Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
segunda-feira, abril 11
As Árvores e as Sombras
A natureza despe-se sem pudor apesar do olhar dos homens. Nasci com a escassez da água por entre os medos da seca e da fome. Mas a natureza não detém a sua marcha perante os receios do homem.
*
No sul o frio é suave e temperado pelo mar e pela vizinhança de África. A minha terra fica mais próxima de África do que de Lisboa. Sempre nos esquecemos disso quando pensamos nos espanhóis.
*
A sul a neve caiu de 1 para 2 de Fevereiro de 1954. Vi-a cair pela primeira vez debruçado de espanto da janela com vista para o meu mundo. A rua ficou branca e fiz bolas de jogar. Mas a neve na minha memória é quente.
*
A nespereira familiar da minha infância prepara-se para dar frutos. Imagino o seu lugar no quintal de onde nunca saiu e se apresenta sempre viçosa às gerações que passam. Ela renova-se e parece imortal.
*
A figueira do caminho do campo despida de folhas olha-me curiosa. O frio fê-la ficar nua e reparei que não se mexia nem tiritava nem sequer temia a sua morte anunciada. Ela sabe que no próximo verão ainda vai dar frutos suculentos.
*
As árvores são um mundo de vida e de afectos para os artistas. Poetas, pintores, músicos, cineastas, fotógrafos ... muitos dos grandes artistas cantaram a natureza através das árvores.
*
A sombra de cada árvore é diferente conforme a sua natureza. Cada sombra projectada por uma árvore tem vida própria e uma personalidade diferente conforme as espécies. As sombras das árvores são todas diferentes.
*
Ir para a sombra era uma obsessão da minha infância. No sul o sol impõe as suas regras. As árvores no verão eram o lugar da sombra antes de serem o lugar dos frutos e da subsistência.
Fotografia de amistad
Natércia Freire
CANÇÃO DO VERDADEIRO ABANDONO
Podem todos rir de mim,
podem correr-me à pedrada,
podem espreitar-me à janela
e ter a porta fechada.
Com palavras de ilusão
não me convence ninguém.
Tudo o que guardo na mão
não tem vislumbres de além.
Não sou irmã das estrelas,
nem das pombas, nem dos astros.
Tenho uma dor consciente
de bicho que sofre as pedras
e se desloca de rastros.
De «Obra Poética», 1991-1995,
IN-CM, Lisboa
domingo, abril 10
POEMA EM LINHA RECTA
Retrato de Fernando Pessoa. [1954, óleo sobre tela, 2010 x 2010 mm - Museu da Cidade, Lisboa, Portugal - Quadro de Almada Negreiros (1893-1970), pintado para o restaurante Irmãos Unidos, de Lisboa, versão final de uma encomenda cujo projecto primitivo se intitulava «Lendo o Orpheu»] Imagem do portal da História
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cómico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um acto ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe —todos eles príncipes— na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não uni pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ô príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semi-deuses!
Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado,
Podem ter sido traídos —mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
Fernando Pessoa/Álvaro da Campos
In "Quinze Poetas Portugueses do Século XX"
Selecção e Prefácio de Gastão Cruz
Assírio & Alvim
sábado, abril 9
"Comissão Permanente para o Acolhimento e Inserção Social da Comunidade Timorense" - Para que não esqueça
A propósito de uma notícia que hoje veio a público, dando conta do apoio da República de Timor-leste à candidatura de António Guterres para “Alto-Comissário da ONU para os Refugiados” (ACNUR), lembrei-me de uma missão que desempenhei a partir de inícios de 1996: Presidente da “Comissão Permanente para o Acolhimento e Inserção Social da Comunidade Timorense”.
No IR AO FUNDO E VOLTAR deixo à disposição o teor da entrevista que, à época, concedi à Lusa (?), cuja última frase é bastante significativa: "Essa comunidade (timorense) vai ter um papel importante num país que um dia há-de ser independente e democrático", as condições em que desempenhei, a título gracioso, aquela função e alguns ensinamentos.
Esclareço que nunca visitei Timor nem a título oficial nem particular. Para que não esqueça.
No IR AO FUNDO E VOLTAR deixo à disposição o teor da entrevista que, à época, concedi à Lusa (?), cuja última frase é bastante significativa: "Essa comunidade (timorense) vai ter um papel importante num país que um dia há-de ser independente e democrático", as condições em que desempenhei, a título gracioso, aquela função e alguns ensinamentos.
Esclareço que nunca visitei Timor nem a título oficial nem particular. Para que não esqueça.
Saber Viver é Vender a Alma ao Diabo
Gosto dos que não sabem viver,
dos que se esquecem de comer a sopa
(Allez-vous bientôt manger votre soupe,
s... b... de marchand de nuages?")
e embarcam na primeira nuvem
para um reino sem pressa e sem dever.
Gosto dos que sonham enquanto o leite sobe,
transborda e escorre, já rio no chão,
e gosto de quem lhes segue o sonho
e lhes margina o rio com árvores de papel.
Gosto de Ofélia ao sabor da corrente.
Contigo é que me entendo,
piquena que te matas por amor
a cada novo e infeliz amor
e um dia morres mesmo
em "grande parva, que ele há tanto homem!"
(Dá Veloso-o-Frecheiro um grande grito?..)
Gosto do Napoleão-dos-Manicómios,
da Julieta-das-Trapeiras,
do Tenório-dos-Bairros
que passa fomeca mas não perde proa e parlapié...
Passarinheiros, também gosto de vocês!
Será isso viver, vender canários
que mais parecem sabonetes de limão,
vender fuliginosos passarocos implumes?
Não é viver.
É arte, lazeira, briol, poesia pura!
Não faço (quem é parvo?) a apologia do mendigo;
não me bandeio (que eu já vi esse filme...)
com gerações perdidas.
Mas senta aqui, mendigo:
vamos fazer um esparguete dos teus atacadores
e comê-lo como as pessoas educadas,
que não levantam o esparguete acima da cabeça
nem o chupam como você, seu irrecuperável!
E tu, derradeira geração perdida,
confia-me os teus sonhos de pureza
e cai de borco, que eu chamo-te ao meio-dia...
Por que não põem cifrões em vez de cruzes
nos túmulos desses rapazes desembarcados p'ra morrer?
Gosto deles assim, tão sem futuro,
enquanto se anunciam boas perspectivas
para o franco frrrrançais
e os politichiens si habiles, si rusés,
evitam mesmo a tempo a cornada fatal!
Les portugueux...
não pensam noutra coisa
senão no arame, nos carcanhóis, na estilha,
nos pintores, nas aflitas,
no tojé, na grana, no tempero,
nos marcolinos, nas fanfas, no balúrdio e
... sont toujours gueux,
mas gosto deles só porque não querem
apanhar as nozes...
Dize tu: - Já começou, porém, a racionalização do trabalho.
Direi eu: - Todavia o manguito será por muito tempo
o mais económico dos gestos!
*
Saber viver é vender a alma ao diabo,
a um diabo humanal, sem qualquer transcendência,
a um diabo que não espreita a alma, mas o furo,
a um satanazim que se dá por contente
de te levar a ti, de escarnecer de mim...
Alexandre O´Neill
Poesias Completas
1951/1981
Biblioteca de Autores Portugueses
Imprensa Nacional Casa da Moeda
sexta-feira, abril 8
Manuais Escolares
As notícias acerca do tema são manifestamente exageradas. O despacho acerca da “transmissão em cadeia” de manuais escolares, agora revogado, não chegou, na prática, a entrar em vigor.
O mês de Abril seria fatal não houvera a revogação agora concretizada. A Ministra da Educação do governo de direita, Maria do Carmo Seabra, não mediu o alcance do despacho que assinou, 5 dias antes das eleições legislativas, publicado a 9 de Março, muitos dias depois das mesmas.
A questão é simples: a viabilidade da aplicação daquele despacho – nos planos técnico e financeiro – não foi acautelada. A revogação pelo governo em funções do dito foi correcta, adequada e tomada em tempo oportuno.
Assim se evitou, com uma medida simples, males maiores para a gestão das escolas. Por razões éticas não devo aprofundar o tema. Mas as razões evocadas pelos detractores da revogação são fundadas na mais pura ignorância ou má fé.
Veja aqui o despacho de revogação bastante bem fundamentado.
E ainda algumas considerações judiciosas na Memória Flutuante
"Diário do Governo" - 9
Jornais de Todo o Mundo
Jornais de todo o mundo on-line
Se clicar sobre a bandeira do país que desejar, aparecerão os jornais desse país. Depois é só clicar no jornal de sua predilecção e abrirá a edição actualizada de cada um.
São 29 Países ao redor do mundo.
Se clicar sobre a bandeira do país que desejar, aparecerão os jornais desse país. Depois é só clicar no jornal de sua predilecção e abrirá a edição actualizada de cada um.
São 29 Países ao redor do mundo.
ABRIL
Foto de amistad
Abril
É um mês que me diz muito. Nele nasci lá mais para o fim. Nele nasce o sangue novo que a primavera desperta. Nele se reconquistou, em Portugal, a democracia e a liberdade.
Abril
Nele me dá vontade de ler e de escrever. Observar a natureza e os seres que se movem como que abandonados à sua sorte. As flores que desabrocham e os cheiros excitantes que, aqui e ali, irrompem do interior da cidade adormecida sobre si própria.
Abril
Da brisa matinal que o atlântico torna fresca e a tez das gentes adocica. Dos brados soltos de janela em janela nos bairros antigos dando a notícia ou o recado. Das crianças que saltam de euforia e dos velhos que se aliviam da triste solidão.
Abril
Das mulheres que mostram no corpo a sua jóia mais preciosa. Das músicas que ecoam suaves nas ruas e nos pátios em que se desenham janelas engalanadas de flores. Da luz que brilha refulgente, nos excita e cega os sentidos.
Abril
Da leitura juvenil dos Cadernos de Camus, ainda da sua época de Argel:
“Abril.
Primeiros dias de calor. Sufocante. Todos os animais estão deitados. Quando o dia começa a declinar, a natureza estranha da atmosfera por cima da cidade. Os ruídos que nela se elevam e se perdem como balões. Imobilidade das árvores e dos homens. Pelas esplanadas, mouros de conversa à espera que venha a noite. Café torrado, cujo aroma também se eleva. Hora suave e desesperada. Nada para abraçar. Nada onde ajoelhar, louco de reconhecimento.”
quinta-feira, abril 7
Girassóis
"Mestre, são plácidas
Todas as horas
Que nós perdemos,
Se no perdê-las,
Qual numa jarra,
Nós pomos flores.
Não há tristezas
Nem alegrias
Na nossa vida.
Assim saibamos,
Sábios incautos,
Não a viver,
Mas decorrê-la,
Tranqüilos, plácidos,
Tendo as crianças
Por nossas mestras,
E os olhos cheios
De Natureza ...
À beira-rio,
À beira-estrada,
Conforme calha,
Sempre no mesmo
Leve descanso
De estar vivendo.
O tempo passa,
Não nos diz nada.
Envelhecemos.
Saibamos, quase
Maliciosos,
Sentir-nos ir.
Não vale a pena
Fazer um gesto.
Não se resiste
Ao deus atroz
Que os próprios filhos
Devora sempre.
Colhamos flores.
Molhemos leves
As nossas mãos
Nos rios calmos,
Para aprendermos
Calma também.
Girassóis, sempre
Fitando o sol,
Da vida iremos
Tranqüilos, tendo
Nem o remorso
De ter vivido."
Fernando Pessoa, como Ricardo Reis.
Imagem e Texto do Pentimento
quarta-feira, abril 6
JOÃO LÚCIO
Província onde nasci, amada do luar
E o sol ruidoso, ardente, imorredoiro …
Lírio fresco e azul deitado à beira-mar,
Com o cálix gentil a orvalhar-se em oiro …
Nesse canto imortal de todo o Universo,
De florestas, de sóis, mares e cordilheiras,
Tu és, unicamente, um perfumado verso,
Feito em luar dormente, azul e laranjeiras.
Lindo verso, porém, dessa lira suprema,
Com hinos triunfais, auroreais, fecundos,
Que abrange a Vida toda e faz o seu poema,
Rimando montes, céus, oceanos e mundos.
Tens o rir jovial e a bonomia calma,
O dulcíssimo aspecto ingénuo das crianças;
O sol doira-te o corpo; a fantasia a alma;
Fala-te o céu de amor; fala-te o mar d´esp´ranças.
Que este livro te diga, oh terra aventureira,
Como o meu coração a voz te sabe ouvir:
Ele é singelamente uma canção ligeira,
Que tu lhe tens cantado e tenta repetir.
Quando os astros de noite, errantes e dispersos,
Vierem mergulhar nas águas do teu mar,
Vai ler-lhes mansamente estes humildes versos
Pra que digam a Deus como te sei amar.
João Lúcio
O Meu Algarve - 1905
HAI-KAIS
Tem chovido bastante: insuportável tempo.
Na noite do quintal, o sapo canta.
*
Conversam como ao longe
não comigo,
Se comigo falavam
cansar-me-iam.
