sábado, janeiro 8

Maioria e Maioria

PS com maioria absoluta nas próximas eleições

Faltam 42 dias para as legislativas de 20 de Fevereiro. Acerca do calendário ninguém tem dúvidas. A sondagem divulgada ontem confirma uma certeza já enraizada na opinião pública: o PS vai ganhar. Já não é nada pouco. Subsiste, no entanto, uma dúvida: qual a dimensão dessa vitória?
O fracasso do PS nestas eleições será a não obtenção da maioria absoluta: 116 deputados. Esta fasquia foi fixada pelo SG e assumida pelo PS. As consequências políticas desse fracasso são impressivas: enfraquecimento da posição do PR (em fim de mandato) e a necessidade do PS encontrar uma fórmula de acordo político envolvendo outra (s) força (s) partidária (s).
Em Portugal é difícil a esquerda ser pragmática, ao contrario da direita. Será que vai quebrar essa sua fraqueza no caso de não alcançar uma maioria absoluta? Subirá, então, ao primeiro plano do debate político a questão das alianças.
A sondagem merece-me um comentário/palpite: o PS obterá, certamente, um resultado à volta dos 46%, o PSD será mais penalizado do que indiciam os 33% previstos, o PP obterá uma expressão superior a 7%, o PCP inferior a este valor e o BE em torno dos previstos 4,5%.

Não se conhecem ainda os programas dos partidos mas o mais importante, neste “campeonato”, são os líderes e as expectativas para o futuro que criem no eleitorado. As vantagens estão todas do lado do PS. As desvantagens todas do lado do PSD. Pelo menos até 20 de Fevereiro se não ocorrer qualquer acontecimento imprevisto e anormal.
A partir de 21 de Fevereiro invertem-se as situações. Se o PS for governo, mesmo com maioria absoluta, vai gerir o caos e a penúria. É para criar esse cenário que a direita tem vindo a trabalhar na maior impunidade.

Carlos de Oliveira

Por vezes sentimos necessidade de explicar o que fazemos embora os nossos impulsos mais íntimos não se possam explicar senão através da arte.

A propósito da sequência de fragmentos de “O Aprendiz de Feiticeiro” de Carlos de Oliveira aqui deixo um belo texto de Gastão Cruz que explica muita coisa.

Que lhe diremos, mestre

“Numa noite do Verão de 1967 encontrei-me com Carlos de Oliveira na «pequena praça circular» a que ele se refere num texto do mesmo ano («Gás» O Aprendiz de Feiticeiro): «O arboricídio floresce (se me permitem a expressão). (...) De modo que descemos, Gelnaa e eu, do nosso sexto andar para assistir ao derrube das árvores na praça.»”

(“Gáz” é, aliás, o último fragmento de “O Aprendiz de Feiticeiro” que consta do meu livro artesanal).

sexta-feira, janeiro 7

Imaginação

“Aqui está como os grandes artistas estimulam a imaginação alheia.”

“O Aprendiz de Feiticeiro” – Carlos de Oliveira
Fragmentos – Pag. 2 (7 de 7)

Um Compromisso Para a Educação

O artigo publicado hoje pelo “Semanário Económico”, com o título em epígrafe, pode ser lido aqui e ainda no IR AO FUNDO E VOLTAR onde encontrará também um conjunto resumido de indicadores acerca do estado da educação e formação na UE e em Portugal.

A LER

Manifesto anti-Lopes


quinta-feira, janeiro 6

O Fácil e o Difícil

Fazer propaganda é fácil, governar é difícil.

Colocar encartes nos jornais com propaganda do orçamento é fácil, ser desmacarado por ser mentira é difícil.

Desculpar-se por ser ministro há cinco meses é fácil, assumir a responsabilidade por ser governo há 3 anos é difícil.

Denunciar a pesada herança socialista por um deficit de 4,2 % (em 2001) foi fácil, justificar um deficit de 5% (em 2004) é difícil.

Dissimular e mentir é fácil, assumir as verdades e responsabilidades é difícil.

