDIAL DA POESIA

Os dias evocativos valem o que valem. Mas está bem de ver que a poesia marca um espaço relevante no meu espírito e ocupa uma boa parte do meu tempo livre. Resolvi, aquando da criação deste blogue, nele não publicar senão poesia de outros. E, entre todos os poetas portugueses, vivos ou mortos, o meu preferido é Jorge de Sena. Assim não admira que, neste dia, tenha escolhido publicar um dos poemas mais extraordinários de sua autoria e da poesia portuguesa de todos os tempos.


UMA PEQUENINA LUZ


Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una piccola ... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta
que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indefectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não iluminam também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui.
no meio de nós.
Brilha.

1950

Jorge de Sena
In Fidelidade (1958)


Ópera "Os fugitivos"


Fui ver "Os Fugitivos" uma ópera original criada por portugueses e falada em português. Quantas vezes na história recente da nossa cultura foi construída uma ópera por encomenda de uma qualquer entidade? Poucas. Raramente e quase sempre só a propósito de grandes eventos nacionais.

Mas esta foi uma encomenda resultante de um projecto de teatro musical e popular que o Teatro da Trindade, através da iniciativa do seu director, Carlos Fragateiro, concebeu e que o INATEL, em tempo oportuno, sob a minha direcção, aprovou.

É um caso exemplar da "pesada herança" socialista assumida, neste caso, pela actual direcção do INATEL. Ainda bem, pois demonstra bom senso e bom gosto. Vamos a ver as cenas dos próximos capítulos…

Gostei da Ópera. Contemporânea. Aderindo aos problemas do nosso tempo. Aberta ao quotidiano. Estruturada e surpreendente nos planos musical e cenográfico. Sem o aparato das grandes óperas de reportório. Mais na linha da "Ópera de Estúdio". Irreverente e criativa. Com alguns bons interpretes. Uma verdadeira lição de como se pode produzir um espectáculo de qualidade com um pequeno orçamento. Muitos apreciadores do género gostariam de ter participado neste aventura. Tive a felicidade de ter participado e tenho muito orgulho nisso. Obra limpa e séria.

Esta Ópera vai ser gravada pela RTP, ao contrário do que aconteceu com o musical "O Navio dos Rebeldes", o que foi uma pena e uma perda. Estes registos são importantes não só para a história como para a divulgação de obras originais que são produzidas à margem dos teatros nacionais....que, aliás, produzem muito pouco.

sábado, março 20

Setembro de 1941

Albert Camus escreveu no seu Caderno, em Setembro de 1941, uma frase cheia de actualidade:

"Organiza-se tudo: É simples e evidente. Mas o sofrimento humano intervém e altera todos os planos"

"In Caderno n.º 3 - Abril de 1939/Fevereiro de 1942"

Parapente em Linhares acabou?



A notícia de que a Escola de Parapente, dirigida por Vítor Baía, vai abandonar a Aldeia Histórica de Linhares da Beira e passar a funcionar em Manteigas é uma realidade.

A imprensa regional
tinha dado relevo a essa possibilidade.


O INATEL promete manter a actividade do parapente em Linhares mas não parece muito convincente.

O Parapente e, em particular, o Open de Linhares da Beira, são uma realidade que representa muitos anos de trabalho sistemático e estruturado. É o desenvolvimento sustentável…na prática.

O Parapente em Linhares acabou?

(A partir de um alerta do Pedro Pedrosa)

sexta-feira, março 19

19 de Março de 1941

Neste dia Albert Camus escreveu no seu Caderno esta frase primaveril:

"Em cada ano, o florir das raparigas sobre as praias. Elas só têm uma estação. No ano seguinte, são substituídas por outros rostos de flores que, na estação maior, ainda eram garotas. Para o homem que as contempla, são vagas anuais cujo peso e esplendor se derrama sobre a areia amarela."

"In Caderno n.º 3 - Abril de 1939/Fevereiro de 1942"

Aborto - uma lembrança

"O acto sexual é para fazer filhos"

Poema de Natália Correia
a João Morgado (CDS)

"O acto sexual é para ter filhos" - disse, com toda a boçalidade, o deputado do CDS, no debate de 1982, sobre a legalização do aborto. A resposta, em poema, fez rir todas as bancadas parlamentares. Veio da deputada Natália Correia:


Já que o coito - diz Morgado -
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.
Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou - parca ração! -
uma vez. E se a função
faz o orgão - diz o ditado -
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado.

