sexta-feira, julho 7

A MARGEM DA ALEGRIA - 10

Posted by Picasa Fotografia de Philippe Pache

e não havia tantas tão miúdas minudências rodeando os corpos

Quando as raparigas punham todo o peso da sua esmagadora juventude
no pé e o pé no pó das antigas estradas a caminho das fontes
onde a água corria pelos vagarosos dias desse tempo
quando os cortesãos nos refeitórios de alto pé-direito e telha vã
renovavam as rosas do colar murchas com o calor
antes de cavalgarem toda a noite pelos campos até de madrugada
quando não só as salas mas as vidas não ficavam
de repente vazias de convivas

(…)
Ruy Belo

A Margem da Alegria [10]

VÍTOR WENGOROVIUS, OUTRA VEZ

Posted by Picasa VÍTOR WENGOROVIUS NO JANTAR DE EXTINÇÃO DO MES

Só agora vi o comentário que a Rita e a Marta Wengorovius, filhas do Vítor, deixaram na caixa de comentários a respeito deste post, encimado pela Fotografia de António Pais , da série respeitante ao jantar de extinção do MES.

Aqui fica o comentário/apelo, com retoques de detalhe:

“Agradecemos comovidas pelas tuas palavras, conseguimos rever o nosso pai por um bocadinho, ajudas-te a revê-lo, andamos a juntar histórias e depoimentos para um livro. Passa a mensagem para que quem o conheceu nos envie material.
Obrigada

Rita e Marta Wengorovius


rita_wengorovius@hotmail.com; wengoroviusmarta@clix.pt; teatroumano@hotmail.com

Sophia Loren no "Pirelli" 2007

quinta-feira, julho 6

A REFORMA DAS REFORMAS

Posted by Picasa Fotografia daqui

Já está disponível no site do “Semanário Económico” o artigo de opinião, com o título em epígrafe, assim como no IR AO FUNDO E VOLTAR.

"A reforma das reformas é a do estado. Reduzir, redimensionar, repensar e qualificar o estado é uma tarefa gigantesca e repleta de escolhos. A resistência às mudanças exige a tomada de medidas enérgicas e uma enorme capacidade de persuasão. É o que está à vista de todos na iminência da concretização do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE)."

TUDO VALE A PENA SE A ALMA NÃO É PEQUENA

Posted by Picasa Figo e Zidane

Vencidos e vencedores. Profissionais e desportistas. Rivais e amigos. Um gesto simbólico que honra os vencidos e enobrece os vencedores. Uma imagem que percorre o mundo, de lés a lés, ajudando à luta pela paz e a concórdia entre os povos e os homens de boa vontade. “Tudo vale a pena se a alma não é pequena”.

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Mar Português

Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena.
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.

APÓS A DERROTA

Posted by Picasa SONJA KINSKI

Esta imagem foi descoberta aqui e não é um separador. As minhas imagens, ultimamente, tresandam a homem talvez por influência do futebol. Depois explico, num post à parte, como o futebol não é, para mim, uma moda mas uma componente estruturante na minha formação cultural. Eu sei que também há o futebol feminino e, no masculino, cada vez mais surgem imagens femininas. O futebol está a perder o sexo!

Os negócios da imagem (e outros) dominam o fenómeno do futebol contemporâneo, eu sei, mas a imagem dos meus heróis de juventude, que quase pagavam para jogar, colou-se na formação do meu gosto e este jamais o perderei ao contrário do vício de fumar que perdi de um dia para o outro.

A beleza do futebol, mesmo após a derrota, tal como a beleza feminina, mesmo sendo produzida (e a beleza não é sempre produzida?), fascina-me e incorpora a minha formação cultural. Não há volta a dar!

quarta-feira, julho 5

PORTUGAL

Posted by Picasa PORTUGAL PARA TODOS

[Desenho do meu filho Manuel, elaborado em Fevereiro de 2001, pelos seus dez anos.]

Os meus companheiros e companheiras, jogadores de bancada, que têm acompanhado a epopeia da equipa nacional a que, antigamente, chamávamos “equipa das quinas” ficaram tristes mas não desesperados. [O meu filho não participou do grupo e logo vi que a coisa podia dar mau resultado].