*
Por nuvens as montanhas não têm picos.
Mas, negras e escalvadas, cabeleira branca.
*
O mar se alonga ao longe tão sereno.
No temporal, há pouco, era mais curto.
*
O ano inteiro esta árvore
larga folhas mortas.
*
Roupa que se abre e cai:
surpresa; ou muito ou pouco.
*
No escuro cresce o amor
que só nocturno se ama.
*
Para encontrar-se o acaso
ai quanto caminhar!
*
Sentado, escreve e lembra
imagens que não viu.
Jorge de Sena
11-12/1/74
terça-feira, abril 5
Política
[Michelangelo Merisi da Caravaggio (1571 – 1610), Giuditta eOloferne (c. 1599), óleo sobre tela, 145 x 195 cm, Galleria Nazionale d’Arte Antica, Pal. Barberini, Roma]
“Não sou feito para a política pois sou incapaz de querer ou de aceitar a morte do adversário.”
Albert Camus, in Cadernos
Imagem de Educação Sentimental
Governadores Civis
O país é pequeno mas há outros países da UE mais pequenos. O país é pobre mas há poucos países mais pobres na UE. Nos últimos anos o PIB do país cresceu menos que a média do PIB dos países da EU. O país empobreceu. O mesmo vai acontecer em 2005 e 2006.
É urgente inverter esta situação de calamidade nacional. Entretanto o governo empossou os novos governadores civis. O que me apraz dizer é: nunca mais acabam os governadores civis!
O ministro António Costa, na posse dos ditos, disse, na presença do primeiro ministro, que devem dar prioridade à prevenção e combate aos incêndios e que não devem comportar-se como “minifundiários”.
Mas a função faz o cargo. O governo civil é mesmo, politicamente, um minifúndio. Não há nada a fazer. A não ser o emparcelamento: ou seja a extinção dos ditos. O governo perdeu uma oportunidade para dar ao país mais um sinal de mudança.
Desta vez o sinal foi de continuidade. “Mudança na Continuidade” ou “Continuidade na Mudança”?
“Diário do Governo” – 8
"Ir até ao fim ..."
Faro - Uma vista do lugar das minhas leituras de juventude de Camus em volta da doca
“Ir até ao fim, não é apenas resistir mas também não resistir. Tenho necessidade de sentir a minha própria pessoa, na medida em que ela é o sentimento daquilo que me ultrapassa. Por vezes preciso de escrever coisas que em parte me escapam, mas que provam justamente o que em mim é mais forte do que eu”.
Albert Camus, in Cadernos
segunda-feira, abril 4
LUZ
Luz. Iluminar. Uma lâmpada que ilumine. A epígrafe de Jorge de Sena que abre o meu último artigo:
“Aprendemos que, em política, a arte maior é a de exigir a lua não para tê-la ou ficar numa fúria por não tê-la mas como ponto de partida para ganhar-se, do compromisso, uma lâmpada de sala que ilumine a todos."….
Lembrei-me de Isadora Duncan. Quando a vejo retratada na minha memória, pelas imagens que me encantaram no cinema, associo à sua imagem a palavra LUZ.
Fascínio
"Público" Inimigo de Si Próprio
Já abordei o tema. O “Público” vai fazer-se pagar pelos acessos on line.
Vai perder pensando que vai ganhar. Um Jornal de referência
em Portugal – ao contrário de outros países – só tem a perder
ao fechar-se face à emergência de uma pluralidade imensa
de canais de informação interactivos. É um erro de gestão.
Um afloramento prático da leitura neo liberal feita por
marxistas fora do seu tempo.
O “Público” corre o rico de se
transformar, em breve, num jornal “careta”,
sem novidade nem carisma. Inimigo de si próprio.
Não vou mais reproduzir as suas notícias e artigos.
O Pacheco Pereira hoje, no Abrupto, identifica, com exactidão,
as consequências do fechamento do “Público” que esta deriva mercantil produzirá.
A ler ainda Atrium.
sábado, abril 2
O PAPA MORREU
O Papa João Paulo II morreu. No seu pontificado, longo e intenso, afirmou-se como uma figura notável. Concretizou um pontificado universalista, em particular, em prol do reencontro entre as religiões. Viajou ao encontro dos povos e usou a palavra como uma arma pela reconciliação e pela paz. Era um conservador em muitas questões que atormentam a vida dos cidadãos e das sociedades contemporâneas como é o caso, por exemplo, da “interrupção voluntária da gravidez”, do uso de métodos contraceptivos e da ordenação das mulheres.
Mas impressionou-me sempre e, em particular, na fase final da sua vida, a forma desassombrada como encarou a velhice, a doença e a morte. Foi até ao fim um protagonista da sua própria vida impregnando de esperança no futuro os desafortunados pela marginalização, pela tirania, pela doença e pela pobreza.
Professemos, ou não, da sua fé, concordemos, ou não, com as orientações do seu pontificado, reconheçamos, humildemente, que foi um grande homem entre os homens do nosso tempo e de todos os tempos.
Uma nota dissonante e, porventura, menor para lastimar como, em Portugal, a RTP, canal público de televisão, realizou a cobertura dos últimos momentos da vida do Papa. No momento em que era anunciada oficialmente a morte do Papa a RTP transmitia um anúncio comercial.
Mais tarde quando o Presidente da República pronunciou a comunicação pública de condolências, em nome do povo português, a RTP não entrou no ar senão quando a comunicação já decorria e, mesmo durante a mesma, mostrou uma imperdoável displicência, sem a presença de um jornalista no acto e partilhando, quase todo o tempo, a imagem do Presidente da República com outras imagens.
A SIC, um canal privado, pelo contrário, cumpriu plenamente o serviço público que deveria competir à RTP. Face a este comportamento indigno a administração da RTP deveria ser exonerada já amanhã.
Mas impressionou-me sempre e, em particular, na fase final da sua vida, a forma desassombrada como encarou a velhice, a doença e a morte. Foi até ao fim um protagonista da sua própria vida impregnando de esperança no futuro os desafortunados pela marginalização, pela tirania, pela doença e pela pobreza.
Professemos, ou não, da sua fé, concordemos, ou não, com as orientações do seu pontificado, reconheçamos, humildemente, que foi um grande homem entre os homens do nosso tempo e de todos os tempos.
Uma nota dissonante e, porventura, menor para lastimar como, em Portugal, a RTP, canal público de televisão, realizou a cobertura dos últimos momentos da vida do Papa. No momento em que era anunciada oficialmente a morte do Papa a RTP transmitia um anúncio comercial.
Mais tarde quando o Presidente da República pronunciou a comunicação pública de condolências, em nome do povo português, a RTP não entrou no ar senão quando a comunicação já decorria e, mesmo durante a mesma, mostrou uma imperdoável displicência, sem a presença de um jornalista no acto e partilhando, quase todo o tempo, a imagem do Presidente da República com outras imagens.
A SIC, um canal privado, pelo contrário, cumpriu plenamente o serviço público que deveria competir à RTP. Face a este comportamento indigno a administração da RTP deveria ser exonerada já amanhã.
JOÃO PAULO II
No fim da vida o Papa polaco, João Paulo, Karol, quis, de vontade própria, dizer ao mundo dos homens que a vida deve ser vivida até ao fim.
Exagero, dizem alguns. Nos últimos dias as imagens das aparições públicas do Papa eram chocantes. E as imagens das guerras e de massacres de civis inocentes? E as imagens da “Quinta das Celebridades”? E as imagens dos corpos amortalhados das vítimas de desastres de viação? E as imagens dos aviões a embaterem nas Torres Gémeas ? ...
No caso deste Papa as imagens do seu sofrimento destinavam-se, por vontade do próprio, a destronar a imagem do efémero atingindo, em plenitude, o coração e a inteligência dos homens. É assim que as entendo.
O Papa quis mostrar que a velhice não é um impedimento para o desempenho de uma profissão, de uma missão, de um trabalho. Que a terceira ou quarta idade, o fim da caminhada pela vida, não é um estigma que justifique o abandono do homem pelos outros homens e a sua condenação à solidão.
Que a doença não é uma fatalidade que se deva aceitar com resignação. O Papa quis, de vontade própria, mostrar ao mundo dos homens, que o sofrimento não é motivo de vergonha e faz parte integrante da vida.
O Papa quis utilizar o poder da sua imagem pública, a sedução que a sua figura exerce em católicos e não católicos, para nos dizer: vivam a vida até ao fim, sem abdicação de nada a que tenham direito, partilhando com a comunidade não só a parte radiosa da criação humana, sempre associada à juventude, como a sua parte mais dolorosa: a dor, a doença e a morte.
Este ritual de exposição pública do sofrimento físico de João Paulo II– anunciando o fim da vida, sem subterfúgios – é uma novidade absoluta que marca uma postura corajosa acerca da vida e, quiçá, o princípio de uma nova era.
Imagem de Cibertulia
sexta-feira, abril 1
SECA
É precisa uma estratégia nacional para a água. E, por conseguinte, para a seca. De alto a baixo. De cabo a rabo. Uma tarefa de fundo, a médio/longo prazo, para o governo. Esta é mesmo uma função do governo.
Se o governo socialista a concretizar já basta para ficar na história. Eu disse concretizar. É difícil mas possível. E tem apoio popular. Garantido à partida. Mas não façam prédicas anunciatórias para empatar tempo e adormecer o auditório.
Acção. Acção.
"A SECA - PEQUENA DISSERTAÇÃO LIVRE"
(Texto integral no IRAOFUNDO E VOLTAR)
Fotografia de Helder Gonçalves
"Diário do Governo" - 7
quinta-feira, março 31
O "Ti Mimoso" Morreu
O “Ti Mimoso” morreu hoje. Acabo de receber a notícia, via email da Patagónia, do Pedro Pedrosa. O “Ti Mimoso” era, com a sua mulher Helena, a referência física e humana de todos os que se deslocam à Aldeia Histórica de Linhares da Beira.
Nela viveram pelo menos dois anos os membros de uma equipa do INATEL que produziram no terreno uma obra de grande alcance chamada “Carta do Lazer das Aldeias Históricas”
Nela se realizou, promovida pelo INATEL, anos a fio a mais consagrada das provas de Parapente de Portugal: o “Open de Linhares da Beira”.
O “Ti Mimoso” era uma âncora humana insubstituível de todas as inúmeras iniciativas e actividades, planeadas e estruturadas, que o INATEL realizou, pelo menos desde 1996 a 2002, em prol do desenvolvimento socio-económico da Linhares da Beira e de toda a região da Beira Interior de Portugal. Um verdadeiro projecto, bem sucedido, de apoio ao desenvolvimento sustentável da região contrariando desconfianças, imobilismos e atavismos.
Nas muitas visitas que fiz aquela aldeia, durante sete anos, era ponto de honra visitar em primeiro lugar o “Ti Mimoso" e a D. Helena na sua “tasca”. Eram figuras de referência de todos os parapentistas nacionais e dos estrangeiros que nos visitavam.
Uma noite cheguei à sua beira, por milagre, debaixo de um nevão incrível conduzido de Jeep pelo Valentim, já de noite, através de uma estrada que era necessário adivinhar, sem avistar vivalma, nos limites da sobrevivência (pelo menos era essa a minha sensação, que não a do Valentim) mas com a determinação de cumprir o programa. E cumprimos.
O “Ti Mimoso” lá estava na sua “tasca” para nos receber não escondendo a surpresa pela visita inesperada e quase impossível.
Eu tinha levado calçados uns sapatos que não resistiram à travessia a pé do jeep à tasca. O "Ti Mimoso" e a D. Helena tiveram a gentileza de me oferecer, na hora, uma botas que me serviam a preceito. Retribui mais tarde oferecendo-lhe um relógio. Sei que ele o ficou a adorar de tal forma que o poupava ao uso não fosse estragar-se. Nunca mais esqueci o "Ti Mimoso", nem esquecerei.
Sempre amável e pronto a ajudar guardo dele, afinal, a memória próxima e fraterna de um companheiro de estrada e de viagem. Honra à sua memória.
Nela viveram pelo menos dois anos os membros de uma equipa do INATEL que produziram no terreno uma obra de grande alcance chamada “Carta do Lazer das Aldeias Históricas”
Nela se realizou, promovida pelo INATEL, anos a fio a mais consagrada das provas de Parapente de Portugal: o “Open de Linhares da Beira”.
O “Ti Mimoso” era uma âncora humana insubstituível de todas as inúmeras iniciativas e actividades, planeadas e estruturadas, que o INATEL realizou, pelo menos desde 1996 a 2002, em prol do desenvolvimento socio-económico da Linhares da Beira e de toda a região da Beira Interior de Portugal. Um verdadeiro projecto, bem sucedido, de apoio ao desenvolvimento sustentável da região contrariando desconfianças, imobilismos e atavismos.
Nas muitas visitas que fiz aquela aldeia, durante sete anos, era ponto de honra visitar em primeiro lugar o “Ti Mimoso" e a D. Helena na sua “tasca”. Eram figuras de referência de todos os parapentistas nacionais e dos estrangeiros que nos visitavam.
