Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
quarta-feira, junho 25
junho - dia 25
A situação nacional agita-se como sempre se agitou, mesmo aquando da aparente calmaria dos tempos de bonança, com disputas por todos os lugares onde o poder se disputa. A banca (rota) deixou de cuidar das aparências mostrando em todo o seu esplendor quanto descuidou a prudência. As gentes remediadas que não almejam senão dispor de serviços que supunham honestos, alarmam-se. Não é caso para menos por mais que se despejem toneladas de água fria por cima do clamor da desconfiança. Até prova em contrário os banqueiros, e sua corte, são gente honesta, sempre anunciada como âncora segura da economia da nação, zelosos cumpridores das leis e das regras da função, afinal, uma elite sem mácula. Assim seja mas, ao que parece, não é possível manter a ordem das coisas quando nem as aparências os banqueiros são capazes de manter. Um dia destes, não se sabe quando nem como, o fogo vai pegar na palha seca.
terça-feira, junho 24
DIGNIDADE
"O que vive em nós mesmo irrealizado precisa nestes tempos dúbios da rijeza da pedra. Orgulho autêntico. Recusa da conivência, do arranjo disfarçado. Dignidade. Elementos de que se faz a vagarosa teimosia dos sonhos. E então a partida está ganha. Pode perdê-la o escritor (por outras razões, aliás) mas o homem vence-a de certeza."
"O Aprendiz de Feiticeiro" de Carlos de Oliveira
Fotografia de Hélder Gonçalves
Roma - Janeiro de 2005
segunda-feira, junho 23
domingo, junho 22
junho - dia 22
Por irónica coincidência passei o dia de solstício de verão, a sul, na minha cidade de Faro. Abro a janela do quarto que dá para a rua, no centro da cidade, e oiço o silêncio quente entre cortado pelo chilrear da passarada. Conheço, tanto como me conheço, este silêncio acolhedor por entre o ar de cores mediterrânicas. E reconheço os contornos das faces felizes, ou sofredoras, dos meus que sempre me rodeiam mesmo quando ausentes. Que viva o verão!
sexta-feira, junho 20
junho - dia 20
Para os meus amigos, sejam elas ou eles, que me lêem, e persistem em me seguir, por pura amizade e devoção, após um dia de trabalho: Trabalhar. Fazer coisas com sentido. Partilhadas. Com esforço e vontade. Talvez criar. Não perder o gosto de trabalhar para o bem comum. Sem perder o sentido do prazer. Do amor-próprio. Respeitar e ser respeitado. Nada perder do sentido do dever. Usar o tempo sem sentir passar o tempo. Envelhecer devagar. Sentidamente. Com um abraço pelo início do verão.
Chico Buarque por Caetano Veloso
"Chico chega aos setenta (e até agosto sou apenas um ano mais velho do que ele, prazer de dois meses a cada ano). O Brasil é capaz de produzir um Chico Buarque: todas as nossas fantasias de autodesqualificação se anulam. Seu talento, seu rigor, sua elegância, sua discrição são tesouro nosso. Amo-o como amo a cor das águas de Fernando de Noronha, o canto do sotaque gaúcho, os cabelos crespos, a língua portuguesa, as movimentações do mundo em busca de saúde social. Amo-o como amo o mundo, o nosso mundo real e único, com a complicada verdade das pessoas. Os arranha-céus de Chicago, os azeites italianos, as formas-cores de Miró, as polifonias pigmeias. Suas canções impõem exigências prosódicas que comandam mesmo o valor dos erros criativos. Quem disse que sofremos de incompetência cósmica estava certo: disparava a inevitabilidade da virada. O samba nos cinejornais de futebol do Canal 100, Antônio Brasileiro, o Bruxo de Juazeiro, Vinicius, Clarice, Oscar, Rosa, Pelé, Tostão, Cabral, tudo o que representou reviravolta para nossa geração foi captado por Chico e transformado em coloquialismo sem esforço. Vimos melhor e com mais calma o quanto já tínhamos Noel, Haroldo Barbosa, Caymmi, Wilson Batista, Ary, Sinhô, Herivelto. A Revolução Cubana, as pontes de Paris, o cosmopolitismo de Berlim, o requinte e a brutalidade de diversas zonas do continente africano, as consequências de Mao. Chico está em tudo. Tudo está na dicção límpida de Chico. Quando o mundo se apaixonar totalmente pelo que ele faz, terá finalmente visto o Brasil. Sem o amor que eu e alguns alardeamos à nossa raiz lusitana, ele faz muito mais por ela (e pelo que a ela se agrega) do que todos nós juntos.”
quarta-feira, junho 18
junho - dia 18
Um texto dos mais antigos que escrevi aqui acerca do futebol. Intitulei-o de "Após a Derrota", de tantas que fazem parte da actividade humana, do jogo da vida e também do desporto. Nada pior do que não saber aceitar a derrota com as suas penas. Nada pior do que não saber vencer com suas alegrias. Escrevi assim: "Os negócios da imagem (e outros) dominam o fenómeno do futebol contemporâneo, eu sei, mas a imagem dos meus heróis de juventude, que quase pagavam para jogar, colou-se na formação do meu gosto e este jamais o perderei ao contrário do vício de fumar que perdi de um dia para o outro. A beleza do futebol, mesmo após a derrota, tal como a beleza feminina, mesmo sendo produzida (e a beleza não é sempre produzida?), fascina-me e incorpora a minha formação cultural. Não há volta a dar!"