Nada mudou na táctica de Scolari – trocar a bola e esperar – mas, como era previsível, quem marcasse um golo ganhava. Os franceses marcaram e ganharam. Portugal, desta vez, não foi eficaz mas desmentiu a campanha infame da imprensa internacional – com honrosas excepções – que quiseram transformar a equipa portuguesa num grupo de arruaceiros.

Ivanov, o árbitro do Portugal-Holanda, foi uma espécie de vacina que transfigurou o “sistema” tornando-o menos exposto à observação dos mais incautos. Salvou-se a França embora resguardando-se, quase o tempo todo, na defesa da vantagem mínima, sem ver qualquer dos seus jogadores “amarelados”, o que afastaria 5 ou 6 deles da final com a Itália.

No fim os portugueses abraçaram e deixaram-se abraçar pelos jogadores franceses, trocaram camisolas e palavras de conforto, mostraram ao mundo que, mesmo no desporto de alta competição, é possível perder com dignidade. Porque nestas coisas do “Mata-Mata” perde-se e ganha-se e nada desmerece, mesmo na derrota, os que lutam, com bravura, por vencer.

Espero que a Itália vença o Mundial e que Portugal não deixe os seus créditos por mãos alheias na disputa de um lugar no “pódium” com a Alemanha.

Ah! E, por fim, muitos dos nossos pequenos e médios intelectuais, que não entendem nada do fenómeno do futebol, poderão, a partir de domingo, ver-se, finalmente, livres das garras “totalitárias” desta torrente comunicacional lúdica que lhes aperta os crânios mas que tão bem rima com as palavras liberdade e democracia.

UM ABRAÇO ORIGINAL

Contro quale squadra per Cannavaro non fa differenza. Francia o Portogallo da un punto di vista delle difficoltà secondo il capitano azzurro si equivalgono. "Tutti parlano della Francia - osserva - forse perché ha battuto il Brasile, ma il Portogallo non è secondo a nessuno. Sono già arrivati alla finale dell'Europeo, anche loro hanno fatto un ricambio generazionale, integrando i giovani con i vecchi. E' una squadra completa, con tecnica, corsa, difesa che concede molto poco e un portiere bravo anche a parare i rigori". Differente, tra Francia e Portogallo, sarebbe il gusto di un'eventuale vittoria. "
(...)

terça-feira, julho 4

ITÁLIA NA FINAL

Posted by Picasa Grosso – o marcador do primeiro golo de Itália

No post do “percebe” tinha arriscado a hipótese de uma final Portugal-Itália. Só falta o mais difícil para nós: ganhar aos franceses.

No mundial Portugal tem vencido com uma táctica aparentemente simples: troca a bola e espera. Os adversários mais fracos, com o passar do tempo, convencem-se que podem ganhar; os mais fortes, com o passar do tempo, convencem-se que podem perder.

Scolari manda trocar a bola e esperar. Joga com o tempo. Trocar a bola e esperar, mesmo que pareça uma eternidade. O objectivo é tornar tempo e espaço, cada minuto que passa, mais escassos para o adversário. Na vertigem dos últimos minutos a moral do adversário desmorona-se. Até este momento a táctica tem resultado.

Defrontando a França Scolari devia mudar alguma coisa. Os franceses sabem que para destruir esta táctica têm que marcar cedo e Portugal não vai ter – como até aqui – tanto espaço, nem tanto tempo para trocar a bola e esperar.

Mas o mais certo é Scolari não mudar nada. Depois se verá se, mesmo assim, os franceses caem na armadilha apesar de a terem estudado até à exaustão. Os alemães caíram na armadilha montada, à sua maneira, pelos italianos. Agora é a nossa vez.

Avanti Portugal!

MATA-MATA

OS MEUS SUBLINHADOS NOS CADERNOS DE CAMUS

Posted by Picasa Albert Camus

Pode ler aqui, na íntegra, o segundo post que escrevi para o blogue Cadernos de Camus.