Condenar os outros e lavar as mãos é fácil, ir a votos é difícil.

É este o pesadelo do Dr. Bagão Félix.


Conversas e Água Benta

Ontem andei, a propósito de umas compras banais, a visitar lojas. Pequenas. De vários ramos. Puxei a conversa com os donos. O negócio anda pelas ruas da amargura. O Natal foi péssimo.

A memória quase não alcança outro igual. Os mais velhos falam em 1984! As minhas conversas confirmam as notícias, de hoje, que nos dizem que o “Clima económico em Portugal piora em Dezembro”.

Atenta a situação o Dr. Bagão Félix não vai a votos. Fugiu a sujeitar-se ao sufrágio popular. Não vai ter a oportunidade de ser encarado pelo povo nas ruas. E o povo não vai ter a oportunidade de o encarar. Nem será directamente julgado nas urnas. É uma pena.

Mas dá entrevistas. Vai aos cumprimentos de Ano Novo a Belém e troca sorrisos afectuosos nos salões. A democracia é uma maçada para os autocratas. Depois dos salões seguir-se-ão os negócios da banca e das seguradoras. E muita água benta.

Pouco edificante? Enojante!

Os portugueses não se podem queixar dos governantes que têm. Foram eles que os escolheram. Muitos portugueses até sentiram orgulho por um deles (o José Manuel) ter sido “escolhido” para n.º 1 da UE.
Mas os governantes que ainda temos preocupam-se mais com a sua barriga (ou umbigo), conforme o grau de formação intelectual, do que em cuidar da “coisa pública” na qual se incluem, curiosamente, os próprios cidadãos portugueses.
Este caso concreto passado com a Embaixada na Tailândia é só mais um dos muitos em que vão sair impunes os inaptos, os descuidados e os relapsos.

Lembram-se de um senhor chamado Martins da Cruz e das suas bazófias acerca da “diplomacia económica”? Nem diplomacia económica e muito menos diplomacia! Quanto mais diplomacia humanitária! É o que este caso mostra.

O Presidente vai partir para a China. Fazer o quê? Se na Tailândia Portugal não foi capaz de apoiar um pequeno grupo de portugueses em dificuldades? Cuidem o Presidente e o Governo de assegurar os básicos - o essencial, o banal, o curial - isso mesmo!
Aquilo que os portugueses pensam que está assegurado até que o destino lhes faz sair em sorte o que pensavam que nunca lhes poderia acontecer.

Não só na diplomacia...Vejam aqui e no Causa Nossa.

"SMS, saudades do Lopes"

"A linha editorial deste blog autoriza a ter pena do Lopes? É que nos últimos dias vejo o homem e choro, às vezes choro a rir, outras cai-me uma lágrima furtiva de compaixão. Sou um ser humano sensível, choro ao lado dos fracos, dos sós e dos pobres de espírito".
(segundo post de um por dia, até terça)
André Bonirre

In A Natureza do Mal


"Razões Irrelevantes Para Não Votar no PP"

Vale a pena ler. No Blogamemucho.

“As franjas intelectuais da direita estão a tornar-se temerárias. A direita portuguesa, historicamente envergonhada da decálage ideológica que a separava da esquerda moderada (sem que seja preciso invocar os mais radicais), subitamente descobriu uma forma engenhosa de fazer valer ideários menos liberais sem que os tenha de disfarçar de temas progressistas.

As doutrinas das liberdades individuais e da promoção da igualdade de direitos gastaram-se, de tão proclamadas, com o tempo. Na prática, isto pode significar que deixou de significar ser vanguardista defender causas que já contam umas boas décadas. Significa, também, que a defesa dos direitos humanos pode, perturbantemente, ser muito mais um comportamento trendy das últimas décadas do século passado do que o salto civilizacional seguro e definitivo que, até agora, pensámos que eram.”

quarta-feira, janeiro 5

O acabamento

"Apenas sucede que é difícil impedir o homem ou, em palavras mais exactas, o homem impedir-se de lamentar o próprio acabamento.”