terça-feira, junho 17
segunda-feira, junho 16
junho - dia 16
Hoje foi um dia não para notícias, não que não hajam notícias, todas as antigas e outras novas, os povos da Europa navegando por entre fumos de guerra. Volto a referir a guerra, o Irão oferece uma aliança aos USA na luta contra os insurgentes sunitas no Iraque. Os USA dão sinais de aceitar. Qual será o negócio? A Rússia ameaça o abastecimento de gás à Ucrânia (e à Europa da UE) e a diplomacia da UE aparenta desnorte, qual barata tonta, enquanto todos chatageiam todos, ameaçando em on e off, como se estivéssemos em plena época de manobras bélicas. Hoje numa tribuna de um país de criação portuguesa, o Brasil, nascido da estratégia vencedora da projecção externa de quinhentos, a chanceler alemã, com toda a carga simbólica, aplaudiu a vitória dos seus. Hoje, em Salvador da Baía, não havia quem simbolicamente confortasse os derrotados, no exacto lugar da chegada de Cabral. A primeira capital, coisas sem importância. Honra aos vencidos, glória aos vencedores.
junho - dia 15
Fotografia de Hélder Gonçalves
Continuo a escrever aqui. Para mim é uma coisa normal. Mas passou muito tempo desde que comecei. Apetece-me escrever quando me recolho. É fascinante a página em branco. Nada me obriga. Oiço dizer em muitos lugares que escrever no espaço público é perigoso. Mas não tenho medo de me manifestar, através da opinião, do testemunhar, tomar partido. De forma mais serena e, naturalmente, mais ponderada do que ontem. Mas não ter medo, salvo raras excepções, não é um estado de espírito inato. Resulta de uma aprendizagem na qual as nossas relações com os outros e o mundo nos conformam o ser em construção. Por estes dias viajei pelo sul litoral. O meu olhar reteve uma paisagem natural extraordinariamente bela, o mar beijando a terra sob a lua de prata. A terra florescente nos seus contrastes fascina o olhar mais distraído. Mas a qualidade dos serviços prestados parece ter parado no tempo, senão mesmo regredido. Será uma injustiça generalizar mas parece-me notório que recrudesceu o amadorismo. A maior parte das nossas pequeníssimas empresas (que são quase a totalidade do nosso empresariado), parece à beira de sucumbir. Poupa-se na ração, o animal ameaça morrer.
Continuo a escrever aqui. Para mim é uma coisa normal. Mas passou muito tempo desde que comecei. Apetece-me escrever quando me recolho. É fascinante a página em branco. Nada me obriga. Oiço dizer em muitos lugares que escrever no espaço público é perigoso. Mas não tenho medo de me manifestar, através da opinião, do testemunhar, tomar partido. De forma mais serena e, naturalmente, mais ponderada do que ontem. Mas não ter medo, salvo raras excepções, não é um estado de espírito inato. Resulta de uma aprendizagem na qual as nossas relações com os outros e o mundo nos conformam o ser em construção. Por estes dias viajei pelo sul litoral. O meu olhar reteve uma paisagem natural extraordinariamente bela, o mar beijando a terra sob a lua de prata. A terra florescente nos seus contrastes fascina o olhar mais distraído. Mas a qualidade dos serviços prestados parece ter parado no tempo, senão mesmo regredido. Será uma injustiça generalizar mas parece-me notório que recrudesceu o amadorismo. A maior parte das nossas pequeníssimas empresas (que são quase a totalidade do nosso empresariado), parece à beira de sucumbir. Poupa-se na ração, o animal ameaça morrer.
sábado, junho 14
junho - dia 14
Não sou mais do que um cidadão interessado pelas coisas do mundo. Preocupam-me os sinais de guerra
que em algumas regiões passaram de ameaças a actos. Não me guio pela agenda da comunicação social global e busco contrariar o esquecimento. Li nas notícias do dia que a França e a Alemanha manifestaram preocupação com a situação na Ucrânia. É a Europa à beira da guerra ou a guerra à beira da Europa. Com aparente surpresa os islamitas radicais (sunitas) ameaçam tomar o poder no Iraque. Não foi lançada pelo ocidente imperial uma "guerra santa" contra o poder sunita de Saddam Hussein? Sabem quando foi? Quanto tempo demorou? Quanto custou? Da democracia que lá implantou? Das razões reais e invocadas? Da Síria as trombetas emudeceram! Da Líbia as novas são escassas! A paz sofre tratos de polé do grande conglomerado militar industrial internacional. Seja qual for o lado em que avança vitoriosa uma guerra as armas ostentam as mesmas insígnias. Alguém as vende, alguém as paga, enquanto os povos sofrem! É preciso ouvir com muita atenção as palavras do Papa Francisco.
