Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
terça-feira, maio 31
Dar força à economia social ─ solidariedade, democracia e socialismo
Fotografia na qual surgem dois destacados militantes do PS oriundos do MES, como eu próprio, desde a sua fundação (Ferro Rodrigues e Joaquim Banha)
Pela primeira vez, desde o momento em que aderi ao Partido Socialista, em 1986, me associo à apresentação de um documento a um Congresso nacional, neste caso ao XXI Congresso que se realiza no próximo fim de semana. Na verdade trata-se de um projeto coletivo cujo principal inspirador foi Rui Namorado ao qual me associei por força das minhas convicções adquiridas, desde há muito, e consolidadas através do meu trabalho profissional na área da economia social. Deixo aqui o texto dessa moção setorial subscrita por um conjunto alargado de socialistas, e de simpatizantes, que têm dedicado grande parte das suas vidas ao pensamento e ação em prol do associativismo livre, do cooperativismo ao mutualismo, da ação social ao desenvolvimento local e regional, em particular, na atividade autárquica. A minha adesão à militância cívica, politica e associativa, como os meus amigos sabem, vem de longa data mas nunca é tarde para a manifestar de forma renovada desde que seja por causas que valham a pena. A economia social, que enraíza no associativismo livre, berço do socialismo democrático, do trabalhismo e da social democracia, é muito mais do que um adorno partidário, no plano programático, contendo em si mesma as sementes de um novo modelo económico-social que está a germinar nas entranhas da crise que atravessa todas as sociedades, em particular, as dos países europeus.
XXI CONGRESSO NACIONAL DO PARTIDO SOCIALISTA
MOÇÃO SETORIAL
Dar força à economia social ─ solidariedade, democracia e socialismo
1. Introdução
2. O PS e a economia social
3. Para uma visão futurante da economia social
4. Alguns vetores estruturantes de uma política de fomento da economia social
5. Para uma política quanto à economia social na Europa e no Mundo
6. Para uma política de fomento da economia social
7. Conclusão
1. Introdução
1.1. A economia social abrange um conjunto de organizações e de
práticas sociais, quase sempre animadas por movimentos sociais
emancipatórios. Baseia-se na cooperação, na reciprocidade e na
solidariedade. É uma resistência à lógica económico-social dominante,
antecipando uma alternativa pós-capitalista.
De um ponto de vista histórico e pela sua dinâmica, a economia
social é uma trave mestra do projeto socialista. Contribui para compensar
os desequilíbrios sociais e as pulsões predatórias que afligem as
sociedades atuais, mas antecipa também um horizonte pós-capitalista.
Responde a problemas do presente, antecipando um futuro desejável e
possível.
É uma instância de transformação social que se guia por princípios
e valores que coincidem, no essencial, com os do socialismo democrático.
De facto, a economia social exprime e acelera a metamorfose exigida pelo
bloqueio que tolhe as sociedades atuais. Por isso, a sua importância é bem
maior do que aquilo que refletem os números que a espelham.
Mas mesmo que fossem apenas esses números a medir a sua
importância mostrariam uma realidade de relevância mundial. Há centenas
de milhões membros dessas organizações que em todo o mundo dão vida
às suas várias famílias; e contam-se por milhões as oportunidades que
suscitam e os postos de trabalho que criam. É enorme a riqueza que
geram. As atmosferas que as rodeiam são focos de irradiação de
solidariedade.
A sua fragilidade enfraquece a democracia; o seu vigor depende do
vigor da democracia. Qualquer estratégia reformista de transformação
social dificilmente se pode afirmar, esquecendo-a.
1. 2. Independentemente da forma jurídica que cada uma das suas
organizações assume, o que identifica a economia social é o primado dos
objetivos sociais sobre a procura do lucro, a sua utilidade social e a
partilha de uma identidade pós-capitalista. Neste sentido, além de uma
galáxia de tipos organizativos, a economia social consubstancia um leque
de movimentos sociais, marcados pela afirmação de uma cidadania
económica e social que completa e aprofunda a cidadania política.
No caso português, a economia social está expressamente
delimitada e caracterizada na Lei de Bases da Economia Social (LBES), a
qual articula os preceitos constitucionais que se ocupam do sector
cooperativo e social com a legislação comum que rege as diversas partes
da economia social. E o sector cooperativo e social consagrado na
Constituição da República (CRP) e que faz parte dela, corresponde quase
por completo ao seu âmbito.