NATÁLIA CORREIA
Diário de Lisboa, 5 de Abril de 1982.

25 de abril - notas pessoais


O tempo das ilusões


Depois de concluída a especialidade fiquei a dar instrução militar, o tempo todo, no 2º GCAM, no Campo Grande, em Lisboa. Passaram-me pelas mãos muitas centenas de jovens soldados recrutas aos quais industriei, o melhor que sabia, na área da administração militar. Foram sucessivas "semanas de campo" e incessantes sessões de instrução de tiro na Carregueira. Estas davam-me um prazer especial com excepção do "lançamento de granadas".

Assim correu o tempo, desde meados de Abril de 1972, até ao 25 de Abril de 1974. A minha vida fazia-se entre o quartel e encontros de conspiração com os amigos e activistas que haveriam de confluir no MES (Movimento de Esquerda Socialista). Tinha a cabeça povoada de todas as ilusões que resultavam das leituras libertárias e marxistas, liberais e heróicas, sonhadoras e utópicas de Huxley, Camus, Gramsci, Luckac, Lenin, Marx, Rosa Luxemburgo, Mao, José Gomes Ferreira, Aquilino, António José Saraiva...

As ideias da democracia directa, das comunas, da plena participação popular, tinham-se sobreposto à realidade, bem mais prosaica, da democracia representativa. Os ecos próximos da experiência do Maio de 68, em França, tinha dado asas à utopia de que o caminho para a felicidade se poderia encontrar na revolta contra o poder burguês. O tempo das ilusões...

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quinta-feira, março 18

18 de Março de 1941

Neste dia Albert Camus escreveu, em plena 2ª Guerra Mundial, no seu Caderno: "Os montes por cima de Argel trasbordam de flores na primavera. O aroma a mel das flores derrama-se pelas ruazinhas. Enormes ciprestes negros deixam jorrar dos seus cumes reflexos de glicínias e de espinheiros cujo percurso se mantém dissimulado no interior. Um vento suave, o golfo imenso e plano. Um desejo forte e simples - e o absurdo de abandonar tudo isto.

"Santa Cruz e a subida através dos pinheiros. O alargamento contínuo do golfo até ao alto de onde a vista se perde sobre uma imensidade. Indiferença - e eu também tenho as minhas peregrinações."

In Caderno n.º 3 - Abril de 1939/Fevereiro de 1942

25 de Abril - notas pessoais

O serviço militar


A minha entrada para o serviço militar deu-se em 7 de Outubro de 1971. Passei à disponibilidade em 4 de Outubro de 1974. Cumpri 3 anos menos dois dia de serviço militar obrigatório. Apesar daquele incidente no dia 16 de Março a minha folha de serviços está impecávelmente limpa.

Como todos os futuros oficiais milicianos, nessa época, fui incorporado em Mafra. Lembro-me, com nitidez, do primeiro dia do serviço militar. Fui no autocarro da carreira com partida de Lisboa. À chegada a inspecção médica, o corte do bigode, pois já tinha antes cortado a barba que, ao longo da vida de adulto, sempre me tem acompanhado.

Seguiram-se três meses de dura instrução. Os meus companheiros mais próximos foram o José Pratas e Sousa e o Raúl Pinheiro Henriques. Na tropa faziam-se fortes amizades e cumpriam-se as regras estritas da instituição militar. Não me desgostou.

No fim da instrução seguiram-se três meses de "especialidade" cumpridos na EPAM, Lumiar, Lisboa. Por ironia do destino nunca fui mobilizado. A conjugação da classificação no curso com a abundância de oficiais do ramo da administração militar fizeram com que não fosse mobilizado para as colónias.

Fui desta forma poupado à decisão dramática que se colocava a muitos que, como eu, tinham assumido uma opção contra a guerra colonial: desertar ou embarcar. Pessoalmente, ainda bem que assim foi. Os meus pais foram poupados à angústia de ver um filho partir para longe de onde podia não mais regressar.

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quarta-feira, março 17

Música

As notícias acerca do volume de jovens que, em Portugal, abandonam precocemente a escola é preocupante. Sejam os valores apresentados pela UE (quase 50%), ou outros valores mais suaves, é uma situação de emergência nacional.

Não está em causa a estatística mas as vidas que se escondem por detrás da estatística. Os jovens, na maior parte dos casos, abandonam a escola por razões económicas no quadro de situações familiares à beira do limiar da sobrevivência.

