domingo, dezembro 16

Jorge Semprun

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Memórias ...


Nasci ao fundo da Rua de Santo António e ali aprendi a andar. Recordo diferentes Natais por ali passados, todos diferentes, todos iguais ao longo dos últimos 40 anos. Recordo com emoção, os últimos passeios antes das lojas fecharem pela mão do meu avô a "admirar as montras" como ele dizia. Ou então, à espera do meu pai, já fora de horas, a atender os últimos clientes que vinham de longe e que não podiam ir de mãos a abanar. E eu à espera que a loja fechasse. E o gato com o rabo a abanar. E sempre as lojas, sempre o servir. Servir e sorrir, ser competente e atencioso, ser melhor, ser diferente. A qualquer hora, fora de horas, a toda a hora…Sinto-me em casa por ali…como se sentem milhares de pessoas que nesta altura e noutras alturas procuram fugir da massificação das compras por obrigação. Que procuram apenas uma boa tarde sentida de uma cara conhecida e um doce que não venha de um franchising pasteleiro. E dois dedos de conversa. E um olá. E um café. E outro. Sem tempo, sem pressa. Apetece-me dizer que vim só por vir, que vim para estar enquanto noutros sítios digo ao que vim e o que quero comprar. Esta concentração cosmopolita dos pequenos prazeres humanos em tão pequeno espaço físico não a encontro em mais nenhuma outra parte do Algarve apesar dos teatros, arenas, shoppings e outras obras dos faraós locais. Quando por ali estou sei que pertenço aqui. Que este espaço é meu. Que faço parte desta cidade. Que não sou um mero cliente. E arrumo-me, faço a barba e até transporto um certo porte de respeito para com ela. Piso com cuidado a calçada portuguesa. Quem sabe, talvez encontre ao virar da esquina um antigo amigo, o Sr. Rodrigues ou até aviste o meu avô. Para lhe agarrar a mão e irmos por aí admirar as montras e acabarmos aquela conversa inacabada que um dia retomaremos.
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sábado, dezembro 15

Oscar Niemeyer

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ALDEIAS DO INTERIOR DE PORTUGAL

O Pedro Pedrosa criou uma empresa na área do turimo aventura prosseguindo a sua paixão no apoio à construção de projectos de desenvolvimento turístico sustentável. Foi ele o Coordenador do projecto da Carta do Lazer das Aldeias Históricas que, depois de um longo período de hibernação, parece querer voltar a levantar voo através de um portal, finalmente adjudicado, em construção, ainda sem endereço, e da constituição de uma agencia de gestão da marca publica-privada à semelhança das Aldeias do Xisto.

No projecto Aldeias do Xisto foi constituida uma agencia - ADXTUR - que agrupa todas as Câmaras Municipais, agências privadas, associações e individuais que têm por fim gerir e manter a qualidade da marca e do destino com trabalho em curso de certificação da qualidade de serviços e de imagem, entre outros.

Os meus desejos sinceros de boa sorte pois todas estas inicitaivas, sendo uma realidade pouco conhecida, são verdadeiras guardas avançadas do desenvolvimento económico/social de regiões deprimidas do interior do país.
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quinta-feira, dezembro 13

TRATADO, REFERENDO ...

Hoje, apesar da dor de cabeça, é impossível não escrever algo acerca do Tratado Reformador de Lisboa. Neste dia 13 de Dezembro foi selado um compromisso entre os 27 governos dos países da UE em prol do prosseguimento do projecto europeu que teve inicio em 1957. Falta a fase de ratificação do Tratado por cada um dos países membros e, como seria de esperar, veio à tona a questão do referendo.

Não há neste facto quelquer novidade nem mesmo surpreende a aliança entre as forças políticas que ocupam os extremos de qualquer hemiciclo em prol da realização do referendo. O que surpreende é o facto, por exemplo, da Juventude Socialista ter saído, hoje mesmo, em sua defesa.

Já dei o meu modesto contributo acerca do Tratado e do Referendo em dois artigos de opinião: PORTUGAL NA PRESIDÊNCIA e REFERENDO E TRATADO EUROPEU. Reconheço que a defesa do referendo, reclamado pelo PS no seu programa eleitoral, e também pelo PSD, se tornou num compromisso inconveniente mais por razões dos outros do que de nós mesmos.

Mas seria uma jogada política de mestre se Sócrates, apesar das razões que diz assistirem às dúvidas do Presidente, viesse a propor a realização do referendo, ou seja, cumprisse com o prometido. Difícil? Impossível? Deve ser da febre. Mas sempre me dava a oportunidade de votar: SIM!

