sábado, junho 18

MULHERES

Sophia de Mello Breyner. "Há tempos num jantar perguntaram-me o que é que eu achava duma senhora fascista ( e desavergonhadíssima) que me odeia a amim e ao Francisco e que nos persegue com malcriações incríveis e calúnias. Eu respondi que a achava boa, inteligente, séria, culta e bem educada. Até os amigos da dita senhora tiveram de dar uma boa gargalhada. É o único sistema: rir de quem nos quer matar." (in Carta a Jorge de Sena de 22 de setembro, 1961).

segunda-feira, junho 13

René Char a Albert Camus – 13 de Julho de 1953

(…) “Je comprends votre fatigue. Je l’éprouve en ce moment. Ou le monde est fou, ou nous le sommes. Lequel est supportable? Finalement, l’âme est recuite, on vit contre un mur. Mais il faut durer, vous le savez comme moi. Durer seulement, et un jour peut-être … (…)»

Fernando Pessoa, nascido, na cidade de Lisboa, em 13 de junho de 1888

“Saber não ter ilusões é absolutamente necessário para se poder ter sonhos. Atingirás assim o ponto supremo da abstenção sonhadora, onde os sentidos se mesclam, os sentimentos se extravasam, as ideias se interpenetram. Assim como as cores e os sons sabem uns a outros, os ódios sabem a amores, e as coisas concretas a abstractas, e as abstractas a concretas. Quebram-se os laços que, ao mesmo tempo que ligavam tudo, separavam tudo, isolando cada elemento. Tudo se funde e confunde.” “Livro do Desassossego” – Fernando Pessoa, aliás, Bernardo Soares, Ajudante de Guarda-Livros na Cidade de Lisboa

sábado, junho 11

MISÉRIA MORAL

"Um tribunal de Londres autorizou o controverso plano do Governo britânico de enviar requerentes de asilo para o Ruanda, rejeitando o apelo de associações de direitos humanos" (in "Expresso") - Um recuo civilizacional num momento em que ocorrem tantos outros sinais de regresso à barbárie. Uma designada potência ocidental não se deixa ficar atrás da Rússia que condena e ataca. A miséria moral em todo o seu explendor.

sexta-feira, junho 10

10 JUNHO

Hoje é dia 10 de junho, um dia como outro qualquer, salvo ter sido escolhido faz tempo, não vem ao caso a razão, para Dia de Portugal. Lembrei-me a propósito do dia 10 de junho de 1977, celebrado na Guarda, como este que hoje se celebra. O que me faz lembrar esse longínquo dia é o discurso que nele foi convidado a proferir Jorge de Sena. Estávamos no fim do chamado período revolucionário, haviam ocorrido as eleições presidenciais, tendo sido eleito Ramalho Eanes, e a voz de Sena, tão pouco chamada a ser ouvida fora dos meios literários e académicos, irrompia como uma fagulha que iluminava temas raramente trazidos à praça pública em eventos de natureza politica, ou afins. A partir desse dia passei a ler a obra de Sena de forma sistemática, em particular a poética, que sempre me inspirou. O discurso de Jorge de Sena, proferido em 10 de junho de 1977, contém tanta actualidade que até dói. Foi uma das suas últimas intervenções públicas em Portugal, senão a última, pois morreu em 4 de junho de 1978 em Santa Bárbara, Califórnia, onde vivia com sua mulher Mécia (já falecida, com a qual me correspondi longo tempo) e a sua vasta prole.

domingo, junho 5

DERROTAR A RÚSSIA

"O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, advertiu hoje que Moscovo atacará novos alvos se o Ocidente fornecer mísseis de longo alcance à Ucrânia, dizendo que as atuais entregas de armas têm por objetivo "prolongar o conflito"". (Dos jornais digitais) A Federação Russa escolheu a guerra invadindo militarmente outro Estado, abrindo as portas a uma generalização de reivindicações da reconquistada de territórios, rotas, portos de mar ... perdidos em anteriores conflitos, nalguns casos muito antigos, encerrados por tratados de paz. De forma simples, sem prejuízo de se buscar a paz por todas as formas decentes: ou a Rússia é derrotada ou teremos uma guerra generalizada de consequências incalculáveis como, afinal, todas as guerras. Dizem alguns que é da natureza humana... mas continuo a acreditar nas vantagens da paz e da concórdia entre os povos e as nações.