“O Aprendiz de Feiticeiro” – Carlos de Oliveira
Fragmentos – Pag. 2 (6 de 7)

Vergonha, precisa-se

Cavaco utilizou imagem de Sá Carneiro em campanha de 1985

O “Diário Digital”, na linha do inefável Delgado, kamikaze ao serviço de Santana, quer apresentar serviço. Sai asneira. Foi encontrar uma imagem da campanha eleitoral de 1985 em que surge Cavaco ao lado de Sá Carneiro.

Talvez dê para Santana aprender alguma coisa de propaganda. Descontando o efeito tempo a foto é mesmo boa.

O DD mostra, ao mesmo tempo, toda a sua ignorância: nas eleições de 1985 o PSD não obteve “maioria absoluta”. Só nas eleições de 1987 e, depois, em 1991.

Surreal

Recebemos cá em casa uma daquelas cartas de que fala hoje o Público.

A ameaça era pesada: penhora de bens por dívidas ao fisco. Data do aviso: 27 de Dezembro. A época é indicada para a contagem de prazos. Levantado ontem da caixa do correio. Prazo para pagar a putativa dívida: 10 dias. Acabava amanhã.

Há sempre a hipótese de algum pagamento ter ficado para trás. O cidadão sabe que pode falhar mesmo que seja diligente e cumpridor. Fiquei na dúvida. Lá fui hoje saber da coisa.

Da diligência surgiu uma dívida da contribuição autárquica de 1998 no montante de 88 euros que somadas todas as alcavalas se elevou a 260 e tal. Fiquei perplexo.

Aquela sensação, que o funcionário não desmentiu, de que se tratava de um desvio provocado pela transferência de uma base de dados antiga para a actual (questão interna do fisco). Ou de um engano no cálculo, feito à mão, do montante anteriormente pago (questão interna do fisco). Ou de uma dívida já prescrita (questão interna do fisco).

A ameaça era manifestamente desproporcionada. Mas paguei logo. Assumi a coisa como uma espécie de pagamento de uma promessa para o Dr. Bagão Félix se ir embora. Depressa. Fico à espera da próxima notificação. Dá para pensar na hipótese de começar a pagar os impostos no estrangeiro. Quiçá ir mesmo embora daqui.

Mas vamos aguentar até ao dia 20 de Fevereiro.

Ano Novo

Para reflectir no princípio de um novo ano

Se fosse possível reduzir a população do mundo inteiro a uma aldeia de 100 pessoas, mantendo a actual proporção dos habitantes do planeta, tal povoação seria composta de:

57 Asiáticos
21 Europeus
14 Americanos (do Norte, Centro e Sul)
8 Africanos
52 seriam mulheres
48 homens
70 não brancos
30 brancos
70 não cristãos
30 cristãos
89 seriam heterossexuais
11 seriam homossexuais.
6 pessoas possuiriam 59% da riqueza total, e todas as seis seriam dos EUA
80 viveriam em casas inabitáveis
70 seriam analfabetos
50 sofreriam de desnutrição
1 estaria para morrer
1 estaria para nascer
1 teria computador
1 teria formação universitária

Se o mundo for considerado sob esta perspectiva, a necessidade de aceitação, compreensão, educação e desenvolvimento torna-se evidente.

Considera ainda que, se acordaste hoje mais saudável que doente, tens mais sorte que um milhão de pessoas, que não verão a próxima semana.

Se nunca experimentaste o perigo de uma batalha, a solidão de uma prisão, a agonia da tortura, a dor da fome, tens mais sorte que 500 milhões de habitantes da Terra.

Se podes entrar numa igreja sem o medo de ser bombardeado, preso ou torturado, tens mais sorte que 3 milhões de pessoas no planeta.

Se tens comida no frigorífico, roupa no armário, um tecto sobre a cabeça, um lugar para dormir, considera-te mais rico que 75% dos habitantes deste mundo.

Se tens dinheiro no banco, na carteira ou uns trocos em qualquer parte, considera-te entre os 8% das pessoas com a melhor qualidade de vida em todo o mundo.

