sábado, dezembro 30

MEMÓRIA DE UMA DITADURA

“Ano Terrível: designação dada ao ano de 1937. Correspondeu à fase mais sinistra do Grande Terror estaliniano: execução de Riutine, segundo Grande Processo de Moscovo (Piatakov, Radek, Serebryakov, Muralov e Sokolnikov – exceptuando Radek, todos foram executados), suicídio de Serguei Ordjonikidze, prisão de Bukharine (que será executado no ano seguinte), execução (sem julgamento) do economista e teórico do comunismo Preobrajensky, assim como a execução do Marechal Tukhatchevsky (e de outros sete notáveis chefes militares, todos eles generais). Por outro lado prosseguiu a “vingança” de Estaline contra Trotsky: o assassínio de Serguei Sedov (filho mais novo) e da execução de Aleksandra Sokolvskaia ( a sua primeira esposa) também ocorreram, neste mesmo ano. No entanto não se pode ignorar o facto de o ano de 1938 não ter sido melhor: execução de Bukharine, Rykov e Krestinsky; e assassínio de Lev Sedov, filho mais velho de Trotsky, em Fevereiro.” In “Bukharine, Minha Paixão” de Anna Larina Bukharina, tradução do notável comunista Ludgero Pinto Basto - “Glossário” - página 419 - (organizado e escrito por Alberto Freire), Edições Terramar

quinta-feira, dezembro 28

IR À RUA

A rua é uma instituição urbana. Os meus antepassados próximos, de origem rural, conheciam mal este conceito. O advento da sociedade urbana atribuiu um estatuto especial a “ir ao campo”. Mas, durante séculos, para os rurais o grande dia era o da feira que os levava a “ir à cidade”. A geração dos “babby-boomers”, de que faço parte, experimentou a fase final desta contradição. Lembro-me da impressão que me causou o filme de Renoir, “Passeio ao Campo”. Lembro-me dos meus passeios ao monte dos meus avós maternos que, ainda nos anos 70, não tinham energia eléctrica em casa tendo assistido, impotentes, à instalação, mesmo ao pé da porta, de dois postes que suportavam a linha que fornecia a energia a Tavira mas não os alimentava a eles. Senti o encanto da grande urbe de Lisboa ainda mal tinha resolvido a contradição “cidade/campo”. Nos primeiros dias, após a minha chegada definitiva a Lisboa, caminhei a pé pela Baixa, calcorreei as ruas dos bairros da Estrela, Campo de Ourique e da Lapa. Até que os pés aguentassem. Só. Fiz a carreira do eléctrico 28 dos Prazeres à Graça e da Graça aos Prazeres. Lindas as palavras que identificam estes dois bairros de Lisboa. Caminhar pelas ruas da cidade de Lisboa era uma alegria. A partir de certo momento tornou-se uma aventura e um risco. Não pelo trânsito nem sequer pela delinquência que, em Lisboa, sempre foi uma brincadeira de crianças se comparada com outras urbes da Europa ou das Américas. Mas porque em certas esquinas, à noite, nas saídas tardias das tertúlias ou das actividades associativas (subversivas?), surgiam vozes cavas e anónimas que pronunciavam o nosso nome em tom ameaçador. Porque ao caminhar pela rua surgiam interpelações ameaçadoras de desconhecidos que nos acotovelavam. Porque o regresso a casa, à noite, tinha de ser cuidadosamente preparado prevendo a arremetida que nos levaria ao hospital ou à prisão. Muitas destas caminhadas fi-las acompanhado pelo Eduardo Ferro Rodrigues. Nunca nos deixamos intimidar mas estávamos longe de prever como seria possível que, nos tempos da democracia, pela qual lutamos a vida toda, ressurgirem as mesmas ameaças à liberdade revestidas de novas e mais subtis formas. Ir à rua, para mim, sempre foi um verdadeiro exercício de liberdade. Como sabemos “ir à rua” pode ser até uma manifestação espontânea, ou organizada, de protesto. Mas há quanto tempo não vamos à rua? Em tempo: ir às urnas, em democracia, também é um salutar exercício de liberdade!

