Às vezes apetece-me oferecer alguma coisa de mim daquelas que se não podem encontrar no mercado e ponho-me a pensar – o quê? Muitas vezes não tenho nada que valha a pena oferecer, não se quadra o desejo com o gesto, nada emerge de dentro que me satisfaça, fico a olhar para as palavras alinhadas, adio, finjo esquecer, ou esqueço mesmo, pois já me tenho esquecido do que não me havia de esquecer. É imperdoável.
Outras vezes sinto aquela sensação que o Ruy Belo – salvo qualquer comparação – tão bem descreveu em três versos do poema REQUIEM POR SALVADOR ALLENDE : (…) Acabara um poema enchia o peito de ar junto da água/sentia-me importante conquistara palavras negação do tempo/o mar era mais meu sob a minha voz ali solta na praia/ (…) e sinto vontade de partilhar o meu prazer.
Antes escreviam-se cartas ou postais, tantos que tenho – trocados entre meus pais – ou enfiava-se a prosápia na gaveta o que – quase sempre – era a mais que merecida sorte da aventura criativa. Pois um dia destes ofereci um poema à Helena e ela, vai daí, “deu-lhe asas”. Um poema, regra geral, para obter os requisitos de publicável, seja lá em que suporte for, dá um trabalho dos diabos.
Todos devem saber que só poucos poemas escapam do lixo e raros – raríssimos – saem à primeira, a mais das vezes, acumulam-se variantes que, sucessivamente, se apagam umas às outras, ao contrário do que acontecia antes com os entrelinhados, emendas e notas à margem da escrita no papel, pois o processo criativo transformou-se radicalmente com o computador, os sites, os blogs e o que mais aí virá.
Não imagino Cavafy, confrontado com a sua selectividade implacável, a escrever nestas máquinas infernais mas não vale a pena tentar agarrar o vento com as mãos…
Eu acumulo mas tenho dias em que me apetece oferecer alguma coisa de mim e, desta vez:
Onde está
Onde está a seara de vento que ondulava
Azul no meu pensamento
Com sons de trigo a escorrer pela eira
E o dia a morrer devagar
À minha beira à vista dos olhares belos
Por vezes tristes de melancolia
Onde se esconderam os gestos antigos
Rasgados e sem medida
Abraçados ao corpo que se despedia
Olhos ao alto num rosto
Cheio de lágrimas
Salgadas do gosto da carne ferida
Onde está a minha vontade desmedida
Que não a encontrei mais
Flamejante a incendiar os sonhos
Impressos a sangue quente
Na ausência habitada
Da tua crença em mim perdida
20/4/2007
Eu acumulo mas tenho dias em que me apetece oferecer alguma coisa de mim e, desta vez:
Onde está
Onde está a seara de vento que ondulava
Azul no meu pensamento
Com sons de trigo a escorrer pela eira
E o dia a morrer devagar
À minha beira à vista dos olhares belos
Por vezes tristes de melancolia
Onde se esconderam os gestos antigos
Rasgados e sem medida
Abraçados ao corpo que se despedia
Olhos ao alto num rosto
Cheio de lágrimas
Salgadas do gosto da carne ferida
Onde está a minha vontade desmedida
Que não a encontrei mais
Flamejante a incendiar os sonhos
Impressos a sangue quente
Na ausência habitada
Da tua crença em mim perdida
20/4/2007
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