Reproduzo a sua introdução:

Em sequência dos meus sublinhados da primeira leitura de juventude dos Cadernos aqui deixo os excertos que mereceram a minha admiração no Caderno nº 2 (22 de Setembro de 1937/Abril de 1939). Assinalo que Camus ingressou no Partido Comunista Argelino em 1934, no mesmo ano do seu casamento com Simone Hié. Entre 1934 e 1937 conclui a licenciatura em Filosofia, separa-se de Simone Hié e, em 1937, é expulso (ou abandona voluntariamente) o Partido Comunista. Este breve apontamento biográfico serve para chamar a atenção para o facto de, por vezes, num futuro aprofundamento deste projecto, ser necessário acompanhar a “acção” com a biografia pois não foi por acaso que Camus adoptou a designação de “Cadernos” e não de “Diário”. Camus tinha uma verdadeira aversão a retratar a sua vida pessoal não existindo nos Cadernos quase nenhumas referências directas às suas vivências pessoais. Mas elas estão lá em abundantes referências indirectas e aos seus projectos de trabalho.

JOGO FALADO - LEITURA LABIAL

segunda-feira, julho 3

... e não havia tantas tão miúdas minudências rodeando os corpos

Posted by Picasa Fotografia de Philippe Pache

(…)

e à volta um rosto paciente e sereníssimo
bastante para alguns primeiros planos de um filme a preto e branco
bastante pra pensar que apenas para o ver valeu a pena ter nascido
quando o mínimo gesto era um gesto criador
e as coisas começavam e o mundo sempre em simples sons se descobria
quando ninguém ainda se movia na periferia da necessidade ou da conveniência
e havia gigantescas tílias que nos davam sombra em troca do cansaço
e a formosura das mulheres se notava até na violência do silêncio
junto às folhas recentes das amigas amoreiras perto de ameixieiras encarnadas
quando as águas do mar eram ainda águas sem medida resolvidas
e não como hoje são domésticas e mansas
quando os homens viviam na intimidade da sensibilidade e dilatavam
as narinas para aspirar profundamente o cheiro do suor
das mulheres quando após o esforço principia a arrefecer
e todas as palavras eram relativamente novas e caíam como pétalas
e não havia tantas tão miúdas minudências rodeando os corpos

(…)

Ruy Belo

A Margem da Alegria [9]

UM TRIO DE MULHERES DE BRANCO

(Clique na fotografia para ampliar)

Da esquerda para a direita: Isabel Cordovil, Emília Moura e Albertina

Um trio de mulheres de branco no jantar de extinção do MES aproveitando para, a propósito, constatar que as mulheres nunca dispuseram, no MES, de espaço para alcançar posições dirigentes. Excepto nas estruturas intermédias, se bem me recordo, nunca qualquer mulher tomou lugar de destaque nas estruturas de topo do Movimento.

É essa a dura realidade que se não pode escamotear. Não que escasseassem as mulheres com formação e capacidade política mas, na verdade, foi escassíssimo o seu protagonismo em funções dirigentes. É uma questão ancestral que ainda hoje está na ordem do dia quando se discute a legislação acerca da chamada questão da paridade.

Em todos os erros que cometemos, desde os pecados originais até às vicissitudes de um processo político exaltante, pois o mais certo é uma revolução passar uma só vez pelas nossas vidas, a flagrante desvalorização do papel das mulheres foi um dos que mais me amarga a memória.

(Desta vez, por pouco, não coloquei, de novo, a Inês no lugar da Isabel.)

A MORTE DA BOA VONTADE

Posted by Picasa Fotografia de José Marafona

- Um querer que toda a gente fique satisfeita;
O sofrer duro de tal ser impossível;
Um querer que nada mostre senão bem
Com saber que tudo tem seu mal;
Não poder condenar totalmente o quer que seja
Certo que o escolher assim é impossível;

Isto passa por ser o contrário do desespero
Mas
É a única real forma possível
De ganhar desesperadamente a vida …

A pega disse:
- Sabes bem que não é toda a verdade.
A máscara serve-te mas não chega …
Vê se consegues dizer o que escondeste.

