Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
quinta-feira, outubro 19
EÇA AO PANTEÃO
«Honny soit qui mal y pense» [1880/1902, Gravura, Album das Glorias - Caricatura
de Rafael Bordalo Pinheiro (1846-1905)]. O caricaturado
, Eça de Queirós, nasceu
na Póvoa de Varzim em 25 de Novembro de 1845.
Lembro-me, como se fosse hoje, da
leitura de largos trechos das “Farpas” pelo Prof. Almodoval, sempre com a sua
gabardina com um rasgão “pespontado”, nas aulas do Liceu. Era no tempo das
turmas pequenas e dos professores fascinantes. Sempre podem haver professores
fascinantes mas na escola elitista o seu peso era maior. Aquelas leituras das
“Farpas” eram uma bênção caída do céu. O tom irónico da crítica social assumia,
no tempo da ditadura, uma espessura e intencionalidade política ("não dita") que
era corrosiva e apaixonante. Sentia-se a subtil passagem de uma mensagem como
que a dizer-nos: “não se deixem amordaçar”, “abram os olhos”, “tomem a realidade
pelos cornos” … uma pedagogia da assumpção de uma cidadania antes do tempo da
democracia. Vi um dia o Prof. Almodoval, com um professor de “canto coral”, o
Prof. Dores, num jogo de futebol no velho “Estádio Padinha”, em Olhão, e não
mais me esqueci do sentimento de estranheza que me tomou acerca da sua presença
ali. O que os teria levado ao futebol? Um gosto que eu não era capaz de colar
aos seus gostos. Ignorância minha. Nunca conhecemos os homens pelas suas
leituras mesmo quando pensamos que os conhecemos. Desse professor, como de
outros que me marcaram profundamente, nunca cheguei, de verdade, a conhecer
nada. Somente a antever a sua cultura humanista e o seu prazer, comedido, em
passar para os alunos o gosto por aprender, o estímulo à curiosidade e, no
fundo, o apelo à insubmissão.
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