Só hoje li a revista “Única”, “Expresso” do passado sábado, cuja capa eu já tinha visto na versão “on line” mas sem acesso ao texto pois não dou um tostão para o peditório do tio Balsemão. Tinha reparado na fotografia do Eduardo Barroso e no título “Um cirurgião de elite” muito ao género das manchetes dos jornais dos países civilizados.
Pelas minhas colegas – jovens, sorridentes e pró activas – fiquei a saber que tive direito, na entrevista, a uma referência a propósito da infeliz passagem de Barroso pelo MES da qual, paradoxalmente, só me lembro da Helena Salvador, sua primeira mulher.
É a pura da verdade e acho mesmo que nunca falei, nos dias da minha vida, com o Eduardo Barroso. Com a Helena sim: uma mulher criativa e cativante que integrou uma estrutura do MES que eu dirigia, ou pensava que dirigia, ostentando uma designação que não lembra ao diabo: DNAPC (Departamento Nacional para a Agitação, Propaganda e Cultura). Seria assim?
Ora o que diz Eduardo Barroso, na referida entrevista, em resposta às perguntas da jornalista:
Existe um clã soarista e/ou barrosista?
Não. Somos uma família unida. Tirando o meu primo Alfredo, que foi chefe da Casa Civil do Dr. Soares durante dez anos, não há ninguém na família que tirasse vantagem dessa ralação pessoal.
A questão não era nesse sentido. Aliás, de João Soares diz-se que na política tem sido mais prejudicado do que beneficiado por ser filho de quem é.
Tive essa experiência no MES (Movimento de Esquerda Socialista), o único sítio onde militei, e foi das coisas mais humilhantemente ridículas que vivi. Queria ser candidato a deputado, a minha estrutura elegeu-me e, depois, três grandes elementos chamaram-me à sede e disseram-me que não podia por ser sobrinho do Dr. Soares! Acabou por ir o meu colega e amigo José Gameiro. A minha militância acabou nesse dia (também ia devido mais à minha primeira mulher).
O MES era dirigido por Augusto Mateus, Ferro Rodrigues e Eduardo Graça, por isso só podem ter sido eles.
Nem confirmo nem desminto. Também já andava um bocado farto … Até para as praias da Costa da Caparica tínhamos ido armados com pás para impedir uma invasão da NATO!! Nunca fui um político, sempre fui demasiado anarquista. Defino-me como conservador de esquerda.
O Eduardo Barroso auto intitula-se um “conservador de esquerda” e compreendo, sem ironia, o seu posicionamento político. Ele é cirurgião e, ao que todos dizem, dos bons. Nunca fui cortado por ele, graças a Deus, ao contrário dele que, pelos vistos, terá sido cortado por mim das listas eleitorais do MES que, por sinal, nunca elegeram ninguém. Mas ser candidato era um gosto que ele tinha e “três grandes elementos do MES”, impediram-no de o satisfazer.
A jornalista, estranhamente, refere três nomes, entre eles o meu, que ele não confirma nem desmente. Teríamos sido nós os desmancha-prazeres do seu gosto? Nem sequer me lembro se a espoliação de que Barroso se queixa lhe foi aplicada com anestesia ou a frio. Por mim não sou capaz de cortar nem coser carne e é isso que os cirurgiões fazem todos os dias.
Eu, apesar de ser citado na entrevista como putativo co-participante daquela espécie de saneamento implacável de Barroso do MES, em favor do José Gameiro, um estimado amigo mas, no caso, psiquiatra -o que torna a preferência de todo apropriada – declaro que não me lembro de nada.
Mas, pelo sim pelo não, o que não quero é cair nas mãos de um cirurgião que pense que eu algum dia o tenha cortado mesmo que a "maldade" lhe tenha dado o pretexto para sair dessa organização humilhantemente ridícula que, no seu douto parecer, foi o MES afirmação vinda, ainda por cima, de “Um cirurgião de elite” e “conservador de esquerda”!
Por mim a ser cortado que o seja por um cirurgião, de preferência, conservador e de direita. É que já tenho experiência e não vou estranhar nem as dores nem a longa convalescença!
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Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
segunda-feira, abril 30
NAIDE GOMES . DE NOVO
Naide Gomes
Eu gostava de ter escrito o que Ferreira Fernandes escreveu, hoje, no DN:
Entrevista a Naide Gomes. Perguntam-lhe: "Alguma vez foi discriminada por ser de raça negra?" E ela não responde o óbvio: "Não me dou com daltónicos." Responde como se ela fosse o que não é: negra. Não que ser negra ou branca seja mais ou menos. É o que é. E, pelo que eu tenho visto na vida, é sempre, mas sempre, o que é em cada indivíduo. Acontece que Naide Gomes não é negra. Olhem-na. E, se for preciso (porque há daltónicos), peçam-lhe o BI. Nome: "Enezenaide do Rosário da Vera Cruz Gomes." Chega? Se não, leia de onde é: "São Tomé." Pronto, já sabe. Naide é da única raça superior que existe. Mário António, poeta angolano e que foi administrador da Gulbenkian, escreveu um livro com este título: Luanda, Ilha Crioula. Fala de um mundo que não se fica pelas Ingombotas. Vai do Rio a Vancôver, passando pela ilha do Príncipe. Naide é dessa raça, a superior. A que se vai fazendo desde que Lucy saiu do corno de África e nos foi inventando. Naide é de amanhã.
Eu gostava de ter escrito o que Ferreira Fernandes escreveu, hoje, no DN:
Entrevista a Naide Gomes. Perguntam-lhe: "Alguma vez foi discriminada por ser de raça negra?" E ela não responde o óbvio: "Não me dou com daltónicos." Responde como se ela fosse o que não é: negra. Não que ser negra ou branca seja mais ou menos. É o que é. E, pelo que eu tenho visto na vida, é sempre, mas sempre, o que é em cada indivíduo. Acontece que Naide Gomes não é negra. Olhem-na. E, se for preciso (porque há daltónicos), peçam-lhe o BI. Nome: "Enezenaide do Rosário da Vera Cruz Gomes." Chega? Se não, leia de onde é: "São Tomé." Pronto, já sabe. Naide é da única raça superior que existe. Mário António, poeta angolano e que foi administrador da Gulbenkian, escreveu um livro com este título: Luanda, Ilha Crioula. Fala de um mundo que não se fica pelas Ingombotas. Vai do Rio a Vancôver, passando pela ilha do Príncipe. Naide é dessa raça, a superior. A que se vai fazendo desde que Lucy saiu do corno de África e nos foi inventando. Naide é de amanhã.
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1º DE MAIO DE 74 - AS PALAVRAS AMARGAS DE TORGA
Clique na fotografia para aumentar
Terceira fotografia que testemunha o primeiro acto público em que o MES (Movimento de Esquerda Socialista) se assumiu como movimento político. No 1º de Maio de 1974 todos estávamos ainda em estado de levitação.
Como tinha sido possível acontecer a liberdade? Muitos já tinham desesperado e, finalmente, em poucos dias, ecoou uma explosão de liberdade onde se juntaram, espontaneamente, multidões de desconhecidos e os mais desencontrados sentimentos.
No quartel limitei-me a assistir a tudo, a preto e brando, pela RTP, a cor destas fotografias que sobreviveram trinta e três anos. O dia 1º de Maio de 1974 fez-nos acreditar que se tinha iniciado uma nova era em Portugal. Apesar de todas as vicissitudes foi mesmo verdade mas, hoje, compreendo o desabafo que Torga plasmou, em palavras amargas, no seu “Diário”:
“Coimbra, 6 de Maio de 1974 – Continua a revolução, e todos se apressam a assinar o ponto.