1.2.57

José Blanc de Portugal

In “ENÉADAS – 9 Novenas”
Imprensa Nacional – Casa da Moeda

domingo, julho 2

RICARDO

Posted by Picasa Ricardo – Um guarda-redes para a história

Após a pausa prometida venho reconhecer que a minha previsão de ruína do “sistema” só aconteceu a 50%. Nesta fase final só um “out-sider” – Portugal – se intrometeu no lote dos quatro que podem aspirar ao título.

O Brasil caiu como, muito bem, explica Marcelo Moutinho no Pentimento.

Assim as quatro selecções das meias-finais são todas europeias: as representantes dos três mais importantes países da UE, Alemanha, França e Itália e o nosso pequeno Portugal. Estranha composição para um mundial assim reduzido a uma finalíssima entre selecções da Europa Ocidental.

O único caso, verdadeiramente interessante, é o de Portugal. Quando o russo Ivanov não foi capaz de nos mandar pela borda fora, após mostrar 9 cartões amarelos em 10 faltas cometidas pelos portugueses, no Portugal-Holanda, a FIFA mudou de estratégia. A partir desse momento algo se alterou nas arbitragens do Mundial. Não sou capaz de interpretar os meandros da coisa mas que houve “coisa” houve.

No Portugal-Inglaterra os jogadores portugueses deram uma lição de fair play: cometerem 6 faltas, no tempo regulamentar, batendo o record do menor número de faltas cometidas por qualquer equipa, a par do Brasil no jogo com o Japão. Diz-me quem viu, ao vivo, que as esposas das estrelas inglesas insultaram, ao mais baixo nível, nos bastidores, as mulheres de alguns jogadores portugueses.

Uma ”flotilha” de um pequeno país derrotar a armada de uma potência imperial também serve para mostrar a miséria moral dos vencidos que sempre se habituaram à glória das vitórias antecipadas. Mas os ingleses deviam saber que, na bola, Portugal sempre os venceu, em jogos oficiais, desde 1966.

Jogando para ganhar a todo o custo, ao contrário da tradição nacional, que sempre costuma assentar na lógica de fazer tudo para sair com honra da derrota, a selecção nacional, deu mais uma lição de capacidade de conquista, organização, coragem e qualidade no desempenho dos protagonistas – os jogadores e “Felipão”.

Só não entendo o que anda por ali a fazer o Postiga e …o Senhor Madaíl. De resto honra ao colectivo e, neste caso, ao Ricardo – um herói português – pois defender 3 penaltys, em quatro, é caso único em mundiais e não é fruto do acaso.

Agora os franceses que se cuidem! Quarta-feira volto ao tema.

(Alterei a redacção do primeiro parágrafo após uma pertinente observação da minha amiga italiana Monica Goracci que faz parte da equipa de torcedores de bancada que têm levado Portugal à vitória. Estava confuso e, além do mais, apresentava um vaticínio, precipitado e injusto, de vitória da Alemanha sobre a Itália.)

sábado, julho 1

BASTE SER GENTE!

Posted by Picasa Fotografia de Philippe Pache

Dure-me a vida apenas quanto baste
P´ra me sentir entre raiz e flor apenas haste
De todo alheia ao seu nascer e morte
Igual alheia a todo azar ou sorte;
E eu, apenas não diferente,
Poder vogar meus dias sendo apenas gente.

21.7.66

José Blanc de Portugal

In “ENÉADAS – 9 Novenas”
Imprensa Nacional – Casa da Moeda

DEUS NOS AJUDE!

Posted by Picasa Até agora, no Mundial, tudo corre conforme manda o “sistema”. Já passaram a Alemanha e a Itália. Agora só faltam a Inglaterra e o Brasil. Aviso, desde já, que hoje o post da bola não surgirá logo após o apito final do Portugal-Inglaterra. Não porque a alegria da vitória me tenha embotado os sentidos ou a amargura da derrota me tenha atirado para a mais funda desesperação.

Vou ver o jogo fora tomado de um súbito ataque de crença primária. É que assim o vejo com os mesmos que suaram sangue assistindo ao Portugal-Holanda. Em equipa que vence não se mexe.

