quarta-feira, março 31

25 de Abril - notas pessoais

Uma confluência


A esquerda socialista, forjada no período ante-25 de Abril, na sua versão original, resulta de confluência de activistas de diversos movimentos sociais e cívicos.

Neste processo foi determinante a experiência da CDE de 1969. Um livro publicado já depois do 25 de Abril de 74, mas preparado antes, retracta de forma bastante fiel os contornos ideológicos do movimento e identifica a origem dos dirigentes que nele confluíram.

O livro em questão, editado pela Afrontamento, intitula-se "Classes, Política/Políticas de Classe", sendo a sua introdução subscrita, por ordem alfabética, pelos seguintes activistas do MES, em gestação: Agostinho Roseta, António Rosas, António Santos Júnior, Augusto Mateus, Edilberto Moço, Francisco Farrica, Jerónimo Franco, Jorge Sampaio, Manuel Lopes, Marcolino Abrantes, Paulo Barcia e Vitor Wengorovius.

Na primeira "Declaração do Movimento de Esquerda Socialista (M.E.S.)", entretanto divulgada, explicitam-se os princípios fundadores do Movimento sob o lema: "A emancipação dos trabalhadores tem de ser obra dos próprios trabalhadores", abrangendo os campos "da luta de fábrica e sindical", "luta anti-colonial", "luta estudantil", "luta urbana" e, muito interessante, nos seus termos, luta "pelo aumento dos tempos livres" título sob o qual se aborda, de facto, a temática laboral..

Esta primeira Declaração do MES é subscrita, em nome de uma "Comissão Organizadora", por activistas identificados, desta vez, pela sua área de intervenção, com variantes em relação ao grupo anterior e já não por ordem alfabética: Manuel Lopes, António Rosas, António Santos Júnior (militantes sindicalistas); Rogério de Jesus, António Machado, Francisco Farrica, Edilberto Moço, Luís Filipe Fazendeiro, Luís Manuel Espadaneiro (militantes operários); Carlos Pratas e José Galamba de Oliveira (militantes estudantis); Víctor Wengorovius, Joaquim Mestre e José Manuel Galvão Teles (candidatos da CDE de Lisboa, em 1969); Eduardo Ferro Rodrigues (consultor sindical e ex-dirigente estudantil); Nuno Teotónio Pereira (militante cristão) e César Oliveira (historiador do movimento operário).

Os subscritores destes documentos confirmam a confluência na designada esquerda socialista de uma nova vaga de dirigentes, não comunistas, dos movimentos operário, sindical, católico progressista e estudantil que se tinham destacado, desde o início dos anos 60, na contestação aberta à ditadura. Outros nomes não surgem por meras razões circunstanciais.

(13 de 32 continua)

terça-feira, março 30

ABANDONO ESCOLAR PRECOCE NA UE

(% da população com idade entre os 18 e os 24 anos cujas habilitações correspondem apenas ao ensino básico e que não continua a estudar nem segue qualquer formação, dados de 2002)

UE: 18,8%
Novos Países aderentes à UE: 8,4%
UE+novos países aderentes: 16,4%
Objectivo a alcançar em 2010: 10%
Portugal: 45,5% (último classificado)
País melhor classificado dos 15: Áustria - 9,5%
Taxas médias

Relatório referente aos objectivos dos sistemas de educação e de formação na Europa - "Estratégia de Lisboa"

(A desenvolver em próximas entradas)


25 de Abril - notas pessoais

Jorge Sampaio


Na primeira fase do MES, que decorreu até ao 1º Congresso, de Dezembro de 1974, a mais importante personalidade que integrou o processo da sua criação foi Jorge Sampaio que tinha emergido como o mais destacado dirigente estudantil da crise académica de 1961/62.

Ele é, desde essa data, uma referência cívica e política incontornável da esquerda portuguesa. Afirmou-se pela sua inteligência, cultura e capacidade de liderança. Jorge Sampaio é alguém que gera confiança, racional e generoso, culto e emocional, organizado e consensual, um conjunto de características fora do comum na cultura meridional.

É um facto que não integrou o MES, enquanto partido político formal, criado após o 1º Congresso. Jorge Sampaio, com um grupo de activistas, havia de constituir o GIS (Grupo de Intervenção Socialista), tendo abandonado o movimento logo no acto da sua institucionalização em Partido no decurso daquele Congresso fundador.