Estamos por isso perante uma noção legalmente fixada e não
perante uma noção difusa que possa variar ao sabor de doutrinas ou de
opiniões.
2. O PS e a economia social
2.1. O PS deve considerar a economia social - uma das raízes
fundadoras do socialismo democrático – como uma das bases da sua
estratégia de promoção do desenvolvimento económico-social do país,
posta em prática através de políticas concretas, consonantes com CRP e a
LBES, e materializadoras de uma verdadeira democracia participativa.
A economia social inscreve-se com naturalidade no horizonte de
esperança do partido socialista. De facto, em regra, as práticas de
economia social antecipam uma sociedade mais justa, livre e humanizada,
o que suscita uma óbvia sinergia com os objetivos últimos do PS.
Por outro lado, a atual conjuntura mostra, de forma vincada, como
não é prudente esquecer que o fomento da economia social deve ser um
elemento fundamental da política de desenvolvimento do nosso país, da
sua sustentabilidade duradoura, bem como da sua qualidade humanista.
2.2. Nessa medida, o PS, em consonância com a sua história, com
o seu posicionamento político e com o seu programa, deve dar
centralidade ao desenvolvimento da economia social. E um dos aspetos
nucleares dessa política é o autárquico, o que implica a valorização dos
processos de desenvolvimento regional e local. Deste modo:
2.2.1. É necessário apoiar, sistematicamente, os militantes e
simpatizantes socialistas, que são protagonistas nas organizações de
economia social.
Por outro lado, o PS deve tornar o fomento da economia social um
elemento central da sua política, quer no plano nacional, quer no plano
regional, quer no plano autárquico, quer mesmo no plano europeu.
2.2.2. Nesta medida, para o PS a economia social tem que ser, muito
mais do que um item programático, um novo território de intervenção
política que se afirme como um dos pilares da sua visão global e como
ilustração prospetiva da sua identidade histórica.
Isto impõe que o PS assuma uma política pública para a economia
social que, respeitando plenamente a sua autonomia, consiga incentivá-la.
Para isso tem que conjugar a ação política do Estado em todos os seus
níveis, com uma intervenção social direta e organizada dos socialistas no
quotidiano da economia social.
2.2.3. Há pois que promover não só o robustecimento estratégico
da sua importância estrutural e prospetiva, mas também a instituição, no
plano partidário, de novas estruturas de intervenção que possibilitem uma
nova maneira de inserir o PS na sociedade.
3. Para uma visão futurante da economia social
3. Sistematizando aspetos essenciais desta visão da economia social,
sublinhem-se algumas ideias básicas que ajudam a clarificar o sentido e a
utilidade das propostas que, de seguida, se apresentam:
3.1. É politicamente regressivo depreciar o potencial reformador
das práticas cooperativas, associativas, mutualistas e solidárias.
3.2. Grande parte das instâncias da economia social
internacionalmente disseminadas são exemplos de uma globalização
emancipatória e solidária.
3.3. As entidades da economia social são pioneiras na valorização,
quer da responsabilidade social das empresas, quer da ação
empresarial em rede.
3.4. Qualquer política de desenvolvimento da economia social tem
que respeitar a história e a autonomia das respetivas organizações.
3.5. Há que refletir nas políticas públicas o facto de a Constituição
consagrar expressamente o princípio da proteção do “sector cooperativo
e social”, encarando-o autonomamente.
3.6. A luta contra o desemprego e contra a exclusão social, baseada
num princípio ativo de protagonismo dos excluídos, recebe da economia
social um contributo decisivo.
3.7. Há uma sinergia forte entre a economia social e o
desenvolvimento regional e local, conducente a um enraizamento
territorial da atividade económica que verdadeiramente a humanize,
potenciando a sua impregnação democrática.
4. Alguns vetores estruturantes de uma política de fomento da
economia social
4. Todas estas ideias devem ser enquadradas por alguns vetores
estruturantes de atuação, destacando-se aqui os que mais têm a ver com
a forte vocação autárquica do Partido Socialista.
4.1. Cabe ao PS valorizar o papel que a economia social
desempenha no desenvolvimento regional e local, estimulando as
sinergias necessárias.
