Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
quinta-feira, junho 30
"TORRE DA LIBERDADE"
Imagem e texto do new york on time
Comentários do crítico de arquitetura do New York Times, Nicolai OUroussoff, sobre o monstrengo apresentado ontem como projeto da "Torre da Liberdade" a ser construída (se for) onde ficavam as torres do World Trade Center:
"Sombrio, opressivo e mal concebido, o projeto sugere um monumento a uma sociedade que virou as costas a qualquer noção de abertura cultural. É exatamente o tipo de pesadelo que as autoridades garantiram que nunca aconteceria aqui: uma torre inexpugnável reforçada contra o mundo de fora... A Torre da Liberdade encarna um mundo moldado pelo medo".
quarta-feira, junho 29
Emídio Guerreiro
Na época de todas as mortes. Emídio Guerreiro um lutador pela democracia e pela liberdade. Morreu aos 105 anos. Bem haja.
Biografia Breve - Uma vida em três séculos
Ao longo da sua longa vida, que atravessou três séculos, Emídio Guerreiro assistiu à implantação da República, viu nascer e morrer a ditadura, de que foi um dos mais destacados combatentes, atravessou duas guerras mundiais e participou na construção do regime democrático em Portugal.
Emídio Guerreiro nasceu a 6 de Setembro de 1899, em Guimarães, numa família de ideais republicanos, que acolheria como seus durante toda a vida. Frequentou a Universidade do Porto, onde cursou Matemática, depois de ter lutado como voluntário na I Guerra Mundial - o seu primeiro encontro com a conturbada história do século XX.
Em 1926, um golpe de Estado impõe a ditadura em Portugal, mas a 3 de Fevereiro do ano seguinte Emídio Guerreiro junta-se aos revoltosos que, em vão, tentaram derrubar os golpistas.Em 1928, funda no Porto a loja maçónica "A Comuna", do Grande Oriente Lusitano Unido.
Em 1932, escreve um panfleto contra o então presidente Óscar Carmona, acabando por ser detido, mas um ano depois conseguiria evadir-se, iniciando um exílio que se prolongaria por mais de 40 anos. A primeira paragem é em Espanha, onde dá aulas, mas o início da guerra civil leva-o a combater ao lado das forças republicanas.
Em 1939, com a vitória dos franquistas, fixa-se em França, passando à clandestinidade quando os nazis invadem o país, durante a II Guerra Mundial, tendo sido membro activo da resistência à ocupação alemã. Findo o conflito, Emídio Guerreiro voltou ao ensino de Matemática, desta vez na Academia de Paris.
Na capital francesa, funda em 1967, juntamente com outros exilados políticos, a LUAR, Liga Unificada de Acção Revolucionária, para combater o regime salazarista.
De regresso a Portugal, depois do 25 de Abril, foi um dos fundadores do PPD. Em 1975 foi eleito secretário-geral, tendo liderando o partido durante o período de ausência de Sá Carneiro no estrangeiro, por doença. Deputado à Assembleia Constituinte, viria a afastar-se do PPD, descontente com o rumo que o partido estava a seguir, e nos últimos anos aproximou-se do PS.
Em entrevista ao "Expresso", por ocasião do centenário do seu nascimento, Emídio Guerreiro elegeu a dignidade humana como o ideal que norteou a sua vida.
"Como não pode haver dignidade se não houver liberdade, naturalmente que eu lutei pela liberdade. Lutei contra todos os regimes prepotentes, lutei contra todas as ditaduras", afirmou.
LUSA
A Última das Paixões
No Pentimento ler artigo, em “O Globo”, acerca da polémica entre Camus e Barthes a propósito de “A Peste”. É um clássico.
“A liberdade é a última das paixões individuais. Eis porque é nos nossos dias imoral. Na sociedade e até por si própria, é imoral.”
Camus, in “Cadernos” (por volta de Outubro de 1945)
SILÊNCIO
Apresentando Amoralva - O sabor da poesia
A propósito da greve dos enfermeiros, mais enfermeiras.
Sempre fui muito bem tratado por eles, mais elas que eles. Sempre que, por infortúnio, precisei dos seus cuidados, poucas vezes, graças a deus, só encontrei o lado bom dos homens, no caso, mais das mulheres. Não conheço todos os regimes especiais da função pública que, em Portugal, agora se soube, preto no branco, são muitos e variados.