- O senhor não diz nada? – Interpelou-me há pouco, despudoradamente, um dos novos prosélitos.
E fiquei sem fala diante da irresponsabilidade de semelhante pergunta. Foi como se me tivessem feito engolir cinquenta anos de protesto.”
Terceira fotografia que testemunha o primeiro acto público em que o MES (Movimento de Esquerda Socialista) se assumiu como movimento político. No 1º de Maio de 1974 todos estávamos ainda em estado de levitação.
Como tinha sido possível acontecer a liberdade? Muitos já tinham desesperado e, finalmente, em poucos dias, ecoou uma explosão de liberdade onde se juntaram, espontaneamente, multidões de desconhecidos e os mais desencontrados sentimentos.
No quartel limitei-me a assistir a tudo, a preto e brando, pela RTP, a cor destas fotografias que sobreviveram trinta e três anos. O dia 1º de Maio de 1974 fez-nos acreditar que se tinha iniciado uma nova era em Portugal. Apesar de todas as vicissitudes foi mesmo verdade mas, hoje, compreendo o desabafo que Torga plasmou, em palavras amargas, no seu “Diário”:
“Coimbra, 6 de Maio de 1974 – Continua a revolução, e todos se apressam a assinar o ponto.
- O senhor não diz nada? – Interpelou-me há pouco, despudoradamente, um dos novos prosélitos.
E fiquei sem fala diante da irresponsabilidade de semelhante pergunta. Foi como se me tivessem feito engolir cinquenta anos de protesto.”
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domingo, abril 29
AFONSO HENRIQUES - NASCIDO EM VISEU?
Imagem daqui
Chegou-me ontem às mãos uma prenda de Natal que estava prometida mas que se não achara nas livrarias – nem no próprio editor – e que, finalmente, foi encontrada: “D. Afonso Henriques”, de José Mattoso, edição do “Círculo de Leitores”.
Interessa-me a biografia de Afonso Henriques por ter sido o fundador na nacionalidade – é mesmo verdade! Talvez por ser o governante que mais anos deteve o poder político em Portugal. Talvez pela sua longevidade pois tendo nascido, segundo Mattoso, em “meados de Agosto de 1109, morreu a 6 de Dezembro de 1185 – com 76 anos de idade!
Lancei-me à leitura e, por coincidência, dou com a notícia da apresentação, em breve, da reedição de uma outra obra, de autoria de Almeida Fernandes, na qual se defende que Afonso Henriques terá nascido em Viseu e não em Guimarães como reza a tradição.
Ora é mesmo verdade que Mattoso corrobora esta tese pois logo nas primeiras páginas da biografia do primeiro rei de Portugal escreve: “Todavia a demonstração feita por Almeida Fernandes alcança verosimilhança suficiente para se admitir como possível, ou mesmo a mais provável, até que outras provas sejam apresentadas em contrário. É, de facto, admissível, com base nos documentos por ele invocados, que Afonso Henriques tivesse nascido em Viseu por meados de Agosto de 1109.” (…)
“O essencial da argumentação de Almeida Fernandes baseia-se, porém, no facto de a Chronica Gothorum (apontamentos cronológicos, recolhidos em Santa Cruz de Coimbra, e quase contemporâneos dos acontecimentos, aí registados), na sua secção de 1085 a 1116, datar o nascimento de Afonso Henriques do ano de 1109. Ora a condessa D. Teresa passou a maior parte desse ano em Viseu, como se pode verificar pelos documentos autênticos por ela outorgados.”
Chegou-me ontem às mãos uma prenda de Natal que estava prometida mas que se não achara nas livrarias – nem no próprio editor – e que, finalmente, foi encontrada: “D. Afonso Henriques”, de José Mattoso, edição do “Círculo de Leitores”.
Interessa-me a biografia de Afonso Henriques por ter sido o fundador na nacionalidade – é mesmo verdade! Talvez por ser o governante que mais anos deteve o poder político em Portugal. Talvez pela sua longevidade pois tendo nascido, segundo Mattoso, em “meados de Agosto de 1109, morreu a 6 de Dezembro de 1185 – com 76 anos de idade!
Lancei-me à leitura e, por coincidência, dou com a notícia da apresentação, em breve, da reedição de uma outra obra, de autoria de Almeida Fernandes, na qual se defende que Afonso Henriques terá nascido em Viseu e não em Guimarães como reza a tradição.
Ora é mesmo verdade que Mattoso corrobora esta tese pois logo nas primeiras páginas da biografia do primeiro rei de Portugal escreve: “Todavia a demonstração feita por Almeida Fernandes alcança verosimilhança suficiente para se admitir como possível, ou mesmo a mais provável, até que outras provas sejam apresentadas em contrário. É, de facto, admissível, com base nos documentos por ele invocados, que Afonso Henriques tivesse nascido em Viseu por meados de Agosto de 1109.” (…)
“O essencial da argumentação de Almeida Fernandes baseia-se, porém, no facto de a Chronica Gothorum (apontamentos cronológicos, recolhidos em Santa Cruz de Coimbra, e quase contemporâneos dos acontecimentos, aí registados), na sua secção de 1085 a 1116, datar o nascimento de Afonso Henriques do ano de 1109. Ora a condessa D. Teresa passou a maior parte desse ano em Viseu, como se pode verificar pelos documentos autênticos por ela outorgados.”
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O MES NO 1º DE MAIO DE 74
Fotografia de Rosário Belmar da Costa
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Esta é a segunda das quatro fotografias da primeira aparição pública do MES baptizado, posteriormente, como Movimento de Esquerda Socialista. Como num texto anterior diz a Rosário ficamos a saber que a ideia do cartaz foi do César de Oliveira. Não me admiraria que a própria sigla do movimento tenha sido inspirada por ele.
O “livro preto”, a que a Rosário se refere, não foi impresso no Bombarral mas no Porto, edição da Afrontamento, ostentando, na última página “Acabou de imprimir-se em 22 de Junho de 1974 na Tipografia Nunes, Lda. Porto”. Essa publicação foi concluída antes do 25 de Abril e publicada já com a revolução consumada e contém, de facto, a base programática do movimento sem, no entanto, nunca a ele se referir.
As duas introduções, datadas respectivamente de Março e Maio de 74, são assinadas pelos mesmos subscritores que assumem, pela primeira vez, publicamente, a paternidade de um conjunto de iniciativas políticas sectoriais que haveriam de convergir no MES. São eles: Agostinho Roseta, António Rosas, António Santos Júnior, Augusto Mateus, Edilberto Moço, Francisco Farrica, Jerónimo Franco, Jorge Sampaio, Manuel Lopes, Marcolino Abrantes, Paulo Bárcia e Vítor Wengorovius.
O documento que a Rosário e o Xico Camões trouxeram do Bombarral foi, quase certamente, a “Declaração do Movimento de Esquerda Socialista -M.E.S”, o primeiro documento em que o MES se assumiu como movimento político organizado, subscrita por uma “Comissão Organizadora” com uma constituição ligeiramente diferente do grupo que subscreveu o “Livro Preto”.