Dirão os mais sofisticados blogueiros que nada justifica não publicar um post na hora pois as tecnologias existem para nos servir e não para que se sirvam de nós. Mas não vou reagir guardando um prudente período de nojo entre o fim da função e o exercício da punção. Não é por nada. Não me apetece versar o tema a quente.

E tomei nota da saída de Freitas na véspera da disputa com os bretões e também das pré-claras declarações de Figo: "Se pensamos no título? O nosso principal objectivo é ganhar o próximo jogo, pois não podemos pensar em ser campeões se não conseguirmos bater a Inglaterra.”

UM TRIO DE CARA LISA

Posted by Picasa Fotografia de António Pais
(Clique na fotografia para ampliar)


Da esquerda para a direita: João Grade, Luís Cruz e Silva e António Pidwell Tavares

Prosseguindo a digressão por esta surpreendente reportagem fotográfica do jantar de extinção do MES (Movimento de Esquerda Socialista), realizado em 7 de Novembro de 1981, eis um trio de cara lisa. Sublinho o encontro das mãos, a transparência dos olhares, a jovialidade, a alegria e o desprendimento que irradiavam nos rostos captados pela câmara do António Pais.

O fim assumido de uma experiência política partidária, com aspectos gratificantes e dolorosos, cumpria uma liturgia na qual a festa se sobrepunha ao luto. Como se cada um de nós estivesse a celebrar o último encontro anunciando uma separação física irreversível e, ao mesmo tempo, o sagrado da reconciliação com o espírito de rebeldia que presidiu à fundação do movimento ao qual quisemos pôr fim.

O João, o Luís e o António, um trio de cara lisa, sorriem. O João e o Luís continuam, certamente, a sorrir. O António morreu jovem tal como jovem tinha morrido, antes, o seu irmão Alberto que é, se não sabiam ficam a saber, o consagrado poeta Al Berto.

sexta-feira, junho 30

CADERNOS DE CAMUS

Posted by Picasa Capa do “Carnets – III”, o último dos volumes, nunca publicado em edição portuguesa

Passaram dois anos e meio quando decidi, nos primórdios do absorto, encetar uma participação num projecto muito apetecível do José Pacheco Pereira, através de um blogue, aberto à participação dos interessados na obra de Albert Camus, que haveria de ser interrompido pouco tempo depois.
Era uma oportunidade para recolher os meus sublinhados da primeira leitura dos “Carnets”, de Albert Camus, que é “o livro da minha vida”. Nunca mais esqueci muitos pensamentos, citações e citações de citações de Camus descrevendo os ambientes, os cheiros, as luminosidades, as vozes, as reflexões e perplexidades de um homem confrontado com as contradições do seu tempo.

Pode ler aqui o primeiro de um conjunto de longos posts que elaborei, em Janeiro de 2004, para o blogue Cadernos de Camus.

quinta-feira, junho 29

... e à volta um rosto paciente e sereníssimo ...

Posted by Picasa Fotografia de Philippe Pache

(…)
das coisas transmitidas de uma geração pra outra geração
quando a estratégia do prazer era tão minuciosa e forte
que com a astúcia habitual da morte conspirava
mas sempre era possível a surpresa do prazer
independentemente da cíclica multiplicação das represálias
como narrar à noite a última aventura desse dia
ou apenas falar de uns olhos onde havia a água da doçura
e à volta um rosto paciente e sereníssimo
(…)
Ruy Belo

A Margem da Alegria [8]

CHICO BUARQUE

quarta-feira, junho 28

"VIVER POR CIMA"

Posted by Picasa Albert Camus

“A qualquer hora do dia, em mim próprio e entre os outros, eu subia às alturas, acendia aí fogueiras bem visíveis e alegres saudações subiam até mim. Era assim que eu tomava gosto à vida e à minha própria excelência.
A minha profissão satisfazia, felizmente, esta vocação das alturas. Ela livrava-me de toda a amargura em relação ao próximo, que eu sempre obsequiava, sem nunca lhe dever nada. Colocava-me acima do juiz, que, por minha vez, eu julgava, acima do réu que eu forçava ao reconhecimento. Pondere bem nisto, meu caro senhor: eu vivia impunemente. Nenhum julgamento me dizia respeito, não me encontrava no palco do tribunal, mas em qualquer outra parte, nos urdimentos, como esses deuses que, de tempos a tempos, são descidos por meio de um maquinismo, para transfigurar a acção e dar-lhe o seu sentido. No fim de contas, viver por cima é ainda a única maneira de ser visto e saudado pela maioria.”