Uma noite cheguei à sua beira, por milagre, debaixo de um nevão incrível conduzido de Jeep pelo Valentim, já de noite, através de uma estrada que era necessário adivinhar, sem avistar vivalma, nos limites da sobrevivência (pelo menos era essa a minha sensação, que não a do Valentim) mas com a determinação de cumprir o programa. E cumprimos.
O “Ti Mimoso” lá estava na sua “tasca” para nos receber não escondendo a surpresa pela visita inesperada e quase impossível.
Eu tinha levado calçados uns sapatos que não resistiram à travessia a pé do jeep à tasca. O "Ti Mimoso" e a D. Helena tiveram a gentileza de me oferecer, na hora, uma botas que me serviam a preceito. Retribui mais tarde oferecendo-lhe um relógio. Sei que ele o ficou a adorar de tal forma que o poupava ao uso não fosse estragar-se. Nunca mais esqueci o "Ti Mimoso", nem esquecerei.
Sempre amável e pronto a ajudar guardo dele, afinal, a memória próxima e fraterna de um companheiro de estrada e de viagem. Honra à sua memória.
CARANGUEJOLA
- Ah, que me metam entre cobertores,
E não me façam mais nada!...
Que a porta do meu quarto fique para sempre fechada,
Que não se abra mesmo para ti se tu lá fores.
Lã vermelha, leito fofo. Tudo bem calafetado...
Nenhum livro, nenhum livro à cabeceira -
Façam apenas com que eu tenha sempre a meu lado,
Bolos de ovos e uma garrafa de Madeira.
Não, não estou para mais; não quero mesmo brinquedos.
Pra quê? Até se mos dessem não saberia brincar...
- Que querem fazer de mim com estes enleios e medos?
Não fui feito pra festas. Larguem-me! Deixem-me sossegar...
Noite sempre plo meu quarto. As cortinas corridas,
E eu aninhado a dormir, bem quentinho- que amor!
Sim: ficar sempre na cama, nunca mexer, criar bolor -
Plo menos era o sossego completo... História! Era a melhor das vidas...
Se me doem os pés e não sei andar direito,
Pra que hei-de teimar em ir para as salas, de Lord?
- Vamos, que a minha vida por uma vez se acorde
Com o meu corpo - e se resigne a não ter jeito...
De que me vale sair, se me constipo logo?
E quem posso eu esperar, com a minha delicadeza?...
Deixa-te de ilusões, Mário! Bom édredon, bom fogo -
E não penses no resto. É já bastante, com franqueza...
Desistamos. A nenhuma parte a minha ânsia me levará.
Pra que hei-de então andar aos tombos, numa inútil correria?
Tenham dó de mim. Co'a breca! levem-me prà enfermaria! -
Isto é, pra um quarto particular que o meu Pai pagará.
Justo. Um quarto de hospital - higiénico, todo branco, moderno e tranquilo;
Em Paris, é preferível, por causa da legenda...
De aqui a vinte anos a minha literatura talvez se entenda -
E depois estar maluquinho em Paris fica bem, tem certo estilo...
- Quanto a ti, meu amor, podes vir às quintas-feiras,
Se quiseres ser gentil, perguntar como eu estou.
Agora no meu quarto é que tu não entras, mesmo com as melhores maneiras...
Nada a fazer, minha rica. O menino dorme. Tudo o mais acabou.
Paris, Novembro de 1915
Mário de Sá-Carneiro
Atenção à Coreia do Norte e ao Irão
Una comisión impulsada por Bush reconoce que la guerra se basó en información totalmente errónea
Los expertos recomiendan en su informe cambios sustanciales en los servicios de inteligencia
EE UU lanzó la guerra de Irak y embarcó en ella a medio mundo basándose en informaciones "totalmente erróneas".
Ése ha sido el rotundo diagnóstico de la comisión designada por el propio presidente Bush para investigar los fallos de las agencias de inteligencia en los meses previos al ataque.
El informe recomienda una reforma en profundidad de los servicios secretos y advierte además de que la información que se maneja sobre Corea o Irán tiene la misma fiabilidad que la que se tenía entonces sobre las armas de Sadam.
El País
Los expertos recomiendan en su informe cambios sustanciales en los servicios de inteligencia
EE UU lanzó la guerra de Irak y embarcó en ella a medio mundo basándose en informaciones "totalmente erróneas".
Ése ha sido el rotundo diagnóstico de la comisión designada por el propio presidente Bush para investigar los fallos de las agencias de inteligencia en los meses previos al ataque.
El informe recomienda una reforma en profundidad de los servicios secretos y advierte además de que la información que se maneja sobre Corea o Irán tiene la misma fiabilidad que la que se tenía entonces sobre las armas de Sadam.
El País
quarta-feira, março 30
Sondagens no Reino Unido
Com eleições gerais, muito provavelmente em 5 de Maio, no Reino Unido são importantes as reflexões do MARGENS DE ERRO em que se afirma, por exemplo, que “uma votação 35%-34% favorável aos Trabalhistas, como a que resulta da última sondagem YouGov (24 Março), por exemplo, significa, na prática, uma vantagem muito maior em termos de deputados. Ou para ser mais preciso: o Labour pode até perder em número de votos e ganhar confortavelmente em deputados.”
Faro - "Capital da Cultura 2005"
Faro, minha cidade natal, parece aturdida com a ingente tarefa de acolher e organizar a “Capital Nacional da Cultura” - 2005.
A cidade sempre foi arredia a essas coisas da cultura. Cidade natal de muitos artistas, só grandes poetas contemporâneos, assim de repente, me lembro de António Ramos Rosa, Gastão Cruz e Casimiro de Brito...
Mas a cidade não acolhe dos seus grandes artistas senão quase só a sua lembrança.
Não admira que a directoria do certame, com sede ali no “Clube Farense”, paredes meias com uma janela do quarto onde eu me sentava na minha adolescência estudando e lendo enquanto ouvia os sons da mesa da batota que se jogava do lado de lá, encontre o caminho eivado de escolhos.
Morei na Rua de Santo António, a rua principal da cidade, na casa que serviu de lançamento para o negócio no qual o meu irmão – em ambiente familiar - havia de prosperar até à sua recente e dolorosa morte.
Dormimos longos anos os dois no mesmo quarto exactamente à beira da tal janela. Ele era o irmão mais velho e foi-me interessando pelas coisas da cultura. A cidade provinciana olhava esses interesses culturais com desconfiança e julgo, em abono da verdade, que nada de essencial mudou, ao longo dos anos, no espírito da cidade.
A “Capital Nacional da Cultura” em Faro seria algo muito fácil de organizar se tivesse sido pensada antes de ser organizada. E se o tivesse sido teria havido um espírito de buscar o que de mais profundo, na cidade e na província, no que respeita à dita cultura (erudita e popular), existe para estudar, aprofundar e divulgar.
Não foi. Os que conhecem as raízes culturais do Algarve, desde a antiguidade até aos nossos dias, sabem muito bem do que falo. Um dia destes volto ao tema. Por agora fico-me pela recordação daquela janela através da qual me interroguei, vezes sem conta, acerca do porquê das vozes que falavam a linguagem da batota.
A mesma palavra, batota, de que se falo agora, no mesmo exacto lugar, a propósito de Faro "Capital da Cultura - 2005".
Imagem da rua de acesso ao Largo da Sé de Faro
Personalidade do ano - 2004
O Carlos Paredes foi “embrulhado” na homenagem que o Ramon Font quis prestar, por interposta imprensa estrangeira, ao Dr. José Manuel Barroso.
Tenho a maior estima pelo Ramon mas o Carlos Paredes não merecia um tal “embrulho”. O Carlos Paredes era um génio na sua arte. O maior virtuoso da guitarra portuguesa – pelo menos - das últimas décadas. Um artista comprometido com a defesa de ideias dos quais nunca abdicou. Foi comunista até ao fim.
O Dr. José Manuel Barroso, com todo o respeito e consideração, é o seu perfeito oposto. Colocar Carlos Paredes como uma pena no chapéu de José Manuel Barroso é, no mínimo, indecoroso.
Tenho a maior estima pelo Ramon mas o Carlos Paredes não merecia um tal “embrulho”. O Carlos Paredes era um génio na sua arte. O maior virtuoso da guitarra portuguesa – pelo menos - das últimas décadas. Um artista comprometido com a defesa de ideias dos quais nunca abdicou. Foi comunista até ao fim.
O Dr. José Manuel Barroso, com todo o respeito e consideração, é o seu perfeito oposto. Colocar Carlos Paredes como uma pena no chapéu de José Manuel Barroso é, no mínimo, indecoroso.
segunda-feira, março 28
Areia
Areia pisada,
areia dorida,
areia beijada,
areia batida,
areia doirada,
areia estendida,
areia rolada,
rolada na vida.
Frescura abraçada
ao mar que se vai,
e os braços crispados
pregados num ai.
E a areia rolada
nos olhos profundos,
e as matas de sombra
ao fundo dos mundos…
E o paço de pedra
Erguido no espaço
e as capelas tristes,
que perco e abraço…
E o sonho do vento,
que gela e que deixa,
e a voz que ergo e calo
e é vida e é queixa…
Os degraus que subo
e são mais de cem,
e os cisnes vogando
nos lagos de além…
E as estradas brandas
onde correm fontes,
e as moças que sonham
sem verem os montes…
E os bancos abertos
aos corpos cansados,
e a chuva da tarde
nos parques molhados…
E os riscos de luz
que bordam o Céu,
e a cortina branca
que ao Sol me escondeu…
E os quartos alheios
que giram à roda,
e as vozes na estrada
que me tolhem toda…
E eu dentro de um sonho
suspensa e vibrante
- areia beijada num mar mais distante –
e rica e mais longa,
e presa e mais livre
- sem mal e sem vida…
Areia doirada,
areia estendida,
areia rolada,
rolada na vida!
Natércia Freire
In "Horizonte Fechado" - 1942
areia dorida,
areia beijada,
areia batida,
areia doirada,
areia estendida,
areia rolada,
rolada na vida.
Frescura abraçada
ao mar que se vai,
e os braços crispados
pregados num ai.
E a areia rolada
nos olhos profundos,
e as matas de sombra
ao fundo dos mundos…
E o paço de pedra
Erguido no espaço
e as capelas tristes,
que perco e abraço…
E o sonho do vento,
que gela e que deixa,
e a voz que ergo e calo
e é vida e é queixa…
Os degraus que subo
e são mais de cem,
e os cisnes vogando
nos lagos de além…
E as estradas brandas
onde correm fontes,
e as moças que sonham
sem verem os montes…
E os bancos abertos
aos corpos cansados,
e a chuva da tarde
nos parques molhados…
E os riscos de luz
que bordam o Céu,
e a cortina branca
que ao Sol me escondeu…
E os quartos alheios
que giram à roda,
e as vozes na estrada
que me tolhem toda…
E eu dentro de um sonho
suspensa e vibrante
- areia beijada num mar mais distante –
e rica e mais longa,
e presa e mais livre
- sem mal e sem vida…
Areia doirada,
areia estendida,
areia rolada,
rolada na vida!
Natércia Freire
In "Horizonte Fechado" - 1942
Dia Mundial do Teatro
Não me esqueci do Dia Mundial do Teatro que se celebrou ontem. A minha formação humana deve muito ao teatro, em particular, ao teatro amador, para que esqueça uma data destas.
Mas reparei que a modéstia das celebrações foi coberta pelo manto das explicações apressadas acerca da coincidência com o período pascal.
A verdade, nua e crua, é que o teatro não é uma prioridade dos governos de Portugal não tanto por penúria mas por falta de vontade política.
Os teatros nacionais, em geral, arrastam-se com programações sem chama, as companhias independentes, na sua maioria, são cada mais dependentes de subsídios públicos e o teatro amador – nas escolas, nas sociedades culturais e recreativas ou nos CCDs de empresa, é quase uma peça de museu. Mas há excepções.
A efeméride fica assinalada com esta notícia que descreve com argúcia a real situação do teatro em Portugal.
E aproveito para dar a conhecer o BLOGAMEMUNCHO.
Mas reparei que a modéstia das celebrações foi coberta pelo manto das explicações apressadas acerca da coincidência com o período pascal.
A verdade, nua e crua, é que o teatro não é uma prioridade dos governos de Portugal não tanto por penúria mas por falta de vontade política.
Os teatros nacionais, em geral, arrastam-se com programações sem chama, as companhias independentes, na sua maioria, são cada mais dependentes de subsídios públicos e o teatro amador – nas escolas, nas sociedades culturais e recreativas ou nos CCDs de empresa, é quase uma peça de museu. Mas há excepções.
A efeméride fica assinalada com esta notícia que descreve com argúcia a real situação do teatro em Portugal.
E aproveito para dar a conhecer o BLOGAMEMUNCHO.