Nela não aparecem os nomes do Agostinho Roseta, Augusto Mateus, Jerónimo Franco, Jorge Sampaio, Marcolino Abrantes e Paulo Bárcia, surgindo, como novidade, os nomes do Rogério de Jesus, Machado (António), Luís Filipe Fazendeiro, Luís Manuel Espadaneiro, Carlos Pratas, José Galamba de Oliveira, Joaquim Mestre, José Manuel Galvão Teles, Eduardo Ferro Rodrigues, Nuno Teotónio Pereira e César de Oliveira.
A alteração nos subscritores marca a diferença entre uma publicação de cariz marcadamente ideológica, sem menção ao partido, e a declaração política que o anuncia, notando-se a vontade de equilibrar a representação dos militantes sindicalistas, estudantis, da CDE, cristãos e intelectuais.
Esta declaração política, de quatro páginas, termina com a consigna que haveria de inspirar a primeira fase da acção política do MES: “A EMANCIPAÇÃO DOS TRABALHADORES TEM DE SER OBRA DOS PRÓPRIOS TRABALHADORES”
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Esta é a segunda das quatro fotografias da primeira aparição pública do MES baptizado, posteriormente, como Movimento de Esquerda Socialista. Como num texto anterior diz a Rosário ficamos a saber que a ideia do cartaz foi do César de Oliveira. Não me admiraria que a própria sigla do movimento tenha sido inspirada por ele.
O “livro preto”, a que a Rosário se refere, não foi impresso no Bombarral mas no Porto, edição da Afrontamento, ostentando, na última página “Acabou de imprimir-se em 22 de Junho de 1974 na Tipografia Nunes, Lda. Porto”. Essa publicação foi concluída antes do 25 de Abril e publicada já com a revolução consumada e contém, de facto, a base programática do movimento sem, no entanto, nunca a ele se referir.
As duas introduções, datadas respectivamente de Março e Maio de 74, são assinadas pelos mesmos subscritores que assumem, pela primeira vez, publicamente, a paternidade de um conjunto de iniciativas políticas sectoriais que haveriam de convergir no MES. São eles: Agostinho Roseta, António Rosas, António Santos Júnior, Augusto Mateus, Edilberto Moço, Francisco Farrica, Jerónimo Franco, Jorge Sampaio, Manuel Lopes, Marcolino Abrantes, Paulo Bárcia e Vítor Wengorovius.
O documento que a Rosário e o Xico Camões trouxeram do Bombarral foi, quase certamente, a “Declaração do Movimento de Esquerda Socialista -M.E.S”, o primeiro documento em que o MES se assumiu como movimento político organizado, subscrita por uma “Comissão Organizadora” com uma constituição ligeiramente diferente do grupo que subscreveu o “Livro Preto”.
Nela não aparecem os nomes do Agostinho Roseta, Augusto Mateus, Jerónimo Franco, Jorge Sampaio, Marcolino Abrantes e Paulo Bárcia, surgindo, como novidade, os nomes do Rogério de Jesus, Machado (António), Luís Filipe Fazendeiro, Luís Manuel Espadaneiro, Carlos Pratas, José Galamba de Oliveira, Joaquim Mestre, José Manuel Galvão Teles, Eduardo Ferro Rodrigues, Nuno Teotónio Pereira e César de Oliveira.
A alteração nos subscritores marca a diferença entre uma publicação de cariz marcadamente ideológica, sem menção ao partido, e a declaração política que o anuncia, notando-se a vontade de equilibrar a representação dos militantes sindicalistas, estudantis, da CDE, cristãos e intelectuais.
Esta declaração política, de quatro páginas, termina com a consigna que haveria de inspirar a primeira fase da acção política do MES: “A EMANCIPAÇÃO DOS TRABALHADORES TEM DE SER OBRA DOS PRÓPRIOS TRABALHADORES”
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sábado, abril 28
CÂNTICO DE LONGE
Fotografia de Família
o rio submerso corre e o oiço
subtil rumorejar longe e perto
no bojo dos cântaros o toco
nas pontas dos dedos o bebo
e a água fresca corre com gozo
no bordo dos púcaros e cedo
à saudade dilacerante do mar
que me liberta o peito e acerto
o passo com o meu rio submerso
que rumoreja longe e perto
23/4/2007
o rio submerso corre e o oiço
subtil rumorejar longe e perto
no bojo dos cântaros o toco
nas pontas dos dedos o bebo
e a água fresca corre com gozo
no bordo dos púcaros e cedo
à saudade dilacerante do mar
que me liberta o peito e acerto
o passo com o meu rio submerso
que rumoreja longe e perto
23/4/2007
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sexta-feira, abril 27
1º MAIO 1974 - O MES SAÍU À RUA
Fotografia de Rosário Belmar da Costa
(Clique na fotografia para ampliar)
No dia 1 de Maio de 1974, o mais memorável dia do trabalhador da história contemporânea portuguesa, o país desceu à rua para celebrar a liberdade. Os relatos são incontroversos acerca da adesão em massa da população aos festejos.
Miguel Torga, por exemplo, no seu “Diário” escreveu: “Coimbra, 1 de Maio de 1974 – Colossal cortejo pelas ruas da cidade. Uma explosão gregária de alegria indutiva a desfilar diante das forças de repressão remetidas aos quartéis.
- Mais bonito do que a Rainha Santa … – dizia uma popular. “
Por mim estive remetido ao quartel e não pude participar na grande festa da liberdade. Ao contrário do que Torga escreveu as forças de repressão já não estavam remetidas aos quartéis pela simples razão de que tinham sido subjugadas ou aderido à revolução.
Nesse dia, na grandiosa manifestação de Lisboa, surgiu, pela primeira vez, em público, o MES (Movimento de Esquerda Socialista). Alguém tomou a iniciativa de desenhar num pano MOVIMENTO DA ESQUERDA SOCIALISTA (EM ORGANIZAÇÃO) e juntar atrás dele os activistas que antes militavam em diversos movimentos sociais e sectoriais.
Esta é uma de quatro fotografias, de autoria de Rosário Belmar da Costa, que me chegaram às mãos através do António Pais que, por sua vez, as recebeu de Inês Cordovil. Publicá-las-ei, sem tratamento gráfico, com autorização da autora, até ao próximo 1º de Maio.
Estas fotografias, 33 anos depois de terem sido fixadas, são, certamente, documentos únicos que testemunham o nascimento de um partido com vida efémera pois que, como é sabido, se auto dissolveu, num jantar, em 7 de Novembro de 1981.
Nesta primeira fotografia, colhida na Alameda D. Afonso Henriques, reconheço, entre outros, José Luís Ganhão, António Santos Júnior, Francisco Farrica e o Victor Silva. (Quem quiser que coloque na caixa de comentários, ou me envie por e-mail, elementos para uma legenda mais completa.)
(Clique na fotografia para ampliar)
No dia 1 de Maio de 1974, o mais memorável dia do trabalhador da história contemporânea portuguesa, o país desceu à rua para celebrar a liberdade. Os relatos são incontroversos acerca da adesão em massa da população aos festejos.
Miguel Torga, por exemplo, no seu “Diário” escreveu: “Coimbra, 1 de Maio de 1974 – Colossal cortejo pelas ruas da cidade. Uma explosão gregária de alegria indutiva a desfilar diante das forças de repressão remetidas aos quartéis.
- Mais bonito do que a Rainha Santa … – dizia uma popular. “
Por mim estive remetido ao quartel e não pude participar na grande festa da liberdade. Ao contrário do que Torga escreveu as forças de repressão já não estavam remetidas aos quartéis pela simples razão de que tinham sido subjugadas ou aderido à revolução.