Mas, salvo muito poucos casos de profissões, absolutamente excepcionais, a luta contra o aumento da idade de reforma é uma luta perdida e inglória. É a lei da vida que se sobrepõe à lei dos homens. Os médicos, mais médicas, e os enfermeiros, mais enfermeiras, sabem disso melhor do que ninguém. Silêncio! A greve é para quê?
terça-feira, junho 28
GARLIC
Garlic [oil on canvas 74 x 63 in]
Lin Chun Yan was born in 1962, China. At 1990 he moved to Australia, and graduated from Sydney University art department at 1994. In 1998, he moved back to Beijing and live there till now. His painting has the Expressionist aspect, he freed his figures, let them fly, stretch into the air, the strokes were thick, and textured, with gesture similar to those in ink painting. He used singular color, pure and bold, very attractive. He painted heads as vegetables, creating highly absurd metaphors.
(Série - Artistas Chineses)
In Tao Water Art Gallery
À MEIA-NOITE, PELO TELEFONE
Foto de Fabiola Narváez
À meia-noite, pelo telefone,
conta-me que é fulva a mata do seu púbis.
Outras notícias
do corpo não quer dar, nem de seus gostos.
Fecha-se em copas:
“Se você não vem depressa até aqui
nem eu posso correr à sua casa,
que seria de mim até ao amanhecer?”
Concordo, calo-me.
Carlos Drummond de Andrade
In “O Amor Natural”
Record
segunda-feira, junho 27
OS HOMENS SÁBIOS ENTENDEM O QUE VAI PASSAR-SE
Porque os deuses sabem dos eventos futuros, e os homens dos eventos presentes. Mas o sábio sabe do que vai passar-se.
Filóstrato, Sobre Apolónio de Tiana, VII,7.
O que acontece agora sabem os mortais,
e o que será um dia os deuses sabem,
os únicos senhores de toda a luz profunda.
Mas o que vai acontecer em breve
o atento sábio sabe. O seu ouvido
às horas do silêncio há que escuta
inquieto e perturbado estranhos sons
que às vezes vêm de eventos que estão prestes.
E respeitosamente atenta neles,
enquanto as gentes fora nada ouvem.
[1915]
Constantino Cavafy
“90 e mais quatro poemas”, tradução de Jorge de Sena
Edições ASA
Margarida Delgado (5)
Vestido – 2 In Sabor a Sal
O corpo visto. Vestido imaginado. O corpo definido. Tomado do ângulo certo. A volúpia do corpo. Dobrado e reflectido. Movimento indefinido. O corpo mais além. O corpo desejado.
POLICIAS
Não me apeteceu escrever nada acerca das manifestações dos policias. Mas reparei nelas. Toda a gente reparou. É para serem reparadas que as manifestações se fazem. São demonstrações. Manifestação e demonstração são mesmo sinónimos.
Eu gosto muito de demonstrações. Quando se faziam contra a ditadura e contra guerra colonial, então nem se fala! E pelos legítimos direitos dos trabalhadores! E pela paz autêntica. Era uma adrenalina maluca quando sabíamos que eles vinham para cima de nós. Quando vinham no nosso encalço e nos perseguiam. Nos batiam com bastões e nos ameaçavam a cavalo ou com cães que espumavam pela boca. Drogados. Os cães.
Os polícias já não são o que eram. Agora são eles que fazem demonstrações. A imaginação ao poder! A primeira demonstração foi uma procissão simulada com um padre a abrir, na frente, o cortejo. A "procissão do ministro morto"! A segunda demonstração foi fardada e ilegal. Digo bem ou digo mal?
Antes fazíamos manifestações apesar das proibições. Agora fazem-se proibições apesar das manifestações. O chefe do sindicalismo policial disse no meio da manifestação ilegal: “agora vale tudo”.
Um dia ainda vamos ter de nos organizar para repor a ordem pública. Colocar os polícias a fazer ordem unida. A desfilar alinhados ao som da música de fanfarra. A ajudar o cidadão indefeso. A dar o exemplo de civilidade e de apego ao cumprimento da lei.