Foi a primeira morte política do MES. Também Alberto Martins, o mais importante dirigente estudantil da crise académica de 1969, em Coimbra, aderiu ao MES e nele se manteve, após 1º Congresso, tal como um conjunto alargado de dirigentes e ex-dirigentes estudantis que tinham assumido papéis relevantes em todas as crises académicas, a partir do início dos anos 60.

Entre eles não posso deixar de destacar Afonso de Barros, já falecido, que sempre me apoiou, pessoalmente, nos momentos mais difíceis.

(12 de 32 continua)

segunda-feira, março 29

Todos já vimos

Todos já vimos
Nos livros, nos jornais, no cinema e na televisão
Retratos de meninas e meninos
A defender a liberdade de armas na mão.
Todos já vimos
Nos livros, nos jornais, no cinema e na televisão
Retratos de cadáveres de meninos e meninas
Que morreram a defender a liberdade de armas na mão.
Todos já vimos!
E então?

Fernando Sylvan




25 de Abril - notas pessoais

Vítor Wengorovius e Nuno Teotónio Pereira


No movimento católico progressista os activistas mais importantes, que integraram o MES, foram o Arquitecto Nuno Teotónio Pereira e o advogado Vítor Wengorovius.

O primeiro foi, desde sempre, a principal referência cívica do movimento. Oriundo da geração de 50, profissional brilhante, com uma carreira consolidada, à época da criação do MES, Nuno Teotónio Pereira, desempenhou um papel de inegável importância na oposição à ditadura. Foi uma referência determinante da credibilização intelectual do movimento.

Mas o mais importante activista do MES, oriundo do movimento católico progressista, foi Vítor Wengorovius. Tendo desempenhado um papel determinante no movimento estudantil, aquando da crise de 61/62, é um brilhante orador e conduziu-se, em todas as circunstâncias, como um hábil, infatigável e maduro negociador, capaz de gerar consensos e fazer pontes em todas as direcções.

Foi sempre prejudicado, nos planos pessoal e político, pelo seu excesso de talento, na formulação de propostas e soluções de consenso, e pelas manifestações do seu temperamento fulgurante.

A estas duas personalidades devemos todos, os jovens quadros dos anos 60 e 70, uma imensidade de ensinamentos, gestos de desprendida solidariedade e humanidade que jamais poderemos retribuir com a mesma intensidade e sentido de dádiva.

(11 de 32 continua)

Vitória da Esquerda em França

"Esquerda francesa impõe pesada derrota à direita nas regionais"

"A esquerda venceu as eleições regionais em França, cuja segunda volta se realizou hoje, passando a controlar 21 regiões administrativas. A penalização da direita nas urnas deverá acelerar a prevista remodelação governamental.

Segundo as projecções reveladas após o fecho das urnas, as listas da esquerda — resultantes da fusão de socialistas, comunistas e Verdes — obtiveram 50 por cento dos votos a nível nacional, enquanto a coligação de direita — unindo o partido conservador UMP e os centristas da UDF — não foi além dos 37 por cento dos votos. A extrema-direita, que conseguiu aceder à segunda volta em 17 regiões, terá conseguido 12,5 por cento dos votos." - Público on line

Os conservadores perderam o Governo em Espanha e, em França, deverão ficar com maioria em apenas 2 de 23 Regiões. A situação política na Europa está em mudança acelerada. A esquerda recupera o que significa que os cidadãos estar fartos das políticas liberais e autoritárias. Será possível gerar alternativas que não reproduzam à esquerda muitas das políticas da direita? É esse o grande desafio da esquerda, na Europa, nos próximos anos.

domingo, março 28

Fogos

"Fogos de Viseu e Aveiro em fase de rescaldo"

"O primeiro grande incêndio deste ano no país, que lavrou ontem nos distritos de Viseu e Aveiro, entrou esta noite em fase de rescaldo e vigilância, informou hoje o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil (SNBPC)."

Uma notícia banal? Em que mês estamos nós? Agosto? Maio? Em que mês estamos nós? Que lições se retiraram dos incêndios do ano passado? A notícia é dada a "seco"! Ninguém questiona o acontecimento. O Governo não explica! A comunicação social não questiona! Estamos mortos?

sábado, março 27

Patriotas!