terça-feira, dezembro 26

PALPITES XXII

O PR está fragilizado. O assunto que despatou essa fragilidade tem ressonâncias à revolução cultural de Mao. Os pais denunciavam os filhos, os filhos denunciavam os pais. O assunto é mais grave do que a correria das notícias do momento permitem, vai ao fundo das relações da vida em sociedade, conforme os nossos padrões. Ao mesmo tempo entrámos em campanha eleitoral. O socialismo moderno em Portugal criou e deu corpo a duas utopias convencionais: o acesso universal e gratuito à educação e à saúde. Digam o que disserem são projetos concebidos, criados e concretizados por governos socialistas. Não é coisa pouca antes pelo contrário. No dia 10 de março é só escolher...

domingo, dezembro 24

NATAL

Da esquerda para a direita: o meu irmão Dimas de flor na lapela. O meu pai Dimas, vestido a rigor, de fato e gravata. Minha mãe, Tolentina, de fina camisa branca. A avó, Maria da Conceição, já doente, austera no seu vestido preto. A tia Lucília, uma beleza cinéfila, brilha à luz quente que envolve o Algarve de todas as estações. O mais pequeno, eu próprio, circunspecto, talvez, pela contrariedade do traje.// Natal. A minha tia Lucília. Irmã mais nova de meu pai. Nascida em 1917. Os fragmentos de suas memórias sempre me surpreenderam. A primeira mulher que me beijou chamada às pressas para ajudar no meu nascimento. Uma mulher linda que se desprendia ao encontro dos outros. Nesta fotografia sou o sobrevivente do grupo que mostra uma família feliz.

sexta-feira, dezembro 22

POLÍTICA

Em vésperas de Natal a direita política está com uma fome desvairada, a direita económica nem tanto. Para mim a direita política são todas as forças, organizadas em partidos, à direita do PS. Não sou capaz de afastar de mim o interesse acerca da política, esse interesse vem de muito longe, quando adolescente, discutia com o meu tio Ventura, homem do Estado Novo, coisas da política, sempre de candeias às avessas. Hoje por hoje, tanto tempo passado, espero não ter que vir a discutir coisas da política com algum familiar adepto dos ideais neo-fascistas (o termo é mesmo este, mais tarde voltarei ao assunto). Em qualquer caso a política, ao contrário de todas as aparências, é uma atividade nobre.

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS) - 4

O meu interesse por esta fotografia vem de longe e reside no facto do pano de fundo ter sido desenhado, em parte, com os pés. Queríamos fazer transbordar o símbolo do seu círculo fechado, subvertê-lo, criar uma imagem de movimento, mostrar um partido como lugar de caminhada e de encontro, o lugar de todas as utopias.

quinta-feira, dezembro 21

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS) - 3

O MES foi, no seu âmago, um partido da esquerda radical, mais do que um partido esquerdista, lidando mal com alinhamentos ideológicos mesmo aquando da sua deriva marxista-leninista, reconheçamo-lo, uma mera proclamação artificial e dolorosamente patética. O MES foi um esboço de casa comum na qual se acolheram cidadãos desalinhados – livres de compromissos com o antigo regime - que aspiravam combater as brutais desigualdades e iniquas misérias herdadas do “Estado Novo”.

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS) - 2

Foi longo o período de gestação do MES, ainda mais se medido à velocidade vertiginosa dos acontecimentos pós 25 de abril de 1974, sendo o seu I Congresso realizado somente cerca de oito meses após o dia 25 de abril. Naquele contexto oito meses era uma eternidade … Este processo, trespassado por lutas e debates, teve muitos e ilustres protagonistas oriundos de diversos sectores da oposição à ditadura. Muito já foi escrito, estudado e debatido acerca da ditadura, seus protagonistas e processos (apesar de alguns, nos quais me incluo, acharem que foi pouco).

I CONGRESSO DO MES (49 ANOS)

Por estes dias de solstício de inverno (21 de dezembro) passa mais um aniversário do I Congresso do MES, realizado a 21 e 22 de dezembro de 1974. Para quem não saiba, por razões da usura do tempo, trata-se de um pequeno partido político criado, de facto, imediatamente antes do 25 de abril de 1974. Foi, no entanto, formalizado somente após a restauração das liberdades, em data imprecisa no plano burocrático, mas precisa no plano político, a meu ver, na manifestação do 1º de maio de 1974, em Lisboa, através da inscrição da sua sigla – ainda sem símbolo - num pano que muitas generosas mãos arvoraram. (A imagem neste caso é a do pano de fundo das sessões do Congresso realizado na Aula Magna da Cidade Universitária, em Lisboa.)

