domingo, janeiro 20

JOSÉ BLANC DE PORTUGAL

“SUBMÚLTIPLOS”

Na escala convencional
Me vou microdividindo
Na velha base decimal.
Eis-me micro-eu
Nano-eu e pico-eu
Fento-eu e atto-eu…
Depois… acabou-se a convenção
Os eus mais pequenos
Já não têm nome…
Vou ver se lhes arranjo um pro-nome
Pois sim! Serão:
Nileus
Embora apercebíveis
E, sempre, até mais ver,
Sempre divisíveis.
Se nileus não é pronome
É lá com os gramáticos.
Mas, meus Senhores!
Sejamos práticos!!

“Descompasso”, Círculo de Poesia – Nova Série
Moraes Editores, Lisboa, 1986


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JOSÉ BLANC DE PORTUGAL
(Lisboa, 1914 – 2000, Lisboa)

Licenciou-se em Ciências Geológicas pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, tendo trabalhado, como meteorologista, no Serviço Meteorológico Nacional. A carreira científica levou-o de Lisboa às ilhas atlânticas (Açores, Madeira e Cabo Verde) e dali a Angola e Moçambique.

Poeta, ensaísta, crítico literário e musical, investigador. No campo da investigação científica, directamente relacionada com a profissão, publicou vários estudos, nomeadamente a monografia Introdução ao Estudo das Correntes de Jacto (1955). Como crítico musical, colaborou em diversas publicações, e foi crítico literário na Emissora Nacional.

Foi uma das figuras literárias portuguesas de mais vasta cultura (em vários domínios) tendo sido adido cultural no Rio de Janeiro (1973-78) e vice-presidente do Instituto de Cultura e Língua Portuguesa (1978-82).

Mas foi sobretudo como poeta que a sua personalidade mais se destacou. Foi fundador e co-director dos Cadernos de Poesia, em todas as séries, entre 1940 e 1953, tendo publicado ali alguns dos seus mais importantes poemas.

Estreou-se com o volume “Parva Naturalia” (1960, Prémio Fernando Pessoa), a que se seguiram “O Espaço Prometido” (1960), “Anticrítico” (1960, obra de reflexão ensaística), “Odes Pedestres” (1965, Prémio Casa da Imprensa), “Descompasso” (1987) e “Enéadas (1989).


 

sábado, janeiro 19

Julia Fischer

Mar Português

Ó mar salgado, quanto do téu sal
São lâgrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!

Valéu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena
Quem quere passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abysmo déu,
Mas nele é que espelhou o céu.

Fernando Pessoa

sábado, janeiro 12

UMA APOSENTAÇÃO EXEMPLAR

Faz tempo que não escrevia directamente na tela branca do absorto como tantas vezes no passado. São ciclos que se cumprem conforme a disponibilidade, e vontade, da cada um em intervir no espaço público. Hoje o que me suscita a vontade de contrariar essa tendência é a notícia da passagem à aposentação da actual presidente da Câmara Municipal de Palmela por quem tenho a maior simpatia pessoal além do mais por ser uma autarca que conhece bem, por experiência profissional, o sector cooperativo ao qual tenho dedicado, no contexto da economia social, estes últimos anos da minha vida.
O que quero dizer neste espaço, reafirmando o que já tenho escrito, é que não há volta a dar à tendência para aumentar a idade de aposentação que resulta da chamado envelhecimento demográfico versus sistema de providência baseado no modelo de redistribuição. Toda esta matéria, sem prejuízo de pontos de vista diferente acerca das políticas a adoptar, está muito bem estudada tendo sido objecto de consensos alargados.
A minha posição acerca da questão em apreço é até bastante heterodoxa pois sou favorável a que, num enquadramento legal adequado, cada cidadão deverá ser livre de escolher a idade da aposentação, não existindo limite máximo de idade, mas que os valores das pensões deveriam ter um tecto (como acontece em alguns países) e ser atribuídas, conforme o tempo de trabalho, de forma equitativa.
Esta situação de aposentação e um titular de um cargo político com menos de 50 anos de idade com contagem de tempo a dobrar - no que respeita ao exercício da função política - só contribui para descredibilizar o sistema actual mostrando a ponta do icebergue das injustiças do modelo do designado "Estado Social".
Serve este episódio ( a meu ver infeliz) para alertar da necessidade, e urgência, de todas as forças politicas e sociais, sem excepção, encontrarem dentro de si próprias a capacidade de tolerância, participação e abertura ao diálogo para, nas sedes próprias, encontrarem as melhores soluções, em primeira linha, para  que o "Estado Social" se mantenha e fortaleça - sim, fortaleça!, o que só poderá ser assegurado por mecanismos que assegurem, aos olhos de todos, mais justiça e equidade nas contribuições (receitas) e nas prestações (despesas) com o equilíbrio que o tempo presente reclama.
Se não formos capazes, como comunidade democrática e livre, de encontrar modelos de gestão dos recursos públicos ( de todos) resultantes do mais amplo consenso, não nos admiremos que ressurjam os mais desvairados populismos que, em última análise, tenderão a pôr em causa o próprio regime democrático. O assunto é sério!          

