Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
sábado, maio 31
NA MORTE DE MARILYN
Morreu a mais bela mulher do mundo
tão bela que não só era assim bela
como mais que chamar-lhe marilyn
devíamos mas era reservar apenas para ela
o seco sóbrio simples nome de mulher
em vez de marilyn dizer mulher
Não havia no fundo em todo o mundo outra mulher
mas ingeriu demasiados barbitúricos
uma noite ao deitar-se quando se sentiu sozinha
ou suspeitou que tinha errado a vida
ela de quem a vida a bem dizer não era digna
e que exibia vida mesmo quando a suprimia
Não havia no mundo uma mulher mais bela mas
essa mulher um dia dispôs do direito
ao uso e ao abuso de ser bela
e decidiu de vez não mais o ser
nem doravante ser sequer mulher
O último dos rostos que mostrou era um rosto de dor
um rosto sem regresso mais que rosto mar
e toda a confusão e convulsão que nele possa caber
e toda a violência e voz que num restrito rosto
possa o máximo mar intensamente condensar
Tomou todos os tubos que tinha e não tinha
e disse à governanta não me acorde amanhã
estou cansada e necessito de dormir
estou cansada e é preciso eu descansar
Nunca ninguém foi tão amado como ela
nunca ninguém se viu envolto em semelhante escuridão
Era mulher era a mulher mais bela
mas não há coisa alguma que fazer se certo dia
a mão da solidão é pedra em nosso peito
Perto de marilyn havia aqueles comprimidos
seriam solução sentiu na mão a mãe
estava tão sozinha que pensou que a não amavam
que todos afinal a utilizavam
que viam por trás dela a mais comum imagem dela
a cara o corpo de mulher que urge adjectivar
mesmo que seja bela o adjectivo a empregar
que em vez de ver um todo se decida dissecar
analisar partir multiplicar em partes
Toda a mulher que era se sentiu toda sozinha
julgou que a não amavam todo o tempo como que parou
quis ser atá ao fim coisa que mexe coisa viva
um segundo bastou foi só estender a mão
e então o tempo sim foi coisa que passou.
Ruy Belo
Transporte No Tempo
Editorial Presença
quarta-feira, maio 28
A minha cabeça está baralhada
"A minha cabeça está baralhada
Sobre um determinado trabalho, sobre um determinado assunto (habitualmente aqueles sobre os quais se fazem dissertações), sobre um determinado dia de vida, gostaria ele de colocar como divisa este dito de comadre: a minha cabeça está baralhada (imaginemos uma língua na qual o jogo das categorias gramaticais obrigasse por vezes o sujeito a enunciar-se sob as vestes de uma velha).
E, todavia, ao nível do seu corpo, nunca sente a cabeça baralhada. (…)
Sente por vezes vontade de deixar repousar toda essa linguagem que tem na cabeça, no trabalho, nos outros, como se a própria linguagem fosse um membro cansado do corpo humano; parece-lhe que, se descansasse da linguagem, descansaria completamente, pelo feriado dado às crises, às repercussões, às exaltações, às feridas, às razões, etc. Vê a linguagem sob os traços duma velha mulher cansada (algo como uma antiga mulher-a-dias de mãos gastas) que suspira por uma certa aposentação”.
"Roland Barthes por Roland Barthes"
Edição portuguesa: "Edições 70"
E, todavia, ao nível do seu corpo, nunca sente a cabeça baralhada. (…)
Sente por vezes vontade de deixar repousar toda essa linguagem que tem na cabeça, no trabalho, nos outros, como se a própria linguagem fosse um membro cansado do corpo humano; parece-lhe que, se descansasse da linguagem, descansaria completamente, pelo feriado dado às crises, às repercussões, às exaltações, às feridas, às razões, etc. Vê a linguagem sob os traços duma velha mulher cansada (algo como uma antiga mulher-a-dias de mãos gastas) que suspira por uma certa aposentação”.