terça-feira, dezembro 19

20 ANOS

No dia 19 dezembro de 2003, pelas 16,20h, foi criado este blog com a seguinte frase: "Estreia absoluta. Um lugar de comunicação. Experiência para a primeira impressão dos outros. Uma primeira audição para inicio de trabalho." Eram tempos em que a chamada blogosfera usufruia de grandes audiências, ao contrário do que acontece hoje.

domingo, dezembro 17

PALPITES XXI

De ontem para hoje, 16 e 17 dezembro de 2023, mudou a liderança do PS. Acontece através de escolhas eleitorais, neste caso internas a um partido, o que é um acontecimento próprio da democracia politica. A defesa da democracia faz-se exercendo a democracia. No caso tendo em vista a escolha de um lider partidário. Não conheço pessoalmente o lider eleito. Mas a minha filiação no PS é antiga e imune a estados de alma acerca da personalidade dos lideres. Esta eleição sublinha um aspeto muito interessante da vida politica nacional. Um partido é apeado do governo após a queda do seu lider. Promove a eleição de um novo. De súbito, no pleito eleitoral nacional, o partido do governo apeado surge com um lider novo, a novidade, invertendo os papéis na relação com o lider do partido incumbente. Ainda para mais o lider novo do partido "velho" denota uma personalidade disruptiva pelo menos no discurso. Aconteceu assim quase sempre, se bem me lembro, como nos casos de Sampaio, Ferro, Sá Carneiro ...

sexta-feira, dezembro 15

15 dezembro 74

Uma efeméride respeitante ao MES: Em vésperas do I Congresso, numa longa carta, de 15 de Dezembro de 1974, que me enviou de Moçambique, Luís Salgado de Matos adverte: "...rezo aos meus santinhos para que não façam cisões - sobretudo a cisão na confusão. Corre-se mais o risco da grupuscularização sem dogma que da social democratização derrapante: não defendo a síntese da carne e do peixe (...) mas julgo que é um risco grave cortar o pano sem ver o tecido. Cisão, a haver - pelo que se pode desenhar - afastará o social democratismo (...) mas reduzirá o MES ao nível do grupinho necessariamente sectário mas sem um conjunto rígido de princípios (que costuma ser a safa destes grupinhos)." Sábias palavras...

quarta-feira, dezembro 13

PALPITES XX

O Estado Social é uma grande conquista das sociedades ocidentais (e não só) impulsionado pelo movimento socialista e sindical, com forte salto e expressão no pós guerra (1945). Pelas razões históricas conhecidas, Portugal não acompanhou esse movimento senão após 1974. O acesso generalizado à educação, aos cuidados de saúde e à segurança social, são as pedras angulares do Estado Social, conquistas do movimento socialista e sindical, após o 25 de abril. Não é uma pequena coisa mas o cerne do modelo social dominante no nosso país. Quem melhor o defende? Os próprios beneficiários que aceitam o papel do Estado, o imposto progressivo, o voto livre, o modelo político da democracia representativa. Não há Estado social sem democracia, ou seja, liberdade de escolha a todos os níveis da sociedade. Qualquer cedência a derivas autoritárias, mesmo quando aparentam a defesa de um Estado forte, é um risco de queda na desordem da arbitrariedade dos vendedores de ilusões.

segunda-feira, dezembro 11

PALPITES XIX

As elites económicas têm muita influência na formação da opinião pública e na conformação das politicas. A falta de vigor dos movimentos sociais reivindicativos, que transparece da presente acalmia, favorece a influência das elites económicas. Não parece plausivel uma evolução gradualista na presente vida politica nacional. Se assim não for será surpreendente. O próprio calendário eleitoral foi subvertido por iniciativa presidencial que antevê uma fragmentação partidária. Mesmo agora se antecipam as eleições regionais nos Açores para uma sucessão de eleições - 4 janeiro, 10 março e 8 junho (1 semestre/três eleições). Um dia mais tarde se fará a história das razões profundas desta inversão de calendário.