sábado, junho 4

PORTUGAL - AS NAÇÕES QUE PERDURAM SÃO UM PROCESSO SEMPRE EM MARCHA

“Na era de 1166 [ano de 1128], no mês de Junho, na festa de S. João Batista, o ínclito Infante D. Afonso, filho do conde Henrique e da rainha D. Teresa, neto do grande imperador da Hispânia, D. Afonso, com o auxílio do Senhor e por clemência divina, e também graças ao seu esforço e persistência, mais do que à vontade e ajuda dos parentes, apoderou-se com mão forte do reino de Portugal. Com efeito, tendo morrido seu pai, o conde D. Henrique, quando ele era ainda criança de dois ou três anos, certos [indivíduos] indignos e estrangeiros pretendiam [tomar conta] do reino de Portugal; sua mãe, a rainha D. Teresa, favorecia-os, porque queria, também, por soberba, reinar em vez de seu marido, e afastar o filho do governo do reino. Não querendo de modo algum, suportar uma ofensa tão vergonhosa, pois era já então de maior idade e de bom carácter, tendo reunido os seus amigos e os mais nobres de Portugal, que preferiam, de longe, ser governados por ele, do que por sua mãe ou por [pessoas] indignas e estrangeiras. Acometeu-os numa batalha no campo de S. Mamede, que é perto do castelo de Guimarães e, tendo-os vencido e esmagado, fugiram diante deles e prendeu-os. [Foi então que] se apoderou do principado e da monarquia do reino de Portugal.” “Anais de D. Afonso, Rei dos Portugueses”, citado por José Mattoso, em “D. Afonso Henriques” que, de seguida, comenta: “Este texto mostra que o seu autor considerava a batalha [de S. Mamede, 24 de Junho de 1128] como o primeiro episódio da história portuguesa." In “D. Afonso Henriques” de José Mattoso, ”S. Mamede”

MULHERES

A minha mãe Tolentina, desafiante e determinada, sempre receosa do mal que pudesse acontecer aos seus, inventando como lhes acudir, acompanhar, incentivar. Uma saudade eterna.

quarta-feira, junho 1

CAVACO, O AMORFOCRATA

Cavaco o amorfocrata, ou seja, o democrata sem forma definida, volta ao ataque desta vez no papel de humorista. Que Deus tenha o seu pensamento em descanso!
"Cavaco dá os parabéns pela maioria absoluta: com a “vontade de fazer reformas e habilidade no diálogo” de Costa, “tudo correrá na perfeição”". (In "Expresso")

domingo, maio 29

FERNANDO PIMENTA

Estou curioso para saber como o país através das suas instituições e titulares das mesmas vai agradecer ao Fernando Pimenta o seu extraordinário percurso de vitórias a nível mundial numa modalidade desportiva "não futebol"...
"O canoísta português Fernando Pimenta esteve hoje envolvido em três das quatro medalhas de ouro conquistadas pela seleção portuguesa na Taça do Mundo de Poznan, na Polónia. O duplamente medalhado olímpico luso venceu as provas individuais de K1 500 metros e K1 1.000 metros e, juntamente com Teresa Portela, ganhou a prova mista de K2 500, num dia em que também João Ribeiro e Messias Baptista venceram, em K2 200." (Dos jornais digitais)

sábado, maio 28

MULHERES

Maria Casares, filha do último 1º ministro do governo repúblicano deposto pelo golpe de Franco, que partiu para Paris, com a mãe, logo em 1936, com a idade de 14 anos. Havia de tornar-se no ambiente terrivel de guerras, exílios e os mais hediondos crimes, numa atriz de mérito reconhecido que a grande custo aprendeu a lingua francesa de forma a ser aceite pelo público e critica. Viveu com Albert Camus uma paixão amorosa ardente e tumultuosa que durou desasseis anos até à morte trágica de Camus (janeiro 1960).

sexta-feira, maio 27

LULA

"Lula mais perto de vencer à primeira volta eleições presidenciais no Brasil" (In "Expresso") Estava na cara que liberto de processos judiciais impeditivos de uma candidatura presidencial Lula ganharia logo que desse o primeiro passo. O seu regresso à presidência do Brasil terá um impacto relevante na politica internacional. O resultado final do seu exercício abre um mundo de interrogações. Ver-se-á se lá chegar ...