Mas caso a opção do Governo socialista seja a da ratificação do Tratado pelo Parlamento então terá que explicar, com detalhe e detença, as razões da quebra do compromisso eleitoral que assumiu perante os portugueses. Não me parece que esta explicação seja politicamente irrelevante. Parece-me mesmo que será muito relevante não tanto como resposta às tomadas de posição do PCP e do BE mas pela credibilidade política do próprio PS enquanto partido de Governo.
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Para quem ainda tenha dúvidas acerca do sucesso da presidência portuguesa da UE vale a pena ler este depoimento qualificado.
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uma por rolo

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terça-feira, dezembro 11

EDUCAÇÃO


Aviso à cabeça que não assisti ao debate de hoje no parlamento, versando o tema da educação, e que o que sei resulta da leitura das notícias na net e de uma imagens que vi passar num café onde avistei o tiranete de dedo espetado a perorar … imagino que fosse acerca de segurança.
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Mas serve o presente post só para dizer que, apesar de ser apóstolo do futuro que, como diz o povo, a Deus pertence, há um tema acerca do qual Santana Lopes não devia abrir a boca sem morrer de vergonha: a educação. Também é verdade que a vergonha não é o seu forte …
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A ministra da educação do governo de Santana Lopes foi uma senhora chamada Maria do Carmo Seabra, o grau zero na matéria, sendo a época do seu magistério a da maior balbúrdia no ME de que há memória nos últimos decénios, incluindo a deslocalização de uma Secretaria de Estado para Aveiro.
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Todos os indicadores, acerca do estado da educação em Portugal, que têm vindo a lume, se referem a períodos de tempo que não ultrapassam o ano de 2006 quando é sabido que o actual governo entrou em funções na primavera de 2005.

Todos os dados avançados, seja por quem for, com mais ou menos grau de certeza, no plano quantitativo, são meramente empíricos, ou provisórios, pois em matérias de educação não é possível escrutinar resultados qualitativos à distância de um ou dois anos face ao momento da tomada de novas medidas de política.

O mais seguro para todos , críticos e criticados, oposição, corporações e governo, se estiverem de boa fé, é esperar pelos resultados de 2008 que devem ser divulgados em 2009, exactamente o ano das eleições legislativas. Ora aí está um timing apertado, mas razoável, para se realizar um balanço acerca dos resultados da política de educação deste governo e dele retirar as devidas ilacções. A democracia tem algumas coisas que fazem lógica!
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A CHINA E A CIMEIRA UE/ÁFRICA

China diz-se satisfeita com conclusões da cimeira Europa-África em Lisboa

Os chineses é que sabem! Vejam lá se encontram na tomada de posição que divulgaram alguma palavra crítica acerca da cimeira EU/África? Os chineses que estão em África em força escolhem, assim, na sua infinita sabedoria, aliarem-se aos seus potenciais concorrentes. Mais vale prevenir do que remediar …
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segunda-feira, dezembro 10

SEIXAS DA COSTA

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Otis Redding

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ALBERT CAMUS - O DIA DO NOBEL CINQUENTA ANOS DEPOIS


Quando soube da atribuição do Prémio Nobel “pela sua importante obra literária, que foca com penetrante seriedade os problemas que se colocam nos nossos dias à consciência dos homems”, Albert Camus escrevu nos Cadernos: “Prémio Nobel: estranho sentimento de desânimo e melancolia. Aos vinte anos, pobre e nu, conheci a verdadeira fama” .

Camus afirmou então que o Prémio deveria ter sido atribuido a André Malraux e manifestou dúvidas acerca da sua própria capacidade e força criadora que sempre o atormentaram. Após o anúncio da atribuição do Nobel sujeitou-se a ataques odiosos, que o não deixaram indiferente e comentou: “Assustado com aquilo que me acontece e que não pedi. E, para cúmulo, ataques tão infames que o coração se me aperta.”(Cadernos).

Mas Camus, segundo todos os testemunhos, não podia, nem queria, recusar o Prémio. Telefonou, de imediato, à mãe, que sempre viveu na Argélia, como que a agradecer à sua origem a honra que lhe tinha batido à porta. Escreveu a Jean Grenier, o seu professor e mentor intelectual : “(…) quando recebi a notícia, o meu primeiro pensamento foi, depois de minha mãe, dirigido ao senhor. Sem o senhor, sem essa mão efectuosa que estendeu à criança pobre que eu era, sem a sua instrução e o seu exemplo nada disto tinha acontecido.” (citado a partir de Roger Quilliot).