4.2. Deve ser dado um apoio sistemático aos socialistas que se
encontram envolvidos nas entidades deste sector.
4.3. O fomento da economia social, como parte do desenvolvimento
regional e local, deve ser encarado como um elemento importante da
reforma do Estado. Ele deve reforçar o carácter democrático da
descentralização administrativa, contribuindo sustentadamente para
atenuar o desequilíbrio demográfico e económico do país, combatendo
assim o seu despovoamento e o aumento do risco de desertificação.
4.4. Por último, insista-se na ideia de se criar um novo setor de
intervenção sociopolítica do partido, consubstanciado na criação de uma
estrutura nacional temática da economia social, no enquadramento nos
Estatutos do Partido de novas seções, no desenvolvimento de seções já
existentes ou num tipo novo de estruturas.
5. Para uma política quanto à Economia Social na Europa e no
Mundo
5. Inserindo-as na visão do mundo que as ideias acima mencionadas
e os vetores estratégicos que as suportam refletem, podem formular-se
algumas propostas políticas mais específicas, no plano europeu e no
plano mundial:
5.1. O PS deve ter uma política europeia para a economia social.
Destaquem-se três vertentes prioritárias.
5.1.1. A primeira implica a defesa, no quadro da União Europeia, da
consideração político-jurídica autónoma da economia social como um
sector com uma lógica própria, que se distingue, quer do sector público
quer do sector privado, sem prejuízo de uma possível colaboração entre
todos eles, no respeito pelas suas diferenças. Um sector que, desse modo,
não pode ser um mero instrumento de políticas públicas ditadas do seu
exterior, nem um instrumento de simples projeção, enriquecimento e
legitimação ao serviço do sector privado e a reboque da respetiva lógica.
5.1.2. A segunda, essencial, consiste na garantia, institucionalmente
formalizada no quadro da UE, de que cada país pode com plena
legitimidade encarar a economia social de acordo com o perfil e com os
limites que ela assuma dentro da respetiva ordem jurídica.
5.1.3. A terceira, em harmonia com a anterior, implica lutar-se para
que as instâncias da União Europeia reconheçam, com todas as
implicações institucionais, políticas, económicas e sociais, que na ordem
jurídica portuguesa são empresas sociais todas aquelas que estiverem
integradas na economia social (tal como a LBES a define) e só essas.
5.2. É um ponto crucial para o desenvolvimento da economia social
o estabelecimento de relações internacionais sólidas com movimentos
congéneres de outros países, regiões e continentes.
Há pois que apoiar a respetiva participação ativa em todas as
instâncias internacionais da economia social. Nesse quadro, há que
valorizar mais o protagonismo de Portugal na cooperação dentro da
Organização Cooperativista dos Países de Língua Portuguesa (OCPLP),
no plano da economia social.
6. Para uma política de fomento da economia social
6. O PS deve assumir uma política de fomento da economia social
em torno dos seguintes eixos centrais de atuação:
6.1. O primeiro traduz-se num conjunto programas de apoio e
fomento:
6.1.1\. Apoio e fomento através de programas para a criação,
modernização e expansão de cooperativas, associações mutualistas e
outras entidades associativas, bem como de fundações, todas elas
orientadas para a produção de bens e serviços de qualidade;
6.1.2. Criação de um programa plurianual de apoio às organizações
do subsetor solidário da economia social – com base num modelo de
contrato de financiamento, por concurso, integrando uma diferenciação
positiva, em função da quantidade e qualidade dos serviços
contratualizados e efetivamente prestados e da avaliação de resultados,
inserindo-os numa lógica cidadã de transformação social, radicada num
respeito efetivo por todos os direitos humanos, rumo a uma diminuição
sustentada e estrutural da pobreza e das desigualdades sociais;
6.1.3. Fomento da criação de parcerias entre entidades dos setores
público e da economia social, sob a forma de “régie cooperativa”,
(cooperativa de interesse público), tendo em vista a reutilização,
reafectação e rentabilização de equipamentos, podendo, para esse efeito,
recorrer aos recursos financeiros oriundos dos “Fundos Estruturais”;
6.1.4. Lançamento, a nível nacional, em parceria público-social que
envolva todas as estruturas representadas no CNES (Conselho Nacional
para a Economia Social), de um programa de divulgação e promoção
dos valores da cooperação, solidariedade e associativismo, nas suas
diversas formas jurídicas, dirigido aos jovens, em particular, em ambiente
escolar, predominantemente dirigido aos alunos do ensino básico;
6.1.5.Promoção de medidas de diferenciação positiva nos regimes
fiscal e de segurança social, dando resposta, de forma integrada, às
diferentes necessidades de implementação, consolidação e viabilização das
entidades da economia social;
6.1.6.Apoio à valorização e capacitação de militantes, criadores e
empreendedores sociais, de forma a habilitá-los a promoverem projetos
que visem criar novas soluções para os mais relevantes problemas sociais,
com o objetivo de encorajar o surgimento de novas organizações ou novas
iniciativas sociais.