Albert Camus“A Queda” (Sublinhados de Ana Alves)

In “Cadernos de Camus”

ZIDANE E O "SISTEMA"

Posted by Picasa O que me levou, na verdade, a escrever este post foi Zidane e a campanha em curso para intimidar Portugal. Estava assumido, ao menos, pelos “nuestros hermanos”, que os “velhinhos” franceses seriam esmagados pela fúria da juventude espanhola. Afinal a sabedoria ganhou à fúria. Que beleza observar a arte de Zidane como se entre ele, a bola e o espaço circundante se desvanecessem as fronteiras e os opositores. Assim acontecem os milagres que podem derrubar todos os “sistemas”.

Após a eliminação da sobranceira Espanha, o estado da arte, imaginando a sujeira dos bastidores [vide algumas arbitragens vergonhosas, a entrevista falsa com Pauleta na imprensa inglesa, as declarações de Parreira ...], é o seguinte:

Das oito selecções sobreviventes, apuradas para os quartos de final, constam duas “out-siders”: Portugal e Ucrânia. Um pequeno país, com uma selecção de grandes jogadores emigrantes, dirigida por um seleccionador brasileiro, e um grande país de emigrantes, rival da Rússia, com um seleccionador que foi um grande jogador da antiga União Soviética. A lógica apontava para que fossem apuradas a Holanda e a Suíça. Mas, no primeiro caso, o árbitro russo Ivanov não foi capaz de eliminar Portugal e, no segundo, os Suíços não foram capazes de eliminar a Ucrânia.

Se o “sistema” funcionar serão apurados para as meias-finais: Brasil, Alemanha, Inglaterra e Itália, a partir dos jogos dos quartos de final cujo calendário é o seguinte: Portugal-Inglaterra; Brasil-França; Argentina-Alemanha e Itália-Ucrânia. O aparelhamento dos quartos de final não permitiu atingir a perfeição pois tem uma disfunção perceptível aos leigos: o Argentina-Alemanha.

Mas imaginem que o “sistema” entra em falência parcial e se apuram: Portugal, França, Argentina e Ucrânia. Teríamos nas meias-finais Portugal-França e Argentina-Ucrânia. Bonito! E imaginem uma final: Portugal-Ucrânia? O “sistema” ficava de pantanas!

Mas não vai ser assim e aposto que a final oporá o Brasil (campeão do mundo em título) e a Alemanha (selecção da casa). Desta forma o mundo continuará a acreditar na justiça praticada entre os homens de boa vontade.

UM TRIO DE BARBA RIJA

(Clique na fotografia para ampliar)

Da esquerda para a direita: António Silva, Diomar Santos e António Marques.

A reportagem do jantar de extinção do MES, a 7 de Novembro de 1981, um facto longínquo mas original, ainda tem mais algumas fotografias interessantes. Este é um trio de barba rija, típico da época.

Os personagens fotografados estão activos e desempenham papéis interessantes na nossa sociedade. Bem hajam. Não sei se alguma daquelas barbas resistiu à passagem do tempo como é o caso da minha própria.

Um dia, como já contei uma vez, resolvi “dar o salto” escapando ao que julgava uma prisão iminente. Estávamos, está bem de ver, no tempo da ditadura. Isso mesmo: a ditadura. Mas o plano falhou e fui obrigado, após ter cortado a barba, a regressar à base.

Verifiquei ao vivo um fenómeno extraordinário: ninguém me reconheceu. Só fui denunciado quando na Esplanada da Estrela, o meu poiso habitual, pedi a “bica” ao empregado do costume. O homem olhou para mim como se estivesse a ver um fantasma. Afinal a voz era o sinal mais forte da minha identificação. A barba, não!