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sábado, junho 30

MEMÓRIAS - I

Posted by PicasaFotografia de Hélder Gonçalves

Aquela singular corrente de memórias voa no tempo
Revolto-me em mudança permanente com o espelho
No qual espreito e nele me revejo em reminiscências
De mim naqueles olhares pacientes de mãos quentes
Abertas ao contar dos dias ou fechadas como punhos
Em seus gestos diligentes revendo o futuro do futuro
Com a morte pendurada nas paredes, os meus muros
São transparentes de cal pura brancos sem espessura
E o meu sangue goteja dos retratos sem que me veja.

Lisboa, 5 de Setembro de 2006
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sexta-feira, junho 8

POESIA

Posted by PicasaDane Shitagi USA, b.1972

Poesia uma dança de palavras sem medo
volteando em torno do seu próprio silêncio
ora de oiro ora de prata

Poesia um tempo solitário assumido
no limite do espaço infindável da invenção
ora sonho ora nada

Poesia um caminho que se alarga crente
no tempo luminoso de uma vida irrepetível
ora livre ora escrava

Poesia uma plenitude nunca alcançada
o espaço da verdade dita ao ritmo da palavra
ora escrita ora apagada

Lisboa, 4 de Junho de 2007

[Inaugurando Caderno de Poesia que acolherá, a partir de hoje, a poesia, própria e alheia, que carecia, há muito, de um espaço autónomo no qual pudesse respirar.]
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sábado, junho 2

AS VOZES

Posted by PicasaO meu irmão Dimas com Ezequiel, meu primo mais velho,
um honrado homem do campo. Já mortos. [Fotografia de família]


As vozes na noite quente
e os passos lá fora,
uma aragem corta o calor
intenso do verão ardente,
ouço o meu tempo passado
ao luar escoar-se
e lembro os rostos gretados
do sol, os braços nus
as veias e o suor salgado
a gotejar na terra seca,
ressequida, revolta
a golpes de enxada

As vozes na noite quente
estou nelas inteiro
e nelas ouço a minha gente.

Faro, 15 de Julho de 2004

(Um poema antigo na sequência
dos exercícios da
Helena acerca
da textura do silêncio, e o mais,
correndo o risco de me repetir.
Mas não nos repetimos sempre?]
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segunda-feira, maio 28

PELAS RUAS

Posted by PicasaDane Shitagi USA, b.1972

Pelas ruas ouve-se um silêncio estranho de espera
Ou será de quem desespera por esperar um dia
Que há-de vir de novo que lhes traga uma alegria

Pelas ruas rareia o movimento como um regresso
Ao passado que se não reconhece no presente
E os homens transformados na sua sombra ausente

Pelas ruas não se notam sinais do riso das mulheres
Nem os fumos de verão saídos dos seus decotes
E nada se parece com as cores dos dias felizes

Pelas ruas não vagueiam os cães nem as carroças
Puxadas a cavalo nem quase uma só bicicleta
E os cheiros são vagamente inodoros de vícios

Pelas ruas corre o vento e o sol por vezes abrasa
Nada faz dormir a natureza e levá-la para casa
É decerto impossível mesmo a golpes de espada

Pelas ruas caminho com pressa ou devagarinho
E olho com fervor aqueles que em certos dias
Me olham com atenção que em outros dias não

Pelas ruas ouve-se um silêncio estranho de espera
Do dia em que desfilem às arrecuas as fanfarras
Anunciando uma boa nova porque se desespera

Pelas ruas por vezes acontece a solidão das mãos
Estendidas mas nada de notícias de boas vindas
Nem braços de polícias sinaleiros nas esquinas

Pelas ruas secou o rio do formigueiro humano
Vejo filas de espera por um lugar no autocarro
Que é feito do teu coração cidade que eu amo?

Lisboa, 12 de Abril de 2005
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quinta-feira, maio 24

LEMBREI-ME

Posted by PicasaDane Shitagi USA, b.1972

Lembrei-me de passar umas horas a esperar
Que acontecesse
Algo de excepcional beleza que me fizesse
Voar
Outra vez à altura dos sonhos verdadeiros
Que se esquecem.

Lembrei-me de passar os dias a divagar
Pelas ruas
Da minha adolescência e deitar-me nelas
Devagar
Revendo os amigos que não vejo nunca
E no ar
Fluido que me habita agarrá-los pela mão
Beijar-lhes
As faces coloridas dar-lhes boas notícias.