Nesse dia, na grandiosa manifestação de Lisboa, surgiu, pela primeira vez, em público, o MES (Movimento de Esquerda Socialista). Alguém tomou a iniciativa de desenhar num pano MOVIMENTO DA ESQUERDA SOCIALISTA (EM ORGANIZAÇÃO) e juntar atrás dele os activistas que antes militavam em diversos movimentos sociais e sectoriais.
Esta é uma de quatro fotografias, de autoria de Rosário Belmar da Costa, que me chegaram às mãos através do António Pais que, por sua vez, as recebeu de Inês Cordovil. Publicá-las-ei, sem tratamento gráfico, com autorização da autora, até ao próximo 1º de Maio.
Estas fotografias, 33 anos depois de terem sido fixadas, são, certamente, documentos únicos que testemunham o nascimento de um partido com vida efémera pois que, como é sabido, se auto dissolveu, num jantar, em 7 de Novembro de 1981.
Nesta primeira fotografia, colhida na Alameda D. Afonso Henriques, reconheço, entre outros, José Luís Ganhão, António Santos Júnior, Francisco Farrica e o Victor Silva. (Quem quiser que coloque na caixa de comentários, ou me envie por e-mail, elementos para uma legenda mais completa.)
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Eduardo,
Estivemos, eu e o Xico (Camões), a puxar pela memória e o que nos lembramos é que começámos o dia por ir ao Bombarral buscar uns livros de capa preta que o Mil Homens tinha conseguido imprimir numa tipografia de lá (sobre o que eram os livros já não nos lembramos - textos de antes do 25 de Abril e prefácio posterior, mas talvez tu saibas*).
Depois viemos ter com o Agostinho (Roseta) (lá para os lados da Portugália) que, fardado, não queria aparecer em evidência. Não sei mesmo mas penso que é o tipo de costas ao pé do pau do lado esquerdo.
A ideia do cartaz foi do César de Oliveira (creio que ainda houve alguma discussão sobre se era Movimento da Esquerda ou Movimento de Esquerda...), que esteve o tempo todo esfuziante aos gritos. Ao pé de nós apareceu um grupo, de desertores e refractários acabadinhos de chegar de Paris, animadíssimo (bem animadíssimos estávamos todos) capitaneado pelo Zé Mário Branco aos gritos de “Desertores, Refractários, Amnistia Total!”. Foi uma tarde de sonho, tal era o entusiasmo, a quantidade de gente toda feliz, a alegria que estava no ar!
Quanto à fotografia o problema é lembrarmo-nos dos nomes…A partir de uma determinada altura já não foi possível fotografar mais nada, já que era tanta a gente que só do alto e com grandes angulares, meios fora do alcance dos amadores que éramos. Felizmente foram a P&B, que têm muita mais conservação que as feitas a cores!
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Rosário Belmar da Costa
* O livro intitula-se: “Classes, política – política de Classes” e tem duas introduções, a primeira, datada de Março de 74, e a segunda de Maio
quinta-feira, abril 26
O REI IMAGINÁRIO
Desculpem lá qualquer coisinha mas o Eusébio da Silva Ferreira que um dia foi a imagem de Portugal no Mundo, com a Amália – qual Salazar nem meio Salazar! – Moçambicano, preto assumido, empolgante e modesto, arrebatador e genial, é daquelas pessoas que não merecem morrer.
Eu sei que, como dizia Camus, a imortalidade não tem futuro mas, no caso de algumas pessoas, devia ser aberta uma excepção na ordem natural das coisas do mundo, tornando o futuro numa ideia sem sentido. Pois vem esta prosa ao caso para dizer que fiquei feliz ao ver Eusébio sair do hospital (privado!) e comovido. Ele há fraquezas que duram toda uma vida …
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quarta-feira, abril 25
O TEMPO É FEITO DE MUDANÇA ...
Fotografia de Hélder Gonçalves
O Presidente da República no seu discurso oficial do 25 de Abril proferiu diversas afirmações interessantes que podem ser lidas aqui: – discurso na íntegra.
Mas o que mais me suscitou a atenção foram as referências à juventude e ao seu inconformismo. Muitos anos depois o Prof. Cavaco Silva, no papel de PR, parece ter-se rendido ao inconformismo da juventude que não aceitava quando, ele próprio, tinha de se confrontar com o inconformismo da juventude. Interessante!
Mudam-se os tempos, mudam-se as atitudes. Mudam as funções, mudam os discursos. O tempo é feito de mudança ... Deu-me vontade de sorrir!
“Apelo, por isso, aos jovens, neste aniversário do 25 de Abril. Com a liberdade de que dispõem, irão até onde a vossa ambição vos quiser levar. Daqueles que nasceram e cresceram em democracia, só podemos esperar o melhor. Agora, tudo depende de vós e do vosso inconformismo. Em nome de Portugal, não se resignem!”
O Presidente da República no seu discurso oficial do 25 de Abril proferiu diversas afirmações interessantes que podem ser lidas aqui: – discurso na íntegra.
Mas o que mais me suscitou a atenção foram as referências à juventude e ao seu inconformismo. Muitos anos depois o Prof. Cavaco Silva, no papel de PR, parece ter-se rendido ao inconformismo da juventude que não aceitava quando, ele próprio, tinha de se confrontar com o inconformismo da juventude. Interessante!
Mudam-se os tempos, mudam-se as atitudes. Mudam as funções, mudam os discursos. O tempo é feito de mudança ... Deu-me vontade de sorrir!
“Apelo, por isso, aos jovens, neste aniversário do 25 de Abril. Com a liberdade de que dispõem, irão até onde a vossa ambição vos quiser levar. Daqueles que nasceram e cresceram em democracia, só podemos esperar o melhor. Agora, tudo depende de vós e do vosso inconformismo. Em nome de Portugal, não se resignem!”
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Fiesole
In “Traços e Cores” através da “Linha de Cabotagem”
Lendo os anexos de “Camus et l’homme sans Dieu” reencontro as notas de viagem de Camus a Florença em Setembro de 1937. Reparo nas notas da Helena. Não resisto.
“As rosas retardatárias de Santa Maria Novella e as mulheres, neste domingo de manhã em Florença. Os seios libertos, os olhos e os lábios que vos fazem bater o coração, a boca seca e um calor nos rins.”*
Curiosamente com o mesmo título que Helena apõe nas suas notas de viagem, pode ler-se nos “Carnets I” de Camus um longo escrito de que transcrevo alguns excertos:
“Fiesole
Leva-se uma vida difícil de viver. Nem sempre se consegue adaptar os actos à visão que se tem das coisas. (…) Milhares de olhos contemplaram esta paisagem e para mim ela é como o primeiro sorriso do mundo.* Põe-me fora de mim, no sentido profundo da palavra.
(…)
Este mundo aniquila-me. Leva-me até ao fim. Nega-me sem cólera. E eu, aquiescente e vencido, encaminho-me para uma sabedoria onde já tudo está conquistado – se as lágrimas não me subissem aos olhos e se este enorme soluço de poesia que me enche o coração não me fizesse esquecer a verdade do mundo.”
“13 de Set. (1937)
O aroma do loureiro que se encontra em Fiesole à esquina de cada rua.