"Roland Barthes por Roland Barthes"
Edição portuguesa: "Edições 70"
segunda-feira, maio 26
Ruy Belo - ...tu és em cada gesto todos os teus gestos
“...tu és em cada gesto todos os teus gestos
e neste momento eu sei eu sinto ao certo o que significam certas palavras como a palavra paz
Deixa-te estar aqui perdoa que o tempo te fique na face na forma de rugas perdoa pagares tão alto preço por estar aqui
prossegue nos gestos não pares procura permanecer sempre presente
deixa docemente desvanecerem-se um por um os dias
e eu saber que aqui estás de maneira a poder dizer
sou isto é certo mas sei que tu estás aqui”
Ruy Belo
in “Toda a Terra”
e neste momento eu sei eu sinto ao certo o que significam certas palavras como a palavra paz
Deixa-te estar aqui perdoa que o tempo te fique na face na forma de rugas perdoa pagares tão alto preço por estar aqui
prossegue nos gestos não pares procura permanecer sempre presente
deixa docemente desvanecerem-se um por um os dias
e eu saber que aqui estás de maneira a poder dizer
sou isto é certo mas sei que tu estás aqui”
Ruy Belo
in “Toda a Terra”
sexta-feira, maio 23
VOTAR - DE NOVO
Tenho escrito sempre na véspera de eleições desde que frequento estes espaços de comunicação - vulgo redes sociais - por dever de consciência. Faço parte daquele grupo de eleitores, que os especialistas na matéria devem qualificar de uma forma qualquer, fiéis a um ideário. Nada que me incomode ou associe, de mim para comigo, a um qualquer imobilismo ou letargia acrítica. A propósito destas eleições europeias tenho-me lembrado, com frequência, da experiência de candidato, independente nas listas do PS, às eleições legislativas de 1985. Ainda no decurso de um período de dura politica de austeridade, dirigida por um governo PS, nas vésperas da adesão à CEE, ser candidato foi mais do que uma maçada, foi um risco físico, à beira de apanhar pancada vinda de enfurecidos, mas pacatos, cidadãos que anunciavam a pior votação de sempre no PS. É como em tudo na vida, umas vezes em baixo outras em cima. Para dizer que, desde que o misterioso e distinto MES, acabou para as lides eleitorais, sempre votei no PS. Para ganhar ou perder é uma manifestação de fidelidade que acalento desde a adolescência. Assim seja!
quinta-feira, maio 22
quarta-feira, maio 21
O COELHINHO QUE NASCEU NUMA COUVE
Era uma vez um coelhinho que nasceu numa couve.
Como os pais do coelhinho nunca mais aparecessem a couve passou a cuidar dele como se do seu próprio filho se tratasse. Com ervinhas tenras que cresciam ao seu redor a couve foi criando o coelhinho dentro do seu seio até que este passou a procurar a sua própria alimentação. O coelhinho, que tinha um coração muito bondoso, retribuindo o afecto que a couve lhe dedicava considerava-a como sua verdadeira mãe. A mãe couve e o seu filhinho adoptivo foram vivendo muito felizes até que um dia uma praga de gafanhotos se abateu sobre aquelas terras. O coelhinho ao ver que aqueles insectos vorazes devoravam tudo o que era verde cobriu com o seu próprio corpo o corpo da mãe couve e assim conseguiu que os gafanhotos pouco dano lhe fizessem. Quando aqueles insectos daninhos levantaram voo os campos em volta passaram a ser um imenso deserto de areias e pedra. O pobre coelhinho, que sempre tinha vivido nas proximidades da sua mãe couve, teve de deslocar-se para muitos quilómetros de distância a fim de procurar comida.Mas já nada havia que se pudesse mastigar naquelas terras. Passaram muitos dias e o pobre coelhinho estava cada vez mais magro mais magro e faminto. Então a mãe couve disse-lhe assim: “Ouve meu filho: é a lei da vida que os velhos têm de dar o lugar aos novos, por isso só vejo uma solução: assim como tu viveste durante algum tempo no meu seio, passarei a ser eu agora a viver dentro do teu. Compreendes, meu filho, o que eu quero dizer?” O pobre coelhinho compreendeu e, embora com grande tristeza na alma não teve outro remédio, comeu a mãe.
