Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
sábado, agosto 4
Valentina Lisitsa
Filmed live at The Royal Albert Hall June 19th 2012
ALEXANDER SCRIABIN 1872--1915
2 Poèmes, op.32
i. Andante cantabile
À DOUTA ATENÇÃO DO BANCO DE PORTUGAL
Durante quase três décadas, o meu pai foi gerente, em Vila Real, de uma das filiais distritais da Caixa Geral de Depósitos, instituição em que trabalhou, com imenso orgulho e insuperável dedicação, 47 anos da sua vida. A Caixa era também a sua família e ainda recordo a alegria que lhe dei quando, em 1971, sem o avisar, fiz concurso e fui admitido como funcionário da Caixa - aquele que foi o meu primeiro emprego.
Durante muitas décadas, a Caixa foi o banco popular de Portugal. Era à Caixa, porque a Caixa era do Estado, que as pessoas mais simples confiavam os seus haveres. A Caixa tinha "cadernetas" escritas à mão, onde era inscritos os juros e registados os saldos. Os depositantes compraziam-se em passar pelo balcão da Caixa, para fazer esse acrescento regular, que lhes assegurava "quanto tinham na Caixa".
O meu pai recordava, às vezes, uma pequena história.
Um dia, um funcionário veio avisá-lo de que um cliente, depois de ter pedido para "atualizar a caderneta", informou que queria levantar todo o dinheiro que tinha na sua conta, em espécie. Tratava-se de um montante bastante elevado e, até por razões de segurança, era um pouco estranho que o cliente quisesse transportar o dinheiro dessa forma. Estaria o homem insatisfeito com o serviço prestado pela Caixa?
O meu pai mandou entrar o cliente para o seu gabinete. Era um homem muito simples, residente numa aldeia próxima de Vila Real, idêntico a uma imensidão de outros clientes oriundos das áreas rurais, que constituiam uma grande massa dos depositantes na Caixa. Perante a estranheza manifestada, pela inusitada (e até arriscada) operação que ele pretendia executar, o homem respondeu: "O dinheiro é ou não é meu? Posso ou não posso fazer com ele o que me apetecer? Quero levantá-lo todo e já!". Perante esta inabalável determinação, o meu pai mandou preparar grandes envelopes com as notas, que foram entregues ao cliente. Após receber o dinheiro, o homem perdeu largos minutos a contar todas as notas. No final, disse: "Agora, quero depositar isto tudo outra vez. Foi só para saber se o dinheiro ainda era meu!". E era, claro.
Lembrei-me disto, na tarde de hoje, também na Caixa, também em Vila Real, quando assisti ao drama de uma pobre senhora de aldeia, a dona Celeste, confrontada com a impossibilidade de resgate do montante de um "produto" em que, há alguns anos, tinha sido convencida a empregar alguns largos milhares de euros e que, agora, se via impossibilitada de levantar, sem perder uma importante fatia do próprio capital. Fui testemunha por largos e pungentes minutos do embaraço delicado dos funcionários, dos lamentos lancinantes da senhora, seguidos do seu desmaio, com hipótese de convocação do 112. Um espetáculo triste, penoso e indigno, que incomodou quem a ele assistiu. Que não sei mesmo como acabou, porque, logo que pude, saí, indignado.
Quem terá sido o funcionário espertalhote que vendeu à dona Celeste o "produto", em cujo "small print" estavam (espero eu!) as condicionantes limitativas das possibilidades de resgate? Aquele que o fez impingiu àquela pobre senhora, que tinha uma evidente limitação cultural para entender as peculiaridades da evolução financeira dos mercados, um "produto" em que enterrou muitos dos seus haveres. E, goste-se ou não da palavra, essa pessoa incorreu, na prática, numa verdadeira fraude. Ela e, com ela, a Caixa Geral de Depósitos, instituição onde também eu tenho as minhas economias e que, por ser propriedade do Estado, sempre tive por um banco diferente, onde tinha a certeza que os clientes nunca seriam tratados assim. Enganei-me, pelos vistos.
Se fosse vivo, e se tivesse assistido a esta lamentável cena, o meu pai teria hoje sentido uma imensa tristeza, idêntica à que eu próprio experimentei. Mas ele já morreu, como também já parece ter desaparecido aquela Caixa Geral de Depósitos que foi o seu orgulho, em que as pessoas mais simples deste país, por muitos anos, se habituaram a confiar.
Durante muitas décadas, a Caixa foi o banco popular de Portugal. Era à Caixa, porque a Caixa era do Estado, que as pessoas mais simples confiavam os seus haveres. A Caixa tinha "cadernetas" escritas à mão, onde era inscritos os juros e registados os saldos. Os depositantes compraziam-se em passar pelo balcão da Caixa, para fazer esse acrescento regular, que lhes assegurava "quanto tinham na Caixa".