Passar
A palavra um a um numa cadeia infinita
E recomeçar
Do princípio a reconhecê-los pelos nomes
Próprios
Que se esquecem na vertigem de conhecer
Tudo
Não conhecendo nada mais que os sonhos
Que nos habitam.

Lembrei-me da jovem negra e da paixão
Inconfessa
Que me acalorou as costas quando pousou
Os joelhos
Nelas e eu me encostei aos seus caracóis
Loiros.

Lembrei-me agora aqui e em toda a parte
De passar
Ao lado do tempo e esperar que o destino
Me trouxesse
Nas mãos o sussurro e o prazer dos corpos
Que não esquecem.

Lisboa, 8 de Outubro de 2004
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domingo, maio 13

VEJO COISAS MUITO BONITAS

Posted by PicasaFotografia de Hélder Gonçaves

Vejo coisas muito bonitas por aí quando olho
À volta nos intervalos do tempo que me dá
De folga a atenção que depositam em mim
O mínimo gesto uma interjeição o silêncio
O bater do coração o resfolegar o protesto
No meio do tempo que vai a mais de metade
Acredito que as coisas bonitas que vejo por aí
São mesmo a verdade que invento e assim
Não me podem causar desalento nem sequer
No dia em que as achar as coisas mais ruins

2/5/2007
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quarta-feira, maio 9

BUS

Posted by PicasaFotografia de família

BUS
BUSio
aBUSio
BUSsola
arBUSto
BUSto
emBUSte
BUS

[Uma brincadeira, talvez de 1981, em torno de BUS,
petit nom da Guida, minha mulher, no dia do seu aniversário,
com algumas palavras inventadas.]

domingo, maio 6

MÃOS

Posted by PicasaFotografia de família

Tolda-se o ar da névoa vinda do mar
Cheira a uma réstia de maresia e a sal
Que o vento traz e se nos agarra à pele

Respiro a bruma da manhã pela janela
Sabe a chá de erva cidreira servido tal
O desejo que satisfaz só faz falta o mel

Vejo mãos múltiplas as mãos estendidas
Na minha direcção e tocam-me por bem
Sabia delas quase tudo e lhes dei prazer

E me deram tudo o que tinham para dar
Que é feito delas? Mãos da minha vida
Que é feito? Esfumaram-se na memória.

Lisboa, 29 de Novembro de 2004

[Um poema antigo para a minha mãe.]
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segunda-feira, abril 30

