Pelo contrário, (Camus) pensa que o marxismo não resiste à reflexão, e contradiz-se quando é posto em prática. Os seus adeptos parecem viver do seu servilismo inconsciente, mal informados sobre a ideologia que professam tão vigorosamente, vivendo somente da sedução:
“Contar-se-iam pelos dedos da mão os comunistas que chegaram à revolução pelo estudo do marxismo. Convertem-se primeiro e só depois lêem as Escrituras". (“O Homem Revoltado”)
São os participantes ideais de um estado baseado no anonimato e na alegada eficiência dos seus funcionários. A burocracia inunda toda a forma de totalitarismo mesmo a que se diz democrática. É a Secretária da Peste que em Estado de Sítio se assume como revolucionariamente justa – e, na verdade, que haveria mais justo que a morte que a todos abraça? – e assim fala sobre a revolução:
“As revoluções não falam de insurrectos. A polícia, hoje, serve para tudo, mesmo para derrubar o governo. E não será melhor assim, de resto? O povo pode descansar enquanto os bons espíritos pensam por ele e decidem em seu lugar sobre a quantidade de felicidade que lhe é favorável”
In CAMUS, M. Luiza Borralho – Rés, 1984 (Um livro raro acerca de Camus, editado em Portugal, que encontrei, por acaso, numa livraria de Lisboa – muito interessante.)
Para A Regra do Jogo
4 comentários:
Sempre tive "mixed feelings" em relação a esse gajú, como tinha em relação ao Céline, por mais ou menos as mesmas razões...
Aqui fica, na voz dele, a coisa que me pôs dividido, desde cêdo:
L'Étranger .
Pois...
Eduardo, o que você acha da discussão atual sobre Camus no Panteão?
abraços,
Nas próximas semanas Camus vai estar na actualidade - em França e não só - a propósito do 50º aniversário da sua morte ocorrida em 4 de Janeiro de 1960. Mas mesmo sem a efeméride é, hoje, um fenómeno de popularidade. As razões dessa popularidade são fáceis de decifrar para quem saiba um pouco da sua obra e do homem que está detrás dela. Não vou entrar por aí nesta caixa de comentários. Leio muito, neste momento, acerca de Camus - os meus amigos municiam-me - e escreverei alguma coisa acerca dele nos próximos tempos. Não admira que o Presidente de França - conservador, filho de imigrantes, se identifique com Camus sem dificuldade. Mas Camus não era de origem burguesa, nem defendia os ideais burgueses, nem sequer precisou nunca,pela sua origem pobre, de se afirmar, ao contrário de Sartre, pelos ideais igualitários apesar de ter chegado a militar no partido comunista argelino. Se fôr ao Panteão abrir-se-á uma polémica póstuma. Mais uma na qual ele não poderá intervir. Serão os seus filhos a decidir. Por mim, amante da sua obra e das suas ideias, o que eles decidirem será bem decidido. Em nada ficará menorizado, antes pelo contrário, poderá ser uma oportunidade de afirmação das ideias que defendeu e que são bastante actuais.
Foi com 'o estrangeiro' que Camus me conquistou: não descreveu as suas ideias, escreve nos seus cadernos:
'a primeira coisa que um escritor deve aprender, é a arte de transpor o que sente no que quer fazer sentir.'
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