Lenga-Lenga em Homenagem aos Ilustres Emigrantes
Queriam um frémito um solavanco democrático algo que mexesse com o que estava mal e agora parece que afinal não está, queriam alguma mudança substancial não digo um grito de guerra: aos abrigos! mas um estugar do passo, um esforço, um ranger de cordas nas amarras, queriam festa pá! não foram à rua como eu fui na noite do dia 20 de fevereiro! se se tivessem dado à maçada de levantar uma bandeira no largo do rato teriam percebido que a democracia está consolidada, estão a ver com – solidada! o entusiasmo nem sorria na cara dos vencedores quanto mais na dos vendedores de cachorros quentes e salvo o meu filho que precisava de experimentar uma celebração destas para conhecer o que pode ser uma celebração no futuro, uma celebração a sério, vi logo que estávamos tramados pá! a direita nem precisa de se reorganizar que a esquerda toma conta dela, a esquerda nem precisa de existir que a direita toma conta dela, todos reunidos na grande praça central à espera que se organize uma sociedade que por ela própria, sem mais nada, se organize, é o mercado, é o mercado, abaixo o estado! clamam uma legião de liberais libertadores da pátria em perigo sempre naquele seu gesto emblemático de mão estendida às benesses do estado, enquanto a associação da imprensa estrangeira louva josé manuel barroso como o homem que em 2004 mais estendeu o nome da pátria no mundo e eu a pensar que tinham sido o figo e o scolari, mas eles lá sabem o que lhes coze o estômago, estamos tramados pá! o barroso um dia vai voltar com o peito cheio de comendas e o guterres também, se passar na prova, e aposto que passa que ele é aluno de 19, a tratar dos refugiados pobres do mundo, isto para mim é uma estratégia montada pelo bush que já arrumou com o santana e pensa que arrumou com o ferro, para pôr ordem no mundo, estão a ver um português a tratar dos ricos da europa e outro portugês a tratar dos pobres do mundo, uma estratégia a nível global para dar sentido à diáspora, uma regressão pós-moderna aos píncaros gloriosos do século XV português com o vasco graça moura a fazer de camões (desculpa lá a letra pequena, pá!) e o eng.º sócrates a fazer de vasco da gama, a nova novíssima ínclita geração ao leme do mundo outra vez e voltamos a libertar o imaginário e a sonhar além da calçada à portuguesa e já não vai ser preciso fazer guerra à armada espanhola, nem posar para a fotografia com o Bush nas lages, vão dando notícias que nós, como sempre, cá nos arranjaremos ... com que então queriam um frémito, um solavanco democrático ...
domingo, março 27
O Corvo
Edgar Allan Poe
1
Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de algúem que batia levemente a meus umbrais.
"Uma visita", eu me disse, "está batendo a meus umbrais.
É só isto, e nada mais."
"O Corvo", de Edgar Allan Poe, Tradução de Fernando Pessoa.
Versão integral no IRAOFUNDOEVOLTAR
A Direita Pensa Mas Pouco
Não se pense que a direita não pensa. Pensa mas pouco. É que em Portugal a direita carrega ainda o estigma do Salazarismo.
No exercício do poder, em democracia, a direita esbarra na sua proverbial intolerância. A mistura de intolerância, populismo e promiscuidade entre interesse “público” e “privado” é explosiva. Denega a democracia.
O PP no governo foi um exemplo vivo dessa denegação como o episódio do retrato de Freitas do Amaral e dos negócios de última hora, “abençoados” por Bagão Félix, evidenciam.
São os próprios pensadores da direita que levantam a ponta do véu acerca da crise de identidade da direita em Portugal.
Mas, como assinala Vasco Pulido Valente, nem sequer se lembraram do papel da igreja católica.
No exercício do poder, em democracia, a direita esbarra na sua proverbial intolerância. A mistura de intolerância, populismo e promiscuidade entre interesse “público” e “privado” é explosiva. Denega a democracia.
O PP no governo foi um exemplo vivo dessa denegação como o episódio do retrato de Freitas do Amaral e dos negócios de última hora, “abençoados” por Bagão Félix, evidenciam.
São os próprios pensadores da direita que levantam a ponta do véu acerca da crise de identidade da direita em Portugal.
Mas, como assinala Vasco Pulido Valente, nem sequer se lembraram do papel da igreja católica.
sábado, março 26
Num mundo que já não crê no pecado, é o artista que está encarregado da pregação. Mas se as palavras do padre produziam efeito era porque o exemplo as alimentava. O artista esforça-se por se tornar num exemplo. Eis porque o fuzilam ou o deportam, com grande escândalo seu. E depois a virtude não se aprende tão depressa como o manejo da metralhadora. O combate é desigual.
Cito Camus a propósito da tragédia de Bobby Fischer
Fotografia de Hélder Gonçalves
ELEGIA DAS ÁGUAS NEGRAS
PARA CHE GUEVARA
Atado ao silêncio, o coração ainda
pesado de amor, jazes de perfil,
escutando, por assim dizer, as águas
negras da nossa aflição.
Pálidas vozes procuram-te na bruma;
de prado em prado procuram
um potro, a palmeira mais alta
sobre o lago, um barco talvez
ou o mel entornado da nossa alegria.
Olhos apertados pelo medo
aguardam na noite o sol onde cresces,
onde te confundes com os ramos
de sangue do verão ou o rumor
dos pés brancos da chuva nas areias.
A palavra, como tu dizias, chega
húmida dos bosques: temos que semeá-la;
chega húmida da terra: temos que defendê-la;
chega com as andorinhas
que a beberam sílaba a sílaba na tua boca.
Cada palavra tua é um homem de pé,
cada palavra tua faz do orvalho uma faca,
faz do ódio um vinho inocente
para bebermos, contigo
no coração, em redor do fogo.
Eugénio de Andrade
1971
sexta-feira, março 25
O "Público" Faz-se Pagar
O “Público” vai começar a cobrar pelo acesso à sua versão em papel em condições ainda mal esclarecidas.
É um modelo já adoptado, por exemplo, pelo “Expresso” e muito utilizado no acesso às publicações em papel de todos os países.
Por mim não vou assinar. Por vezes reproduzo as suas notícias mas, em boa verdade, não preciso do “Público” para nada. Eles também não precisam de mim. É o negócio deles e que lhes faça bom proveito.
É interessante a coincidência desta decisão com a entrada em funções do governo socialista. Nos tempos da Dra. Manuela Ferreira Leite não de lembraram da coisa.
Aproveito para divulgar o JORNALISMO E COMUNICAÇÃO onde catrapisquei esta notícia.
É um modelo já adoptado, por exemplo, pelo “Expresso” e muito utilizado no acesso às publicações em papel de todos os países.
Por mim não vou assinar. Por vezes reproduzo as suas notícias mas, em boa verdade, não preciso do “Público” para nada. Eles também não precisam de mim. É o negócio deles e que lhes faça bom proveito.
É interessante a coincidência desta decisão com a entrada em funções do governo socialista. Nos tempos da Dra. Manuela Ferreira Leite não de lembraram da coisa.
Aproveito para divulgar o JORNALISMO E COMUNICAÇÃO onde catrapisquei esta notícia.
Breves Despedidas
“Lê-se no «Público» que o antigo (bela palavra) ministro da Defesa Paulo Portas resolveu ter como último acto público a atribuição de medalhas da Defesa Nacional, criadas pelo Governo de Durão Barroso em 2002 (e ainda dizem que o homem nunca fez nada por Portugal).
Curiosamente, o antigo ministro resolveu condecorar o seu antigo (que bela palavra) ministro das Finanças, Bagão Félix (o que só lhe fica bem) e, surpresa das surpresas ou talvez não, deu mais uma medalha ao antigo (que belíssima palavra) embaixador americano em Portugal Frank Carlucci.
O que fez Frank Carlucci por Portugal nos últimos tempos que justifique esta medalha? Ou melhor, o que fez o Grupo Carlyle por Portugal nos últimos tempos que justifique esta medalha (a não ser tratar-nos como uma coutada)? Ou melhor, o que fez o Grupo Carlyle nos últimos tempos por Paulo Portas que justifique esta medalha (perguntar não ofende)?
Recorde-se que já Santana Lopes, a mando e em substituição do (defunto) Barroso, tinha aproveitado uma ida a Nova Iorque para, num intervalo discreto, condecorar o mesmo Frank Carlucci (isto foi há meses) com uma daquelas medalhas grandes e pesadas do Presidente da República, tendo o mesmo Presidente da República aceite a sugestão do (defunto) Barroso para condecorar Carlucci. Porquê agora?”
Extracto do artigo “Breves Despedidas”, de Clara Ferreira Alves, publicado, hoje, na “Única”, revista do Expresso.
Versão integral, que vale a pena, no IRAOFUNDOEVOLTAR.
Curiosamente, o antigo ministro resolveu condecorar o seu antigo (que bela palavra) ministro das Finanças, Bagão Félix (o que só lhe fica bem) e, surpresa das surpresas ou talvez não, deu mais uma medalha ao antigo (que belíssima palavra) embaixador americano em Portugal Frank Carlucci.
O que fez Frank Carlucci por Portugal nos últimos tempos que justifique esta medalha? Ou melhor, o que fez o Grupo Carlyle por Portugal nos últimos tempos que justifique esta medalha (a não ser tratar-nos como uma coutada)? Ou melhor, o que fez o Grupo Carlyle nos últimos tempos por Paulo Portas que justifique esta medalha (perguntar não ofende)?
Recorde-se que já Santana Lopes, a mando e em substituição do (defunto) Barroso, tinha aproveitado uma ida a Nova Iorque para, num intervalo discreto, condecorar o mesmo Frank Carlucci (isto foi há meses) com uma daquelas medalhas grandes e pesadas do Presidente da República, tendo o mesmo Presidente da República aceite a sugestão do (defunto) Barroso para condecorar Carlucci. Porquê agora?”
Extracto do artigo “Breves Despedidas”, de Clara Ferreira Alves, publicado, hoje, na “Única”, revista do Expresso.
Versão integral, que vale a pena, no IRAOFUNDOEVOLTAR.
O Dr. Bagão Ainda Governa (3)
O governo socialista já governa.
O anterior governo fica “destapado”. O que se vai sabendo das suas acções é aterrador. Mais tarde se perceberá melhor o sentido da acção de alguns dos seus ministros.
Nicolau Santos, no “Expresso”, a propósito de “Um negócio demasiado nebuloso” escreve:
Há que dizer-se das coisas o somenos que elas são, escreveu Natália Correia. E o mínimo que se pode dizer é que Daniel Sanches e Bagão Félix foram demasiado imprudentes ao assinar este contrato com a Sociedade Lusa de Negócios. Será que não se interrogaram porque os melhores fabricantes europeus, como a Nokia, EADS e Siemens, que levantaram o caderno de encargos, se recusaram a apresentar propostas? Será que não tiveram conhecimento que o mesmo sistema poderia ser fornecido por 200 milhões de euros?
Às vezes, há coisas tão nebulosas, que não só o novo Governo as deve deitar para o caixote de lixo e começar tudo de novo, como investigar as razões de quem decidiu.
O anterior governo fica “destapado”. O que se vai sabendo das suas acções é aterrador. Mais tarde se perceberá melhor o sentido da acção de alguns dos seus ministros.
Nicolau Santos, no “Expresso”, a propósito de “Um negócio demasiado nebuloso” escreve:
Há que dizer-se das coisas o somenos que elas são, escreveu Natália Correia. E o mínimo que se pode dizer é que Daniel Sanches e Bagão Félix foram demasiado imprudentes ao assinar este contrato com a Sociedade Lusa de Negócios. Será que não se interrogaram porque os melhores fabricantes europeus, como a Nokia, EADS e Siemens, que levantaram o caderno de encargos, se recusaram a apresentar propostas? Será que não tiveram conhecimento que o mesmo sistema poderia ser fornecido por 200 milhões de euros?
Às vezes, há coisas tão nebulosas, que não só o novo Governo as deve deitar para o caixote de lixo e começar tudo de novo, como investigar as razões de quem decidiu.
Governo e Crítica
É verdade que o PS nunca tinha alcançado uma maioria absoluta em eleições legislativas. A maioria absoluta de deputados no parlamento não dispensa, como foi afirmado, pelo primeiro-ministro, a audição dos partidos minoritários nas questões essenciais da governação. Essa vontade não pode, no entanto, constranger o partido do governo de afirmar os seus valores e a sua ideologia.
O pior erro que o PS poderia cometer seria o de abdicar de se afirmar como partido de causas assentes nos valores da esquerda que se podem sintetizar em duas palavras antigas para uma esquerda moderna: justiça e liberdade.
O governo pode “governar ao centro”, encontrar soluções de governação de natureza social-democrata na área social, adoptar posturas liberais de esquerda, na área da economia, concertar negócios e conceber benefícios que atraiam o investimento estrangeiro, assumir o primado de uma função reguladora e defensora dos consumidores e por aí fora, obtendo, momentaneamente, o apoio daqueles que ainda dias atrás fustigavam os socialistas com as críticas mais ferozes.
Mas o PS, sendo a base de apoio do governo, não pode deixar de ser um partido crítico do próprio governo.
Tudo o que agora são medidas reluzentes e sorrisos radiosos nas faces dos membros do governo se transformarão, a médio prazo, em penosas justificações de insucessos e atrasos e em faces crispadas no momento das respostas às perguntas implacáveis das oposições e da comunicação social.