O meu pai recordava, às vezes, uma pequena história.
Um dia, um funcionário veio avisá-lo de que um cliente, depois de ter pedido para "atualizar a caderneta", informou que queria levantar todo o dinheiro que tinha na sua conta, em espécie. Tratava-se de um montante bastante elevado e, até por razões de segurança, era um pouco estranho que o cliente quisesse transportar o dinheiro dessa forma. Estaria o homem insatisfeito com o serviço prestado pela Caixa?
O meu pai mandou entrar o cliente para o seu gabinete. Era um homem muito simples, residente numa aldeia próxima de Vila Real, idêntico a uma imensidão de outros clientes oriundos das áreas rurais, que constituiam uma grande massa dos depositantes na Caixa. Perante a estranheza manifestada, pela inusitada (e até arriscada) operação que ele pretendia executar, o homem respondeu: "O dinheiro é ou não é meu? Posso ou não posso fazer com ele o que me apetecer? Quero levantá-lo todo e já!". Perante esta inabalável determinação, o meu pai mandou preparar grandes envelopes com as notas, que foram entregues ao cliente. Após receber o dinheiro, o homem perdeu largos minutos a contar todas as notas. No final, disse: "Agora, quero depositar isto tudo outra vez. Foi só para saber se o dinheiro ainda era meu!". E era, claro.
Lembrei-me disto, na tarde de hoje, também na Caixa, também em Vila Real, quando assisti ao drama de uma pobre senhora de aldeia, a dona Celeste, confrontada com a impossibilidade de resgate do montante de um "produto" em que, há alguns anos, tinha sido convencida a empregar alguns largos milhares de euros e que, agora, se via impossibilitada de levantar, sem perder uma importante fatia do próprio capital. Fui testemunha por largos e pungentes minutos do embaraço delicado dos funcionários, dos lamentos lancinantes da senhora, seguidos do seu desmaio, com hipótese de convocação do 112. Um espetáculo triste, penoso e indigno, que incomodou quem a ele assistiu. Que não sei mesmo como acabou, porque, logo que pude, saí, indignado.
Quem terá sido o funcionário espertalhote que vendeu à dona Celeste o "produto", em cujo "small print" estavam (espero eu!) as condicionantes limitativas das possibilidades de resgate? Aquele que o fez impingiu àquela pobre senhora, que tinha uma evidente limitação cultural para entender as peculiaridades da evolução financeira dos mercados, um "produto" em que enterrou muitos dos seus haveres. E, goste-se ou não da palavra, essa pessoa incorreu, na prática, numa verdadeira fraude. Ela e, com ela, a Caixa Geral de Depósitos, instituição onde também eu tenho as minhas economias e que, por ser propriedade do Estado, sempre tive por um banco diferente, onde tinha a certeza que os clientes nunca seriam tratados assim. Enganei-me, pelos vistos.
Se fosse vivo, e se tivesse assistido a esta lamentável cena, o meu pai teria hoje sentido uma imensa tristeza, idêntica à que eu próprio experimentei. Mas ele já morreu, como também já parece ter desaparecido aquela Caixa Geral de Depósitos que foi o seu orgulho, em que as pessoas mais simples deste país, por muitos anos, se habituaram a confiar.
sexta-feira, agosto 3
Deixar uma marca
Nestes primeiros dias de agosto ensaiarei um regresso à escrita - quase sem imagens - neste espaço, criado em 19 de dezembro de 2003, com o texto que reproduzo de seguida:
Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
nada dever ao esquecimento que esvazia o sentido do perdão olhando o mundo e tomando a medida exacta da nossa pequenez,
atravessar a solidão, esse luxo dos ricos, como dizia Camus, usufruindo da luz que os nossos amantes derramam em nós porque por amor nos iluminam,
observar atentos o direito e o avesso, a luz e a sombra, a dor e a perda, a charrua e a levada de água pura, crer no destino e acreditar no futuro do homem,
louvar a Deus as mãos que nos pegam, e nunca deixam de nos pegar, mesmo depois de sucumbirem injustamente à desdita da sorte ou à lei da vida,
guardar o sangue frio perante o disparar da veia jugular ou da espingarda apontada à fronte do combatente irregular,
incensar o gesto ameno e contemporizador que se busca e surge isento no labirinto da carnificina populista,
ousar a abjecção da tirania, admirar a grandeza da abdicação e desejar a amizade das mulheres,
admirar a vista do mar azul frente à terra atapetada de flores de amendoeira em silêncio e paz.