Pedro Oom
IN “2 HISTÓRIAS PARA CRIANÇAS (EMANCIPADAS) QUE ILUSTRAM A DIFERENÇA ENTRE O AMOR FILIAL E O AMOR CONJUGAL” (Também magistralmente dito por Mário Viegas em Humores, 1980)
Actuação Escrita, edição & etc (1980)
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PEDRO OOM
Francisco Pedro dos Santos Oom do Vale nasceu em Santarém, a 24 de Junho de 1926.
Aos 2 anos acompanha a família para Setúbal e a partir dos 11 fixa-se em Lisboa. A aspiração do pai a que ingressasse no Colégio Militar nunca foi cumprida pois Pedro Oom se recusou.
Ingressa na Escola António Arroio onde conheceu Júlio Pomar, Vespeira, Mário Cesariny, Cruzeiro Seixas e outros que viriam a aderir ao surrealismo.
Aos 24 anos, órfão de pais, ingressa no INE, como funcionário público, onde segue uma carreira desconcertante de disciplina em relação ao período anterior da sua vida e um “interregno”, afastando-se de toda a actividade artística e literária ligada ao surrealismo.
Dedicou-se, entretanto, com entusiasmo, ao xadrez modalidade na qual se distinguiu.
Em 1962 dá por finda a sua vida de funcionário público, sai do INE, reingressando, dois anos passados, desta vez, no Ministério da Educação onde se dedicou a estudos de estatística sobre o ensino.
A sua obra literária, poética e panfletária, ficou dispersa sendo impregnada de uma ironia que vai dos tons mais violentos da contestação à mordacidade pessoal.
Morreu no dia 26 de Abril de 1974, pelas duas e trinta da tarde, no Restaurante “13” quando, com alguns amigos, festejava os acontecimentos que então se viviam apaixonadamente.
A sua obra foi publicada em dois volumes sob o título “Actuação Escrita” pelas Edições & etc de cujas “notas biográficas” se respigou o presente texto.
domingo, maio 18
sábado, maio 17
sexta-feira, maio 16
NORMALIDADE
Fotografia de Hélder Gonçalves
quinta-feira, maio 15
AÇORES
Ontem fui a Ponta Delgada em viagem profissional. Os Açores no seu conjunto e, em particular, a ilha de São Miguel são um paraíso na terra. Lugar de excepção, apesar dos elevados índices de pobreza e desigualdade. A maioria das estradas, ruas, caminhos, são tão bem cuidados, seja quem for os cuida, que impressiona o mais distraído. Tudo em aberto para o progresso humano após tamanhos avanços na área das infraestruturas. Que se continue a proteger o ambiente quase no limite do fundamentalismo na crista da insularidade. Resiste a imprensa regional, modernizando-se como o Açoriano Oriental. Com esperança nos novos tempos que surgirão no horizonte útil das nossas vidas.
domingo, maio 11
sexta-feira, maio 9
quinta-feira, maio 8
DIAS DIFÍCEIS (3)
A vida é feita de pequenas coisas, pequenos nadas, a mão que adormece, uma pontada no corpo, uma falta inesperada, um desgosto por nada, uma doença por perto, tirar sangue para análise, ficar desapontado, engolir em seco, ver ganhar quem se gosta, ver perder quem se ama, uma fala inoportuna, o suor, uma lágrima, a fruta que apodrece, o pão que acaba, o sono que não vem, o dinheiro que falta, o imposto cresceu, o menino adormece, o homem do círculo (de leitores), a notícia mil vezes repetida, a dor nas costas, a cadeira predileta, o sofá que se disputa; no meio de tudo, dos pequenos nadas, uma disputa imensa, a casa grande onde cabem todos, a luta por vencer, uma opinião, a sociedade aberta, os pequenos nadas, a hora da grande decisão. Os pequenos nadas, sem medo, mudam de qualidade, fundem-se, resistem. Connosco tudo acontece, aos outros nada acontece. Na hora acertada todos os pequenos nadas fazem sentido. Conhecemos-mos pelo olhar dos outros. Desassossegam-se nossos passos. Unos e plurais, Sempre, Rendidos jamais.