quarta-feira, maio 25

segunda-feira, maio 23

MULHERES

Sofia Loren por David Seymour - American, b.1911

ASSÉDIO SEXUAL

Não me venham com esta conversa de que o assédio sexual é transversal e tal e coiso... O que os responsáveis por cada uma das instituições (ainda para mais as de ensino) nas quais se prove essa prática, o que têm a fazer é tudo fazer para que os abusadores sejam severamente punidos (disciplinar e criminalmente). Aqui não há mas nem meio mas, nem vale generalizar para encobrir.
"Assédio sexual “é um problema transversal à sociedade portuguesa” “Não há um sítio que é o antro dos malfeitores e os outros são sítios assépticos”, afirma o reitor da Universidade de Lisboa, Luís Ferreira, a propósito das queixas de assédio na Faculdade de Direito (FDUL). Saúde mental dos estudantes da universidade vai ser avaliada." (In "Público")

sábado, maio 21

MULHERES

Conceição filha de minha tia Lucília, irmã mais nova de meu pai, serena e jovial, fotografada no lugar do anjo que nos encoraja a olhar o futuro. A propósito do Natal de 2006 lembrei-me de uma fotografia da comunhão solene da Conceição.
Porque o ar puro que emana da imagem dela, fotografada com arte verdadeira, corresponde à própria natureza do ser fotografado. A distância entre a realidade e a imagem que dela se faz encurta-se, aplana-se, tendendo para a representação da felicidade.

sexta-feira, maio 20

MULHERES

A minha tia Lucília, irmã de meu pai, uma mulher linda de morrer, no dia do seu centenário. Já não está entre nós mas reconstruo-me evocando a memória dos meus. E assim caminho...

terça-feira, maio 17

MULHERES

Fotografia de família – a minha avó paterna . Ressonâncias de outros tempos com gente povoando os caminhos e as casas habitadas em comum com suas regras horários lugares marcados uma luta pela sobrevivência é assim que me soam as ressonâncias de outros tempos. Nela as mulheres ocupam no meu imaginário o centro do mundo. O ponto cardeal em torno do qual volteiam todos os devaneios. Desfilam pela minha memória os seus rostos, vozes e cheiros. Na família tradicional que era (e é) a minha, as mulheres parece que nunca desertam dos seus deveres, nunca morrem, permanecem no centro da vida, lugar da vida, origem da vida. Se tivesse sido iluminado pelo dom de uma qualquer arte dedicar-lhes-ia um monumento, uma obra-prima, um prolongado aplauso. [24/2/2008]

domingo, maio 15

O SOFRIMENTO HUMANO

“Setembro. (1941) Organiza-se tudo: É simples e evidente. Mas o sofrimento humano intervém, e altera todos os planos.” Albert Camus, in Caderno” n.º 3 (Abril de 1939/Fevereiro 1942).
Na esquina de um olhar – Fotografia de Hélder Gonçalves

quinta-feira, maio 12

MAIO

Maio. Erro de uma psicologia de pormenor. Os homens que se procuram, que se analisam. Para nos conhecermos bem, temos que nos afirmar. A psicologia é acção - não reflexão sobre si próprio. Definimo-nos ao longo da vida. Conhecermo-nos perfeitamente, é morrer. [pág.34] As filosofias valem aquilo que valem os filósofos. Maior é o homem, mais a filosofia é verdadeira. [pág. 36] Combate trágico do mundo sofredor. Futilidade do problema da imortalidade. Aquilo que nos interessa, é de facto o nosso destino. Mas não "depois", "antes". [pág. 37] Regra lógica. O singular tem valor de universal. -ilógica: o trágico é contraditório. -prática: um homem inteligente em certo plano pode ser um imbecil noutros. [pág. 37] Os casais: o homem tenta brilhar diante de terceiros. A mulher imediatamente: "Mas tu também…", e tenta diminui-lo, torná-lo solidário da sua mediocridade. [pág. 41] Mulheres na rua. A besta arrebatada do desejo que trazemos enroscada na cavidade dos rins e que se agita com uma suavidade estranha. [pág. 43] Albert Camus, in "Cadernos" (1962-Editions Gallimard), Colecção Miniatura das Edições "Livros do Brasil", Caderno nº1 (Maio de 1935/Setembro de 1937).