domingo, dezembro 10

CAMUS, 10 DEZEMBRO 1957

Quando soube da atribuição do Prémio Nobel “pela sua importante obra literária, que foca com penetrante seriedade os problemas que se colocam nos nossos dias à consciência dos homems”, Albert Camus escrevu nos Cadernos: “Prémio Nobel: estranho sentimento de desânimo e melancolia. Aos vinte anos, pobre e nu, conheci a verdadeira fama”. Camus afirmou então que o Prémio deveria ter sido atribuido a André Malraux e manifestou dúvidas acerca da sua própria capacidade e força criadora que sempre o atormentaram. Após o anúncio da atribuição do Nobel sujeitou-se a ataques odiosos, que o não deixaram indiferente e comentou: “Assustado com aquilo que me acontece e que não pedi. E, para cúmulo, ataques tão infames que o coração se me aperta.”(Cadernos). Mas Camus, segundo todos os testemunhos, não podia, nem queria, recusar o Prémio. Telefonou, de imediato, à mãe, que sempre viveu na Argélia, como que a agradecer à sua origem a honra que lhe tinha batido à porta. Escreveu a Jean Grenier, o seu professor e mentor intelectual : “(…) quando recebi a notícia, o meu primeiro pensamento foi, depois de minha mãe, dirigido ao senhor. Sem o senhor, sem essa mão efectuosa que estendeu à criança pobre que eu era, sem a sua instrução e o seu exemplo nada disto tinha acontecido.” (citado a partir de Roger Quilliot). René Char, um amigo de todas as horas, não cabia em si de contente e manifesta esse contentamento de várias formas incluindo um artigo publicado, logo em 26 de Outubro de 1957, no Figaro littéraire, intitulado “Je veux parler d’ un ami”. No ínicio de Dezembro de 1957 Camus partiu com a mulher, Francine, para Estocolmo e, em todas as suas aparições em público, tinha a consciência que devia estar preparado para ser atacado a propósito da sua discrição a respeito do conflicto na Argélia que estava no auge. Albert Camus, a 10 de Dezembro de 1957, recebeu das mãos do Rei Gustavo VI da Suécia o diploma e, no banquete que se seguiu, proferiu o seu discurso de agradecimento. Logo num dos dias seguintes escreveu a Jean Grenier descrevendo, de forma sintética, o que sentia: “A corrida acaba, o touro está morto, ou quase.”

sexta-feira, dezembro 8

Com Parlamento dissolvido, Marcelo não pode ser alvo de processos (in Expresso)

LIBERALIDADES

É paradoxal a situação atual dos dois responsáveis politicos da área da saúde - Marta Temido e Lacerda Sales - que no periodo da pandemia assumiram a primeira linha do combate, nos limites da tragédia, à pandemia Covid 19. Pouco tempo passado já se desvaneceu da memória coletiva a relevância do seu papel nesse periodo trágico, do papel determinante que desempenharam, e de sua coragem pessoal e politica. Hoje, ao que parece, a partir de uma liberalidade ao mais alto nível, estão a assistir a que os seus nomes sejam arrastados na lama. O meu abraço.

terça-feira, dezembro 5

PALPITES VIII

Marcelo perdeu o chão. No mesmo dia da publicação do artigo de Cavaco, Marcelo falou ao país. O assunto de que tratou na sua comunicação não é de Estado. Trata-se de uma sua eventual intervenção, ou de alguém por si, destinada a facilitar o acesso a um tratamento médico no SNS, por sinal caro. Nada sei acerca do assunto e dos seus meandros, somente do que se fala na comunicação social. Venho aqui a propósito de algo que me chocou muito na prédica de Marcelo: a forma como, no final, destratou o filho, entregando-o ao juízo da opinião pública e, eventualmnte, da justiça. Aconteça o que acontecer, fiel aos princípios que professo, um filho é uma preciosidade que se defende sempre, sejam quais forem as circunstâncias, até ao fim.

segunda-feira, dezembro 4

UM MENTIROSO COMPULSIVO

Quando Cavaco fala ou escreve algo para o público é sinal de que temos a esquerda no poder, no caso português, pasme-se, os socialistas a solo, caso raro, mesmo único, na Europa. Logo me apetece, conhecendo a criatura, escrever também algo pois a conheço de tempos idos, e de todos os tempos, mesmo de muito antes de ter emergido na politica. É de perfil autoritário, embora democrata, com uma falha de caráter na relação com a verdade. Estou a ser simpático ...

domingo, dezembro 3

PALPITES VII

Além de inúmeras desvantagens quais as vantagens do PS passar à oposição? Olhar as politicas públicas do lado de fora, permitindo-lhe exercitar a crítica, forjando a renovação de um ideário e programa progressistas/reformistas, testando, ao mesmo tempo, a capacidade de uma nova liderança; reposicionar-se para recuperar em próximas eleições o terreno perdido após o desgaste de muitos anos de governo (europeias, autárquicas, presidenciais); promover um processo de formação de quadros politicos dramaticamente abondonado nos últimos muitos anos. Dir-me-ão: e o poder? Respondo: de nada serve o poder se não soubermos o que fazer com ele!