"Soponata vendida à General Maritime por 340 milhões euros"

"O Grupo José de Mello acordou hoje (sexta-feira) a venda da transportadora marítima Soponata aos norte-americanos da General Maritime (GM) por 415 milhões de dólares (340 milhões de euros), revelou à Lusa fonte ligada ao processo.

A mesma fonte adianta que as negociações foram fechadas esta madrugada, adquirindo a GM cinco navios da empresa portuguesa especializada no transporte de produtos petrolíferos.

O negócio vai ser concluído até Maio deste ano e os norte- americanos ficam também com quatro contratos de construção de navios e a equipa de gestão técnica da Soponata."


A General Maritime compra cinco navios de transporte de petróleo e fica com quatro contratos de construção de novos navios."

Uma notícia banal? O patriotismo económico dos nossos industriais é uma lenda. Eles vendem tudo, eles vendem tudo e não deixam nada! Viva o Compromisso Portugal!

sexta-feira, março 26

LA CASADA INFIEL


Y yo que me la lleve al río
creyendo que era mozuela,
pero tenía marido.

Fue la noche de Santiago
y casi por compromiso.
Se apagaron los faroles
y se encendieron los grillos.
En las últimas esquinas
toque sus pechos dormidos,
y se me abrieron de pronto
como ramos de jacintos.
El almidón de su enagua
me sonaba en el oído
como una pieza de seda
rasgada por diez cuchillos.

Sin luz de plata en sus copas
los árboles han crecido
y un horizonte de perros
ladra muy lejos del río.

*

Pasadas las zarzamoras,
los juncos y los espinos,
bajo su mata de pelo
hice un hoyo sobre el limo.
Yo me quité la corbata.
Ella se quito el vestido.
Yo, el cinturón con revólver.
Ella, sus cuatro corpiños.
Ni nardos ni caracolas
tienen el cutis tan fino,
ni los cristales con luna
relumbran con ese brillo.

Sus muslos se me escapaban
como peces sorprendidos,
la mitad llenos de lumbre,
la mitad llenos de frío.
Aquella noche corrí
el mejor de los caminos,
montado en potra de nácar
sin bridas y sin estribos.

No quiero decir, por hombre,
las cosas que ella me dijo.
La luz del entendimiento
me hace ser muy comedido.
Sucia de besos y arena,
yo me la llevé del río.
Con el aire se batían
las espadas de los lirios.

*

Me porté como quien soy.
Como un gitano legítimo.
Le regalé un costurero
grande, de raso pajizo,
y no quise enamorarme
porque teniendo marido
me dijo que era mozuela
cuando la llevaba al río.


Federico García Lorca

Antología Poética (Romancero Gitano)
Selección de Guillermo de la Torre y Rafael Alberti.
Editorial Losada, Buenos Aires 1980

Um livro de Lorca (IV)

Neste último excerto, José Viale Moutinho, no texto de apresentação do livro de Federico García Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS", conclui:

Recomendando-lhes uma visita à casa natal de Federico García Lorca em Fuentevaqueros, nos arredores de Granada, recordo-lhes também a leitura do seu livrinho "Seis Poemas Galegos", que ele escreveu como reflexo das duas vezes que esteve na Galiza. Este livro foi publicado por Anxel Casal, editor e que foi o último alcaide republicano de Santiago de Compostela.

Quis a sorte que Lorca e o seu editor galego fossem assassinados no mesmo dia, eles e centenas, milhares de outros republicanos espanhóis. E foram mortos apenas porque eram gente de bem, homens para quem a II República constituía um instrumento para construir a felicidade dos seus povos.

Um dia pude deixar um cravo na campa de Anxel Casal, porém, como disse, não se sabe onde efectivamente se encontram os restos mortais de Federico García Lorca, os restos deles e de uns quantos que no mesmo dia, à mesma hora e no mesmo secreto sítio, foram abatidos pela sanha dos fascistas incondicionais de Queipo de Llano, esbirro sinistro do tenebroso Franco que se fez enterrar no monumento Valle de los Caídos, arredores de Madrid, uma construção onde foi utilizado o trabalho escravo de republicanos condenados à miséria.

Para que conste."

José Viale Moutinho: excerto da apresentação do livro ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS, de Federico Garcia Lorca, editado pelo Sector Intelectual da DORP do PCP, Auditório da Junta de Freguesia de Massarelos.