segunda-feira, maio 9

O COROA MORREU

O Campos Coroa morreu, não o refiro como reflexo das notícias de suas ligaçôes à Académica de Coimbra, mas como filho de Campos Coroa, um médico, tal como ele, que levou o teatro de Coimbra para o Algarve. Foi aí que aprendi na juventude muita coisa essencial para a minha vida futura até hoje e sempre. Deixo um texto antigo em sua homenagem.
Uma Sala Vazia O teatro foi uma escola para mim. Desde o liceu até ao teatro amador vivi uma experiência intensa fazendo teatro. No GTCCA (“Grupo de Teatro do Círculo Cultural do Algarve”), dirigido pelo Dr. Emílio Campos Coroa, encenaram-se os clássicos e fizeram-se representações e digressões sem conta. Em salas pequenas e grandes, modestas e grandiosas, em ruas e praças, em barcos ancorados (“O Lugre”) e praias douradas (Albufeira), de dia e de noite. Uma loucura. A acção da família Campos Coroa na promoção do teatro foi, e é, uma gesta heróica. O exagero está na realidade e não na fantasia do teatro. Representamos a “Trilogia das Barcas”, de Gil Vicente, versão integral, vezes sem conta. Desempenhava, nessa trilogia, três papéis, um em cada acto: o “Procurador”, no primeiro, o “Tafúl” (cena final do segundo acto) e o “Cardeal”, no terceiro. O dispêndio de energias era fenomenal e as cabeleiras nunca me cabiam na cabeça. O meu desempenho era somente razoável para um actor autodidacta, sem escola, nem formação específica. Mas os espectáculos eram uma festa tensa e exigente. O espectáculo de Portimão (ou de Lagos?) ficou-me vincado na memória por uma razão oposta à maioria dos outros. Antes do início, perto da hora marcada, a sala apresentava-se deserta. Não sei já, ao certo, mas sentavam-se na plateia um ou dois espectadores. Tinha falhado, certamente, a divulgação. O Dr. Emílio Campos Coroa (enfurecido!) reuniu a “companhia” nos bastidores e fez uma prédica que nunca mais esqueci. A sua mensagem era cristalina: o espectáculo realiza-se, de qualquer maneira, como se estivéssemos perante uma sala cheia. Com a mesma energia e dedicação, sem falhas nem hesitações. Fez-se. Correu bem. Reforcei a convicção de que os compromissos são para respeitar mesmo na adversidade. Obrigado doutor.

PELO ANIVERSÁRIO DE MARGARIDA RAMOS

Pelos caminhos da vida por entre perigos e desafios, enfrentando-os ou torneando-os conforme as circunstâncias, em mim repousa e vive o outro, suas alegrias e dores, tanto tempo e tão pouco, sempre o olhar erguido em frente, prontos a aceitar para ser aceites, sei que a eternidade é uma ideia sem futuro, mas creio sempre no valor sagrado da vida em liberdade e nos valores nos quais nos revemos. Feliz aniversário!

AGOSTINHO ROSETA

Agostinho Roseta morreu no dia 9 de Maio de 1995, na plena pujança das suas faculdades humanas, intelectuais e políticas. A sua morte prematura impediu que tivesse, muito provavelmente, exercido influência ainda mais marcante, a partir de 1995, no movimento sindical, no Partido Socialista e, quiçá, no governo. Ele foi, no movimento operário e sindical, o activista mais importante do MES associando juventude (ou talvez melhor, jovialidade), capacidade teórica e sentido prático de organização sendo, ao mesmo tempo, persuasivo, sedutor e desprendido do poder. Falar de pessoas é sempre muito delicado mas não receio cometer qualquer injustiça destacando a influência marcante de Agostinho Roseta na formação pessoal e política de um vasto e influente conjunto de dirigentes políticos e sindicais portugueses. Lembro-o, além do mais, pela amizade sincera que sempre por ele nutri, aliás, retribuída, e porque foi ele o primeiro, entre todos nós, que mais cedo compreendeu o fracasso do projecto político do MES optando por dedicar as suas imensas capacidades de liderança ao movimento sindical. O dia da sua morte coincide, ironicamente, com o dia de aniversário de minha mulher a quem pedi para reconstruir a última imagem que dele possuo: uma fotografia de grupo registada, certamente, em 27 de Outubro de 1994 na celebração do 4º aniversário de meu filho. (Dedicado à sua mulher Helena e a seus filhos, um post de Março de 2004, reescrito, pois nunca esqueço esta triste efeméride.)

