Fotografia de Hélder GonçalvesNo verão, por vezes, o vento Leste invade
a urbe. O vento da meseta – que o povo
diz não trazer nada de bom -, seca tudo
na sua frente. Também a cidade
está cheia de pessoas que secam tudo
na sua frente. Só conhecem pássaros
em gaiolas, árvores em toros
para crepitarem nas lareiras. O vento
cai, os insectos que arrastou
adubam os canteiros. As pessoas
duram todo o ano, estão sempre
vigilantes nas suas teias. De quem
falo – perguntas –. Ignoro! Abri
o computador a pensar num poema
e o texto foi invadido por um vento
cálido que não sei
para onde se dirige. Esperarei
Setembro, outra atmosfera, poderei
sair de casa, ir até ao correio,
escrever mensagens em que as aves
chilreiem, façam ninhos primaveris,
e pensar a cidade como se eu fosse
um forasteiro, com olhos de espanto:
carregar a memória com o crepúsculo,
coleccionar metáforas para,
no regresso, depositar
sob o teu olhar, avançar a mão
para a floresta, galopar intra-muros,
ouvir depois o boletim meteorológico
para saber onde iremos amanhã.
Egito Gonçalves .