15 de Set.(1937)
No claustro de São Francisco em Fiesole, um pequeno pátio rodeado de arcadas, coberto de flores vermelhas * de sol e de abelhas amarelas e pretas. (…) Estou sentado no chão e penso naqueles franciscanos cujas celas vi há pouco, dos quais vejo agora as inspirações, e sinto que, se eles têm razão, é comigo que eles têm razão. Atrás do muro a que me apoio, sei que há a colina que desce para a cidade e essa dádiva de Florença inteira com os seus ciprestes. Mas esse esplendor do mundo é como a justificação destes homens. Ponho todo o meu orgulho em acreditar que ela é também a minha e a de todos os homens da minha raça – que sabem que uma extrema pobreza se aproxima sempre do luxo e da riqueza do mundo. Se eles se despojam, é para uma vida maior (e não para uma outra vida). É o único sentido que consigo extrair da palavra “miséria”. “Estar nu” contém sempre um sentido de liberdade física e essa harmonia da mão e das flores, esse acordo aproximado da terra e do homem liberto do humano., ah, converter-me-ia de boa vontade se ela não fosse já a minha religião.
(…)
Esta presença de mim próprio em mim próprio, esforço-me por a conduzir até ao fim, por a conservar diante de todos os rostos da minha vida – mesmo ao preço da solidão que agora sei tão difícil de suportar. Não ceder: aí está o essencial. Não consentir, não trair. Toda a minha violência me auxilia e no ponto a que ela me leva o meu amor vai ter comigo e, com ele, a furiosa paixão de viver que dá sentido aos meus dias.
(…)
Ir até ao fim, é saber guardar o seu segredo. Sofri por estar só, mas por guardar o meu segredo venci o sofrimento de estar só. E hoje não conheço maior glória que viver só e ignorado. Escrever, minha profunda alegria!
(…)
E os mesmos homens que, em San Francesco, vivem diante das flores vermelhas, têm nas suas celas o crânio do morto que lhes alimenta as meditações, Florença na janela e a morte em cima da mesa.
(…)
Se hoje me encontro tão longe de tudo, é que não tenho outro desejo senão amar e admirar. Vida com rosto de lágrimas e de sol, vida sem o sal e a pedra quente, vida como a amo e a entendo, parece-me que ao acariciá-la, todas as minhas forças de desespero e de amor se conjugarão. Hoje não é como uma paragem entre sim e não. Mas ele é sim e é não. Não e revolta perante tudo o que não é o sol e as lágrimas. Sim à minha vida de que sinto pela primeira vez a promessa próxima. Um ano intenso e desordenado que termina e a Itália; a incerteza do futuro, mas a liberdade absoluta em relação ao passado e a mim próprio. Está nisso a minha pobreza e a minha única riqueza. É como se recomeçasse a partida; nem mais feliz nem mais infeliz. Mas com a consciência das minhas forças, o desprezo pelas minhas vaidades, e esta febre, lúcida, que me preocupa em face do meu destino.”
[Estas são algumas das páginas mais significativas e pujantes saídas da pena de Camus e que definem o sentido do seu pensamento e da sua obra. Inspiradoras para quem quiser e puder compreender o seu significado, hoje, agora, aqui, num dia assim!]
Lendo os anexos de “Camus et l’homme sans Dieu” reencontro as notas de viagem de Camus a Florença em Setembro de 1937. Reparo nas notas da Helena. Não resisto.
“As rosas retardatárias de Santa Maria Novella e as mulheres, neste domingo de manhã em Florença. Os seios libertos, os olhos e os lábios que vos fazem bater o coração, a boca seca e um calor nos rins.”*
Curiosamente com o mesmo título que Helena apõe nas suas notas de viagem, pode ler-se nos “Carnets I” de Camus um longo escrito de que transcrevo alguns excertos:
“Fiesole
Leva-se uma vida difícil de viver. Nem sempre se consegue adaptar os actos à visão que se tem das coisas. (…) Milhares de olhos contemplaram esta paisagem e para mim ela é como o primeiro sorriso do mundo.* Põe-me fora de mim, no sentido profundo da palavra.
(…)
Este mundo aniquila-me. Leva-me até ao fim. Nega-me sem cólera. E eu, aquiescente e vencido, encaminho-me para uma sabedoria onde já tudo está conquistado – se as lágrimas não me subissem aos olhos e se este enorme soluço de poesia que me enche o coração não me fizesse esquecer a verdade do mundo.”
“13 de Set. (1937)
O aroma do loureiro que se encontra em Fiesole à esquina de cada rua.
15 de Set.(1937)
No claustro de São Francisco em Fiesole, um pequeno pátio rodeado de arcadas, coberto de flores vermelhas * de sol e de abelhas amarelas e pretas. (…) Estou sentado no chão e penso naqueles franciscanos cujas celas vi há pouco, dos quais vejo agora as inspirações, e sinto que, se eles têm razão, é comigo que eles têm razão. Atrás do muro a que me apoio, sei que há a colina que desce para a cidade e essa dádiva de Florença inteira com os seus ciprestes. Mas esse esplendor do mundo é como a justificação destes homens. Ponho todo o meu orgulho em acreditar que ela é também a minha e a de todos os homens da minha raça – que sabem que uma extrema pobreza se aproxima sempre do luxo e da riqueza do mundo. Se eles se despojam, é para uma vida maior (e não para uma outra vida). É o único sentido que consigo extrair da palavra “miséria”. “Estar nu” contém sempre um sentido de liberdade física e essa harmonia da mão e das flores, esse acordo aproximado da terra e do homem liberto do humano., ah, converter-me-ia de boa vontade se ela não fosse já a minha religião.
(…)
Esta presença de mim próprio em mim próprio, esforço-me por a conduzir até ao fim, por a conservar diante de todos os rostos da minha vida – mesmo ao preço da solidão que agora sei tão difícil de suportar. Não ceder: aí está o essencial. Não consentir, não trair. Toda a minha violência me auxilia e no ponto a que ela me leva o meu amor vai ter comigo e, com ele, a furiosa paixão de viver que dá sentido aos meus dias.
(…)
Ir até ao fim, é saber guardar o seu segredo. Sofri por estar só, mas por guardar o meu segredo venci o sofrimento de estar só. E hoje não conheço maior glória que viver só e ignorado. Escrever, minha profunda alegria!
(…)
E os mesmos homens que, em San Francesco, vivem diante das flores vermelhas, têm nas suas celas o crânio do morto que lhes alimenta as meditações, Florença na janela e a morte em cima da mesa.
(…)
Se hoje me encontro tão longe de tudo, é que não tenho outro desejo senão amar e admirar. Vida com rosto de lágrimas e de sol, vida sem o sal e a pedra quente, vida como a amo e a entendo, parece-me que ao acariciá-la, todas as minhas forças de desespero e de amor se conjugarão. Hoje não é como uma paragem entre sim e não. Mas ele é sim e é não. Não e revolta perante tudo o que não é o sol e as lágrimas. Sim à minha vida de que sinto pela primeira vez a promessa próxima. Um ano intenso e desordenado que termina e a Itália; a incerteza do futuro, mas a liberdade absoluta em relação ao passado e a mim próprio. Está nisso a minha pobreza e a minha única riqueza. É como se recomeçasse a partida; nem mais feliz nem mais infeliz. Mas com a consciência das minhas forças, o desprezo pelas minhas vaidades, e esta febre, lúcida, que me preocupa em face do meu destino.”
[Estas são algumas das páginas mais significativas e pujantes saídas da pena de Camus e que definem o sentido do seu pensamento e da sua obra. Inspiradoras para quem quiser e puder compreender o seu significado, hoje, agora, aqui, num dia assim!]