quarta-feira, maio 7
DIAS DIFÍCEIS (2)
Não é difícil dar-mo-nos conta de estar a viver em período pré eleitoral. Deve acontecer o mesmo com todos os cidadãos nos restantes 26 países da UE. As eleições banalizaram-se, uma coisa boa. As eleições institucionalizaram-se, uma coisa banal. Quatro décadas atrás, em Portugal, as eleições, livres e democráticas, foram uma novidade e lembro-me de meus pais terem vestido os melhores trajes no dia do voto, das longas filas de espera à porta das urnas, do ar feliz da multidão surpreendendo-se ao encarar no ato civico de votar a concretização de uma aspiração desaprendida. A maioria nunca havia votado senão uma meia dúzia, incluindo democratas, nos simulacros eleitorais do antigo regime. Vem esta prosa a propósito do que podemos designar da "fadiga eleitoral" do nosso tempo, revelada pelo crescente abstencionismo, perda de energia no ato da escolha, moda na descrença nos políticos ("são todos iguais!"), frustração de expectativas por promessas não cumpridas, o que se sabe ... que a maioria diz, ou pensa e não diz, mantendo, no entanto, uma sábia reserva de esperança em mudanças que abram caminho à reinvenção da democracia representativa. Não é tarefa fácil reinventar o sufrágio universal, essa criação extraordinária que permite dar voz, através do voto, a todos os cidadãos em liberdade e igualdade. É tempo de não perder de vista o essencial, o voto. O vazio criado pela omissão das escolhas abre as portas aos messias de todos os tempos.
segunda-feira, maio 5
DIAS DIFÍCEIS
Dias difíceis no vendaval de uma espécie de anúncio de armistício na austeridade que o tempo dirá da espessura e sustentabilidade. É o que se discute, ou seja, o significado politico, e as consequências para a comunidade nacional, do encerramento formal de um pequeno ciclo de assumpção de politicas de austeridade. O que me preocupa, mais que tudo, é a pulsão que paira acerca da bondade do debate público aberto, do confronto de ideias, que tende a constranger a construção e apresentação de alternativas. Como se as soluções para os problemas nacionais pudessem ser forjados a golpes de espada e não através do confronto aberto de ideias. Os sinais que nos chegam de fora não são animadores. Os populismos de cariz fascista, no caso da Europa, de forma surpreendente para os menos atentos, alargam a sua base de apoio e ameaçam ganhar eleições. Basta ver quer as ameaças de guerra na Ucrânia, com seu cortejo de manifestações populistas de direita, quer as sondagens tendo em vista as eleições para o Parlamento Europeu, em França e Inglaterra, que apontam para a possível vitória de partidos de cariz fascista como sempre enfeitados com seus apelos ultra nacionalistas, xenófobos e racistas. Todo um ambiente de tempestade perfeita - politica, económica e financeira - prenúncio de guerra. Os democratas não podem debandar da sua luta, nem deixar aberto o campo às aventuras dos inimigos da liberdade. É o tempo de juntar forças.