sábado, maio 7

FOTOGRAFIAS DE FAMÍLIA

As fotografias de família confrontam-nos com as memórias. Reconciliam-nos ou antagonizam-nos connosco no contexto da família a que pertencemos. O colectivo e o individual misturam-se na poeira do tempo. São imagens que reflectem fragmentos da vida captados em fracções de segundos. Sempre me reconcilio com a memória quando olho as fotografias de família. Na diversidade das diversas famílias a que pertenço. Outros lidam mal com elas e horrorizam-se quando vasculham no baú da memória. A partir dos finais dos anos 40 o meu pai adquiriu três objectos de culto: a moto “Norton”, a máquina fotográfica “Kodak” e o automóvel “Ford Prefect”. Esta é uma fotografia rara retratando um objecto: o “Ford Prefect” surge como se fosse um membro da família. Matrícula LH-14-11. Uma matrícula que, ao contrário de outras, nunca mais esqueci.

GUERRA É GUERRA

Na guerra da Ucrânia, que nem tão cedo sairá do nosso quotidiano mediático, uma coisa ficou clara nos últimos dias: os USA e a GB (que arrastarão a UE e outros) definiram a sua estratégia no sentido de tudo fazerem para a vitória politico-militar da Ucrânia. O discurso acompanha a prática através de apoio militar, a todos os niveis, relevante. Só sabemos da missa a metade - quase ocultada a guerra da inteligência e o negócio de armamento. Só a partir da posição de vencedores poderão encetar uma negociação a sério com a Rússia. O resto são detalhes que podem avultar em ruído mas que não serão decisivos. O nosso caso de Setúbal é simplesmente mais uma sequela doméstica que indicia o declinio da influência do PCP, ou melhor dito, um episódio na infindável campanha do PCP para alcançar a irrelevância politica.

sexta-feira, maio 6

BRASIL

A politica no Brasil é coisa triste, os brasileiros não merecem tais araustos de um grande e rico país-continente, ainda para mais de lingua portuguesa. Lula acerca da guerra da Ucrânia disse umas inanidades que Bolsonaro deve ter tido pena de lhe terem sido roubadas. Fica-se com a sensação que as opções viáveis de vitória nas próximas presidencais anunciam novas aparências mas com mais do mesmo. E fico triste, pá...

terça-feira, maio 3

A POSSE

A designada guerra da Ucrânia continua e tenho para mim que assim é por ser do interesse de todos menos do povo que sofre as suas consequências. Finalmente foi sempre assim pois se assim não fosse seria uma breve chama que um simples sopro apagaria. Sempre os negócios, o dominio das fontes de matérias primas, das rotas, da terra, do mar, a volúpia da posse...a posse.... a posse... . Das guerras saem sempre vencidos os povos mesmo quando os seus governos saem vencedores, hoje por hoje, acresce o espectáculo que estimula o imaginário heróico da beligerância em desfavor da pacata grandeza da concórdia. Daí o desprezado heroísmo de Guterres ... e por aqui me fico ...