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*”Noces, p. 81, 88/89 e 82 a 85 (ed. 1950)
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O CADÁVER DE ABRIL
E andei eu a dar o cabedal para fazer o 25 de Abril para isto!... a partir do glória fácil e deus me livre sua eminência se algum dia me passou pela cabeça que alguém fosse capaz, salvo algum maluquinho - e conheço alguns – de comemorar o 25 de abril com tal ordem de operações. Se fosse o jaime gama a mandar na coisa nunca teria havido 25 de abril nenhum mas antes uma conferência acerca da necessidade de realizar o dito e a sua sujeição a uma data de audições para verificar se estava tudo em ordem e afinal não estaria e as operações seriam adiadas para que o marcelo caetano ganhasse tempo para reformar o antigo regime por dentro … e viva a república, porra …
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SESSÃO SOLENE COMEMORATIVA
DO XXXIII ANIVERSÁRIO DO 25 DE ABRIL
10,00HORAS
CERIMONIAL
1. Um batalhão, representando os três ramos das Forças Armadas, com estandarte, banda e fanfarra, encontra-se postado no passeio fronteiro à Assembleia da República, a partir das 09,00 horas, para prestar a Guarda de Honra. A Escadaria Nobre está guarnecida com sentinelas de honra. Está içada a Bandeira de Hastear da Assembleia da República na Varanda do Palácio de S. Bento.
2. Os Presidentes do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça chegam à Assembleia da República às 09,30 e 09,35 horas, respectivamente. São aguardados na Escadaria Exterior por elementos do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo e por estes conduzidos à Sala de Visitas da Presidência.
3. O Primeiro-Ministro chega à Assembleia da República às 09,40 horas. É aguardado na Escadaria Exterior por um Vice-Presidente da Assembleia da República, pelo Vice-Chefe do Protocolo do Estado e pelo Chefe de Divisão de Protocolo que o conduzem à Sala de Visitas da Presidência, após ter recebido o toque de continência da Guarda de Honra.
4. Na Sala de Visitas, encontram-se já, para além do Primeiro-Ministro, do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e do Presidente do Tribunal Constitucional, os Vice-Presidentes da Assembleia da República, os Presidentes dos Grupos Parlamentares, os Secretários e os Vice-Secretários da Mesa e o Presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República.
5. O Presidente da Assembleia da República e a Senhora de Jaime Gama saem do Gabinete da Presidência às 09,41 horas, acompanhados pelo Chefe de Gabinete, dirigindo-se para a base da Escadaria Exterior do Palácio de S. Bento, onde recebe honras militares da Guarda de Honra, aguardando, em seguida, o Presidente da República.
6. O Pavilhão Presidencial é içado na varanda do Palácio de S. Bento às 09,44 horas.
7. O Presidente da república chega às 09,45 horas. É recebido junto ao estandarte do batalhão, que faz a Guarda de Honra, pelo Presidente da Assembleia da República, pela Secretária-Geral da Assembleia da República e pelo Chefe do Protocolo do Estado.
8. A Senhora de Cavaco Silva sai da viatura na base da Escadaria Principal, cumprimenta a Senhora de Jaime Gama e ambas são imediatamente acompanhadas pelo protocolo à Sala de Visitas da Presidência.
9. Após saudar o Estandarte, o Presidente da República cumprimenta o Presidente da Assembleia da República, a Secretária-Geral da Assembleia da república e o Chefe do Protocolo do Estado. Dirigem-se em seguida para a base da Escadaria Exterior do palácio de S. Bento.
10. O Presidente da República recebe as honras militares, escuta o Hino Nacional e passa revista à Guarda de Honra acompanhado pelo Presidente da Assembleia da República.
11. O Presidente da República, acompanhado pelo Presidente da Assembleia da República, sobe a Escadaria Exterior, atravessa o Átrio, sobe a Escadaria Nobre e dirige-se à Sala de Visitas em cortejo organizado da seguinte forma:
¨ Auxiliares Parlamentares;
¨ Secretários do Protocolo do Estado;
¨ Chefe do Protocolo do Estado e Secretária-Geral da Assembleia da República;
¨ Presidente da Assembleia da República e Presidente da República;
¨ Director do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo e Chefe de Gabinete do Presidente da Assembleia da República;
¨ Comitiva do Presidente da República;
¨ Auxiliares Parlamentares.
12. Na Sala de Visitas da Presidência, o Presidente da República, acompanhado pelo Presidente da Assembleia da República, recebe os cumprimentos da Senhora de Jaime gama, do Primeiro-Ministro, do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, do Presidente do Tribunal Constitucional, dos Vice-Presidentes da Assembleia da República, dos Presidentes dos Grupos Parlamentares, dos Secretários e Vice-Secretários da Mesa e do Presidente do Conselho de Administração da Assembleia da República.
13. Após a apresentação dos cumprimentos, a Senhora de Cavaco Silva, a Senhora de Jaime gama, os Vice-Presidentes da Assembleia da República, os Presidentes dos Grupos Parlamentares, os Vice-Secretários da Mesa da Assembleia da República, o Presidente do Conselho de Administração, bem como os Chefes das Casas Civil e Militar do Presidente da República e outros membros da Comitiva do Presidente da República vão imediatamente ocupar os seus lugares na Sala das Sessões, com excepção dos Secretários da Mesa.
14. Já terão, entretanto, ocupado os seus lugares no Hemiciclo os Deputados, os Ministros, os Presidentes do Supremo Tribunal Administrativo e do Tribunal de Contas, o Procurador-Geral da República, o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, o Provedor de Justiça, os Representantes da República para os Açores e para a Madeira, os Presidentes das Assembleias e dos Governos Regionais dos Açores e da Madeira, os Conselheiros de Estado, os Chefes dos Estados-Maiores dos três ramos das Forças Armadas, o Presidente do Conselho Económico e Social, o Governador do Banco de Portugal, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, os Vice-Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça, o Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana, o Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, o Secretário-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa e A Governadora Civil de Lisboa; na Tribuna A, a Senhora de Jaime Gama dá a direita à Senhora de Cavaco Silva; têm ainda assento os anteriores Presidentes da República - General Ramalho Eanes, Doutor Mário Soares, Doutor Jorge Sampaio - e respectivas Senhoras , os anteriores Presidentes da Assembleia da República e respectivas Senhoras, os anteriores Primeiros-Ministros e respectivas Senhoras. Toma também assento nesta Tribuna o Cardeal Patriarca de Lisboa; na Galeria I, o Corpo Diplomático; na Galeria II, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições, o Presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados, o Presidente da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, o Presidente e os restantes membros da Comissão da Liberdade Religiosa, o Presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o Comandante Naval, o Governador Militar de Lisboa, o Comandante do Comando Operacional da Força Aérea, o Comandante do Comando Operacional das Forças Terrestres, a Direcção da Associação dos ex-Deputados da A.R. e alguns elementos da Comunicação Social; na Galeria III, os restantes Membros do Governo, o Presidente do Partido da Nova Democracia, os ex-Conselheiros da Revolução, o Director do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal, a Directora da Representação da Comissão Europeia em Portugal, os Deputados Constituintes, o Secretário-Geral da CGTP, o Secretário-Geral da UGT, os representantes da Associação 25 de Abril, o Presidente da Associação de Deficientes das Forças Armadas e outras individualidades convidadas; na Tribuna D os representantes dos Órgãos de Comunicação Social e nas Galerias IV a VI, o público.