Obrigada!

O Público assegura que o governo garante que as "Comemorações do 25 de Abril não vão substituir a diversidade ideológica"

Por outro lado vejo na Lusa uma referência ao Diário de Notícias:" Sondagem apresenta socialistas perto da maioria absoluta e PSD em queda.
Os socialistas estão à beira da maioria absoluta, com 43,9% das intenções de voto, de acordo com uma sondagem divulgada sexta-feira pelo Diário de Notícias que aponta ainda para uma quebra no PSD (34,9%).Em relação às intenções de Fevereiro, em Março o PS subiu 1,7% e o PSD desceu 3,8%. Se as eleições legislativas de 2006 fossem hoje, o CDS-PP subia 1,5%, para 3,8%, o PCP alcançaria 6,9% dos votos e o Bloco de Esquerda 5,7%."

Aparentemente o governo não tem razões para ficar preocupado porque a diversidade ideológica está assegurada. De qualquer maneira obrigada pelos cuidados!



25 de Abril - notas pessoais

António Santos Júnior


No movimento operário de base destacou-se, emergindo das lutas da TAP, que antecederam o 25 de Abril, António Santos Júnior. Ele liderou um movimento de novo tipo, associando as reivindicações tradicionais do operariado urbano com os novos desígnios da participação do movimento operário na acção política.

É um admirável homem de acção e de organização, persuasivo e generoso. Aliás Santos Júnior deveria ter discursado na grande manifestação, em Lisboa, do 1º de Maio de 1974, em representação do MES, mas tal objectivo foi impedido pela aliança PCP-PS.

Foi nessa manifestação que surgiu, pela primeira vez, em público a sigla MES inscrita num pano onde se podia ler "Movimento de Esquerda Socialista - em organização".

Outros dois destacados activistas do movimento operário e sindical, com relevante participação no MES, foram Manuel Lopes (sindicalista que aderiu à CGTP, já falecido) e o ideólogo das lutas da TAP, Jerónimo Franco.

(10 de 32 continua)

quinta-feira, março 25

LLANTO POR IGNACIO SÁNCHEZ MEJÍAS (1935)


La cogida y la muerte

A las cinco de la tarde.
Eran las cinco en punto de la tarde.
Un niño trajo la blanca sábana
a las cinco de la tarde.
Una espuerta de cal ya prevenida
a las cinco de la tarde.
Lo demás era muerte y sólo muerte
a las cinco de la tarde.

El viento se llevó los algodones
a las cinco de la tarde.
Y el óxido sembró cristal y níquel
a las cinco de la tarde.
Ya luchan la paloma y el leopardo
a las cinco de la tarde.
Y un muslo con un asta desolada
a las cinco de la tarde.
Comenzaron los sones del bordón
a las cinco de la tarde.
Las campanas de arsénico y el humo
a las cinco de la tarde.
En las esquinas grupos de silencio
a las cinco de la tarde.
¡ Y el toro solo corazón arriba !
a las cinco de la tarde.
Cuando el sudor de nieve fue llegando
a las cinco de la tarde,
cuando la plaza se cubrió de yodo
a las cinco de la tarde,
la muerte puso huevos en la herida
a las cinco de la tarde.
A las cinco de la tarde.
A las cinco en punto de la tarde.

Un ataúd con ruedas es la cama
a las cinco de la tarde.
Huesos y flautas suenan en su oído
a las cinco de la tarde.
El toro ya mugía por su frente
a las cinco de la tarde.
El cuarto se irisaba de agonía
a las cinco de la tarde.
A lo lejos ya viene la gangrena
a las cinco de la tarde.
Trompa de lirio por las verdes ingles
a las cinco de la tarde.
Las heridas quemaban como soles
a las cinco de la tarde,
y el gentío rompía las ventanas
a las cinco de la tarde.
A las cinco de la tarde.
¡ Ay qué terribles cinco de la tarde !
¡ Eran las cinco en todos los relojes !
¡ Eran las cinco en sombra de la tarde !

Federico García Lorca

Um livro de Lorca (III)

Neste terceiro excerto, José Viale Moutinho, no texto de apresentação do livro de Federico García Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS", afirma:

"Ora queria ainda falar-lhes de outra coisa, de algo tão idiota como o propalado apoliticismo de Federico Garcia Lorca. Ian Gibson, seu biógrafo mais atento, nas vésperas de apresentar uma reedição da sua obra "El asesinato de Garcia Lorca", creio que em finais dos anos 70 do século passado, ainda nas provas desse livro mostrou-me documentos que me surpreenderam porque revelavam um Lorca a intervir directa e politicamente.