sábado, dezembro 2

PALPITES VI

Ao abordar, discutindo em família, as alternativas partidárias tendo em vista as próximas eleições (e são muitas!), suscitam-se as questões mais relevantes a ter em conta na sociedade na qual nos integramos, de forma simples: paz civil, igualdade, emprego. Por outras palavras: preservar a integração internacional, desde logo na UE, assegurar a segurança, travar as desigualdades económicas e sociais, desde logo através de impostos progressivos, criar empregos cada vez mais qualificados e melhor remunerados. Estes poderiam ser os únicos pontos de um programa político progressista. O PS e o PSD asseguram a fidelidae ao essencial deste programa. Como fazer para prevenir as derivas anarco capitalistas (IL) e radical populistas (C)?

quinta-feira, novembro 30

PALPITES V

Curiosa a minha experiência destes últimos dias com amigos e companheiros de trabalho. A propósito da crise política. Quase sem exceção todos manifestam de forma aberta, ou velada, a expetativa de que o PS vencerá as eleições. Manifesto o meu cepticismo e os interlocutores mostram evidente deceção. Qual seria a melhor solução para a liderança do PS. Muitos defendem Carneiro. Contraponho Nuno Santos. Qual a diferença? Eu aposto no líder da oposição, eles no líder do governo.

quarta-feira, novembro 29

PALPITES IV

O golpe de estado que visa decapitar o PS é um contínuo de atos que prosseguirão até 10 de março. Anúncios em cima de anúncios, arquivamento de processos antigos, abertura de novos, buscas e indícios, um regabofe, em que tudo será de esperar... reduzir este processo ao PS talvez seja redutor, ele visa mais alto, levar ao poder a extrema direita, instilar o medo, limitar as liberdades e testar a fortaleza da democracia...

terça-feira, novembro 28

COISAS DIFÍCEIS, PARA LEMBRAR UMA DECISÃO RADICAL

Em 29 de Novembro de 1807, após um dia chuvoso, o príncipe d. João, d. Carlota, seus filhos, a rainha d. Maria I, vários outros parentes partiram em meio ao outono lisboeta. Do rio Tejo saíram as embarcações. Seguiram, além da família real, nobres, funcionários da Corte, ministros e políticos do Reino. Cerca de 15 mil pessoas. Os franceses ao chegarem à capital portuguesa em 30/11 ficaram a ver navios, frustrados com a não captura dos governantes lusos. Tudo o que era necessário para permanecer governando foi transportado. Insistia, entrementes, uma sensação dúbia: covardia ou esperteza? D. João estava angustiado. Seu país sendo atacado, o povo morrendo e ele seguindo viagem. Desconfortos psicológicos e físicos. Tormentas nos pensamentos e nos vagalhões dos mares que chegou a atrapalhar a travessia. Escassearam os víveres. Natal, Ano Novo e Dia de Reis se passaram. Então, a terra firme finalmente chegou. Em 22 de Janeiro de 1808 os barcos atracaram na antiga primeira capital do Brasil, a ensolarada Salvador. Porém, o abatido e cheio de dúvidas d. João após 54 dias no mar pisou o solo brasileiro apenas 24 hs depois. Foi o primeiro rei europeu a fazê-lo. Revisões nos navios, um pouco de descanso. Seguiram a viagem em 26 de Fevereiro. Dia 7 de Março a família real chegava ao destino final, a cidade do Rio de Janeiro.

CSI - uma criação de quem nunca se fala

Complemento Solidário para Idosos (CSI) Decreto-Lei n.º 232/2005 de 29 de Dezembro Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 2 de Dezembro de 2005. - José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa - Fernando Teixeira dos Santos - Alberto Bernardes Costa - Pedro Manuel Dias de Jesus Marques. Promulgado em 19 de Dezembro de 2005. Publique-se. O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.

segunda-feira, novembro 27

PALPITES III

O PSD congressou de agenda pretérita. Virou comício promocional. Como soe dizer-se tudo previsivel, e nenhum partido per si obterá maioria de mandatos. Quanto mais o PSD bater no futuro lider do PS menos espaço para alianças ao centro esquerda. Mais o PSD fica à merçê da extrema direita que será implacável.

domingo, novembro 26

PALPITES II

A direita saliva. Faz parte. Como já ouvi dizer, vai suceder algo engraçado: o PSD apresenta um lider velho, ontem acompanhado de outro ainda muito velho, o PS apresentará um lider novo, que a direita empurra para o lado do esquerdismo. Suspeito que ninguém, nem à direita nem à esquerda, se assusta ... com o chamado radicalismo.

sexta-feira, novembro 24

PALPITES I

Pedro Nuno vai ganhar a disputa interna no PS. É jovem e um tribuno formidável da escola dos velhos republicanos/socialistas. É a melhor solução para fazer oposição no próximo futuro.