A comunidade, aqueles que trabalham e pagam impostos, os que lutaram pela liberdade, com o sacrifício, às vezes, da sua própria liberdade, e da vida, agradecem a quem de direito que ponha os policias na ordem.
domingo, junho 26
IR PELA SUA MÃO
Fotografia de Om Namah Shivaya
Em memória de meu pai
Ir pela sua mão era caminhar
para um paraíso sem nome,
sonhar uma aventura terna
sabendo de cor o caminho
de regresso a casa a pé
sem guia nem vertigens
Ir pela sua mão aberta
à ternura de mão solitária
era saborear um engano
sem mácula, sobreviver
e nada dever aos outros
que se não pudesse devolver
Ir pela sua mão desarmada
não deixava rasto no chão
e a minha cabeça voava à roda
do meu coração que batia
como agora quando me escapo
à rotina do bater do dia
Ir pela sua mão lembra-me
sempre o dobrar dos dias,
homens tristes de ombros
postos nas esquinas luzidias
esperando taciturnos perder
o sentido do seu próprio corpo
Ir pela sua mão seria partir
do nada ao especial feito,
rasgar um caminho incerto
de mágoas, uma alegria banal,
sagradas confidências guardadas
entre nós que se não confiam
Ir pela sua mão dava acesso
ao mundo, mas ninguém soube
das suas amantes que eu vi,
nem dos gritos do seu olhar
que se abria dolente para mim
pedindo em silêncio aceitação
Eu tudo lhe dei sempre sem pedir
nada em troca, somente por vezes
a sua mão para ir nela confiante
em busca de um caminho qualquer
que não sabia onde levava nem
isso de verdade nada interessava.
(In "Ir pela sua mão" - Maio 2003 - Editora Ausência. Um poema meu, a título excepcional, suscitado pela referência amável do JPN no Respirar o Mesmo Ar)
sábado, junho 25
ANNE BANCROFT
A Tribute to Anne Bancroft [September 17, 1931 – June 6, 2005]
Tenho algures um cromo antigo, daqueles das colecções, com o seu rosto. Deslumbrante pois deixava transparecer mais do que a superficialidade que, injustamente, muitas vezes, se associa às grandes actrizes.
Como diz, hoje, no Expresso, José Cutileiro, “o seu génio histriónico era servido por interesses sociais, grande cultura e uma energia transbordante…” e “Arthur Penn dissera que aconteciam mais coisas na sua cara em dez segundos do que acontecem na cara da maioria das mulheres em dez anos”.
FIGURE
Figure in the Word Series-2 [oil on canvas and wood]
Jiang Hai (b.1961- ), who had been producing shocking pieces for more than twenty years, painted group gigantic paintings. People were amazed that he had energy of a volcano that could endlessly erupt. There were distorted depressed nudes in his paintings. His large strokes were bold and strong, as if exploding out of his heart, layer by layer, from left to right, as chaotic as a knot of entangled hemp with dazzling colors, which produced a strong visual impact. His highly expressionistic paintings were symbolic imageries of his intensive emotions, revealing the conflicts and dilemmas between humanity and the society.
(Série - Artistas Chineses)
In Tao Water Art Gallery
LISBOA
A palavra Lisboa sempre me faz lembrar poesia. As ruas inclinadas e os elevadores, a alta e a baixa, o rio e a serra, as colinas e a melancolia. Tantos poetas que a cantaram e cantam. Tantos perseguidos que nela buscaram amigável refúgio. Os motivos de encantamento de Lisboa estão sempre à frente. As misérias sempre atrás. Que as há. Mas a luz de Lisboa esconde o escuro das vidas sem destino.
Lisboa vai escolher quem a governe, durante 4 anos, a partir de Outubro de 2005. A sondagem, publicada hoje no Expresso, mostra que as eleições autárquicas em Lisboa serão, desde 1989, as primeiras sem coligação de esquerda. Qual o espanto acerca do resultado dessa sondagem? Nenhum!
A esquerda, em Lisboa, é maioritária mas dividida perde. Salvo no dealbar da democracia representativa, logo após o 25 de Abril de 74, sempre assim foi. Nem outra coisa seria de esperar!
A solução do “cada um por si”, adoptada pelos partidos de esquerda, é perdedora à partida. Ainda para mais no actual contexto político geral! Só uma milagrosa votação no PP poderia fazer reverter a situação.
Nem falo do candidato do PS. Estimável. Mas todos os outros são mais fortes, no seu estilo e face à expectativa dos seus eleitorados, do que Carrilho. O erro está a montante. Mas não vale a pena falar disso.
sexta-feira, junho 24
OU ISTO OU AQUILO
Apresentando Om Namah Shivaya
OU ISTO OU AQUILO
Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo em dois lugares!