UMA LUZ

Posted by PicasaFotografia daqui

Uma luz trémula no fundo da vida
Bruxuleia fria hesita acredita vive

Uma luz ténue a esperança clareia
O incerto destino é tempo e espera

Uma luz que aquece afora o futuro
Faz forte a vida clamor sem trégua

Uma luz que nunca mais se apaga
E ignora as vidas duras que alumia

Uma luz que se derrama uma gota
De sol que me ilumina e incendeia

26/4/2007
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sábado, abril 28

CÂNTICO DE LONGE

Posted by PicasaFotografia de Família

o rio submerso corre e o oiço
subtil rumorejar longe e perto

no bojo dos cântaros o toco
nas pontas dos dedos o bebo

e a água fresca corre com gozo
no bordo dos púcaros e cedo

à saudade dilacerante do mar
que me liberta o peito e acerto

o passo com o meu rio submerso
que rumoreja longe e perto

23/4/2007
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domingo, abril 22

ONDE ESTÁ

Posted by PicasaFotografia de Hélder Gonçalves

Às vezes apetece-me oferecer alguma coisa de mim daquelas que se não podem encontrar no mercado e ponho-me a pensar – o quê? Muitas vezes não tenho nada que valha a pena oferecer, não se quadra o desejo com o gesto, nada emerge de dentro que me satisfaça, fico a olhar para as palavras alinhadas, adio, finjo esquecer, ou esqueço mesmo, pois já me tenho esquecido do que não me havia de esquecer. É imperdoável.
Outras vezes sinto aquela sensação que o Ruy Belo – salvo qualquer comparação – tão bem descreveu em três versos do poema REQUIEM POR SALVADOR ALLENDE : (…) Acabara um poema enchia o peito de ar junto da água/sentia-me importante conquistara palavras negação do tempo/o mar era mais meu sob a minha voz ali solta na praia/ (…) e sinto vontade de partilhar o meu prazer.
Antes escreviam-se cartas ou postais, tantos que tenho – trocados entre meus pais – ou enfiava-se a prosápia na gaveta o que – quase sempre – era a mais que merecida sorte da aventura criativa. Pois um dia destes ofereci um poema à Helena e ela, vai daí, “deu-lhe asas”. Um poema, regra geral, para obter os requisitos de publicável, seja lá em que suporte for, dá um trabalho dos diabos.
Todos devem saber que só poucos poemas escapam do lixo e raros – raríssimos – saem à primeira, a mais das vezes, acumulam-se variantes que, sucessivamente, se apagam umas às outras, ao contrário do que acontecia antes com os entrelinhados, emendas e notas à margem da escrita no papel, pois o processo criativo transformou-se radicalmente com o computador, os sites, os blogs e o que mais aí virá.
Não imagino Cavafy, confrontado com a sua selectividade implacável, a escrever nestas máquinas infernais mas não vale a pena tentar agarrar o vento com as mãos…

Eu acumulo mas tenho dias em que me apetece oferecer alguma coisa de mim e, desta vez:

Onde está

Onde está a seara de vento que ondulava
Azul no meu pensamento
Com sons de trigo a escorrer pela eira
E o dia a morrer devagar
À minha beira à vista dos olhares belos
Por vezes tristes de melancolia

Onde se esconderam os gestos antigos
Rasgados e sem medida
Abraçados ao corpo que se despedia
Olhos ao alto num rosto
Cheio de lágrimas
Salgadas do gosto da carne ferida

Onde está a minha vontade desmedida
Que não a encontrei mais
Flamejante a incendiar os sonhos
Impressos a sangue quente
Na ausência habitada
Da tua crença em mim perdida

20/4/2007
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sábado, abril 7

FIDELIDADE À TERRA

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Regresso ao céu
da minha inocência
Aprendi tudo olhando
além da imensa luz
Na terra sagrada dos meus
o voo das gaivotas outra vez
Rasga no claro da manhã
o traço em que renasço

7/4/2007
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quarta-feira, março 21

Só escrevo

Posted by PicasaFotografia de sophie thouvenin

Só escrevo para me soltar de mim
E me fazer acompanhar pelo eco
Das palavras que se soltam vivas
E vibrantes da ponta da espada
Como a voz que não reconheço

Só escrevo uma vez e por vezes
Esqueço-me de tornar viável
A palavra deixando-a pendurada
No estendal das ideias húmidas
A arrefecer das dores de que padeço

1/3/2007
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sábado, março 3

DANÇA


Falta-me muito coisa para saber colher
Os ecos do silêncio e hoje o meu corpo
Deambula afastado dos sons ancestrais
Entre hiatos de olhares que o desejam

24/02/2007
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quinta-feira, fevereiro 22

CLARIDADE

Posted by PicasaPhilippe Pache

A claridade aflorava por debaixo das portas
Uma nesga horizontal floria a horas mortas

E os sons longínquos das vozes ressoavam
E sorriam à luz dos rostos que me amavam

15/02/2007

[Aqui deixo um “comentário” que a Helena
transformou num post
. O poema dela que
o suscitou é que, na verdade, vale a pena.
]
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terça-feira, maio 17

MAIS QUE TUDO O MAR


Ilha Deserta, Ria Formosa - Faro (Foto Margarida Ramos)

Mais que tudo o mar
me fala dos homens
de ti,

Meteste o pé na água
molhaste o teu corpo

Mais que tudo o mar
de ti o arrepio a água
gelada,

E o teu olhar aflito me
toma desejado absorto

Mais que tudo o mar
o azul além do tempo
infinito,

O olhar breve fugaz
grita um grito aflito

Mais que tudo amar
Mais que tudo o mar
bendito,

Faro, 14 de Julho de 2004

segunda-feira, março 21

domingo, dezembro 19

Dois Poemas

A tentação comum de todas as inteligências:
o cinismo


Do outro lado de um coração que pensa
insidiosa
a tirania elogia o caos à beira do abismo
e conclama
a tentação comum de todas as inteligências:
o cinismo.



O espaço está cheio de aves cruéis e perigosas


As aves volteiam em torno de nossas cabeças:
o espaço está cheio de aves cruéis e perigosas.


(A propósito do 1º Aniversário do absorto publico, excepcionalmente, dois poemas de um conjunto inédito - “Glosas Imperfeitas” - a partir de citações de Camus.)
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