Contrariar esta tendência é uma tarefa do Estado, quer dizer, da comunidade. O núcleo essencial para atacar o problema é a escola. A comunidade escolar conhece os problemas dos alunos, as suas dificuldades, as tensões que atravessam as suas vidas concretas.

O combate ao abandono da escola, antes do fim da escolaridade obrigatória, deveria ser considerado um grande desígnio nacional. Assim uma espécie de Euro 2004. Com prazos fatais. E obras emblemáticas. E figuras públicas reconhecidas envolvidas na promoção. Uma campanha a sério com objectivos quantificados e fiscalização da sua execução. Assim uma espécie da campanha, realizada anos atrás, para o uso do cinto de segurança nos automóveis.

Não sei se seremos capazes de planear a médio/longo prazo um projecto de reducção drástica desta hemorragia de recursos que representa o abandono escolar. Seria necessário muita clareza nas medidas e muita determinação e rigor nos procedimentos e nas acções a empreender para as tornar mobilizadoras para toda a comunidade nacional. Não se trata tanto de uma questão de recursos materiais mas de vontade política e de mobilização cívica.

Mas o futuro de Portugal depende de sermos capazes de pôr fim a esta situação anómala de muitas famílias e jovens encararem a escola como uma obrigação que se pode abandonar sem uma fortíssima penalização social. É um projecto que exige uma complexa engenharia de meios financeiros, materiais e humanos. Exige o fim das querelas e disputas entre as instituições que gerem os recursos destinados à formação profissional e à educação. A participação empenhada dos parceiros com papel no terreno: professores, funcionários, sindicatos, associações de pais, autarquias, etc.

Eis uma tarefa gigantesca que exige ambição e vontade de reforma autêntica. O título deste post - música - deve-se ao facto de o ter pensado, inicialmente, para dar notícia que o meu filho, de 13 anos, obteve a nota máxima em mais um teste de música. Uma trivialidade que serve para concluir que o sucesso do processo educativo não passa só pela boa prestação dos alunos nas áreas tradicionais em que assumem papel prepoderante as disciplinas de matemática e português. Atenção às artes, às ciências e ao ensino profissional.

Um debate nacional é urgente. Quem o promove?

ÓPERA

" Os Fugitivos" sobem ao palco do Teatro da Trindade que acolhe, esta quarta-feira, a estreia de "Os Fugitivos", uma ópera em português com libreto escrito por Rui Zink. As récitas vão até ao dia 04 de Abril. Com o objectivo declarado de fazer uma ópera acessível, José Eduardo Rocha e Rui Zink criaram, a convite do Teatro da Trindade, "Os Fugitivos".
Esta notícia tem um especial significado para mim. A ideia de assumir este projecto foi do Carlos Fragateiro, director do Teatro da Trindade, desde 1999. Raros são aqueles que sabem mas o TT é uma estrutura do INATEL.
Quem aprovou a produção desta ópera foi o INATEL quando eu exercia as funções de Presidente da Direcção. Uma ousadia e um risco num país de sacanas onde impera a inveja e a vil baixeza. Felizmente que ninguém foi capaz de atropelar os fugitivos. Este é certamente um espectáculo digno e de qualidade, realizado com poucos recursos.
Onde estão as óperas do Teatro S. Carlos? E o Teatro D. Maria, que é feito?

Aniversário

O Governo ficou, de súbito, muito preocupado com a ameaça terrorista no território português. Ou melhor ficou preocupado com a vitória do PSOE. Os socialistas espanhóis têm na própria sigla um sem número de horrores: PSOE - Partido Socialista Operário Espanhol. Socialista e Operário. Ao fim de dois anos o Governo português tem, certamente, razões para estar preocupado. Mas os portugueses podem ficar descansados. A retoma vem aí. Os Ministros da Administração Interna, da Defesa e da Justiça dão garantias de segurança e o Dr. Delgado, à frente da Lusa, dá garantias de verdade e isenção na informação. Além do mais Portugal não é a Espanha. Aqui quem está no Governo não é o PP, é o PSD. Já repararam?

Soneto VI


De mim não falo mais: não quero nada.
De Deus não falo: não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.

Nem de existir, que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver, que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.

Por mais justiça... -Ai quantos que eram novos
em vão a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade...Ó transfusão dos povos!

Não há verdade: o mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais, todos mentiram.