quinta-feira, janeiro 10

A BOLEIA PERDIDA

Nas férias de verão, em finais dos anos 60, costumava ir à boleia de Faro a Armação de Pêra. Era uma boleia certa. Ida e volta. Eu ia namorar. Mas um dia a boleia de volta falhou. Fiquei pendurado no sítio combinado. À beira da estrada. E nada. Fez-se noite e as minhas esperanças desvaneceram-se. Sem dinheiro, que só havia pouco, regressei a pé, à vila.

A namorada já estava longe e perto. Em casa de seus pais e eu lá não ia. Na época não havia telemóveis e na casa de meus pais nem telefone fixo. Só na loja mas tinha encerrado. Não os pude avisar da minha ausência para o jantar.

Havia que tomar medidas de emergência. Encontrar alguém amigo, ou conhecido, para pedir algum emprestado. A minha decisão, inevitável, tinha sido a de pernoitar em Armação de Pêra. Por sorte, à primeira volta pela vila, apareceu uma mão amiga. Procurei uma pensão. Havia quartos disponíveis apesar de ser verão. Sei que estávamos em 1968 pois retenho na memória as imagens dos Jogos Olímpicos, desse ano, que passavam na TV.

Dormi e de manhã regressei ao ponto de encontro habitual na praia. O meu surgimento, cedo, foi uma surpresa. Breves explicações e o resto foram as carícias de um verão promissor. Águas límpidas e areias finas, beber a vida de um trago, a reencarnação da própria beleza...

Nesse dia regressei a casa o mais depressa possível e, desta vez, sujeito ao horário do autocarro. Os meus pais não me pediram qualquer explicação, nem disseram uma palavra. Sofreram, em silêncio, a minha ausência inesperada. Imagino os seus receios e medos.

Fiquei a admira-los ainda mais. A sua confiança em mim era ilimitada. Nunca os esquecia e eles sempre me perdoavam.
 
[Um post de Novembro de 2004 no dia seguinte ao aniversário da morte de meu pai.]

quarta-feira, janeiro 9

Sibelius Symphony No. 2 - Finale

UM PEQUENO DETALHE (2ª EDIÇÃO)

Hoje na véspera da tomada de posse de Chávez, após ter ganho as eleições, sabemos que o acto não  terá lugar. Chávez, a crer nos seus próprios correligionários, não está em condições de comparecer por razões de saúde. Neste contexto veio-me à memória o que escrevi em setembro de 2007 e que a presente situação, de forma dramática, confirma:

Não vale a pena ter contemplações com este tipo de projecto de poder. Não há ditaduras a prazo. Não há ditaduras democráticas. O que Chávez quer toda a gente entende muito bem. Quer o bem dos pobres. Todos os ditadores querem o bem dos pobres. É um caminho conhecido que acaba sempre mal. Ainda pior quando os ditadores são levados ao poder através de eleições. Um dia destes Chávez deu-se ao luxo de apresentar o seu projecto de poder comparando-o com o das democracias liberais nas quais, para ele, os políticos também se perpetuam no poder. Pura aldrabice! Salvo o caso das monarquias nas quais o poder do monarca é simbólico, ou de representação, todos os regimes democrático, nos países da UE, e não só, integram mecanismos que inviabilizam a perpetuação no exercício do poder de qualquer partido ou personalidade. Os modelos são diversos mas o princípio é o da livre escolha, através de eleições democráticas, regulares, dos presidentes e dos governos. Existe até, nalguns casos, limitação do número de mandatos. É o caso do presidente da República, em Portugal, que não pode exercer o cargo por mais do que dois mandatos seguidos. É claro que sempre nos podemos colocar naquela posição de pessimismo absoluto, à beira do niilismo, de considerar todos os regimes políticos e respectivos protagonistas desprezíveis. “São todos iguais!” diz o povo amiudadas vezes. Os seres pensantes têm por obrigação contrariar este populismo de pacotilha. Essa é mesmo uma condição essencial para que os que pensam da democracia o pior possível possam continuar a dispor da liberdade de dizer mal dela. Um pequeno detalhe na fronteira entre a liberdade e a tirania.

domingo, janeiro 6

O FUNERAL DE ALBERT CAMUS - 6 de JANEIRO DE 1960

Le 6 janvier 1960, une foule d´anonymes et quelques amis se retrouvent devant la grande maison de Lourmarin où le corps d´Albert Camus a été transporté dans la nuit. Quatre villageois portent le cercueil que suivent son épouse, son frère Lucien, René Char, Jules Roy, Emmanuel Roblès, Louis Guilloux, Gaston Gallimard et quelques amis moins connu, parmi lesquels les jeunes footballeurs du village. Le cortège avance lentement dans cette journée un peut froide et atone de ce « pays solennel  et austère – malgré sa beauté bouleversante ».