Ou guardo dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e não guardo o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.
Cecília Meireles
quinta-feira, junho 23
BLAIR
Imagem e mais informação no Tugir
Reproduzo no IR AO FUNDO E VOLTAR, na íntegra, o discurso hoje proferido por Tony Blair no Parlamento Europeu.
Parece-me uma peça importante na actual crise da UE e um indício favorável à sua resolução.
Aqui fica um breve, e significativo, excerto desse discurso:
“Since being Prime Minister I signed the Social Chapter, helped, along with France, to create the modern European Defence Policy, have played my part in the Amsterdam, the Nice, then the Rome Treaties.
This is a union of values, of solidarity between nations and people, of not just a common market in which we trade but a common political space in which we live as citizens.
It always will be.
I believe in Europe as a political project. I believe in Europe with a strong and caring social dimension. I would never accept a Europe that was simply an economic market.”
At Lake Side
At Lake Side [68 x 68 cm. Ink and color on rice paper]
Wu Yang was born 1970 China. 1991 he graduated from Central Academy of Fine Arts with Chinese Painting major. Now he lives in China.
(Série - Artistas Chineses)
In Tao Water Art Gallery
Professores
Fotografia de Pela Lente
Ao longo da minha vida escolar fui aluno e confrontei-me com professores novos e menos novos. Desde a “escola primária”, passando pelo secundário, até à universidade. Tive sorte. Os novos eram, quase todos, muito bons: dizer nomes não adianta mas sempre cito Maria José Espanhol (que será feito?), Luisa Neto Jorge (grande poeta, já falecida), Fiama Hasse Pais Brandão (idem, mas viva), o José Neves (quase até ao fim), Almodoval, Joaquim Magalhães ...
Os novos, por vezes, encantavam pela sua energia. Os velhos, quase sempre, pela sua sabedoria. Hoje um professor é velho aos 55 anos? A experiência adquirida fê-lo perder capacidades? Qual a idade da sabedoria?
Todo o discurso, explícito ou implícito, em favor da reforma antecipada da vida activa, forçada ou voluntária, é falso e eivado de hipocrisia. Os professores quanto mais velhos mais capazes para ensinar. Caso contrário estaremos perante um mundo às avessas. E não me venham argumentar com a escola democrática e multicultural, de hoje, como se fosse um campo de batalha! A escola, mesmo elitista, sempre foi (e é) um campo de batalha.
Pois não é nela que se realiza o confronto entre a ignorância e o saber. Entre a impulsividade própria da juventude e a paciência própria da maturidade. Entre culturas diversas, etnias e sensibilidades. A escola é o lugar do encontro de todas as expectativas, frustrações, sentimentos, paixões, ódios, desejos, arrebatamentos, saberes e ignorâncias.
Difícil? Mas alguma grande obra que envolva toda a sociedade na batalha do conhecimento é fácil?
quarta-feira, junho 22
MORTOS MAS FELIZES
Apresentando a Mega Fauna
Discutem-se muitas coisas interessantes a propósito da administração a partir das iniciativas do governo. Uma das questões que mais se discute é a idade da reforma. Desde 1996 que escrevi diversos textos acerca da questão do “envelhecimento demográfico”.
Sempre foi claro para mim e para qualquer um, que tenha um mínimo de senso, que a idade de reforma tem de aumentar. Sabem que, por exemplo, os professores do 1º ciclo (antigos “professores primários”) se podem reformar com 30 anos de serviço e 55 anos de idade? Ou com 32 anos de serviço e 52 anos de idade?
Com pensões superiores às remunerações dos professores e técnicos no topo das carreiras e que permanecem no activo? Como a maior parte são professoras isto representa simplesmente que estarão, em média, 30 anos na reforma, ou seja, o mesmo número de anos que estiveram no activo.
Acham possível manter esta situação? Razoável no plano da solidariedade intergeracional? Viável no plano financeiro? Justa no plano social? Mas não pensem que se tratam de casos pontuais, desiludam-se. São mesmo em número muito elevado.
Para que não fiquemos todos sós no deserto, mortos mas felizes, talvez seja de pensar em trabalhar até um pouco mais tarde. Eu penso assim e vi que, por exemplo, o Galopim de Carvalho, numa entrevista recente, pensava da mesma maneira.
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