Fotografia de Hélder Gonçalves
sábado, maio 3
25 de ABRIL- 25 de abril - 40 anos, 82
Fotografia de Hélder Gonçalves
Deixo que a palavra
tão incerta
teça
a liberdade a meio
deste Abril
para que a memória em Portugal não esqueça
tomando da flor
o cravo na matriz
teimando que a paixão
a tudo vença
dizendo não àquilo
que não quis
Maria Teresa Horta
Março 99
sexta-feira, maio 2
APENAS ISSO - 25 de abril - 40 anos, 81
Fotografia de Hélder Gonçalves
Dai-me ainda outro verão,
um verão do sul, redondo
lento maduro; um verão
de rolas frementes de cio,
de porosa alegria, de luz varrida
pela cal; dai-me
mais um verão rente à sombra
do pátio onde um rumor
cativo do poço sobe aos ramos;
um verão
limpo como o céu da boca;
mais dentro, mais fundo.
Ou por fim o silêncio.
Caindo a prumo.
Foz do Douro, 8/1/99
quinta-feira, maio 1
BREVE OLÊNCIA - 25 de abril - 40 anos, 80
Fotografia de Hélder Gonçalves
Estão cerrados todos os jardins,
onde asas voaram e se romperam as pedras.
Como esquecer as estrelas pousadas no verão
e a ciência exacta das flores claras de ar?
Estão cerrados todos os jardins,
queimados da fome, escarlates de treva.
Que tempo esvoaça, lacuna ou máscara,
pelo lento longo suor das noites?
Estão cerrados todos os jardins,
hoje ervas sem pálpebras, gritos sem boca.
Cativeiros de estátuas, deixaram que o tempo
durasse muito tempo, em campo entardecido.
Estão cerrados todos os jardins,
Em palavras vendidas que esconderam o mundo.
Os olhos ruídos soam a sombra
nos risos sem riso, nos corações calados.
Estão cerrados todos os jardins.
A pele cresce, digerimos o vazio.
As palavras articulam-se de ossos.
Mudada em terra, toda água morrerá.
Estão cerrados todos os jardins
e seus lazeres felinos, seus salmos de pé.
É a hora surda de cicatrizes sem beijos,
de muros soterrados e pulsos incolores.
Estão cerrados todos os jardins
e vão nascendo dólmenes e corujas de ouro.
Porque se agita ainda a cauda dos peixes,
buscando fogos extintos no termo dos rios?
Estão cerrados todos os jardins.
A nada a alma se assemelha.
O mar perdeu-se contra as paredes.
Vivemos do que não pudemos viver.
Estão cerrados todos os jardins,
são antigas as novidades do mundo,
obedecemos a ordens, a norte do futuro.
Mas ainda estamos nus. E respiraremos.
Orlando Neves
Estão cerrados todos os jardins,
onde asas voaram e se romperam as pedras.
Como esquecer as estrelas pousadas no verão
e a ciência exacta das flores claras de ar?
Estão cerrados todos os jardins,
queimados da fome, escarlates de treva.
Que tempo esvoaça, lacuna ou máscara,
pelo lento longo suor das noites?
Estão cerrados todos os jardins,
hoje ervas sem pálpebras, gritos sem boca.
Cativeiros de estátuas, deixaram que o tempo
durasse muito tempo, em campo entardecido.
Estão cerrados todos os jardins,
Em palavras vendidas que esconderam o mundo.
Os olhos ruídos soam a sombra
nos risos sem riso, nos corações calados.
Estão cerrados todos os jardins.
A pele cresce, digerimos o vazio.
As palavras articulam-se de ossos.
Mudada em terra, toda água morrerá.
Estão cerrados todos os jardins
e seus lazeres felinos, seus salmos de pé.
É a hora surda de cicatrizes sem beijos,
de muros soterrados e pulsos incolores.
Estão cerrados todos os jardins
e vão nascendo dólmenes e corujas de ouro.
Porque se agita ainda a cauda dos peixes,
buscando fogos extintos no termo dos rios?
Estão cerrados todos os jardins.
A nada a alma se assemelha.
O mar perdeu-se contra as paredes.
Vivemos do que não pudemos viver.
Estão cerrados todos os jardins,
são antigas as novidades do mundo,
obedecemos a ordens, a norte do futuro.
Mas ainda estamos nus. E respiraremos.
Orlando Neves
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