15. Às 10,00 horas, o Presidente da República, o Presidente da Assembleia da República, o Primeiro-Ministro, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Presidente do Tribunal Constitucional e os Secretários da Mesa da Assembleia da República saem da Sala de Visitas para a Sala das Sessões, em cortejo assim constituído:
¨ Auxiliares Parlamentares;
¨ Secretários do Protocolo do Estado;
¨ Chefe do Protocolo do Estado e Secretária-Geral da Assembleia da República;
¨ Presidente da Assembleia da República e Presidente da República;
¨ Presidente do Tribunal Constitucional, Primeiro-Ministro e Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
¨ Secretários da Mesa da Assembleia da República;
¨ Director do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo, Chefe de Gabinete do Presidente da Assembleia da República e Vice-Chefe do Protocolo do Estado;
¨ Auxiliares Parlamentares.
16. O cortejo entra na Sala das Sessões e passa em frente da Tribuna dos Oradores, detendo-se o tempo necessário para o Presidente da República e o Presidente da Assembleia da República saudarem o Corpo Diplomático.
17.O Presidente da República e o Presidente da Assembleia da República dirigem-se para os seus lugares na Tribuna da Presidência, onde ficam ladeados pelos Secretários da Mesa da Assembleia da República.
18. Entretanto, ocuparam os seus lugares no Hemiciclo o Primeiro-Ministro, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e o Presidente do Tribunal Constitucional.
19. A Secretária-Geral da Assembleia da República, o Chefe do Protocolo do Estado e os restantes elementos do cortejo tomam os seus lugares no Hemiciclo junto da Tribuna dos Órgãos de Comunicação Social, com excepção dos Auxiliares Parlamentares que assumem posições junto da Presidência (dois em cima, ladeando a Presidência, e dois em baixo nos espaços laterais da bancada do Governo).
20. Nesse momento é executado o Hino Nacional pela banda da GNR, formada nos Passos Perdidos, com a assistência ainda de pé.
21. O Presidente da Assembleia da República declara aberta a Sessão, dando depois a palavra aos Representantes dos Grupos Parlamentares, pela ordem seguinte: Partido Ecologista “Os Verdes”, Bloco de Esquerda, Centro Democrático Social/Partido Popular, Partido Comunista Português, Partido Social Democrata e Partido Socialista (a duração de cada intervenção é de dez minutos).
22. O Presidente da Assembleia da República usa em seguida da palavra.
23. O Presidente da Assembleia da República anuncia que o Presidente da República vai usar da palavra para dirigir uma mensagem ao Parlamento.
24. O Presidente da República usa da palavra.
25. O Presidente da Assembleia da República declara encerrada a Sessão.
26. Neste momento, a banda da GNR executa o Hino Nacional nos Passos Perdidos.
A assistência escuta de pé o Hino Nacional.
27. O Presidente da República sai da Sala das Sessões para o Salão Nobre onde tem lugar a sessão de cumprimentos, em cortejo assim organizado:
¨ Auxiliares Parlamentares;
¨ Secretários do Protocolo do Estado;
¨ Chefe do Protocolo do Estado e Secretária-Geral da Assembleia da República;
¨ Presidente da Assembleia da República e Presidente da República;
¨ Presidente do Tribunal Constitucional, Primeiro-Ministro e Presidente do Supremo Tribunal de Justiça;
¨ Secretários da Mesa da Assembleia da República;
¨ Director do Gabinete de Relações Internacionais e Protocolo, Chefe de Gabinete do Presidente da Assembleia da República e Vice-Chefe do Protocolo do Estado;
¨ Auxiliares Parlamentares.
28.Entretanto, o Presidente do Supremo Tribunal Administrativo e Presidente do Tribunal de Contas, os antigos Presidentes da República, os Ministros, o Presidente do PSD, os Vice-Presidentes da Assembleia da República, os Presidentes dos Grupos Parlamentares, o Procurador-Geral da República, o Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, o Provedor de Justiça, os Representantes da República para as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, os Presidentes das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas, os Presidentes dos Governos Regionais, os antigos Presidentes da Assembleia da República, os antigos Primeiros-Ministros, o Cardeal Patriarca de Lisboa, os Conselheiros de Estado, os Presidentes das Comissões Permanentes da Assembleia da República, os Secretários de Estado, os Chefes dos Estados-Maiores da Armada, do Exército e da Força Aérea, os Deputados, o Presidente do Conselho Económico e Social, o Governador do Banco de Portugal, os Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional, os Vice-Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça, o Comandante-Geral da Guarda Nacional Republicana, o Director Nacional da Polícia de Segurança Pública, o Corpo Diplomático, o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, a Governadora Civil de Lisboa, o Presidente da Comissão Nacional de Eleições, o Presidente do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa, o Presidente da Comissão Nacional de Protecção de Dados, o Presidente da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos, o Presidente e os restantes membros da Comissão da Liberdade Religiosa, o Presidente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o Comandante Naval, o Governador Militar de Lisboa, o Comandante do Comando Operacional da Força Aérea, o Comandante do Comando Operacional das Forças Terrestres, a Direcção da Associação dos ex-Deputados da A.R., o Presidente do Partido da Nova Democracia, os ex-Conselheiros da Revolução, o Director do Gabinete do Parlamento Europeu em Portugal, a Directora da Representação da Comissão Europeia em Portugal, os Deputados Constituintes, o Secretário-Geral da CGTP, o Secretário-Geral da UGT, os representantes da Associação 25 de Abril e o Presidente da Associação de Deficientes das Forças Armadas dirigem-se para o Salão Nobre (porta do lado esquerdo).
29.Findos os cumprimentos, o Presidente da República e o Presidente da Assembleia da República despedem-se do Primeiro-Ministro, do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, do Presidente do Tribunal Constitucional, dos Presidentes dos Grupos Parlamentares e da Mesa da Assembleia da República, após o que se reconstitui o cortejo de chegada (v. nº. 9).
30.O cortejo sai do Salão Nobre, e dirige-se à escadaria Exterior pelos Passos Perdidos, passando pela Escadaria Nobre e Átrio Principal. Ao fundo da Escadaria Exterior o Presidente da República e a Senhora de Cavaco Silva despedem-se do Presidente da Assembleia da República e da Senhora de Jaime Gama e são acompanhados até ao carro pela Secretária-Geral da Assembleia da República e pelo Chefe do Protocolo do Estado.
31.O Presidente da Assembleia da República e a Senhora de jaime Gama, seguidos da Comitiva, regressam às instalações do Gabinete da Presidência.
32.Depois da partida do Presidente da República, o Primeiro-Ministro é conduzido até à Escadaria Exterior por um Vice-Presidente da Assembleia da República, pelo Vice-Chefe do Protocolo do Estado e pelo Chefe de Divisão de Protocolo, que aí dele se despedem.
33.As Altas Autoridades presentes, incluindo o Corpo Diplomático, só deverão abandonar o Palácio de S. Bento após a partida do Primeiro-Ministro.