6.2.Um outro eixo da política de desenvolvimento da economia
social que deve ser prosseguida pelo PS é o que envolve a continuação da
reforma legal e institucional da economia social e a sua permanente
reavaliação, à luz da nova política seguida pelo atual Governo, tendo
sempre presente o imperativo de respeito pela Constituição e de
compatibilidade com a LBES. Assim, propõe-se:
6.2.1. A continuação e a reavaliação da reforma da legislação
ordinária do setor da economia social, no quadro da LBES e com pleno
respeito pela Constituição, para serem criadas condições para o
desenvolvimento e modernização das entidades que o integram e para a
expansão das suas atividades;
6.2.2. A promoção da reforma estatutária da CASES, dotando-a
de competências próprias de entidade reguladora do setor da economia
social, considerando o seu perímetro nos termos do previsto no art.º 4.º da
LBES;
6.2.3. A promoção da reforma do estatuto do voluntariado,
respeitando a sua complementaridade em relação ao trabalho assalariado,
de modo a dotá-lo de um enquadramento legal adequado à promoção do
seu crescimento, dada a sua importância na sociedade portuguesa;
6.2.4. Em articulação com as estruturas do sector, instituir estímulos
relevantes à criação entre os jovens de organizações inseridas na
economia social;
6.2.5. Promover sistematicamente a educação e a formação
cooperativa, mutualista e solidária, no plano da educação, quer formal,
quer informal, no quadro de uma valorização geral e estruturante da
economia social.
6.3. Um outro eixo do fomento da economia social a ser assumido
pelo PS é o que visa o apoio e incentivo ao reforço e reforma do
movimento associativo, garantindo-se:
6.3.1. Estímulo e apoio a uma reforma da organização do
movimento associativo, preservando a sua autonomia e independência
face aos poderes públicos, em prol do fortalecimento, e criação, de
organizações associativas de grau superior – Uniões, Federações e
Confederações – reforçando e dignificando a sua presença nas instâncias
de concertação social nacionais e nos fora internacionais;
6.3.2. Reforma do CNES (Conselho Nacional para a Economia
Social), promovendo o seu alargamento a novas entidades representativas
do setor da economia social;
6.3.3. Reformulação do programa de apoio à qualificação
institucional das entidades associativas de nível superior do setor da
economia social, reforçando os recursos que lhe são destinados com
origem nos Fundos Estruturais.
6.4. Como passo relevante, indispensável e urgente, no
desenvolvimento de políticas autárquicas de fomento da economia social,
propõe-se a criação de um Conselho Municipal da Economia Social que
projecte, no plano municipal, aquilo que significa no plano nacional o
Conselho Nacional para a Economia Social. Essa criação deve ser
articulada, no seu desenho e na sua implantação em concreto, com outras
práticas congéneres eventualmente já existentes no plano
autárquico.
6.4.1.Nos municípios liderados pelo PS pode desde já abrir-se
caminho, instituindo como instância política informal um Conselho
Municipal para a Economia Social, enquanto órgão de consulta da
Câmara Municipal.
6.4.2. No mesmo sentido, o PS criará uma Lei-Quadro dos
Conselhos Municipais para a Economia Social, que ficará assim
disponível para ser utilizada pelas câmaras municipais que o queiram
instituir em concreto.