Tudo o que na fase inicial da governação são despesas virtuosas se transformará, na fase seguinte, em desperdícios evitáveis na boca dos opositores da governação socialista.
Mais valia ao governo dispor de um PS que afirmasse a sua autonomia com uma postura de crítica construtiva desde o início. Vêm estas palavras a propósito da prestação de Jorge Coelho no programa “Quadratura do Círculo”, na SIC Notícias, da noite passada e de muitas outras atitudes de apoio entusiástico e voluntarista que têm surgido nestes primeiros dias da acção do governo.
Ao governo o que é do governo, ao partido do governo o que é do partido do governo. Ao governo cabe cumprir o seu programa, ao partido do governo compete, naturalmente, apoiá-lo sem descurar a vigilância crítica desde a primeira hora.
O ambiente político, nesta fase inicial, não tem apontado para esta dialéctica saudável o que, na minha opinião, pode pressagiar um enfraquecimento do governo a médio prazo. Mais valia começar desde já a preparar o terreno para as dificuldades da concretização de muitas das medidas anunciadas e de outras medidas difíceis que aí virão.
O país real, que dá pelo nome de Portugal, é exactamente o mesmo que no dia 19 de Fevereiro de 2005. Mudou o governo, o que já não é nada pouco, mas não mudaram as dificuldades, os constrangimentos e, como consequência, as condições objectivas da governação. Cuidado que a memória das gentes é curta, a gratidão morreu solteira e o pecúlio escasso.
“Diário do Governo” – 6
O pior erro que o PS poderia cometer seria o de abdicar de se afirmar como partido de causas assentes nos valores da esquerda que se podem sintetizar em duas palavras antigas para uma esquerda moderna: justiça e liberdade.
O governo pode “governar ao centro”, encontrar soluções de governação de natureza social-democrata na área social, adoptar posturas liberais de esquerda, na área da economia, concertar negócios e conceber benefícios que atraiam o investimento estrangeiro, assumir o primado de uma função reguladora e defensora dos consumidores e por aí fora, obtendo, momentaneamente, o apoio daqueles que ainda dias atrás fustigavam os socialistas com as críticas mais ferozes.
Mas o PS, sendo a base de apoio do governo, não pode deixar de ser um partido crítico do próprio governo.
Tudo o que agora são medidas reluzentes e sorrisos radiosos nas faces dos membros do governo se transformarão, a médio prazo, em penosas justificações de insucessos e atrasos e em faces crispadas no momento das respostas às perguntas implacáveis das oposições e da comunicação social.
Tudo o que na fase inicial da governação são despesas virtuosas se transformará, na fase seguinte, em desperdícios evitáveis na boca dos opositores da governação socialista.
Mais valia ao governo dispor de um PS que afirmasse a sua autonomia com uma postura de crítica construtiva desde o início. Vêm estas palavras a propósito da prestação de Jorge Coelho no programa “Quadratura do Círculo”, na SIC Notícias, da noite passada e de muitas outras atitudes de apoio entusiástico e voluntarista que têm surgido nestes primeiros dias da acção do governo.
Ao governo o que é do governo, ao partido do governo o que é do partido do governo. Ao governo cabe cumprir o seu programa, ao partido do governo compete, naturalmente, apoiá-lo sem descurar a vigilância crítica desde a primeira hora.
O ambiente político, nesta fase inicial, não tem apontado para esta dialéctica saudável o que, na minha opinião, pode pressagiar um enfraquecimento do governo a médio prazo. Mais valia começar desde já a preparar o terreno para as dificuldades da concretização de muitas das medidas anunciadas e de outras medidas difíceis que aí virão.
O país real, que dá pelo nome de Portugal, é exactamente o mesmo que no dia 19 de Fevereiro de 2005. Mudou o governo, o que já não é nada pouco, mas não mudaram as dificuldades, os constrangimentos e, como consequência, as condições objectivas da governação. Cuidado que a memória das gentes é curta, a gratidão morreu solteira e o pecúlio escasso.
“Diário do Governo” – 6
quinta-feira, março 24
O Dr. Bagão Ainda Governa (2)
No Expresso online surge a notícia "Impostos sobem ainda este ano". Mas o aspecto mais importante está no último parágrafo, que sublinho, dando conta que o défice implícito do Orçamento de Estado/2005 está nos 7%. O Dr. Bagão ainda governa!
"O GOVERNO vai apresentar em Maio um Orçamento Rectificativo, que contempla um conjunto de medidas fiscais destinadas a fazer face à «situação particularmente difícil» e ao «irrealismo» do Orçamento do Estado para 2005. O Ministério das Finanças não descarta que entre essas medidas esteja contemplada a subida de alguns impostos e o congelamento de despesas.
Os impostos que fazem entrar dinheiro imediatamente nos cofres públicos são essencialmente o IVA, imposto sobre combustíveis (ISP) e Imposto Automóvel (IA). Quanto aos cortes nas despesas serão detalhados no Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente (PPRDC), a apresentar pelo Governo dentro de seis meses e visando um horizonte de quatro anos.
Estas medidas visam responder ao défice implícito do Orçamento do Estado/2005, que está nos 7% devido a: crescimento económico 50% abaixo do previsto; preço do barril de petróleo acima dos 39 dólares; não contemplação dos encargos de 500 milhões de euros com as SCUT; 250 milhões de euros da dotação provisional para aumentos salariais; suborçamentação dos serviços, mais 1.700 milhões de euros; medidas extraordinárias de 2.300 milhões de euros; contas da Saúde."
"O GOVERNO vai apresentar em Maio um Orçamento Rectificativo, que contempla um conjunto de medidas fiscais destinadas a fazer face à «situação particularmente difícil» e ao «irrealismo» do Orçamento do Estado para 2005. O Ministério das Finanças não descarta que entre essas medidas esteja contemplada a subida de alguns impostos e o congelamento de despesas.
Os impostos que fazem entrar dinheiro imediatamente nos cofres públicos são essencialmente o IVA, imposto sobre combustíveis (ISP) e Imposto Automóvel (IA). Quanto aos cortes nas despesas serão detalhados no Programa Plurianual de Redução da Despesa Corrente (PPRDC), a apresentar pelo Governo dentro de seis meses e visando um horizonte de quatro anos.
Estas medidas visam responder ao défice implícito do Orçamento do Estado/2005, que está nos 7% devido a: crescimento económico 50% abaixo do previsto; preço do barril de petróleo acima dos 39 dólares; não contemplação dos encargos de 500 milhões de euros com as SCUT; 250 milhões de euros da dotação provisional para aumentos salariais; suborçamentação dos serviços, mais 1.700 milhões de euros; medidas extraordinárias de 2.300 milhões de euros; contas da Saúde."
O Dr. Bagão Ainda Governa
O Dr. Bagão Félix ainda publica legislação, despachos e portarias.
Um dia destes recebi uma citação das finanças com ameaça de penhora de bens. Como descrevi num post anterior fui a correr às finanças saber de que se tratava. Era uma quantia irrisória que resultou, conforme me foi dito, de um acerto provocado por questões informáticas. Não havia, de facto, dívida alguma. A quantia era pequena e para evitar o calvário das reclamações a que o contribuinte se sujeita paguei.
Mas, a partir de agora, olharei os funcionários das finanças como patrões com interesse directo nos resultados das cobranças. Como responsáveis directos pelos erros e omissões. Desconfiarei sempre da boa fé das suas contas. Não perdoarei as desatenções e as esperas. Nenhum erro se pode perdoar a quem dele pode beneficiar.
Um dia destes recebi uma citação das finanças com ameaça de penhora de bens. Como descrevi num post anterior fui a correr às finanças saber de que se tratava. Era uma quantia irrisória que resultou, conforme me foi dito, de um acerto provocado por questões informáticas. Não havia, de facto, dívida alguma. A quantia era pequena e para evitar o calvário das reclamações a que o contribuinte se sujeita paguei.
Mas, a partir de agora, olharei os funcionários das finanças como patrões com interesse directo nos resultados das cobranças. Como responsáveis directos pelos erros e omissões. Desconfiarei sempre da boa fé das suas contas. Não perdoarei as desatenções e as esperas. Nenhum erro se pode perdoar a quem dele pode beneficiar.
ENQUANTO HÁ FORÇA
Enquanto há força
No braço que vinga
Que venham ventos
Virar-nos as quilhas
Seremos muitos
Seremos alguém
Cantai rapazes
Dançai raparigas
E vós altivas
Cantai também
Levanta o braço
Faz dele uma barra
Que venha a brisa
Lavar-nos a cara
Seremos muitos
Seremos alguém
Cantai rapazes
Dançai raparigas
E vós altivas
Dançai também
José Afonso
quarta-feira, março 23
Gracias a la vida
Gracias a la vida (Mercedes Sosa)
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me dio dos luceros que cuando los abro
perfecto distingo lo negro del blanco
y en el alto cielo su fondo estrellado
y en las multitudes el hombre que yo amo
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me ha dado el sonido y el abecedario
con él, las palabras que pienso y declaro
madre, amigo, hermano
y luz alumbrando la ruta del alma del que estoy amando
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me ha dado la marcha de mis pies cansados
con ellos anduve ciudades y charcos
playas y desiertos, montañas y llanos
y la casa tuya, tu calle y tu patio
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me dio el corazón que agita su marco
cuando miro el fruto del cerebro humano
cuando miro el bueno tan lejos del malo
cuando miro el fondo de tus ojos claros
Gracias a la vida que me ha dado tanto
me ha dado la risa y me ha dado el llanto
así yo distingo dicha de quebranto
los dos materiales que forman mi canto
y el canto de ustedes que es el mismo canto
y el canto de todos que es mi propio canto
Gracias a la vida, gracias a la vida
(Agradecendo à Colombina)
terça-feira, março 22
Haverá quem ache estranho as minhas deambulações pelas memórias, pelos antepassados, pelos caminhos e lugares da infância.
Essa estranheza não me estranha. Mas nenhum percurso se faz sem passado, sem enlaçar outros percursos, sem comunicação, sem resposta mesmo quando nos julgamos imortais.
Alguém, além de nós, que nos compreenda e acredite é o maior anseio do homem.
Creio nos meus porque sei que me acompanham sempre mesmo quando parece que os não acompanho.
Poucos desses estão fora da família natural. Nela reside o segredo da minha crença no futuro do homem.
Fotografia de Hélder Gonçalves
No Cimo do Monte
Subi este fim-de-semana ao cimo do monte onde brilha a casa
dos meus avós maternos José Fernandes de Brito (7/11/1891- 12/10/1979)
e Rosa da Conceição Marques (1/1/1892 - 7/12/1984)
no sítio de Sinagoga, Santo Estêvão, Tavira. Do terraço,
ao alto, pintado de branco puro, avista-se a costa algarvia,
de lés a lés, desde Espanha às cercanias de Olhão.
Muita terra, arvoredos, céu azul, lugares camponeses,
aldeias piscatórios e as praias todas. No sentido do norte o
barrocal com a sua vegetação característica a que sempre ouvi
chamar de mato. Tomei o compromisso, para com a minha mãe,
de manter aquela casa, através das gerações, para que os vindouros
possam nela rever-se na vida dos seus antepassados camponeses.
Para que com essa memória se não perca o sentido do tempo e
da honra da pertença a uma família camponesa honrada e a um
povo e dela se possa imaginar até a vista das sandálias que a minha
mulher um dia fotografou abandonadas numa daquelas praias à
distância de um golpe de olhar à mistura com as copas das árvores.
segunda-feira, março 21
Viva o Retrocesso !
Hoje é dia de apresentação e discussão do programa do governo socialista no Parlamento.
Passam para a opinião pública bastantes boas ideias. Retive algumas. Orçamento de estado plurianual a partir de 2006. Uma revolução. Podem crer! Se for para fazer.
Combate à pobreza a começar pelos idosos com 80 anos ou mais e a "deslizar", anualmente, até aos 65 anos. Boa ideia para medir sensatamente o impacto social e financeiro da medida.
Redução das férias judiciais de dois para um mês. E outras, muitas outras, no terreno da economia. Talvez tenham saltado para a opinião pública ideias demais. Mas se o governo não apresentasse ideias no princípio de vida ...
Assim o governo acredita-se desde que seja capaz de acompanhar os anúncios com as concretizações. Os representantes das corporações atacam.
Os representantes dos sindicatos resignam-se e esperam. Aliás são sempre os mesmos e já seria hora de mudarem de elenco! É o Carvalho e o Proença, o Proença e o Carvalho. Bolas!
Desta vez o representante dos farmacêuticos deu um ar da sua graça. Denunciou o "retrocesso" da venda de medicamentos fora das farmácias. Que falta de imaginação!
Os agentes da justiça atacam a redução das férias judiciais.
Não acreditam? Se as corporações estão contra as medidas anunciadas pelo governo é porque elas devem ser boas. É um critério um pouco grosseiro mas, infelizmente, com grandes hipóteses de ser justo.