Se puderes ler esta mensagem, recebeste uma dupla benção, pois alguém pensou em ti e tu não estás entre os dois mil milhões de pessoas que não sabem ler.

Vale a pena tentar:

a) Trabalhar como se não precisasses de dinheiro
b) Amar como se nunca ninguém te tivesse feito sofrer
c) Dançar como se ninguém estivesse olhando
d) Cantar como se ninguém estivesse ouvindo
e) Viver como se aqui fosse o paraíso!

O princípio do ano é uma espécie de Semana Internacional da Amizade!

Envia esta mensagem a quem consideras amigo, a quem queiras desejar um dia radiante.

Criemos um mundo mais tolerante, próspero e humano. Façamos do Homem a medida de todas as coisas.
(Esta é uma daquelas muitas muitas mensagens que se recebem e que merece divulgação)

terça-feira, janeiro 4

O Falhanço

“Mas então, que alegria triste assumir como última consequência de ser livre a responsabilidade do falhanço.”

“O Aprendiz de Feiticeiro” – Carlos de Oliveira
Fragmentos – Pag. 2 (5 de 7)

Facadas

A caminho do fim. Os dois episódios de hoje - recusa de Cavaco em autorizar a utilização da sua imagem na campanha do PSD e a trapalhada de Pôncio na lista do PSD (Porto) - foram mais dois passos para o abismo.

Faltam 46 dias. O PSD parece que só poderia recuperar lançando pela borda fora Santana Lopes. Mas já é tarde. Resta saber qual a dimensão do desastre e se o PS aproveita dele para obter a primeira maioria absoluta da sua história. O PP espreita a oportunidade para se arvorar na verdadeira alternativa de direita.

"Facada nas costas"

"A realidade é muito simples: quem não tem força para dominar o seu partido, com certeza que não tem tanta ou igual força para dominar um governo", continuou, acrescentando que Santana Lopes "não comanda o partido" e "não sabe o que anda a fazer". "Se calhar isto foi bom para o país, porque sabemos com quem contamos, sabemos o partido que temos e sabemos quem manda ou não no partido", concluiu Pôncio Monteiro.” SIC



Cavaco


Surpresa? Para mim, não!

segunda-feira, janeiro 3

Deserto

“A poesia portuguesa, sobretudo a moderna, está cheia de desertos. Deserto é a palavra chave, uma obsessão, como podia provar facilmente.”

“O Aprendiz de Feiticeiro” – Carlos de Oliveira
Fragmentos (4 de 7)

Entreatos

Um post roubado ao Pentimento um blog brasileiro da minha preferência.

Para que tenhamos a noção das dificuldades em entender a descrição da realidade de países que falam a mesma língua. Reparem nas diferenças do português. Para ajudar a compreender Lula. Oportuno nas vésperas de uma campanha eleitoral em Portugal. Alguém que se lembre de rodar um documentário nos bastidores da campanha de Sócrates.

“Algumas observações atrasadas sobre Entreatos, filme de João Moreira Salles:

. O documentário é uma aula de política, justamente por registrar (com a usual elegância do João M. Salles) os bastidores, as conversas reservadas, os papos descontraídos, ou seja, tudo aquilo que está fora das declarações e dos atos oficiais cotidianos;

. Lula demonstra uma visão política global que, sinceramente, me surpreendeu. Destaque para as acuradas análises que faz a respeito da trajetória dos partidos de esquerda desde o pós-Guerra e sobre os conflitos do próprio PT;

. Mais uma vez a câmera de Walter Carvalho é operada com genialidade, buscando em meio à confusão que é o interior de uma campanha política planos significativos e de grande poder simbólico;

. Aliás, a opção pela "câmera invisível" é acertada. À medida que o filme transcorre, acompanhando no decorrer do tempo o desenrolar da campanha, é evidente que Lula e os demais ficam mais à vontade, esquecendo-se por vezes que tudo está sendo registrado;