Devant le caveau, Francine Camus jette une rose sur le cercueil. Le maire prononce une courte allocution et le silence n´est troublé que par le bruit de la terre sue le bois de la bière.

L´heure est de recueillement. Les communiqués officiels, les télégrammes affluent. Tous unanimes dans l´hommage et l´affliction conjugués.

Les temps ont changé, et ils sont nombreux, les détracteurs d´hier qui saluent aujourd´hui la disparition de celui aux côtés duquel ils avaient obstinément refusé de marcher. Celui qui, au terme de tant d´attaques et de malveillance, avait choisi de s´enfermer dans un douloureux silence.

Les premiers tirs étaient venus de gauche, et plus particulièrement du parti communiste qui ne pardonnait pas à cet ex-compagnon de route de prendre du recul, de regarder en face certaines réalités. De  dire l´intolérable : le stalinisme, les camps, les idéaux mis au pas par des tyrans de l´histoire.  
 
In Les Derniers Jours de la vie d´Albert Camus, José Lenzini, Actes Sud

sexta-feira, janeiro 4

Hannah Cohen

ALBERT CAMUS - O DIA DA SUA MORTE NO ANO DO CENTENÁRIO [1913-1960]



Em 2013 celebra-se o centenário de Albert Camus, nascido em 7 de novembro de 1913, na Argélia. Não estranhará a ninguém que aqui o evoquemos ainda com mais assiduidade ao longo deste ano. Este é o primeiro post de uma série que contamos dedicar à sua personalidade e à sua obra. Hoje é o dia do 53º aniversário da sua morte, ocorrida em 4 de janiro de 1960.
 
Camus publicou em vida dezanove obras, de 1937 a 1959, entre as quais se destacam os romances (“L’Étranger” em 1942, “La Peste” em 1947), as novelas (“La Chute” em 1956, “L’Exil et le Royaume” em 1957) as peças de teatro (“Caligula” e “Le Malentendu" em 1944, “L’État de siège" em 1948, “Les Justes” em 1950), e os ensaios (“L’Envers et l’Endroit" em 1937, “Noces” em 1939, “Le Mythe de Sisyphe” em 1942, “Les lettres à un ami allemand” em 1945, “L´Homme révolté” em 1951 e”LÊté” em 1954). É necessário ainda juntar três recolhas de ensaios políticos (“Les Actuelles”), “Les deux Discours de Suède” (pronunciados aquando da atribuição do Nobel) e a contribuição para a obra de Arthur Koestler intitulada “Réflexions sur la peine capitale”.
 
Outras obras foram editadas após a sua morte entre as quais se contam o “diário” dos seus pensamentos e leituras, assim como notas de trabalho, publicado sob o título “Carnets”; o diploma de estudos superiores de 1936: “Métaphysique chrétienne et néoplatonisme”, publicado pela “La Pléiade”; o romance inédito, “La Morte heureuse”, cuja redacção data de 1937; o manuscrito inacabado, encontrado na pasta de Camus depois do acidente de viação que o vitimou:“Le Premier Homme”, esboço do que viria a tornar-se o seu grande romance quasi autobiográfico e ainda a sua correspondência com o amigo Jean Grenier.

quarta-feira, janeiro 2

12-8

Hoje pela manhã cedo fui fazer os exames da medicina do trabalho – pois eu trabalho e tenho muito orgulho em trabalhar – e sinto sempre um vago sentimento de medo quando faço exames médicos seja de medicina do trabalho, ou quejandos, e o medo faz-me subir a tensão arterial, (só a bata branca me atemoriza), e disse-o ao médico, afável, que após a medição me disse 12-8, sem mais nem menos, admirável surpresa, tão baixa, e logo me lembrei quão efémera é a vida. O dia seguiu sem mais surpresas… e longo será este ano!

terça-feira, janeiro 1

ANTÓNIO MARQUES JÚNIOR



HOMENAGEM A ANTÓNIO MARQUES JÚNIOR MILITAR DEMOCRATA E POLÍTICO DE CORPO INTEIRO, UM CIDADÃO ENTRE PARES, QUE PARTILHOU A LIDERANÇA DA REVOLUÇÃO DO 25 DE ABRIL ASSUMINDO TODOS OS RISCOS SEM NADA PEDIR EM TROCA. QUE VIVA!