"Diário do Governo" - 5
Passam para a opinião pública bastantes boas ideias. Retive algumas. Orçamento de estado plurianual a partir de 2006. Uma revolução. Podem crer! Se for para fazer.
Combate à pobreza a começar pelos idosos com 80 anos ou mais e a "deslizar", anualmente, até aos 65 anos. Boa ideia para medir sensatamente o impacto social e financeiro da medida.
Redução das férias judiciais de dois para um mês. E outras, muitas outras, no terreno da economia. Talvez tenham saltado para a opinião pública ideias demais. Mas se o governo não apresentasse ideias no princípio de vida ...
Assim o governo acredita-se desde que seja capaz de acompanhar os anúncios com as concretizações. Os representantes das corporações atacam.
Os representantes dos sindicatos resignam-se e esperam. Aliás são sempre os mesmos e já seria hora de mudarem de elenco! É o Carvalho e o Proença, o Proença e o Carvalho. Bolas!
Desta vez o representante dos farmacêuticos deu um ar da sua graça. Denunciou o "retrocesso" da venda de medicamentos fora das farmácias. Que falta de imaginação!
Os agentes da justiça atacam a redução das férias judiciais.
Não acreditam? Se as corporações estão contra as medidas anunciadas pelo governo é porque elas devem ser boas. É um critério um pouco grosseiro mas, infelizmente, com grandes hipóteses de ser justo.
"Diário do Governo" - 5
domingo, março 20
As terras a sul estão da mesma cor como sempre as conheci. Aqui e ali despontam uns tímidos tons de verde. Todos estão conformados ao castanho tisnado da descrença. Agora já não é a "pesada herança" mas o presságio futuro da desgraça. Mudam os tempos mas não mudam as vontades. Fotografia de Helder Gonçalves
Crise Lamentável
Gostava tanto de mexer na vida,
De ser quem sou – mas de poder tocar-lhe...
E não há forma: cada vez perdida
Mais a destreza de saber pegar-lhe.
Viver em casa como toda a gente,
Não ter juízo nos meus livros - mas
Chegar ao fim do mês sempre com as
Despesas pagas religiosamente.
Não ter receio de seguir pequenas
E convidá-las para me pôr nelas –
À minha Torre ebúrnea abrir janelas,
Numa palavra, e não fazer mais cenas.
Ter força um dia para quebrar as roscas
Desta engrenagem que emperrando vai.
- Não mandar telegramas ao meu Pai,
- Não andar por Paris, como ando, às moscas.
Levantar-me e sair - não precisar
De hora e meia antes de vir prà rua.
- Pôr termo a isto de viver na lua,
- Perder a “frousse” das correntes de ar.
Não estar sempre a bulir, a quebrar coisas
Por casa dos amigos que frequento -
Não me embrenhar por histórias melindrosas
Que em fantasia apenas argumento.
Que tudo em mim é fantasia alada,
Um crime ou bem que nunca se comete
E sempre o Oiro em chumbo se derrete
Por meu Azar ou minha Zoina suada...
Paris, Janeiro de 1916
Mário de Sá-Carneiro
De ser quem sou – mas de poder tocar-lhe...
E não há forma: cada vez perdida
Mais a destreza de saber pegar-lhe.
Viver em casa como toda a gente,
Não ter juízo nos meus livros - mas
Chegar ao fim do mês sempre com as
Despesas pagas religiosamente.
Não ter receio de seguir pequenas
E convidá-las para me pôr nelas –
À minha Torre ebúrnea abrir janelas,
Numa palavra, e não fazer mais cenas.
Ter força um dia para quebrar as roscas
Desta engrenagem que emperrando vai.
- Não mandar telegramas ao meu Pai,
- Não andar por Paris, como ando, às moscas.
Levantar-me e sair - não precisar
De hora e meia antes de vir prà rua.
- Pôr termo a isto de viver na lua,
- Perder a “frousse” das correntes de ar.
Não estar sempre a bulir, a quebrar coisas
Por casa dos amigos que frequento -
Não me embrenhar por histórias melindrosas
Que em fantasia apenas argumento.
Que tudo em mim é fantasia alada,
Um crime ou bem que nunca se comete
E sempre o Oiro em chumbo se derrete
Por meu Azar ou minha Zoina suada...
Paris, Janeiro de 1916
Mário de Sá-Carneiro
O LIVRO - Entrei numa livraria. Pus-me a contar os livros que há para ler e os anos que terei de vida. Não chegam, não duro nem para metade da livraria. Deve certamente haver outras maneiras de se salvar uma pessoa, senão estou perdido. No entanto, as pessoas que entravam na livraria estavam todas muito bem vestidas de quem precisa salvar-se. Almada Negreiros In "A invenção do dia claro" - 1921
sábado, março 19
Seca
Ao descer o caminho do campo da minha infância vi as figueiras secas que parecem peças de uma arte por inventar. Percebi uns laivos de rebentos nas pontas dos ramos, uma esperança de redenção. A seca é muito mais grave que Pedro Santana Lopes. A seca veio para ficar, todos já percebemos. Santana já partiu, mas ainda não percebeu. Ele e o Expresso que lhe dá direito a manchete.
Hoje a Sul
Um passeio pelas ruas da minha infância. Coelho de Melo, Brito Cabreira, Emiliano da Costa. A meio das ruas caminho e reparo nas portas e janelas que me separam da vivência dos seus interiores. Alumínio no lugar da madeira. Alcatrão no lugar da terra batida. Sem gente, sem alma, sem vozes, sem murmúrios. Um deserto.
Comprei 4 livros (em Faro compro sempre livros de poesia)
- João Lúcio – Poesias Completas - toda a gente se esqueceu deste poeta algarvio (1880/1918);
- Poesia de Vítor Matos de Sá (1926/1975)– Desconhecia a sua poesia belíssima;
- Natércia Freire -Obra poética –Vol I Poesias escolhidas 1942-52 ;
- Obra Poética Completa de Federico Garcia Lorca – edição brasileira da Martins Fontes (bilingue).
Deu-me prazer esta incursão pelas memórias e pelas compras.
Comprei 4 livros (em Faro compro sempre livros de poesia)
- João Lúcio – Poesias Completas - toda a gente se esqueceu deste poeta algarvio (1880/1918);
- Poesia de Vítor Matos de Sá (1926/1975)– Desconhecia a sua poesia belíssima;
- Natércia Freire -Obra poética –Vol I Poesias escolhidas 1942-52 ;
- Obra Poética Completa de Federico Garcia Lorca – edição brasileira da Martins Fontes (bilingue).
Deu-me prazer esta incursão pelas memórias e pelas compras.
sexta-feira, março 18
A Imigração no Programa de Governo do PS
"Portugal optou por uma política de abertura regulada à imigração, adoptando uma estratégia em torno de três eixos: regulação, fiscalização e integração. Esta estratégia foi inspirada na estratégia da União Europeia de criação de políticas comuns de estrangeiros e de asilo, a qual merece total adesão do Governo."
Esta é a primeira frase do programa de governo do PS respeitante à imigração. O capítulo integral referente a este tema pode ser lido no IR AO FUNDO E VOLTAR.
Esta é a primeira frase do programa de governo do PS respeitante à imigração. O capítulo integral referente a este tema pode ser lido no IR AO FUNDO E VOLTAR.
quinta-feira, março 17
Primavera
Imigração
Portugal surgiu num inquérito de opinião como um país xenófobo.
Os imigrantes seriam malqueridos pelo povo português. O inquérito é de 2003. Será que existe alguma relação entre esta revelação e o facto de Portugal ter sido governado, até há dias atrás, por uma coligação de direita que integrava o PP?
Se o povo português é xenófobo porque razão não votou em massa no PP? Nenhum partido assumiu politicamente, de forma aberta, a xenofobia! Ou o povo português não é xenófobo? Os inquéritos são muito traiçoeiros! O Presidente da República ficou surpreendido? A legislação não é adequada? Não havia política para a imigração? E vai haver, no futuro, política para a imigração?
O partido socialista apresentou, no seu programa eleitoral, uma política muito bem estruturada para a imigração. O programa do governo socialista foi aprovado hoje. Todos os portugueses esperam que seja para cumprir. O programa não é xenófobo antes se fundamenta na integração social dos imigrantes e na aceitação da diversidade étnica e cultural.
"Diário do Governo" - 4
Os imigrantes seriam malqueridos pelo povo português. O inquérito é de 2003. Será que existe alguma relação entre esta revelação e o facto de Portugal ter sido governado, até há dias atrás, por uma coligação de direita que integrava o PP?
Se o povo português é xenófobo porque razão não votou em massa no PP? Nenhum partido assumiu politicamente, de forma aberta, a xenofobia! Ou o povo português não é xenófobo? Os inquéritos são muito traiçoeiros! O Presidente da República ficou surpreendido? A legislação não é adequada? Não havia política para a imigração? E vai haver, no futuro, política para a imigração?
O partido socialista apresentou, no seu programa eleitoral, uma política muito bem estruturada para a imigração. O programa do governo socialista foi aprovado hoje. Todos os portugueses esperam que seja para cumprir. O programa não é xenófobo antes se fundamenta na integração social dos imigrantes e na aceitação da diversidade étnica e cultural.
"Diário do Governo" - 4
quarta-feira, março 16
Correio de Leitores
Escolas “boas”/Escolas “más”
Estamos, regra geral, em pleno Outono e, mais dia menos dia, eis que eles surgem, com pompa e circunstância. A comunicação social não o faz por menos. Urge informar o cidadão em geral, os pais e os alunos sobre as “verdadeiras performances” das nossas escolas. Falo-vos dos Rankings, da seriação de escolas que os jornais (Público, Expresso, Diário de Notícias....) encomendam, nunca procurei saber a quem, e que tornam merecedor de notícia.
A forma como essa avaliação é concebida carece de uma panóplia de variáveis caracterizadoras da real identidade, diversidade e complexidade das nossas escolas, (e quanto a isto parece que estamos quase todos de acordo) mas isso parece ser de somenos importância.
Não sei se bem, mas resolvi considerar os rankings como uma espécie de vírus que apelidei de SIDACS (Síndroma de Imune Deficiência Adquirida Comunico-Social ). Pode entender-se como uma variante do SIDA, não tão fatal quanto este mas, se não lhe for dada atenção, pode, a prazo, provocar sérios danos em algumas das nossas escolas.
Um vírus, como o próprio nome indica, é sempre algo de mau e, por isso, melhor fora que não existisse. Mas o que é facto é que existe e quem lhe dá vida, e o torna público, exerce uma influência enorme ao nível da formação das opiniões públicas. Daí que escolas e comunidades educativas não lhe devem ser indiferentes, devem, isso sim, analisá-lo, desmontá-lo e começar a criar verdadeiras alternativas para a avaliação das escolas. Quem anda pelas nossas escolas percebe que se há coisa que não falta é massa pensante, capaz de dar um contributo importantíssimo a este nível. Eu diria que alguns já o estão a fazer por sua conta e risco, logo, importaria tornar esse trabalho igualmente merecedor de notícia. Aqui fica o desafio à nossa comunicação social.
A educação é uma realidade muito complexa devendo ser vista como um sistema global onde cada escola, enquanto subsistema, se insere numa relação de interacção e de singularidade.
Importa transformar mais esta adversidade numa potencialidade, geradora de reflexão, capaz de mobilizar as escolas para a realização de um verdadeiro diagnóstico numa colaboração estreita com os organismos do ME e das forças sociais, económicas e culturais que com a escola interagem.
SR
Estamos, regra geral, em pleno Outono e, mais dia menos dia, eis que eles surgem, com pompa e circunstância. A comunicação social não o faz por menos. Urge informar o cidadão em geral, os pais e os alunos sobre as “verdadeiras performances” das nossas escolas. Falo-vos dos Rankings, da seriação de escolas que os jornais (Público, Expresso, Diário de Notícias....) encomendam, nunca procurei saber a quem, e que tornam merecedor de notícia.
A forma como essa avaliação é concebida carece de uma panóplia de variáveis caracterizadoras da real identidade, diversidade e complexidade das nossas escolas, (e quanto a isto parece que estamos quase todos de acordo) mas isso parece ser de somenos importância.
Não sei se bem, mas resolvi considerar os rankings como uma espécie de vírus que apelidei de SIDACS (Síndroma de Imune Deficiência Adquirida Comunico-Social ). Pode entender-se como uma variante do SIDA, não tão fatal quanto este mas, se não lhe for dada atenção, pode, a prazo, provocar sérios danos em algumas das nossas escolas.
Um vírus, como o próprio nome indica, é sempre algo de mau e, por isso, melhor fora que não existisse. Mas o que é facto é que existe e quem lhe dá vida, e o torna público, exerce uma influência enorme ao nível da formação das opiniões públicas. Daí que escolas e comunidades educativas não lhe devem ser indiferentes, devem, isso sim, analisá-lo, desmontá-lo e começar a criar verdadeiras alternativas para a avaliação das escolas. Quem anda pelas nossas escolas percebe que se há coisa que não falta é massa pensante, capaz de dar um contributo importantíssimo a este nível. Eu diria que alguns já o estão a fazer por sua conta e risco, logo, importaria tornar esse trabalho igualmente merecedor de notícia. Aqui fica o desafio à nossa comunicação social.