. O personagem Lula é o filme. Espirituoso, bem-humorado, extremamente carismático, o presidente protagoniza cenas hilárias e demonstra uma simplicidade que me orgulha muito, em momentos como aquele em que vai ao barbeiro de sempre, um local humilde, para aparar a barba, ou quando, penalizado, dá carona no jatinho de campanha a um desconhecido que perdeu o vôo;

. É hilário ver o hoje ministro Palocci receitando remédio para a sinusite de Lula (e José Alencar imediatamente querendo a receita também);

. É tocante ver o carinho que Lula dispensa à mulher, cabeça recostada na dela, enquanto assiste aos programas de TV que retratam sua vitória;

. É impressionante ver com são atuais certas conversas travadas ainda durante a campanha. A questão dos dados do IBGE, por exemplo;

. É engraçado ver Lula, após receber os cumprimentos de Serra pela vitória, dizendo, em espanhol: "Perdio..."

. É de matar de rir ver Lula brincando ao telefone, como se atendesse Bush e, sem seguida, Dualde, a quem diz: "O quê? Você quer que mande o Favre de volta?"

. É bacana também vê-lo afirmar com sinceridade que não gostaria de voltar à vida na fábrica, ou o gosto pelo terno-e-gravata;

. É melhor ainda o momento em que responde um desses bobos "intelectuais de esquerda", que lhe dissera "preferir o Lula de macacão ao de terno". Retruca Lula: "Então por que você não tira esse terno e veste um macacão?"

. É alentador ver que temos um presidente bacana, concorde-se ou não com suas idéias e posturas políticas;

. É, acima de tudo, sensacional constatarmos novamente que nossos documentários estão anos luz à frente do que se faz lá fora, principalmente nos EUA, com seus incensados michael-moores. A visão chapada de Moore e seus imitadores lamentavelmente empolgam o público e grande parte da crítica, ainda que se valham de expedientes exatamente igual àqueles aos quais criticam: montagens manipuladoras e dados falsos.
Os trabalhos de João Moreira Salles e Eduardo Coutinho, mestre maior, são a prova mais absoluta de que o gênero documentário pode, sim, ser ético. E isso significa ser ético também na forma. E não se fechar em estrelismos ou maniqueísmos juvenis.
Escrito por Marcelo"

Os Amigos Nunca Morrem

Nos tempos em que a política era a resistência à ditadura, ao contrário do nosso tempo, em que a política é a resistência à inércia, havia uns heróis que se impunham por si próprios. Alguns são reconhecidos pela história, outros vivem na memória de uns quantos amigos que sobreviveram.

O Matias, que ficou conhecido como o “estudante Matias”, foi o meu ídolo de juventude nas andanças iniciáticas da oposição à ditadura. Ele suscitava confiança, tinha carisma, mobilizava para a leitura e para a acção. O Matias era um “self made man” que a doença ceifou prematuramente da vida.

Uma das primeiras tarefas que cumpri, após a minha chegada a Lisboa, nos idos de finais de 1966, foi visitá-lo, no hospital Curry Cabral, onde agonizava à espera de autorização do governo para receber um transplante de rim, à época, só possível em França. Não foi autorizado, apesar das petições, e morreu cedo.

Foi, de facto, assassinado daquela forma mansa tão típica dos tiranos da nossa terra. Não me permitiram a visita e nunca mais esqueci o ambiente opressivo e abafado dos corredores do hospital.

Restou-me acompanhá-lo no funeral realizado na minha cidade de Faro. Lembro-me, como se fosse hoje, do percurso e dos rostos de muitos dos acompanhantes. No acto final a urna foi aberta e, estando eu colocado no sentido da brisa que corria quente, fui invadido pelo cheiro do seu corpo em decomposição. Fiquei agoniado, mas resisti.

Nunca mais me saiu da memória a figura do Matias nem das narinas o cheiro do seu corpo. Talvez seja a brutalidade deste acontecimento uma das razões da minha dificuldade em suportar as visitas aos hospitais e a aceitação dos cerimoniais fúnebres.

É que os povos, os familiares e os verdadeiros amigos nunca morrem.