domingo, maio 1

À MINHA MÃE TOLENTINA

Reconheço o amor nos olhos que me olham com desmedida atenção enquanto durmo. Os olhos de minha mãe adoravam ter esperança no futuro no qual jogava a sua crença de ir mais longe. A primeira mulher da minha vida. A mais ousada na sua imprevisível arte de romper barreiras e chegar mais além. A fonte da força que me mantém de pé contra todas as adversidades. Uma mulher de um só homem que não era homem de uma só mulher. A fidelidade nascida da tradição que não da fraqueza ou da futilidade. A irreverência herdada da rudeza do campo, das agruras da natureza à força de puxar a besta e de encaminhar a água à raiz certa não fosse perder-se uma gota. A escola da escassez sonhando a fartura que havia de vir fruto do trabalho honrado. Não perder tempo chorando o tempo perdido. Fazer do tempo um passeio para espairecer e voltar ao arado da vida com sonhos lá dentro. A mulher que se fez a si própria descobrindo os outros e o que se pode e se não pode fazer com eles. Aceitar mudar e escolher o caminho da mudança. Tactear o caminho levando ao colo os seus amores. A primeira mulher que acreditou no caminho hesitante que me havia de fazer homem. Sem saber para onde ia ao certo. Nem ninguém sabia, ninguém nunca sabe, mas não duvidou que havia de chegar a um lugar onde brilharia o sol e sou capaz de a lembrar como a minha primeira mulher. Aquela que mais me amou, sempre me amou além do que a vida pode conter de riqueza material. Um dia ao fim de uma longa caminhada sem sequer saber dos meus males escolheu morrer nos meus braços. A mais sublime homenagem que alguém pode prestar a alguém. De súbito suavemente, na alegria da celebração da juventude, deixou para sempre a esfusiante tradição de me abraçar como se fosse a criança que para ela nunca deixara de ser. [21/1/2008]

HOJE É DIA DE MAIO

Hoje é dia de Maio, dizia-se no campo de meus avós, tão longe no tempo, tão perto na memória. Hoje passam 48 anos sobre a data em que se desfizeram muitas dúvidas acerca da natureza da revolução de Abril. Por toda a parte ressoaram os passos de milhões de manifestantes. Num repente um povo submisso parecia ter-se transformado num povo rebelde. Mas as revoluções só sobrevivem naqueles breves momentos de fusão em que tudo parece ser possível. Torga, apesar do seu cepticismo, vigilantemente crítico, escrevia, pouco tempo depois, no seu Diário: “Aveiro, 9 de Junho de 1974 – A caminho da Costa Nova, com a sensação de que os barcos navegam no meio dos milheirais.” E, ainda antes, a propósito das suas incursões pela política: “Coimbra, 1 de Junho de 1974 – Discurso num comício socialista. Ainda hei-de escrever meia dúzia de linhas a propósito da situação trágico-cómica de um poeta em bicos de pés num estrado cívico, a esforçar-se por estar à altura da sua reputação e ao mesmo tempo a saber que ninguém o ouve.” Jorge de Sena, na América, escreveu em 2 de Maio de 1974 o poema “Com que então libertos, hein?...”: “Falemos de política, / discutamos de política, escrevamos de política, /vivamos quotidianamente o regressar da política à posse de cada um /essa coisa de cada um que era tratada como propriedade do paizinho. /Tenhamos sempre presente que, em política, os paizinhos/ tendem sempre a durar quase cinquenta anos pelos menos. /E aprendamos que, em política, a arte maior é a de exigir a lua/ não para tê-la ou ficar numa fúria por não tê-la, / mas como ponto de partida para ganhar-se, do compromisso, /uma boa lâmpada de sala, que ilumine a todos. (…) As quatro fotografias, a preto e branco, sobreviveram 48 anos tal como algunsde nós que nelas se podem rever. Nesta última, entre muitos dos activistas do MES que, publicamente, se anunciava, vejam se conseguem reconhecer o Eduardo Ferro Rodrigues! QUE VIVA O 1º DE MAIO!

sábado, abril 30

O CARTEL

O capital financeiro, a Banca manda em tudo, é juiz supremo da vida das nações. Em Portugal com a particularidade de termos chegado ao fim da linha, com desenho surrealista, de um capitalismo sem capital, capitalistas sem banca própria, reduzidos à pública CGD que, imagine-se!, vai partilhar sede com governo, tudo o resto (que é quase tudo) tomado pelo capital estrangeiro (salvo Montepio e Caixa de Crédito Agrícola, pequenos bancos da economia social, originários da 1ª república, sempre na mira da voracidadde alheia.) "Não há sentença judicial final ...!
"Não há sentença judicial final do cartel da banca, porque o processo vai ter de ir para esclarecimentos para o Tribunal de Justiça da União Europeia. O caso será suspenso até vir a resposta desta instituição europeia ao Tribunal de Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém."