25 novembro 1967

No dia 25 de novembro de 1967, era sábado, lembro-me de sair, era já tarde/noite, do ISCEF, pouco mais de um ano após ter iniciado os estudos naquela escola. Teria ido, certamente, participar numa reunião ou, mais prosaicamente, jantar na cantina da Associação de Estudantes. Ao sair devo ter feito o caminho de casa, um quarto alugado, ao cimo da Calçada da Estrela. Chovia muito, mas não estranhei porque, ao contrário de hoje, era normal chover nesta época do ano. Não levava qualquer resguardo para a chuva, que nem me pareceu excessiva, e caminhei colado às paredes até chegar ao destino. A minha perceção da chuva que caía naquela hora não me permitiu sequer imaginar as consequências que haveria de provocar. Chovia, simplesmente. Na manhã do dia seguinte, domingo, devo ter feito o caminho oposto, corriam as notícias de inundações em diversos sítios de Lisboa e arredores, e devo ter-me dirigido ao Técnico para me juntar à gigantesca mobilização estudantil que se organizou para avançar para as zonas mais atingidas em socorro das vitimas e no apoio à reparação dos estragos. O quartel general, que me lembre, havia sido montado no Técnico e deve ter sido a primeira vez que, à margem dos poderes instalados, com autonomia e mobilizando recursos próprios, se promoveu uma ação voluntária juvenil de grande envergadura à margem da politica oficial do regime. Foi um processo organizado que enquadrou a vontade espontânea de uma multidão de jovens estudantes ávidos de participação cívica e politica. Fui numa brigada para Alhandra munidos de meios rudimentares e lembro-mo com nitidez de nos afadigarmos a limpar ruas no meio da maior destruição que se possa imaginar. Retenho na memória o ambiente de caos e de tensão pois, afinal, estávamos a participar numa ação voluntária não autorizada que, naquela época, comportava riscos pessoais. Não havia medo, mas necessidade, e vontade de ação. Os meios para o socorro eram escassos, mas o que contava, de verdade, era participar, prestar solidariedade, ver com os próprios olhos in loco o que, de súbito, nos surgiu como uma calamidade de enormes proporções. Uma pá na lama, os destroços, uma palavra de conforto e incentivo, uma força coletiva que enfrentava sem medo a situação dramática de populações desprotegidas e, afinal, um regime decadente acobertado na ignorância, na censura e na repressão. No que me respeita ficou uma experiência sem dissabores. Não poderia imaginar que estávamos nas vésperas da queda de Salazar e da emergência, em 27 de setembro de 1968, do governo de Marcelo Caetano, menos de um ano depois daquelas trágicas inundações. Afinal aquela gigantesca ação voluntária havia de contribuir, de forma relevante, para o início do processo politico que desembocou no 25 de abril de 1974.

quinta-feira, novembro 23

A PROPÓSITO DOS HOLANDESES

"Os holandeses, oh!, são muito menos modernos! Têm tempo, repare neles. Que fazem? Ora bem, estes senhores vivem do trabalho daquelas senhoras. São, de resto, machos e fémeas, umas burguesíssimas criaturas que têm o costume de vir aqui, por mitomania ou estupidez. Em suma, por excesso ou falta de imaginação. De tempos a tempos, estes senhores puxam pela faca ou pelo revólver, mas não julgue que com muito empenho. O papel exige, eis tudo, e morrem de medo, disparando os últimos cartuchos. Posto o que, acho ainda mais moralidade neles que nos outros, aqueles que matam em família, pelo desgaste. Não notou ainda que a nossa sociedade está organizada neste género de liquidação? Já ouviu falar, naturalmente, daqueles minúsculos peixes dos cursos de água brasileiros que se lançam aos milhares sobre o nadador imprudente e o limpam, em alguns instantes, a pequenas bocadas rápidas, não deixando mais que um esqueleto imaculado? Pois bem, é essa a organização deles. «Quer uma vida limpa? Como toda a gente?» Dirá que sim, naturalmente. Como dizer que não? «De acordo. Vai ficar limpinho. Aqui tem um emprego, uma família, lazeres organizados.» E os dentes minúsculos cravam-se na carne até aos ossos. Mas sou injusto. Não é a organização deles que se deve dizer. Ela é a nossa, ao fim e ao cabo: é a ver quem limpará o próximo." Albert Camus, in A Queda