6.4.3. Uma instância deste tipo, necessariamente flexível para poder
ser utilizada pelas autarquias permitindo um reforço do protagonismo das
entidades nela envolvidas, do seu mútuo reconhecimento, acompanhado
por um sentimento de pertença a um mesmo conjunto e por um forte
impulso dirigido à intercooperação. Vai também ficar mais facilitada uma
colaboração sistemática entre o poder autárquico e a economia social,
suscetível de os entrelaçar duravelmente.
6.4.4. Será igualmente desejável que, a partir dos Conselhos
Municipais para a Economia Social, se abra caminho a novas formas de
cooperação e a novas sinergias entre as entidades de economia social
situadas em cada freguesia, potenciando-se até, naturalmente, o
envolvimento das correspondentes entidades autárquicas nesses processos.
6. 5. No âmbito de uma política de desenvolvimento regional e local
fortemente impregnada pela economia social, deverá promover-se politica,
jurídica e institucionalmente uma plena inserção do subsector
comunitário na economia social, com especial relevo para os baldios.
Far-se-á assim uma reavaliação do protagonismo possível das
cooperativas de interesse público nesse novo contexto, quer ao nível
municipal, quer ao nível das freguesias.
6.6. No âmbito da modernização político-jurídica da economia
social, o PS deverá também ocupar-se do subsector autogestionário,
atualizando o seu enquadramento jurídico comum, de modo a criar um
caminho viável de subsistência para as empresas de que os seus titulares
desistirem, pela mão e sob a responsabilidade dos respetivos
trabalhadores.
6.7. No âmbito do subsector cooperativo, deve ser dada
continuidade à reforma jurídica, sem contudo deixar de se reavaliar o
caminho já percorrido, quer no plano jurídico-constitucional, quer no
plano político. Devem ainda ser abertas algumas janelas de renovação, tais
como, a título de exemplos:
6.7.1. Preenchimento da inexplicável lacuna do sistema jurídicocooperativo
português, existente desde a entrada em vigor do Código
Cooperativo em 1980, quanto às cooperativas de crédito. Na verdade, não
foi ainda publicado nenhum diploma legal que regulasse, na sua
globalidade, as cooperativas de crédito, apenas se tendo mantido uma
das suas parcelas, a das Caixas de Crédito Agrícola Mútuo (CCAM).
A iniciativa a assumir deve ser naturalmente concertada, quer com
as CCAM, quer com outros estabelecimentos bancários que existam no
seio da economia social, nomeadamente com o Montepio.
6.7.2. Na esteira de algumas das propostas políticas atrás feitas,
justifica-se uma reapreciação do diploma legal por que se regem as
cooperativas de interesse público, de modo a ajustá-lo ao acréscimo
qualitativo de protagonismo que se espera deste tipo de entidades.
Na verdade, não deve aqui recear-se a opção por uma atitude
pioneira que, ainda que muito atenta às necessidades e potencialidades das
cooperativas de interesse público já existentes, tenha o rasgo necessário
para dar respostas inovadoras, no plano da cooperação entre o sector
público e o sector cooperativo e social. Por exemplo, poder-se-ia renovar a
abordagem da problemática das empresas de inserção, que tão
promissoras foram, fazendo com que assumissem a forma de cooperativas
de interesse público.
6.7.3. Como resposta inovadora a desafios urgentes, há que apostar
na criação de um novo ramo cooperativo, as cooperativas de mão-de-obra,
instrumento que pode ajudar os trabalhadores a gerir melhor a sua
própria precariedade, o risco de desemprego, aumentando a flexibilidade
da oferta laboral, mas podendo calibrá-la eles próprios, em termos que
maximizem a proteção dos seus direitos. A complexidade e a novidade
desta via impõem uma prévia concertação com o movimento sindical,
indispensável para garantir que o novo ramo se insira na defesa dos
trabalhadores e não na instrumentalização das suas dificuldades.
6.7.4. Numa outra vertente, radicada na educação, seria muito
positivo criar mais um novo ramo cooperativo ou integrar uma vertente
nova num ramo já existente, predominantemente destinado aos alunos dos
primeiros níveis de ensino, o das cooperativas escolares. Assim, seria
gerada um vivência sistemática de cooperação, reciprocidade e
solidariedade, que enriqueceria o processo educativo geral e seria
indiretamente uma educação cooperativa pela prática.