sexta-feira, junho 13
junho - dia 13
Fotografia de Hélder Gonçalves
Dia de Santo António, feriado em Lisboa, inicio do campeonato do mundo de futebol. Nada de novo a ocidente a não ser tudo o que de novo o nosso tempo anuncia. Sob os nossos pés, tantas vezes sem nos darmos conta, florescem sinais de mudança. O tempo, leal conselheiro, faz o seu trabalho. Muitas injustiças, que a nossos olhos são irreparáveis (e muitas são), reverterão em favor dos injustiçados. As mulheres e os homens de boa vontade, seja qual for a sua condição social, profissão, ideologia, partido, raça ou credo, em suas tarefas e misteres, não temem as dificuldades. As barreiras tantas vezes derrubadas ao longo da história por movimentos que os próprios homens moldaram serão de novo derrubadas. De um a outro campo da vida em comunidade, adversários e correlegionários, entrecuzam-se e disputam o poder. Sempre assim foi em democracia. Nada de novo a ocidente a não ser tudo o que de novo o nosso tempo anuncia.
quinta-feira, junho 12
junho - dia 12
Véspera de Santo António, dia de festa em Lisboa. Só para lembrar que a rendição de Lisboa ocorreu em 21 de Outubro, mas a tomada de Lisboa aos "mouros" deu-se em 25 de Outubro de 1147. Ao calcorrear as ruas de Lisboa, ao sentir a quentura da sua luminosa luz, ao ouvir a grita de suas gentes, mesmo no auge de sua nostalgia, lembremos que esta é uma cidade antiga. Hoje cosmopolita talvez mais do que nunca, a porta maior de abertura de Portugal ao mundo, um porto, um rio, uma mescla de gentes de toda a sorte, ao olhá-la atentamente, com seus claros e escuros, Lisboa ilumina-nos a esperança no futuro.
terça-feira, junho 10
junho - dia 10
Hoje é dia 10 de junho, um dia como outro qualquer, salvo ter sido escolhido faz tempo, não vem ao caso a razão, para Dia de Portugal. Lembrei-me a propósito do dia 10 de junho de 1977, celebrado na Guarda, como este que hoje se celebra. O que me faz lembrar esse longínquo dia é o discurso que nele foi convidado a proferir Jorge de Sena. Estávamos no fim do chamado período revolucionário, haviam ocorrido as eleições presidenciais, tendo sido eleito Ramalho Eanes, e a voz de Sena, tão pouco chamada a ser ouvida fora dos meios literários e académicos, irrompia como uma fagulha que iluminava temas raramente trazidos à praça pública em eventos de natureza politica, ou afins. A partir desse dia passei a ler a obra de Sena de forma sistemática,em particular a poética, que sempre me inspirou. Publiquei, na madrugada de hoje, o discurso de Jorge de Sena, proferido em 10 de junho de 1977, no IRAOFUNDOEVOLTAR porque contém tanta actualidade que até dói. Foi uma das sua últimas intervenções públicas em Portugal, senão a última, pois morreu em 4 de junho de 1978 em Santa Bárbara, Califórnia, onde vivia com sua mulher Mécia (haja saúde) e sua vasta prole.
segunda-feira, junho 9
domingo, junho 8
junho - dia 8
O verão ameaça dar sinal de si por entre os ruídos de todos os perigos que ameaçam a paz na Europa. Abate-se o silêncio acerca da emergência dos extremismos que as eleições europeias revelaram em toda a sua crueldade. Ao solavanco da surpresa sucede-se a acomodação ou o que parece ser a aceitação de uma normalidade que, na verdade, deveria colocar em alerta vermelho os amantes da liberdade. Na falta do pão a primeira tentação dos povos é valorizar a justiça em detrimento da liberdade. A maior tentação de todas as comunidades, em períodos de carência, é menosprezar os valores da liberdade em favor dos da justiça. Um erro que sempre se pagou caro na maior parte das vezes com a eclosão da guerra. É preciso manter o equilíbrio para não nos tornarmos assassinos mesmo quando as vozes se elevam mais alto do que os valores que proclamam.
sexta-feira, junho 6
junho - dia 6
Chove em Lisboa, cheira a verão, não ardem os pinheiros, sempre me lembram os pinheiros, quase à beira mar, e as figueiras do campo de meus avós, e seus saborosos frutos. Hoje celebra-se o 70º aniversário do longínquo dia D, o desembarque na Normandia, que é a batalha emblemática que ditou a derrota do nazi fascismo. Os americanos vieram derramar o seu sangue na Europa, os ingleses resistiram aos bombardeamentos, os franceses desertaram dos seus ideias de liberdade igualdade e fraternidade, deixando ao heroísmo de uma minoria de resistentes a tarefa de resgatar a sua honra, o povo russo, uma vez mais, mostrou que jamais será vencido pelas armas. Na hora que passa semeiam-se sinais de uma nova peste totalitária. Ainda bem que os lideres são capazes de se juntar para celebrar a efeméride.
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