segunda-feira, novembro 20

LIBERDADE V

A sociedade dos negociantes pode definir-se como uma sociedade na qual as coisas desaparecem em proveito dos signos. Quando uma classe dirigente avalia as suas riquezas, já não pelo hectare de terra nem pelo lingote de oiro mas pelo número de cifras que idealmente correspondem a um certo número de operações de câmbio, dedica-se ao mesmo tempo a pôr uma certa espécie de mistificação como centro da sua experiência e do seu universo. Uma sociedade fundada nos signos é, na sua essência, uma sociedade artificial em que a realidade carnal do homem se acha mistificada. Ninguém então se admirará de que essa sociedade tenha escolhido, para dela fazer a sua religião, uma moral de princípios formais, e de que grave as palavras liberdade e igualdade tanto nas suas prisões como nos seus templos financeiros. Entretanto, não é impunemente que se prostituem as palavras. O valor hoje mais caluniado é certamente o valor da liberdade. Bons espíritos (…) fazem doutrina de ela não ser senão um obstáculo ao verdadeiro progresso. Mas se disparates tão solenes puderam ser proferidos foi porque, durante cem anos, a sociedade negociante fez da liberdade um uso exclusivo e unilateral, considerou-a mais como um direito do que como um dever e não receou pôr, tão frequentemente quanto pôde, uma liberdade de princípio ao serviço de uma opressão de facto. Albert Camus, in Discursos da Suécia (Conferência de 14 de dezembro de 1957 - Universidade de Upsala).

quarta-feira, novembro 15

LIBERDADE IV

A liberdade não é qualquer coisa assim que se possa vender bem, pois... como calcular o seu valor acrescentado ou a sua influência no PIB ou no déficit...ai a liberdade... é difícil lidar com a liberdade. Não se compra, não se vende, é um bocado imaterial demais a liberdade. Não está tempo para isso de aturar a liberdade. É isso mesmo um aborrecimento, uma seca, uma ideia um bocado vazia...não sei mas apetecia experimentar outro produto que desse mais segurança ao mercado. Ai a liberdade... faz lembrar o 25 de Abril, o dia foi muito animado, no princípio até parecia um golpe dos ultras, mas aquele período a seguir foi uma maçada em particular ter de aturar os esquerdistas do PPD...e do MRPP... ai a liberdade... uma palhaçada, é verdade que os americanos falam disso como princípio sagrado mas pensando bem são um país novo e ultrapassado. Ai a liberdade...os filósofos, os poetas e toda a espécie de iluminados, e mesmo os homens de negócios, antigos e modernizados, falam disso mas é um discurso especializado, sei lá do género, livre de impostos, livre circulação, liberdade de culto, liberdade de imprensa, ir apanhar ar livre... ai a liberdade..

domingo, novembro 12

LIBERDADE III

O exercício da democracia é complexo e não me refiro às altas esferas dos poderes – todos os poderes – mas ao quotidiano das nossas vidas de cidadãos comuns. Penso em tanta gente conhecida, que não vejo, mas me pode ver, a quem não escrevo, mas me pode ler, a quem não falo, mas me pode falar; penso na manhã de segunda-feira passada quando, enquanto esperava pela inspecção à viatura, fui abordado por um cidadão já entradote aliciando-me para aderir aos ideais da ditadura. Como fazer? Tratar-se-á de um crime público? Chamar a polícia? Quando alguém faz a apologia do salazarismo, insinuando, ou afirmando a bondade do fascismo, o que fazer? Quando alguém usa da liberdade para combater a liberdade o que fazer? Suprimir, ou limitar a liberdade, como empecilho ao cabal exercício da autoridade? Ou exercer a autoridade, de forma justa e proporcional, para salvar a liberdade? É tudo uma questão de equilíbrio para não nos tornarmos assassinos