Eu conhecia alguma correspondência sua a Teixeira de Pascoais, tanto mais que era amigo do sobrinho, o pintor João Teixeira de Vasconcelos.

Porém uma notícia intitulada Comité de Amigos de Portugal, editada no "El Socialista", de 6 de Maio de 35, dava nota da recente constituição de um Comité de Amigos de Portugal "que se propunha popularizar em Espanha os métodos brutais de repressão da ditadura fascista de Salazar em Portugal, organizando uma campanha de protesto entre as massas populares espanholas, assim como a ajuda em todas as suas formas às vítimas do fascismo português".

Entre outros, integravam o comité Ramón J. Sender, Rafael de Olmo, Victoria Kent, Pasionaria, Teresa Leon, Ortega y Gasset e Federico Garcia Lorca. O segundo documento a que me queria referir data de 4 de Julho de 1936 e é considerado como o último que ele assinou, pois foi fuzilado em 19 de Agosto seguinte.

É uma carta aberta do referido comité a Salazar formulando "um enérgico protesto em nome dos direitos e sentimentos que constituem a conquista mais apreciada da civilização: o direito e a liberdade de análise e de crítica e o sentimento de defesa e amparo da dignidade humana." diz depois a mensagem: "calam os escritores e os homens de pensamento em Portugal que não podem iludir a coacção brutal das suas armas, Sr. Salazar. Mas outros portugueses fazem a partir de fora do seu país a melhor homenagem ao seu próprio patriotismo e à sua cidadania, chamando a nossa consciência e a de todos os homens livres do mundo a favor dos lares portugueses desfeitos, dos milhares de concidadãos presos em condições desumanas, de centenas de homens inermes, cujo martírio se renova cada dia, e de milhões de seres humanos, a grande massa do povo português, que você procura envilecer na escravidão e na miséria".

Com Lorca, assinam este documento Largo Caballero, Ramón J, Sender, António Machado, Rafael Alberti, bem como milhares de outros antifascistas espanhóis."

(3 de 4 continua)

Um grito

"Senhor Aznar, é responsável pela morte do meu filho" gritou alguém na cerimónia fúnebre de Madrid.

Uma mãe disse, num telefonema, á rádio SER: "Não me sinto capaz de estar face a face com Aznar, Power e Blair, o meu filho colou um cartaz contra a guerra na janela do seu quarto." Daniel tinha 20 anos e morreu no atentado. Pilar, a mãe, não foi a Almudena. Como não foram os fiéis adventistas e muçulmanos, familiares de muitos mortos, por considerarem que a diferença da sua fé não foi respeitada". Vem no Público.

Espero que o Director do Público leia o Público de hoje como um simples cidadão. Um dia, de vez em quando, os directores dos órgãos de comunicação social deviam ser demitidos. No dia seguinte podiam retomar funções se provassem que tinham lido as suas próprias notícias e editoriais, do dia anterior, com os olhos de um vulgar cidadão.

E hoje leia também a entrevista de Saramago no Diário de Notícias. Os ideólogos da direita, de todos os matizes, têm de suportar aquilo que não gostam de ouvir. E, por favor, tenham contenção nas comparações com o nazi/fascismo. Assassinos há muitos e nem todos usam ostensivamente farda, religião ou ideologia ...basta serem fanáticos.

25 de Abril - notas pessoais

Agostinho Roseta


No movimento operário e sindical o activista mais importante do MES foi Agostinho Roseta, já falecido. Ele associava juventude (ou talvez melhor, jovialidade), capacidade teórica e sentido prático de organização, era persuasivo, sedutor e desprendido do poder.

Morreu num 9 de Maio, muitos anos depois do MES ter sido extinto, na plena pujança das suas qualidades humanas e intelectuais A sua morte prematura impediu que tivesse, muito provavelmente, exercido uma influência marcante, a partir de 1995, no movimento sindical (UGT) e no Partido Socialista.