quinta-feira, abril 28

ANIVERSÁRIO

Aniversário, num tempo repleto de novos desafios, ameaças à paz entre os povos e as nações, sinais de guerra que me convocam para espreitar oportunidades e vontade agir pela mudança do modelo de sociedade onde impera a crescente desigualdade social. Sempre mantendo viva a memória dos outros sem os quais não somos ninguém. Aos meus, avós, pais, irmão, companheira, filho, família alargada de todos os ramos que em mim desaguou e sempre me enriqueceu. A todas, e todos, as amigas, e amigos, que me deram o privilégio de comigo conviverem e me oferecerem com sentido de dádiva parte de suas vidas. Quantas alegrias e sofrimentos partilhamos, olhares em flecha postos no futuro radioso que sonhámos, e tantas vezes vimos florescer ou desiludir. Sempre com o olhar posto na vida vivida com esperança no futuro e os revezes encarados como oportunidades de novas conquistas. Como soe dizer-se, otimista na vontade, pessimista na razão. Aniversário que escrevo como se fora a primeira palavra de um dicionário aberto a todas as inscrições que celebrem a vida.

segunda-feira, abril 25

25 ABRIL - QUE VIVA!

Neste 25 de abril escrevo aqui bem perto da casa onde nasci, dia claro e temperado, como naquele longinquo dia em que as circunstâncias fizeram com que tivesse participado na ação militar que derrubou a ditadura. Um golpe militar que desaguou numa revolução popular, singular, como havia sido singular a ditadura que caiu com estrondo em poucas horas. Não vem ao caso dissertar acerca destas singularidades, mas apetece-me reafirmar que fizemos, todas e todas os que dicidiram por vontade própria participar ativamente no derrube da ditadura, o que tinha que ser feito, honrando a memória dos que desde 1926 tentaram por todos os meios, com sacrificio da sua liberdade e, quantas vezes, da vida, restaurar a democracia perdida com o 28 de maio de 1926 que derrubou a 1ª República. No dia seguinte ao da vitória eleitoral de Macron em França, o 25 de abril celebrado como dia da libertação em Portugal e em Itália, podemos saudar a França, as francesas e franceses, que com o seu voto permitiram manter aberta aquela pequena frincha pela qual se ilumina a vida dos povos que aspiram a viver am liberdade. Que Viva o 25 de Abril!
(Na porta de armas do quartel do Campo Grande em Lisboa, com o João Mário Mascarenhas, num dos dias entre 25 e 30 abril de 1974)

25 ABRIL - O GOSTO DA LIBERDADE

No dia 25 de Abril de 1974 em que a história, o imaginário e o simbólico se fundiram, num magna único, as raízes falaram mais alto. Uma das recordações mais fortes do 25 de Abril, que persistem em mim, foi a preocupações em telefonar, naquela manhã, do quartel onde ficara enclausurado, para casa de meus pais. Talvez seja incompreensível a persistência desta memória mas ela explica-se pelo facto de ter vivido, a maior parte da minha vida, longe da família, rodeado pela memória das paredes brancas, da luz do sul, dos cheiros da terra com vista para o mar. Das vozes e dos olhares que me viram crescer. Das ruas que conheço de cor e sou capaz de imaginar ao pormenor. Do rosto daqueles que são o rio no qual desagua o meu imaginário. Naquele momento mágico, a madrugada do 25 de Abril de 1974, em que o sonho de gerações de portugueses se transformou em realidade veio ao cimo das minhas preocupações o que, em regra, nunca constituía preocupação: falar com a família para lhes dar a boa nova, trocar uma palavra de regozijo, ofertar um cravo imaginado, abraçar o futuro, verter uma lágrima, agradecer a liberdade que me tinham oferecido mesmo antes dos cravos brilharem nos canos das espingardas. Reparei então como não somos nada sem as raízes que nos prendem ao chão das nossas origens. O 25 de Abril foi uma vertigem de libertação que ainda mais despertou em mim o gosto da participação cívica. Ganhei esse gosto pela iniciativa do meu irmão Dimas à época em que todos os pais hesitam acerca do destino dos seus filhos. Os gostos não são inatos. Não nascem connosco. São uma construção na relação com o mundo que nos rodeia. Sendo um filho tardio recebi dos meus pais a liberdade de escolher a minha vida e do meu irmão a discreta cumplicidade para que me afirmasse, no que quer que fosse, com respeito pelos princípios da liberdade e da democracia. O 25 de Abril foi a confluência de uma miríade de vontades libertadoras, um momento singular, que honraremos cultivando o gosto da liberdade. (Publicado em 23 abril de 2006)