René Char, um amigo de todas as horas, não cabia em si de contente e manifesta esse contentamento de várias formas incluindo um artigo publicado, logo em 26 de Outubro de 1957, no Figaro littéraire, intitulado “Je veux parler d’ un ami”.

No ínicio de Dezembro de 1957 Camus partiu com a mulher, Francine, para Estocolmo e, em todas as suas aparições em público, tinha a consciência que devia estar preparado para ser atacado a propósito da sua discrição a respeito do conflicto na Argélia que estava no auge.

Albert Camus , a 10 de Dezembro de 1957, passam hoje 50 anos, recebeu das mãos do Rei Gustavo VI da Suécia o diploma e, no banquete que se seguiu, proferiu o seu discurso de agradecimento. Logo num dos dias seguintes escreveu a Jean Grenier descrevendo, de forma sintética, o que sentia: “A corrida acaba, o touro está morto, ou quase.

Albert Camus – discurso de 10 de Dezembro de 1957

Dircurso pronunciado, segundo a tradição, na Câmara Municipal de Estocolmo, no fim do banquete que encerrava as cerimónias da atribuição dos Prémios Nobel. (Versão integral em francês.)

Alguns excertos:

Je ne puis vivre personnellement sans mon art. Mais je n'ai jamais placé cet art au-dessus de tout. S'il m'est nécessaire au contraire, c'est qu'il ne se sépare de personne et me permet de vivre, tel que je suis, au niveau de tous. L'art n'est pas à mes yeux une réjouissance solitaire. Il est un moyen d'émouvoir le plus grand nombre d'hommes en leur offrant une image privilégiée des souffrances et des joies communes.
(...)
C'est pourquoi les vrais artistes ne méprisent rien ; ils s'obligent à comprendre au lieu de juger. Et s'ils ont un parti à prendre en ce monde ce ne peut être que celui d'une société où, selon le grand mot de Nietzsche, ne règnera plus le juge, mais le créateur, qu'il soit travailleur ou intellectuel.

(...) l'écrivain peut retrouver le sentiment d'une communauté vivante qui le justifiera, à la seule condition qu'il accepte, autant qu'il peut, les deux charges qui font la grandeur de son métier : le service de la vérité et celui de la liberté. Puisque sa vocation est de réunir le plus grand nombre d'hommes possible, elle ne peut s'accommoder du mensonge et de la servitude qui, là où ils règnent, font proliférer les solitudes. Quelles que soient nos infirmités personnelles, la noblesse de notre métier s'enracinera toujours dans deux engagements difficiles à maintenir : le refus de mentir sur ce que l'on sait et la résistance à l'oppression.
(...)
Ces hommes, nés au début de la première guerre mondiale, qui ont eu vingt ans au moment où s'installaient à la fois le pouvoir hitlérien et les premiers procès révolutionnaires, qui furent confrontés ensuite, pour parfaire leur éducation, à la guerre d'Espagne, à la deuxième guerre mondiale, à l'univers concentrationnaire, à l'Europe de la torture et des prisons, doivent aujourd'hui élever leurs fils et leurs œuvres dans un monde menacé de destruction nucléaire.
(...)
Chaque génération, sans doute, se croit vouée à refaire le monde. La mienne sait pourtant qu'elle ne le refera pas. Mais sa tâche est peut-être plus grande. Elle consiste à empêcher que le monde se défasse.
(...)
Je n'ai jamais pu renoncer à la lumière, au bonheur d'être, à la vie libre où j'ai grandi. Mais bien que cette nostalgie explique beaucoup de mes erreurs et de mes fautes, elle m'a aidé sans doute à mieux comprendre mon métier, elle m'aide encore à me tenir, aveuglément, auprès de tous ces hommes silencieux qui ne supportent, dans le monde, la vie qui leur est faite que par le souvenir ou le retour de brefs et libres bonheurs.

Ramené ainsi à ce que je suis réellement, à mes limites, à mes dettes, comme à ma foi difficile, je me sens plus libre de vous montrer pour finir, l'étendue et la générosité de la distinction que vous venez de m'accorder, plus libre de vous dire aussi que je voudrais la recevoir comme un hommage rendu à tous ceux qui, partageant le même combat, n'en ont reçu aucun privilège, mais ont connu au contraire malheur et persécution. Il me restera alors à vous en remercier, du fond du cœur, et à vous faire publiquement, en témoignage personnel de gratitude, la même et ancienne promesse de fidélité que chaque artiste vrai, chaque jour, se fait à lui-même, dans le silence.
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