SUSPEITAS

Na política há pequenos detalhes que fazem toda a diferença e a injustiça, tal como a moral, não tem calibre. Na vida é igualmente assim. * Lembro-me de um filme que vi no qual um inocente foi incriminado por um crime racista. O governador do estado, no último dia de funções, comutou-lhe a pena e fugiu. Antes de ser libertado o inocente foi morto pelos racistas amotinados. Havia um jornal de referência, à época, que atiçava os ânimos. * Para justificar um assassinato político cria-se um facto, de preferência divulgado através de jornais de referência, acima de toda a suspeita, insiste-se no facto semanas a fio, desdobra-se o facto em sub factos, espera-se que a vítima, em lume brando, amoleça e se torne desprezível para a opinião pública. * Mais perfeito ainda. Cria-se um facto político divulgando-o através de depoimentos de testemunhas avalizadas pela autoridade, insiste-se e injecta-se em doses massivas na opinião pública, depois faz-se desaparecer a testemunha, eterniza-se a suspeita e a vitima torna-se numa sombra que paira longe. * Um dia um primo meu, a cumprir o serviço militar, foi colocado nos Açores. Casado com uma jovem, ao que contam as crónicas, linda de morrer. Um dia o sapateiro meteu-se com ela. O meu primo foi buscar explicações. O sapateiro anavalhou-o. Assassinou-o em Angra do Heroísmo. Um inocente morreu em defesa da honra. Aqui não houve dúvidas acerca de carrasco e vítima. * Uns anos atrás pedi à minha cunhada, em viagem, que procurasse o meu primo no cemitério de Angra. Havia dois. Ela acertou no cemitério certo. Encontrou-o. Trouxe-me as fotografias. Apesar de terem passado tantos anos está bem. A campa. * Todos os crimes deixam rastro, têm vítimas e carrascos. Basta procurá-los com persistência porque há crimes que não têm perdão. (A fotografia retrata o meu primo assassinado nos Açores. No funeral de sua avó, minha tia paterna, encontrei uma senhora da terra que, vindo à fala a má sorte deste meu primo, abriu a carteira e, muitos anos depois, me mostrou a fotografia dizendo-me que sempre a acompanhava. Comovente).

sábado, novembro 11

LIBERDADE II

“Revolta. Finalmente, escolho a liberdade. Pois que, mesmo se a justiça não for realizada, a liberdade preserva o poder de protesto contra a injustiça e salva a comunidade. A justiça num mundo silencioso, a justiça dos mundos destrói a cumplicidade, nega a revolta e devolve o consentimento, mas desta vez sob a mais baixa das formas. É aqui que se vê o primado que o valor da liberdade pouco a pouco recebe. Mas o difícil é nunca perder de vista que ele deve exigir ao mesmo tempo a justiça, como foi dito. Dito isto, há também uma justiça, ainda que muito diferente, fundando o único valor constante na história dos homens que só morreram bem, quando o fizeram pela liberdade. A liberdade é poder defender o que não penso, mesmo num regime ou num mundo que aprovo. É poder dar razão ao adversário." Albert Camus, in Cadernos

LIBERDADE

É pela política que o PS vai lá! É pela política que o PS pode aspirar a ganhar eleições! Uma das linhas distintivas do PS em relação aos restantes partidos é a questão da liberdade. A defesa da liberdade pode ser penosa para outros partidos, menos para o PS. É a bandeira da liberdade que o PS não pode, em circunstância alguma, deixar de levantar porque é ela que distingue o PS, pela história e pela acção quotidiana, dos restantes partidos, à sua esquerda e à sua direita. Albert Camus, no conturbado período do pós guerra (1945) escreveu: “Finalmente, escolho a liberdade. Pois que, mesmo se a justiça não for realizada, a liberdade preserva o poder de protesto contra a injustiça e salva a comunidade.” (…) [In Cadernos nº 4]. E Jorge de Sena, nos alvores da Revolução de Abril, em 4 de Junho de 1974, escreveu no magnífico poema “Cantiga de Maio” este verso emblemático: “Liberdade, liberdade, tem cuidado que te matam.” Será o eleitorado de esquerda capaz de compreender o que está em jogo nestas eleições?

quarta-feira, novembro 8

7 NOVEMBRO 1981 - MES (FIM)

Em 7 novembro de 1981 realizou-se um evento improvável: a celebração da extinção de um partido politico, o Movimento de Esquerda Socialista (MES).