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25 DE ABRIL
Fotografia de Hélder Gonçalves
Deixo que a palavra
tão incerta
teça
a liberdade a meio
deste Abril
para que a memória em Portugal não esqueça
tomando da flor
o cravo na matriz
teimando que a paixão
a tudo vença
dizendo não àquilo
que não quis
Maria Teresa Horta
Março 99
Deixo que a palavra
tão incerta
teça
a liberdade a meio
deste Abril
para que a memória em Portugal não esqueça
tomando da flor
o cravo na matriz
teimando que a paixão
a tudo vença
dizendo não àquilo
que não quis
Maria Teresa Horta
Março 99
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terça-feira, abril 24
25 de Abril - Presente
Esta noite passam trinta e três anos sobre o início de um acontecimento que marcou, para sempre, a vida dos que nele participaram: o 25 de Abril de 1974.
Entre a madrugada do dia 25 de Abril e o 1º de Maio de 1974 vivi enclausurado no Quartel do Campo Grande, em Lisboa, onde hoje funciona uma universidade privada e naquela época estava sedeado o 2º Grupo de Companhias de Administração Militar. Lá entrei já a madrugada ia alta, tal conjurado, com o António Dias e o João Anjos, após termos perseguido, de carro, a coluna do Salgueiro Maia desde a sua entrada no Campo Grande até ao Terreiro do Passo.
Já contei essa história. De todas as imagens que guardo na memória a mais impressiva é a que mostrava a fragilidade da coluna revoltosa. Não sabia quem a comandava mas o impensável viria a tornar-se realidade. E a vitória da força aparentemente mais fraca deveu-se, tão-somente, à justeza da sua razão e à coragem do seu líder.
Aos mais ortodoxos do colectivismo assinalo que falo num símbolo. Também sei que, desde sempre, entre esses, reinou a desconfiança a respeito de Salgueiro Maia, como hoje reina a desconfiança a respeito do Gato Fedorento. Para os “donos” da revolução nem todos devem desfilar na Avenida da Liberdade mas quis o destino – ou a ordem de operações – que o primeiro a nela desfilar fosse aquele que, oferecendo o peito às balas, fez estalar o click que mudou o rumo da história: Salgueiro Maia.
É claro que um homem não faz uma revolução e nela muitos foram decisivos a começar por quem dirigiu as operações, no posto de comando da Pontinha: Otelo Saraiva de Carvalho, Vítor Alves, Franco Charais, José Santos Osório, Nuno Fisher Lopes Pires, Amadeu Garcia dos Santos, Vítor Crespo, Luís Macedo, José Maria Azevedo…. O tempo faz esquecer. O tempo é malicioso. O tempo mata a memória.
A revolução foi branda para com os seus inimigos, perdoou-lhes os crimes, ofereceu o seu sangue em troca da liberdade, ganhou a admiração do mundo e isso é o seu legado histórico mais valioso. Os antigos carrascos da liberdade: os PIDES, os censores, os legionários, todos os esbirros da ditadura, seus ajudantes e admiradores, ganharam o direito a viver em liberdade, ainda hoje se cruzam connosco nas ruas e nos locais de trabalho, emitem opinião, sendo detentores de todos os direitos cívicos e políticos.
A nossa revolução foi branda para com os carrascos da liberdade mas pode orgulhar-se da grandeza de lhes oferecer o bem mais precioso que eles sempre negaram aos seus benfeitores. Mas que ninguém espere que os aspirantes a tiranos, que os há por aí, nos retribuam tanta generosidade. Por isso é prudente que, para preservar a liberdade, a democracia não vacile no combate aos seus inimigos.
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Entre a madrugada do dia 25 de Abril e o 1º de Maio de 1974 vivi enclausurado no Quartel do Campo Grande, em Lisboa, onde hoje funciona uma universidade privada e naquela época estava sedeado o 2º Grupo de Companhias de Administração Militar. Lá entrei já a madrugada ia alta, tal conjurado, com o António Dias e o João Anjos, após termos perseguido, de carro, a coluna do Salgueiro Maia desde a sua entrada no Campo Grande até ao Terreiro do Passo.
Já contei essa história. De todas as imagens que guardo na memória a mais impressiva é a que mostrava a fragilidade da coluna revoltosa. Não sabia quem a comandava mas o impensável viria a tornar-se realidade. E a vitória da força aparentemente mais fraca deveu-se, tão-somente, à justeza da sua razão e à coragem do seu líder.
Aos mais ortodoxos do colectivismo assinalo que falo num símbolo. Também sei que, desde sempre, entre esses, reinou a desconfiança a respeito de Salgueiro Maia, como hoje reina a desconfiança a respeito do Gato Fedorento. Para os “donos” da revolução nem todos devem desfilar na Avenida da Liberdade mas quis o destino – ou a ordem de operações – que o primeiro a nela desfilar fosse aquele que, oferecendo o peito às balas, fez estalar o click que mudou o rumo da história: Salgueiro Maia.
É claro que um homem não faz uma revolução e nela muitos foram decisivos a começar por quem dirigiu as operações, no posto de comando da Pontinha: Otelo Saraiva de Carvalho, Vítor Alves, Franco Charais, José Santos Osório, Nuno Fisher Lopes Pires, Amadeu Garcia dos Santos, Vítor Crespo, Luís Macedo, José Maria Azevedo…. O tempo faz esquecer. O tempo é malicioso. O tempo mata a memória.
A revolução foi branda para com os seus inimigos, perdoou-lhes os crimes, ofereceu o seu sangue em troca da liberdade, ganhou a admiração do mundo e isso é o seu legado histórico mais valioso. Os antigos carrascos da liberdade: os PIDES, os censores, os legionários, todos os esbirros da ditadura, seus ajudantes e admiradores, ganharam o direito a viver em liberdade, ainda hoje se cruzam connosco nas ruas e nos locais de trabalho, emitem opinião, sendo detentores de todos os direitos cívicos e políticos.
A nossa revolução foi branda para com os carrascos da liberdade mas pode orgulhar-se da grandeza de lhes oferecer o bem mais precioso que eles sempre negaram aos seus benfeitores. Mas que ninguém espere que os aspirantes a tiranos, que os há por aí, nos retribuam tanta generosidade. Por isso é prudente que, para preservar a liberdade, a democracia não vacile no combate aos seus inimigos.
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segunda-feira, abril 23
As Vésperas e a Alvorada de Abril
A Editora Thesaurus, de Brasília, vai editar, no próximo dia 25 de Abril, um livro da autoria de Francisco Seixas da Costa, com o título "As Vésperas e a Alvorada de Abril".
O livro é ilustrado por fotografias de Alfredo Cunha e Carlos Gil, recolhidas nas ruas de Lisboa, no dia 25 de Abril de 1974.
O texto é uma memória pessoal do autor sobre a vida lisboeta nos meses que antecederam a Revolução de Abril, com notas sobre o ambiente político, militar, intelectual e académico que então se vivia.
Trata-se de uma edição não comercial que pretende ser também, como se diz na respectiva introdução, " um agradecimento ao Brasil, país em cuja generosidade foi possível, em todos os tempos, encontrar acolhimento para quantos portugueses para aqui vieram à procura da liberdade e da esperança."
Francisco Seixas da Costa é actualmente embaixador de Portugal no Brasil e este post é muito mais do que publicidade pois só se divulga uma obra que se não conhece se a confiança no autor for além das convenções.
E, para mim, não há convenções para a verdadeira amizade mesmo que os sujeitos físicos da dita se encontrem distantes no espaço e raramente se vejam. São sentimentos e convicções ancestrais e, como dizia, poucas horas atrás, o poeta Antonio Gamoneda, ao receber o prémio Cervantes – 2006 –, a tradição, ao contrário de todas as aparências, é progressista.
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