domingo, abril 24

25 ABRIL - COMENDAS

É para dizer que estou de acordo com a decisão do PR de condecorar todos os militares que participaram no 25 abril. Não faria sentido que fosse de outro modo sabendo que os havia de todas as tendências politicas e ideológicas. Muitos deles, como não poderia deixar de ser, vinham do tempo da ditadura, tinham-na apoiado, tendo pelas mais diversas razões, e não pouco relevante por razões corporativas, apoiado o movimento que derrubou a ditadura. Mas cinquenta anos depois o que interessa catalogar em prateleiras ideológico-políticas os que participaram do movimento militar que fez implodir a ditadura? Ficarão a faltar os milicianos, oficiais, sargentos e soldados (que eram quase todos), ou seja, a "carne para canhão" utilizada na guerra colonial. Para colmatar essa falta grosseira seria necessário condecorar coletivamente uma multidão de milicianos. Não sei como...mas serão imjustiçados.
"Decisão do Presidente da República de condecorar todos os militares de Abril, que tem sido alvo de polémica, não foi submetida a parecer. Conselheiros em silêncio." (In "Expresso")

25 ABRIL - A VÉSPERA

Por esta hora neste dia, 24 de abril de 1974 (era uma 4ª feira), estaria no quartel, já informado que havia chegado o dia. Com os companheiros de armas mais chegados – António Cavalheiro Dias e João Mário Anjos – entramos em estado de prontidão para o que desse e viesse. Outros, por diversas vias, estariam também alerta. Já não me lembro com precisão quem terá sido o mensageiro, certamente, um oficial do quadro permanente. Conversas e contactos discretos, temperatura primaveril, tensão crescente sem contra ordens. Acertámos encontrarmo-nos, quando se aproximasse a noite, em casa do Cavalheiro Dias, em Benfica. Ao final da tarde saí do quartel, devo ter passado por casa e de seguida fui a casa do Ferro Rodrigues, na Travessa do Ferreiro, avisá-lo(s). O Sporting jogava para as competições europeias, se não erro, com uma equipa da Alemanha de Leste. Tudo parecia, apesar da tentativa falhada do 16 de março, bastante inverosímil. Um golpe de estado militar? Uma revolução? Regressei a Benfica, sempre em transportes públicos, para me juntar aos companheiros de armas. A espera valeu a pena. Seguiu-se a madrugada mais longa, e inesperada, da minha vida. Muitos haviam lutado, sem sucesso, pelo advento da liberdade e, finalmente, fez-se-lhes justiça. Lembro o General Humberto Delgado.

sexta-feira, abril 22

25 ABRIL

Não me lembro do nascer do dia. Andávamos na rua à procura de entender se era mesmo verdade. Com o António Cavalheiro Dias e o José Mário Anjos percorri a cidade, de lés a lés, atrás da coluna de Salgueiro Maia, olhando cada esquina e movimento, com uma atenção fulminante, não fosse falhar tudo outra vez. Não me lembro de ter visto nascer o dia. Naquela noite não houve madrugada. Os telefones devem ter começado a tocar a partir de determinada hora: “Olha parece que houve um golpe militar!”, “dizem que há tropa na rua!”. A minha preocupação era telefonar a meus pais. No quartel pude fazê-lo já a manhã tinha despontado. Que alegria. Afinal não era um golpe dos ultras! Era um golpe militar mesmo daqueles com que sonharam Humberto Delgado e tantos que morreram sem conhecerem a cor da liberdade. 48 anos de ditadura é muito tempo! Que pena não poder ver os sonhadores da liberdade nesse dia. Observar a comoção nos seus rostos e ouvir as suas primeiras palavras. Mas não me lembro do despontar daquela madrugada. Ouço os sons, cheiro os cheiros, vejo os camaradas de armas, o povo a passar defronte do quartel, bandeiras desfraldadas ao vento, as vozes enrouquecidas e as lágrimas a cair-lhes pelas faces, mas não me lembro do despontar do dia 25 de Abril de 1974. Mas o que interessa é que estava lá. E vencemos! [Escrito em 22 de abril de 2005. Postado agora com uma fotografia do Hélder Gonçalves.]