Falar de pessoas é sempre muito delicado. Mas não é possível falar do 25 de Abril sem referir o papel daqueles que foram decisivos na nossa própria formação pessoal e na conformação do nosso percurso político. Sempre que hajam referências pessoais cingir-me-ei às personalidades que, no meu ponto de vista, foram as mais relevantes.

Farei referência a um número restrito de pessoas pois, dessa forma, reduzo os riscos de ser injusto ou mal interpretado. Além do mais o MES foi uma escola de quadros políticos que ocupam, e continuarão a ocupar, no futuro próximo, posições de grande destaque na vida pública portuguesa.

Julgo que isso se deve ao facto, incontroverso, de se terem reunido no MES, na volúptia política dos anos 70, um escol de quadros de grande qualidade humana e intelectual que, discretamente, se orgulham do seu passado de empenhamento cívico e político.

(9 de 32 continua)

quarta-feira, março 24

Romance Sonambulo


Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar
y el caballo en la montaña.
Con la sombra en la cintura
ella sueña en su baranda,
verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Verde que te quiero verde.
Bajo la luna gitana,
las cosas la están mirando
y ella no puede mirarlas.

Verde que te quiero verde.
Grandes estrellas de escarcha,
vienen con el pez de sombra
que abre el camino del alba.
La higuera frota su viento
con la lija de sus ramas,
y el monte, gato garduño,
eriza sus pitas agrias.
¿Pero quién vendrá? ¿Y por dónde?
Ella sigue en su baranda,
verde carne, pelo verde,
soñando en la mar amarga.

-Compadre, quiero cambiar
mi caballo por su casa,
mi montura por su espejo,
mi cuchillo por su manta.
Compadre, vengo sangrando,
desde los puertos de Cabra.
-Si yo pudiera, mocito,
este trato se cerraba.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
-Compadre, quiero morir,
decentemente en mi cama.
De acero, si.puede ser,
con las sábanas de holanda.
¿No ves la herida que tengo
desde el pecho a la garganta?
-Trescientas rosas morenas
lleva tu pechera blanca.
Tu sangre rezuma y huele
alrededor de tu faja.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
-Dejadme subir al menos
hasta las altas barandas,
dejadme subir!, dejadme
hasta las verdes barandas.
Barandales de la luna
por donde retumba el agua.

Ya suben los doscompadres
hacia las altas barandas.
Dejando un rastro de sangre.
Dejando un rastro de lágrimas.
Temblaban en los tejados
farolillos de hojalata.
Mil panderos de cristal
herían la madrugada.

Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
Los dos compadres subieron.
El largo viento dejaba
en la boca un raro gusto
de hiel, de menta y de albahaca.
-¡Compadre! ¿Dónde está, dime?
¿Dónde está tu niña amarga?
¡Cuántas veces te esperó!
¡Cuántas veces te esperara,
cara fresca, negro pelo,
en esta verde baranda!

Sobre el rostro del aljibe
se mecía la gitana.
Verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Un carámbano de luna
la sostiene sobre el agua.
La noche se puso íntima
como una pequeña plaza.
Guardias civiles borrachos
en la puerta golpeaban.
Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
El barco sobre la mar.
Y el caballo en la montaña.

Federico García Lorca

(Há uma magnífica tradução em português
deste poema de autoria de
Eugénio de Andrade em "Trinta
e Seis Poemas e Uma Aleluia Erótica",
Editorial Inova, 1968)

Federico García Lorca

Federico García Lorca fue un poeta, en el sentido más determinante y profundo que puede tener esta afirmación. Fue un poeta porque la poesía condicionó toda su vida e incluso su misma muerte: de no ser el escritor triunfante que era y la criatura radicalmente libre que la poesía le enseñó a ser, es probable que la barbarie no lo hubiera asesinado. Él lo dijo en una ocasión: "...yo no como, ni bebo, ni entiendo más que en la Poesía".

Su poesía fue, en efecto, su médula y su raíz, su supremo y cotidiano alimento terrestre. Lejos de toda torre de marfil, para él ser poeta era ante todo ser fiel a la voz de la muerte, a la voz del arte, a la voz del amor: las tres voces que escuchaba el poeta, según reclamó. La voz de la muerte, "con todos sus presagios" llamaba al canto exasperado y agudo de la vida; la voz del arte decía la superior verdad de las formas, el equilibrio cenital en el que la palabra del poeta se llena de sentido y trasciende el tiempo, sin dejar de ser tiempo, la voz del amor hacía llamear la plenitud de los cuerpos y las almas, la belleza divina de la creación. Nunca hubo en él oposición entre poesía y vida. Por eso hablaba de "la inmensa alegría consciente de crear".