Jorge de Sena
In Génesis - Coroa da Terra (1946)

25 de Abril - notas pessoais


Intolerável absurdo


O golpe militar foi a consequência inevitável do predomínio dos ultraconservadores na governação. O Estado Novo, na sua fase terminal, esmagou a "ala liberal" na qual, muitos de nós, tínhamos depositado esperanças de mudança. De facto o grande acontecimento político do século XX português, depois da implantação da República, em 1910, teria sido a transição pacífica da ditadura para a democracia.

Depois da morte política de Salazar o que terá passado pela mente de Marcelo Caetano? Porque não agiu? Por falta de coragem? Por falta de um verdadeira desígnio reformista? A razão de fundo para essa trágica omissão terá sido a política colonial que, desde o início dos anos 60, foi conduzida com o recurso à guerra, em desfavor da negociação com os movimentos de libertação. O regime foi conduzido a um beco sem saída. Os reformistas civis não foram capazes de forjar uma aliança consequente com os reformistas militares.

Ainda hoje está por explicar, por outro lado, o papel da diplomacia das potências ocidentais nesta estranha situação de arrastamento de uma crise que se havia declarado, a partir de 1958, aquando da fracassada candidatura presidencial do General Humberto Delgado. As diplomacias ocidentais, que certamente estavam bem informadas dos acontecimentos em Portugal mantiveram, salvo raras e honrosas excepções, uma plácida e comprometedora inércia, que nem o cruel assassinato de Humberto Delgado desbloqueou. Será possível que os EUA e as potências europeias tenham sido apanhadas desprevenidas pelo 25 de Abril?

Intolerável absurdo!

(3 de 32 continua)

Mudança

Hoje processou-se uma mudança na apresentação do absorto. Três meses depois de ter iniciado a sua participaçãp na blogosfera era tempo de encetar uma mudança de visual. Por outro lado o editor do absorto tinha programado assumir plenamente a sua autoria passada uma primeira fase experimental. Apesar da próxima criação de um blogue colectivo, no qual participarei, e que deverá ser apresentado por alturas do dia 25 de Abril, o absorto manter-se-à com autoria individual. As mudanças vão continuar porque acreditamos que, apesar de todas as resistências, enganos e mal entendidos, a internet é o futuro.
Eduardo Graça

terça-feira, março 16

25 de Abril - notas pessoais

16 de Março - um mau prenúncio


O chamado "Golpe das Caldas" ocorreu a 16 de Março de 1974. Passam hoje exactamente 30 anos.

Cumpria, como Oficial Miliciano, o serviço militar obrigatório no 2º Grupo de Companhias de Administração Militar (2º GCAM), onde hoje está instalada, no Campo Grande, em Lisboa, a "Universidade Lusófona". Depois de conhecidas as notícias do avanço da coluna militar, a partir das Caldas da Rainha, instalou-se uma grande agitação no quartel. Era sábado mas eu estava lá talvez porque estivesse de serviço. Finalmente surgia uma manifestação concreta de revolta militar mas eram notórias as dúvidas e incerteza acerca do destino do golpe.

Pela manhã desse dia recebi ordem do Comandante para recolher ao quarto. Estive preso umas breves horas. Após o golpe ter fracassado, na manhã seguinte, mandaram-me sair. Fiquei aliviado. Iniciava-se, assim, a fase final do verdadeiro e decisivo golpe militar.

Não o podíamos adivinhar mas o "Estado Novo" que, desde a ditadura militar, instaurada pelo golpe de 28 de Maio de 1926, iria perfazer 48 anos, estava a breves semanas do fim. Várias gerações de portugueses viveram toda, ou grande parte, das suas vidas sem conhecerem a cor da liberdade, pesando sobre as cabeças dos conspiradores a responsabilidade de pôr fim ao pesadelo. (2 de 32 continua)

segunda-feira, março 15

As "Esquerdas Terroristas" ("ETs")