A educação é uma realidade muito complexa devendo ser vista como um sistema global onde cada escola, enquanto subsistema, se insere numa relação de interacção e de singularidade.
Importa transformar mais esta adversidade numa potencialidade, geradora de reflexão, capaz de mobilizar as escolas para a realização de um verdadeiro diagnóstico numa colaboração estreita com os organismos do ME e das forças sociais, económicas e culturais que com a escola interagem.
SR
terça-feira, março 15
Freitas do Amaral - Um Pensamento Clarividente
Lendo a introdução do livro “Do 11 de Setembro à Crise do Iraque”, de finais de 2002, percebe-se a clarividência das posições de Freitas do Amaral acerca da Europa, dos EUA e da Administração Bush.
Não posso estar mais de acordo. Transcrevo esse texto, na íntegra, no IRAOFUNDO EVOLTAR e aqui deixo um extracto. (O texto de Freitas do Amaral foi retirado do Insurgente. )
“Na verdade, entre a direita pró-americana que aplaude incondicionalmente a política externa e de segurança nacional do presidente Bush, e a esquerda antiamericana que condena irremediavelmente tudo quanto a América faz ou deixa de fazer, tenho-me situado numa linha intermédia (quiçá, centrista) que se caracteriza por dois elementos fundamentais:
– Um sentimento básico, estrutural, permanente, de amizade e admiração pelos EUA;
– Uma atitude crítica bastante forte, na conjuntura actual, contra a política externa e de segurança nacional do Presidente George W. Bush.
Com efeito, pode ser-se estruturalmente pró-americano e conjunturalmente anti-Bush. Pretender, como têm dito alguns dos meus críticos, que rejeitar a política externa e de segurança nacional de Bush é ser antiamericano é uma atitude mental muito próxima daqueles que, durante o Estado Novo, afirmavam que quem era anti-salazarista era necessariamente antipatriota ou mau português.
A verdade é que, em Democracia, pode ser-se, no plano interno, contra um Presidente ou contra um Governo sem se ser antipatriota; e, no plano das relações internacionais, pode discordar-se de certas políticas seguidas por determinados governos sem se ser inimigo ou mau amigo do respectivo país.
O direito à crítica, fruto da liberdade de opinião, e o direito à oposição, corolário da liberdade de posicionamento político, são direitos que não existem em ditadura, mas que fazem parte essencial das liberdades democráticas. É tão legítimo, numa democracia, ser a favor do Governo como ser a favor da oposição: ambas as atitudes são legítimas e contribuem para o bem comum. Ninguém exprime melhor essa filosofia do que os ingleses, que falam em Her Majesty’s Government e na Her Majesty’s Oposition. O que quer dizer que Governo e oposição, como elementos essenciais da democracia, são ambos acolhidos e legitimados como servidores da Coroa, expressão e símbolo da unidade nacional.
O mesmo se passa, mutatis mutandis, no plano internacional. Qualquer pessoa pode criticar a política externa do Presidente norte-americano sem que isso permita dizer, automaticamente, que essa pessoa é antiamericana; não é por se criticar, por hipótese, o liberalismo conservador do Governo francês que se é, necessariamente, antifrancês; nem é ser antigermânico criticar a política europeia do chanceler alemão.
Pode-se gostar muito de um país, do seu povo, da sua história, das suas instituições, dos seus êxitos e vitórias contra a adversidade, e no entanto discordar desta ou daquela política de um ou outro dos seus governos.”
Não posso estar mais de acordo. Transcrevo esse texto, na íntegra, no IRAOFUNDO EVOLTAR e aqui deixo um extracto. (O texto de Freitas do Amaral foi retirado do Insurgente. )
“Na verdade, entre a direita pró-americana que aplaude incondicionalmente a política externa e de segurança nacional do presidente Bush, e a esquerda antiamericana que condena irremediavelmente tudo quanto a América faz ou deixa de fazer, tenho-me situado numa linha intermédia (quiçá, centrista) que se caracteriza por dois elementos fundamentais:
– Um sentimento básico, estrutural, permanente, de amizade e admiração pelos EUA;
– Uma atitude crítica bastante forte, na conjuntura actual, contra a política externa e de segurança nacional do Presidente George W. Bush.
Com efeito, pode ser-se estruturalmente pró-americano e conjunturalmente anti-Bush. Pretender, como têm dito alguns dos meus críticos, que rejeitar a política externa e de segurança nacional de Bush é ser antiamericano é uma atitude mental muito próxima daqueles que, durante o Estado Novo, afirmavam que quem era anti-salazarista era necessariamente antipatriota ou mau português.
A verdade é que, em Democracia, pode ser-se, no plano interno, contra um Presidente ou contra um Governo sem se ser antipatriota; e, no plano das relações internacionais, pode discordar-se de certas políticas seguidas por determinados governos sem se ser inimigo ou mau amigo do respectivo país.
O direito à crítica, fruto da liberdade de opinião, e o direito à oposição, corolário da liberdade de posicionamento político, são direitos que não existem em ditadura, mas que fazem parte essencial das liberdades democráticas. É tão legítimo, numa democracia, ser a favor do Governo como ser a favor da oposição: ambas as atitudes são legítimas e contribuem para o bem comum. Ninguém exprime melhor essa filosofia do que os ingleses, que falam em Her Majesty’s Government e na Her Majesty’s Oposition. O que quer dizer que Governo e oposição, como elementos essenciais da democracia, são ambos acolhidos e legitimados como servidores da Coroa, expressão e símbolo da unidade nacional.
O mesmo se passa, mutatis mutandis, no plano internacional. Qualquer pessoa pode criticar a política externa do Presidente norte-americano sem que isso permita dizer, automaticamente, que essa pessoa é antiamericana; não é por se criticar, por hipótese, o liberalismo conservador do Governo francês que se é, necessariamente, antifrancês; nem é ser antigermânico criticar a política europeia do chanceler alemão.
Pode-se gostar muito de um país, do seu povo, da sua história, das suas instituições, dos seus êxitos e vitórias contra a adversidade, e no entanto discordar desta ou daquela política de um ou outro dos seus governos.”
segunda-feira, março 14
Alguns detalhes da discussão pública acerca da alusão de Sócrates à liberalização da venda de medicamentos - não sujeitos a prescrição médica - é de morrer a rir.
É um caso de desespero de uma corporação que resiste a aceitar as mais elementares regras do mercado (concorrência, transparência, acessibilidade, preço...) e tudo o mais que é banal nos países civilizados. E a coisa ainda agora começou...
Todos os problemas sérios que o assunto coloca - segurança, por exemplo - estão resolvidos a montante, ou seja, os medicamentos de venda livre estão embalados e certificados cumprindo regras de segurança pré definidas e fiscalizadas pela entidades competentes.
O Regresso à Normalidade
A decisão de fazer regressar as secretarias de estado “deslocalizadas” a Lisboa teve honras de ser a terceira medida anunciada pelo governo socialista.
Não seria necessário justificar a decisão com a contenção de despesas. É simplesmente o regresso à normalidade. Ponto final.
“Diário do Governo” – 2
Não seria necessário justificar a decisão com a contenção de despesas. É simplesmente o regresso à normalidade. Ponto final.
“Diário do Governo” – 2
Reconhecimento à Loucura
Já alguém sentiu a loucura vestir de-repente o nosso corpo?
Já.
E tomar a forma dos objectos?
Sim.
E acender relâmpagos no pensamento?
Também.
E às vezes parecer ser o fim?
Exactamente.
Como o cavalo do soneto de Ângelo de Lima?
Tal e qual.
E depois mostrar-nos o que há-de vir
muito melhor do que está?
E dar-nos a cheirar uma cor
que nos faz seguir viagem
sem paragem nem resignação
E sentirmo-nos empurrados pelos rins
na aula de descer abismos
se fazer dos abismos descidas de recreio
e covas de encher novidade?
E de uns fazer gigantes
e de outros alienados?
E fazer frente ao impossível
atrevidamente e ganhar-lhe, e ganhar-lhe
a ponto do impossível ficar possível?
E quando tudo parece perfeito
poder-se ir ainda mais além?
E isto de desencantar vidas
aos que julgam que a vida é só uma?
E isto de haver sempre ainda mais uma maneira para tudo?
Tu só loucura és capaz de transformar
o mundo tantas vezes quantas sejam as necessárias para olhos individuais
Só tu és capaz de fazer que tenham razão
tantas razões que hão-de viver juntas
Tudo, excepto tu, é rotina peganhenta.
Só tu tens asas para dar
a quem t´as vier buscar
José de Almada Negreiros
Obras Completas – Vol. I – Poesia
Biblioteca de Autores Portugueses
Já.
E tomar a forma dos objectos?
Sim.
E acender relâmpagos no pensamento?
Também.
E às vezes parecer ser o fim?
Exactamente.
Como o cavalo do soneto de Ângelo de Lima?
Tal e qual.
E depois mostrar-nos o que há-de vir
muito melhor do que está?
E dar-nos a cheirar uma cor
que nos faz seguir viagem
sem paragem nem resignação
E sentirmo-nos empurrados pelos rins
na aula de descer abismos
se fazer dos abismos descidas de recreio
e covas de encher novidade?
E de uns fazer gigantes
e de outros alienados?
E fazer frente ao impossível
atrevidamente e ganhar-lhe, e ganhar-lhe
a ponto do impossível ficar possível?
E quando tudo parece perfeito
poder-se ir ainda mais além?
E isto de desencantar vidas
aos que julgam que a vida é só uma?
E isto de haver sempre ainda mais uma maneira para tudo?
Tu só loucura és capaz de transformar
o mundo tantas vezes quantas sejam as necessárias para olhos individuais
Só tu és capaz de fazer que tenham razão
tantas razões que hão-de viver juntas
Tudo, excepto tu, é rotina peganhenta.
Só tu tens asas para dar
a quem t´as vier buscar
José de Almada Negreiros
Obras Completas – Vol. I – Poesia
Biblioteca de Autores Portugueses
domingo, março 13
Almada Negreiros
25+1
PANFLETO SOCIAL
Eh comunistas! Eh fascistas!
Eu sei, eu sei:
“Não há esconderijo senão nas massas”!
Assim mesmo necessitais de inimigos
Chamais construir: eliminar inimigos
Almada Negreiros
PANFLETO SOCIAL
Eh comunistas! Eh fascistas!
Eu sei, eu sei:
“Não há esconderijo senão nas massas”!
Assim mesmo necessitais de inimigos
Chamais construir: eliminar inimigos
Almada Negreiros
Einstein em Lisboa
A Pública publica um trabalho extenso acerca de Einstein. Uma das peças intitula-se: "Einstein, as varinas de Lisboa e Gago Coutinho"
A propósito da sua visita a Lisboa ressalta uma descrição, escrita pelo próprio, que ainda hoje, guardadas as distâncias, é bastante concludente assim como a proverbial capacidade dos portugueses para esquecerem ou "passarem ao lado" do que é verdadeiramente importante.
"Tinha o costume de escrever um diário em viagem, por isso conhecemos as impressões com que ficou de Lisboa. Einstein passou só um dia na capital, a 11 de Março de 1925, e comentou a incursão pela cidade:
"Dá uma impressão maltrapilha, mas simpática. A vida parece transcorrer confortável, bonacheirona, sem pressa ou mesmo objectivo ou consciência. Por toda a parte temos consciência da cultura antiga. Graciosa. Vendedora de peixes fotografada com uma bandeja de peixe na cabeça, gesto orgulhoso, maroto."
(...)
A passagem pelo Brasil não podia contrastar mais com a recepção em Lisboa. Tanto quanto se sabe, não foi recebido por ninguém, nem no dia da visita nem depois os jornais publicaram uma linha."
A propósito da sua visita a Lisboa ressalta uma descrição, escrita pelo próprio, que ainda hoje, guardadas as distâncias, é bastante concludente assim como a proverbial capacidade dos portugueses para esquecerem ou "passarem ao lado" do que é verdadeiramente importante.
"Tinha o costume de escrever um diário em viagem, por isso conhecemos as impressões com que ficou de Lisboa. Einstein passou só um dia na capital, a 11 de Março de 1925, e comentou a incursão pela cidade:
"Dá uma impressão maltrapilha, mas simpática. A vida parece transcorrer confortável, bonacheirona, sem pressa ou mesmo objectivo ou consciência. Por toda a parte temos consciência da cultura antiga. Graciosa. Vendedora de peixes fotografada com uma bandeja de peixe na cabeça, gesto orgulhoso, maroto."
(...)
A passagem pelo Brasil não podia contrastar mais com a recepção em Lisboa. Tanto quanto se sabe, não foi recebido por ninguém, nem no dia da visita nem depois os jornais publicaram uma linha."
Mulheres (2)
Muito importante este exercício mais do que imaginário de Mário Mesquita e Ana Sá Lopes: “O Contra-Governo Provocatório”.
Eu próprio seria capaz de formar um outro governo imaginário exclusivamente formado por mulheres técnica e politicamente competentes.