Porque la poesía no era una huida del mundo; bien al contrario, representaba la inmersión en el mundo.

(De la monografía de Miguel García-Posada en la Agenda Cultural 1998)

Um livro de Lorca (II)

Continuando, José Viale Moutinho, no texto de apresentação do livro de Federico García Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS", afirma:

"Ora em Setembro de 1931, cinco meses já desde que Manuel Azaña, outro grande escritor da língua castelhana, tivesse tomado posse como primeiro presidente da II República de Espanha, Lorca, com 33 anos, está em Fuentevaqueros, num acto público.

Folheando as actas municipais nota-se uma actividade vertiginosa. O ministro Fernando de los Rios, primeiro-ministro da Justiça da jovem Republica, é distinguido com o título de "filho adoptivo de Fuentevaqueros". Militante do Partido Socialista Operário, com os seus camaradas Indalecio Prieto e Largo Caballero formavam a ala esquerda do Governo Provisório.

A 9 de Maio, Fuentevaqueros pede a abolição da pena de morte no Estado Espanhol e a expulsão das ordens religiosas, que controlavam grande parte da economia espanhola. Por outro lado, na natural mudança das placas toponímicas, foi deliberado que a Rua da Igreja passaria a chamar-se Rua de Federico García Lorca, que ele agradece nesta alocução.

E verdade é que a sugestão de 1929, a da biblioteca popular, transformara-se, entretanto, em obra prioritária da autarquia republicana em 1931. E isso entusiasmava Federico. Conta o irmão Francisco que este discurso foi pronunciado a coberto do sol por uns toldos, rodeado por balancés e barracas de tiro ao alvo da feira de Fuentevaqueros, estando mudos os músicos enquanto Lorca falava. Informa-nos ainda que o produto daquela festa, que metia bailes e verbenas se destinava à biblioteca popular e que a organização era da Juventude Socialista.

Ora esta segunda alocução não a percam, não deixem de a ler, leiam-na em voz alta, aos vossos amigos, aos vossos filhos, que terão gosto em sentir tão maravilhosamente a história do livro, dos livros de pedra aos livros de papel.

Quando conheci este texto, vindo do entusiasmo do Francisco Duarte Mangas, também me empolguei porque, raio de feitio, também acho que um discurso como este vale tanto como As filhas de Bernarda Alba ou qualquer poema. Apesar de ser um texto pequeno, que escapou aos lorquianos até meio século depois da morte do seu autor."

(Foi introduzida uma correcção necessária a um erro de minha responsabilidade:
o nome do poeta é: Federico García Lorca.)

(2 de 4 continua)

25 de Abril - notas pessoais

Independentes e rebeldes


A nossa visão do papel da luta operária e do movimento sindical era muito diferente da perspectiva do PCP. Defendíamos a "auto organização" dos trabalhadores e a emancipação do movimento sindical fora do controle político partidário do PCP ou de qualquer outra formação partidária.

A raiz da nossa concepção da organização operária e sindical bebia da tradição anarco-sindicalista e dos ideais auto-gestionários. As diferenças entre as nossas concepções da vida, da luta de emancipação dos trabalhadores e da organização do Estado, tornaria muito difícil qualquer tentação de aliança estratégica com o PCP e, por maioria de razão, tornava-nos imunes a ser absorvidos pela sua reconhecida vocação hegemónica.

No MES confluíram quadros intelectuais e operários cujos destinos pessoais não eram compatíveis com a submissão a qualquer autoridade. Éramos (e somos!) ferozmente independentes e rebeldes.

Por isso não admira que o MES tenha sido o único Partido, criado na aurora do 25 de Abril, que se extinguiu, por vontade da maioria dos seus militantes, com uma festa.

Nem sequer admira que sejam raros os ex-activistas do MES que tenham, algum dia, aderido ao PCP, ou às teses neoconservadoras, ao contrário do que aconteceu com muitos ex-activistas dos movimentos políticos marxistas-leninistas que se reivindicavam do maoismo.

Anti-autoritários e de esquerda toda a vida...

(8 de 32 continua)