Bem me queria parecer que esta coisa das eleições podia dar chatices. É claro que a maioria dos "10 grandes educadores da opinião pública" ficaram tristes com o sentido do voto dos "nuestros hermanos". A democracia, para eles, não está em causa. O problema é a surpresa. O povo vota muitas vezes com o coração. Se a esquerda ganha o povo vota de uma forma impensada. Influenciado pelas más razões. É vingativo. Pouco generoso. A democracia não está educada mas não está em causa. No caso de "nuestros hermanos" este resultado foi uma vitória para os terroristas. A partir deste momento histórico sempre que a direita perder eleições quem ganha não é a esquerda, é o terrorismo! Eis um extraordinário argumento democrático. A associação da palavra esquerda a "terrorismo", tornando socialistas e social-democratas, nas suas diversas formulações no Mundo Ocidental, em "ETs" - "esquerdas terroristas". Tanto mais que na esquerda, que se saiba, são estas formações políticas que ganham eleições. A democracia é, para a direita, um valor absolutamente intocável caso ganhe as eleições. Mas, caso ganhe a esquerda, a democracia passa a ser um subtil instrumento dos desígnios tenebrosos do terrorismo internacional. Eis ao ponto a que chegou o rigor ético do pensamento político dos publicistas da direita. Bem vistas as coisas os 10 milhões e meio de espanhóis que votaram no PSOE são aliados dos terroristas e, nalguns casos, serão mesmo terroristas. Se Kerry ganhar as eleições nos EUA a maioria dos americanos passarão à condição de suspeitos de terrorismo senão mesmo terroristas... Este é o jogo da direita ultraconservadora e da extrema direita para descredibilizar a democracia. Que os "educadores da opinião pública", com passado e, nalguns casos, presente, socialista e social-democrata, caiam nesta armadilha é que espanta e … assusta!

domingo, março 14

25 de Abril - notas pessoais

O passado e o futuro


25 de Abril de 1974. Passaram 30 anos.

Pouco tempo na história de um país. Muito tempo para uma geração. As datas históricas ganham espessura com o passar do tempo. Mas os seus protagonistas não devem apresentar-se como sobreviventes de uma época em que fizeram história. Apesar de todas as vicissitudes, excessos e erros, o 25 de Abril foi o dia da reconquista da liberdade. A data é uma circunstância. Ela identifica o tempo dos acontecimentos.

Este é o primeiro de 32 textos, fragmentos sem cronologia, notas pessoais escritas de memória, com referências a factos, alguns inéditos, que não têm pretensão de escrever história. No Portugal contemporâneo celebrar o 25 de Abril, deveria ser uma oportunidade para debater os grandes desígnios nacionais do presente e do futuro: a reforma da democracia representativa e o reforço da integração de Portugal na Europa. São estes os temas que há que debater a nível nacional.

Não creio que esta celebração seja um contributo relevante para esse debate e para a consolidação e desenvolvimento das extraordinárias conquistas políticas e sociais dos últimos 30 anos. A tendência das celebrações é a de evocar o passado e Portugal precisa, com urgência, de repensar o futuro. Apesar da mentira espreitar, as mais das vezes, nas evocações do passado, realçando o lado mais favorável das nossas próprias memórias, escondendo erros, fracassos e injustiças próprias, que outro acontecimento foi mais importante, no Século XX português, do que o 25 de Abril?

Por isso decidi correr o risco...

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Eleições em Espanha

Se a participação popular nas eleições for forte será uma vitória para a democracia e para a liberdade. Ganhe quem ganhar. Isso é o mais importante. O terrorismo é uma realidade com a qual a Espanha convive desde há muitos anos. Não é uma novidade nem para os espanhóis nem para ninguém. A Europa não é, nem nunca foi, um paraíso imune ao terrorismo como nos querem fazer crer. Tem havido recentemente atentados na Europa. Desde logo em Espanha através da ETA mas lembremo-nos do assassinato da Ministra dos Estrangeiros Sueca, antes dela, do líder do partido de extrema-direita holandês, ou antes ainda Olof Palme e lembremo-nos dos atentados em Itália e da situação na Irlanda…É um assunto abordado por pensadores, políticos e artistas desde há muitos séculos. O cinismo e a mentira também não são novidade na política e na diplomacia. A propósito de atentados, como o de 11 de Março em Madrid, mais vale não acreditar no que afirmam os governos, em particular, em véspera de eleições. Mas, em qualquer circunstância, os povos têm direito a saber a verdade e os governos democráticos a obrigação de lhes dizer a verdade..

sábado, março 13

25 de Abril - notas pessoais

As 32 notas pessoais que publicarei, a partir de 2ª feira, dia 15 de Março, sob o título "25 de Abril - notas pessoais", podem ser desenvolvidas no futuro. Depende exclusivamente da minha vontade. Nunca nada está encerrado na nossa memória mas a memória individual não é eterna. Como disse Camus "Só tardiamente ganhamos a coragem de assumir aquilo que sabemos." Concordo plenamente. Resta sermos justos no exercício da nossa liberdade de expressão.