(um programa para o absorto)
Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
nada dever ao esquecimento que esvazia o sentido do perdão olhando o mundo e tomando a medida exacta da nossa pequenez,
atravessar a solidão, esse luxo dos ricos, como dizia Camus, usufruindo da luz que os nossos amantes derramam em nós porque por amor nos iluminam,
observar atentos o direito e o avesso, a luz e a sombra, a dor e a perda, a charrua e a levada de água pura, crer no destino e acreditar no futuro do homem,
louvar a Deus as mãos que nos pegam, e nunca deixam de nos pegar, mesmo depois de sucumbirem injustamente à desdita da sorte ou à lei da vida,
guardar o sangue frio perante o disparar da veia jugular ou da espingarda apontada à fronte do combatente irregular,
incensar o gesto ameno e contemporizador que se busca e surge isento no labirinto da carnificina populista,
ousar a abjecção da tirania, admirar a grandeza da abdicação e desejar a amizade das mulheres,
admirar a vista do mar azul frente à terra atapetada de flores de amendoeira em silêncio e paz.
(um programa para o absorto)
quinta-feira, agosto 2
quarta-feira, agosto 1
Verdi' Requiem
Proms 2011 - Prom 13 - Broadcast on BBC 4
Original concert on 24 July 2011 - Broadcast on 21 August 2011
Verdi's Requiem
Marina Poplavskaya - soprano
Mariana Pentcheva - mezzo-soprano
Joseph Calleja - tenor
Ferruccio Furlanetto - bass
BBC Symphony Chorus
BBC National Chorus of Wales
London Philharmonic Choir
BBC Symphony Orchestra
Semyon Bychkov - conductor
terça-feira, julho 31
Hélène Tysman
The Symphony Orchestra of the Liszt School Of Music (Conductor: Prof. Nicolás Pasquet) plays Maurice Ravels Piano concerto for the left hand, which he composed 1929 for austrian pianist Paul Wittgenstein who lost his right arm during WW I. On the piano Hélène Tysman (29) who finishes her final exam at the Liszt School with this concert.
segunda-feira, julho 30
domingo, julho 29
sábado, julho 28
quinta-feira, julho 26
quarta-feira, julho 25
terça-feira, julho 24
segunda-feira, julho 23
domingo, julho 22
sábado, julho 21
sexta-feira, julho 20
quarta-feira, julho 18
terça-feira, julho 17
segunda-feira, julho 16
domingo, julho 15
sábado, julho 14
sexta-feira, julho 13
quinta-feira, julho 12
quarta-feira, julho 11
terça-feira, julho 10
segunda-feira, julho 9
domingo, julho 8
sábado, julho 7
quinta-feira, julho 5
quarta-feira, julho 4
terça-feira, julho 3
segunda-feira, julho 2
domingo, julho 1
sábado, junho 30
terça-feira, junho 26
domingo, junho 24
sexta-feira, junho 22
quinta-feira, junho 21
quarta-feira, junho 20
terça-feira, junho 19
segunda-feira, junho 18
domingo, junho 17
quinta-feira, junho 14
quarta-feira, junho 13
domingo, junho 10
sábado, junho 9
sexta-feira, junho 8
quarta-feira, junho 6
terça-feira, junho 5
segunda-feira, junho 4
domingo, junho 3
sábado, junho 2
sexta-feira, junho 1
quarta-feira, maio 30
terça-feira, maio 29
segunda-feira, maio 28
domingo, maio 27
sábado, maio 26
quinta-feira, maio 24
quarta-feira, maio 23
terça-feira, maio 22
segunda-feira, maio 21
domingo, maio 20
quinta-feira, maio 17
quarta-feira, maio 16
terça-feira, maio 15
segunda-feira, maio 14
domingo, maio 13
sábado, maio 12
quinta-feira, maio 10
quarta-feira, maio 9
terça-feira, maio 8
segunda-feira, maio 7
domingo, maio 6
NO DIA DE UMA QUASE CERTA MUDANÇA POLÍTICA EM FRANÇA
Fotografia de Albert Lemoine
A Europa e o mundo vivem sob o espectro de uma crise financeira, energética e alimentar. Três choques, em simultâneo, que põem em risco o equilíbrio em que assenta o mundo do pós guerra. Os chamados países emergentes, com a China à cabeça, estão no centro da crise. Esses países passaram de sociedades miseráveis a sociedades de consumo. A China é como uma fogueira gigante que consome crescentes recursos que afluem de todo o mundo e, ao mesmo tempo, alimenta outras fogueiras que, de igual modo, consomem mais do que a humanidade é capaz de produzir. Entramos numa nova fase da vida das nações que exigirá mudanças profundas também nas estruturas das instituições internacionais. A questão: como gerir essas mudanças sem guerra?
[7/5/2008]
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