Mas não seria preciso ir tão longe. Para ser razoavelmente fiel à modernidade, de que Sócrates se reclama, num governo de 16 ministros e 35 secretários de estado, Sócrates só teria de ter assegurado, e seria ainda conservador, pelo menos, 25% de mulheres ministras (quatro em vez de duas) e paridade nas secretarias de estado (dezassete em vez de quatro).
A preocupação com a presença feminina no governo teria sido um exercício realmente estimulante.
Eu próprio seria capaz de formar um outro governo imaginário exclusivamente formado por mulheres técnica e politicamente competentes.
Mas não seria preciso ir tão longe. Para ser razoavelmente fiel à modernidade, de que Sócrates se reclama, num governo de 16 ministros e 35 secretários de estado, Sócrates só teria de ter assegurado, e seria ainda conservador, pelo menos, 25% de mulheres ministras (quatro em vez de duas) e paridade nas secretarias de estado (dezassete em vez de quatro).
A preocupação com a presença feminina no governo teria sido um exercício realmente estimulante.
sábado, março 12
Governo Novo
O governo socialista acabou de tomar posse. Gostei da sobriedade da cerimónia e do discurso de Sócrates. Pareceu determinado e seguro da missão que lhe cabe. Tocou todos os grandes temas da governação. Foi bastante clarividente. Abriu caminhos para o futuro.
Anunciou até duas medidas emblemáticas. Uma boa prática nestes discursos de estado. Uma dela deu-me muito prazer. Acabar com o monopólio das farmácias na venda de medicamentos que não precisem de receita médica. Abre-se assim uma batalha na qual os portugueses vão apoiar o governo.
O Dr. Cordeiro, “boticário mor do reino”, vai tremer de raiva. Lembro a campanha que desencadeou contra Ferro Rodrigues nas anteriores eleições a propósito da proposta das farmácias sociais. Espero que este combate pela transparência e concorrência no mercado dos medicamentos não se fique por aqui.
A outra medida concreta anunciada é um desafio à capacidade das instituições do topo da hierarquia do estado para reformar o próprio modelo de actuação do estado. Fazer as eleições autárquicas e o referendo à constituição europeia no mesmo dia parece qualquer coisa fácil de aceitar e concretizar. Ganhamos todos com isso.
E afinal o governo PS não está a empurrar os referendos para 2006 como se queria fazer querer. Vamos ver como Sócrates conduzirá as medidas que forem sendo tomadas. Quais? Como? Em que sentido? Quais os beneficiários? Quais as metodologias?
Para começar não está nada mal. Haja esperança na capacidade dos homens para aprender com a realidade e os seus próprios erros.
Anunciou até duas medidas emblemáticas. Uma boa prática nestes discursos de estado. Uma dela deu-me muito prazer. Acabar com o monopólio das farmácias na venda de medicamentos que não precisem de receita médica. Abre-se assim uma batalha na qual os portugueses vão apoiar o governo.
O Dr. Cordeiro, “boticário mor do reino”, vai tremer de raiva. Lembro a campanha que desencadeou contra Ferro Rodrigues nas anteriores eleições a propósito da proposta das farmácias sociais. Espero que este combate pela transparência e concorrência no mercado dos medicamentos não se fique por aqui.
A outra medida concreta anunciada é um desafio à capacidade das instituições do topo da hierarquia do estado para reformar o próprio modelo de actuação do estado. Fazer as eleições autárquicas e o referendo à constituição europeia no mesmo dia parece qualquer coisa fácil de aceitar e concretizar. Ganhamos todos com isso.
E afinal o governo PS não está a empurrar os referendos para 2006 como se queria fazer querer. Vamos ver como Sócrates conduzirá as medidas que forem sendo tomadas. Quais? Como? Em que sentido? Quais os beneficiários? Quais as metodologias?
Para começar não está nada mal. Haja esperança na capacidade dos homens para aprender com a realidade e os seus próprios erros.
Condecorai-vos uns aos outros
O Dr. Portas condecora os seus na véspera de partir. Só me espanta que Marques Júnior, Capitão de Abril e deputado do PS, tenha aceite ser condecorado por Portas. Temos de estar preparados para tudo…
"Portas condecora Bagão, Adriano Moreira e Frank Carlucci
Paulo Portas condecorou esta sexta-feira, no seu último acto público como ministro da Defesa, o ministro das Finanças, Bagão Félix, o ex-presidente do CDS-PP Adriano Moreira e o antigo embaixador norte-americano em Portugal Frank Carlucci. No total, 12 pessoas foram distinguidas."
"Portas condecora Bagão, Adriano Moreira e Frank Carlucci
Paulo Portas condecorou esta sexta-feira, no seu último acto público como ministro da Defesa, o ministro das Finanças, Bagão Félix, o ex-presidente do CDS-PP Adriano Moreira e o antigo embaixador norte-americano em Portugal Frank Carlucci. No total, 12 pessoas foram distinguidas."
"Diário do Governo"
Vou seguir dia a dia a acção do governo – socialista – que hoje entra em funções. A maioria em que assenta este governo é muito cómoda e vai fazer, por si só, muitos estragos. O diário será constituído por comentários pessoais. Críticos. Curtos e incisivos. Com títulos adequados ao assunto abordado. Nalguns casos com links para notícias e postas de outros blogs. Cada alteração à composição do governo dará origem a um novo governo. Cada erro considerado fatal será também devidamente assinalado. Alguma interrupção forçada na apresentação deste diário será anunciada previamente ou resultará de força maior. Já há muita coisa para contar mas este primeiro dia, o da tomada de posse, será de "folga".
Fotografia de Helder Gonçalves
sexta-feira, março 11
Para não esquecer o Horror
"Creio no homem. Já vi
dorsos despedaçados a chicote,
almas cegas avançando aos saltos
(espanhas a cavalo
de fome e sofrimento). E acreditei.
Creio na paz. Já vi
altas estrelas, recintos chamejantes
e amanhecentes, incendiando rios
fundos, caudal humano
para outra luz: vi e acreditei.
Creio em ti, pátria. Digo
o que já vi: relâmpagos
de raiva, amor em frio e uma faca
chiando, fazendo-se em pedaços
de pão: embora hoje só haja sombra, vi
e acreditei"
[Blas de Otero, Fidelidad, in Pido la Paz y la palavra, 1955, trad. José Bento (1985)]
No almocreve das Petas
dorsos despedaçados a chicote,
almas cegas avançando aos saltos
(espanhas a cavalo
de fome e sofrimento). E acreditei.
Creio na paz. Já vi
altas estrelas, recintos chamejantes
e amanhecentes, incendiando rios
fundos, caudal humano
para outra luz: vi e acreditei.
Creio em ti, pátria. Digo
o que já vi: relâmpagos
de raiva, amor em frio e uma faca
chiando, fazendo-se em pedaços
de pão: embora hoje só haja sombra, vi
e acreditei"
[Blas de Otero, Fidelidad, in Pido la Paz y la palavra, 1955, trad. José Bento (1985)]
No almocreve das Petas
quinta-feira, março 10
Freitas do Amaral - de novo
O mais interessante fenómeno político em Portugal, nos últimos tempos, tem sido o ataque feroz da direita a Freitas do Amaral.
Afinal o PS de Ferro Rodrigues não era assim tão “esquerdista” nas suas opções de política externa. Ana Gomes é, no fim de contas, uma moderada. Somente diz aquilo que muitos pensam, mas calam. (Vide a propósito de outro assunto a sua tomada de posição acerca das mulheres no PS).
Alguns conspiradores profissionais devem estar a pensar que mais valia terem deixado Ferro Rodrigues em paz. Não é? Sempre se poupavam às dores de ter de suportar Freitas do Amaral no MNE.
E o Dr. Portas – chefe do partido que Freitas fundou - não necessitaria de explicar aos seus amigos da administração Bush que este Freitas já não é o mesmo que fundou o CDS, mas outro, sendo, na verdade o mesmo... As voltas da política tem destas curiosas ironias.
O Prof. Freitas do Amaral será um perigo para o prestígio de Portugal no mundo? Freitas do Amaral criticou duramente a administração Bush pela intervenção militar americana – unilateral – no Iraque. Muito bem. Não fez mais do que expressar a opinião da maioria do povo português. A maioria que deu a vitória ao PS. Nada me parece mais coerente.
Quanto à política externa de Portugal, segue dentro de momentos. E vai manter-se, no essencial, fiel ás alianças tradicionais de Portugal.
A diferença estará no tom da afirmação da identidade de Portugal no concerto das nações pela voz prestigiada e lúcida de Freitas do Amaral. É este o verdadeiro problema da direita. Mas este não será, verdadeiramente, um problema para a política externa de Portugal. Veremos.
Afinal o PS de Ferro Rodrigues não era assim tão “esquerdista” nas suas opções de política externa. Ana Gomes é, no fim de contas, uma moderada. Somente diz aquilo que muitos pensam, mas calam. (Vide a propósito de outro assunto a sua tomada de posição acerca das mulheres no PS).
Alguns conspiradores profissionais devem estar a pensar que mais valia terem deixado Ferro Rodrigues em paz. Não é? Sempre se poupavam às dores de ter de suportar Freitas do Amaral no MNE.
E o Dr. Portas – chefe do partido que Freitas fundou - não necessitaria de explicar aos seus amigos da administração Bush que este Freitas já não é o mesmo que fundou o CDS, mas outro, sendo, na verdade o mesmo... As voltas da política tem destas curiosas ironias.
O Prof. Freitas do Amaral será um perigo para o prestígio de Portugal no mundo? Freitas do Amaral criticou duramente a administração Bush pela intervenção militar americana – unilateral – no Iraque. Muito bem. Não fez mais do que expressar a opinião da maioria do povo português. A maioria que deu a vitória ao PS. Nada me parece mais coerente.
Quanto à política externa de Portugal, segue dentro de momentos. E vai manter-se, no essencial, fiel ás alianças tradicionais de Portugal.
A diferença estará no tom da afirmação da identidade de Portugal no concerto das nações pela voz prestigiada e lúcida de Freitas do Amaral. É este o verdadeiro problema da direita. Mas este não será, verdadeiramente, um problema para a política externa de Portugal. Veremos.
Os meus avós paternos, Maria da Conceição Neto Graça e Dimas Eduardo Graça, com expressões firmes, serenas e determinadas, numa foto datada de 14 de Novembro de 1911, obtida em Santos, Brasil, por Joaquim Pereira, Rua 15 de Novembro, nº 8, Santos. Dimas se chamou meu pai, Dimas também meu irmão, Eduardo sou eu. Um tributo em memória de meu avô.
O Fim do Pesadelo (quase em forma de diatribe)
No próximo sábado os portugueses vão ver-se livres de um pesadelo. O governo de direita (ou, melhor dito, “das direitas”) vai cessar funções.
Não uso palavras pesadas demais. Tenho até a percepção de que são pesadas de menos. Tenho ouvido, visto e sentido, por toda a parte, gente abandonada e ressentida, à beira da ruína, da marginalidade e do desespero, com fome e sem trabalho, sem futuro e sem esperança. Não só no mundo do trabalho como também no mundo dos negócios.
O pesadelo resultou de muitos e variados factores mas, entre eles, avulta o facto de o governo ter sido “sequestrado” por um partido extremista minoritário que tem um nome, um chefe e um ideólogo. O nome: CDS/PP; o chefe: Paulo Portas; o ideólogo: Bagão Félix.
Aliás a natureza totalitária do CDS/PP, de Paulo Portas/Bagão Félix, ficou bem evidenciada pelo recente episódio do retrato de Freitas do Amaral. Só os partidos totalitários suprimem a figura dos seus pais fundadores. O episódio, aparentemente irrelevante, tem um significado profundo: mostra à evidência que Portugal tem sido governado por uma coligação que integra um partido com vocação totalitária. As consequências desse facto, para o país, foram desastrosas.
Texto integral em IRAOFUNDOEVOLTAR
Não uso palavras pesadas demais. Tenho até a percepção de que são pesadas de menos. Tenho ouvido, visto e sentido, por toda a parte, gente abandonada e ressentida, à beira da ruína, da marginalidade e do desespero, com fome e sem trabalho, sem futuro e sem esperança. Não só no mundo do trabalho como também no mundo dos negócios.
O pesadelo resultou de muitos e variados factores mas, entre eles, avulta o facto de o governo ter sido “sequestrado” por um partido extremista minoritário que tem um nome, um chefe e um ideólogo. O nome: CDS/PP; o chefe: Paulo Portas; o ideólogo: Bagão Félix.
Aliás a natureza totalitária do CDS/PP, de Paulo Portas/Bagão Félix, ficou bem evidenciada pelo recente episódio do retrato de Freitas do Amaral. Só os partidos totalitários suprimem a figura dos seus pais fundadores. O episódio, aparentemente irrelevante, tem um significado profundo: mostra à evidência que Portugal tem sido governado por uma coligação que integra um partido com vocação totalitária. As consequências desse facto, para o país, foram desastrosas.
Texto integral em IRAOFUNDOEVOLTAR
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