6.7.5. O fomento do cooperativismo agrícola, na atual conjuntura
com especial incidência nas adegas cooperativas, é um estímulo poderoso
do desenvolvimento económico-social de muitos territórios. Merece uma
menção específica. E só pode esgotar todas as suas virtualidades se for
encarado como um aspeto do desenvolvimento rural, como um aspeto
importante do combate ao despovoamento do interior do país e nalguns
casos à sua desertificação.
O estímulo ao cooperativismo agrícola implica um reexame
profundo da fiscalidade que nele incide, bem como das estratégias
implícitas nas políticas públicas que o materializem, sejam elas nacionais
ou europeias. Um reexame que se deve inserir na aposta numa
territorialização conjugada dos protagonismos vividos dentro da economia
social, favorecendo e pressupondo uma intercooperação alargada,
especialmente no que diz respeito à cooperativização da intermediação
económica.
Essa política de fomento deve assumir-se também, nomeadamente,
como procura de novas formas de propriedade e de posse (cooperativas
e sociais), como uma aposta num reforço estrutural do papel nela atribuído
às cooperativas de interesse público (ou régies cooperativas), como
opção por um aprofundamento da natureza e da qualidade da gestão
cooperativa, bem como pela abertura a uma aproximação com as
microempresas em geral, num esforço de complementaridade que as
conjugue sistematicamente com a economia social, no plano local.
6.8. Existiu, ligada ao PS, a Fundação Azedo Gneco, uma
fundação que se ocupava do cooperativismo e do associativismo. Foi
extinta. Pelo papel que a Economia Social tem vindo a conquistar em
Portugal, na Europa e no Mundo, e pelo modo com é urgente que se insira
na vida do PS, compreende-se facilmente a proposta de recuperação da
Fundação Azedo Gneco.
Poderá ser uma fundação autónoma ou a criação de uma seção
autónoma dentro da Fundação Res Publica. Poderá ter a sua sede física
fora de Lisboa. Abrangerá toda a economia social.
6.9. Para que a economia social não continue a ser menosprezada e
incompreendida, com prejuízo para o seu desenvolvimento e para os seus
objetivos, é indispensável encará-la como objeto autónomo de estudo,
investigação e ensino.
Nomeadamente, é urgente autonomizar, nos concursos públicos de
projetos de investigação, uma área da economia social, delimitada e
identificada com base na ordem jurídica portuguesa.
7. Conclusão
Esta moção pretende alertar para a relevância da economia social,
quer como decisiva instância de solidariedade e desenvolvimento, quer
como elemento estruturante do socialismo democrático.
É urgente levar a sério a sua temática. Ignorá-la poderá traduzir-se
num prejuízo para o país, numa renúncia do PS a um maior enraizamento
social e a uma maior robustez política. E para o atual Governo poderá ser
a perda de um importante contributo para a prossecução dos seus objetivos
essenciais, poderá ser a renúncia a um fator estratégico de reforço da
maioria parlamentar que o sustenta.
sábado, maio 28
EUROPA
A Europa, na sua versão UE, estrebucha em suas contradições, exercitando a hegemonia das potências do centro, sem territórios contíguos para conquistar (a Rússia a leste nunca foi conquistável!), e sem exército capaz de qualquer empresa militar de vulto (a Inglaterra debate-se com a opção entre o continente ou o reencontro com sua velha tradição atlântica), centrifugando os países que compõem a sua periferia a sul, paradoxalmente, vizinhos de zonas politicamente destruturadas e socialmente pulverizadas. O centro da Europa (a Alemanha, os países do Benelux, e seus aliados a Norte) parece estar apostada em desguarnecer uma fronteira crucial para o desenvolvimento do seu próprio projeto hegemónico. A Rússia e os USA têm vindo, no plano estratégico, a cercar a Europa e os sistemas de alianças intraeuropeus, de que a UE é o supremo paradigma, oscilam ameaçando ruir. Haverá o "suplemento de alma" capaz de fazer resistir o projeto da UE, com seus princípios democráticos, a todas as ameaças? Ou ainda veremos surgir, como vencedores, os pregadores das vantagens da tirania? Com ou sem guerra? Esperemos pelo referendo no Reino Unido e pelas eleições na América. Logo depois se poderá fazer um balanço realista acerca das perspetivas de futuro.
segunda-feira, maio 23
Festejos futebolisticos
Nos últimos dias têm sido só festas futebolísticas, por entre as sombras de um processo de investigação a viciação de resultados, com receções oficiais e manifestações populares de norte a sul. Quem vence festeja e, como os céticos costumam dizer, o povo esquece as carências e as mágoas. Quem perde aspira à "vingança" na próxima oportunidade. O mais curioso das festas deste ano é a associação presidencial - dos clubes e da república - ao júbilo dos vencedores, em regra, sem uma palavra para os vencidos. Como se também nesta disputa, o fluxo futebolístico não fosse sempre composto por duas partes que se complementam: vencedores e derrotados. Por detrás de todos os contendores, que se digladiam pelos campos de futebol desse pais, existem paixões e imaginários que nem por se tratar de um jogo são menos importantes do que a luta pela dignidade no trabalho, pela defesa da liberdade e pela exaltação da cidadania. Nada contra as festas mas como se escreveu naquela ardósia da gelataria de Almoçageme, de uma familiar de um italiano fugido à ditadura fascista de Mussolini, Paz Respeito Liberdade.
sábado, maio 14
AEROPORTO GENERAL HUMBERTO DELGADO
Amanhã, domingo, o aeroporto da Portela, em Lisboa, vai ser batizado de Aeroporto General Humberto Delgado.
Um ato simbólico que enobrece quem decidiu, o apoia e acompanha. Humberto Delgado (General da Força Aérea) foi o inspirador, e criador, da Força Aérea Portuguesa moderna, assim como da aviação civil (desde a criação da TAP às infraestruturas aeroportuárias). Tendo participado, em jovem, no 28 de maio que derrubou a I República, era temido por Salazar que só andou de avião uma vez - um Lisboa Porto - para nunca mais!, que sempre afastou Delgado do exercício de altos cargos militares a que aspirava. Humberto Delgado era um militar de carreira, exigente, cumpridor e competente. Salazar deu-lhe a missão de negociar com os aliados as bases aéreas dos Açores, e assim foi; nomeou-o para cargos diplomático fora do país, e assim foi; por volta de 1957 desafiado por António Sérgio (ideia partilhada com o capitão Henrique Galvão que estava preso) candidatou-se à presidência da República, e assim foi. As eleições de 58 foram duras e o General afrontou, politica e fisicamente a ditadura, como ninguém antes havia feito, com forte apoio popular, a ditadura tremeu, e ficou conhecido como o General sem medo. Sendo um democrata liberal, desalinhado no plano partidário, ameaçado de prisão, quase sozinho, escapou a todas as perseguições, participou, desde 58, em todas as tentativas de golpe para derrubar a ditadura, até que a ditadura decidiu elimina-lo fisicamente, e assim foi. Em 13 de fevereiro de 1965, atraído a uma cilada, foi assassinado por uma brigada da PIDE, em Espanha junto à raia. Os criminosos, e seus inspiradores, após um julgamento interminável e cheio de peripécias indignas, ficaram impunes. Honra à sua memória.
Um ato simbólico que enobrece quem decidiu, o apoia e acompanha. Humberto Delgado (General da Força Aérea) foi o inspirador, e criador, da Força Aérea Portuguesa moderna, assim como da aviação civil (desde a criação da TAP às infraestruturas aeroportuárias). Tendo participado, em jovem, no 28 de maio que derrubou a I República, era temido por Salazar que só andou de avião uma vez - um Lisboa Porto - para nunca mais!, que sempre afastou Delgado do exercício de altos cargos militares a que aspirava. Humberto Delgado era um militar de carreira, exigente, cumpridor e competente. Salazar deu-lhe a missão de negociar com os aliados as bases aéreas dos Açores, e assim foi; nomeou-o para cargos diplomático fora do país, e assim foi; por volta de 1957 desafiado por António Sérgio (ideia partilhada com o capitão Henrique Galvão que estava preso) candidatou-se à presidência da República, e assim foi. As eleições de 58 foram duras e o General afrontou, politica e fisicamente a ditadura, como ninguém antes havia feito, com forte apoio popular, a ditadura tremeu, e ficou conhecido como o General sem medo. Sendo um democrata liberal, desalinhado no plano partidário, ameaçado de prisão, quase sozinho, escapou a todas as perseguições, participou, desde 58, em todas as tentativas de golpe para derrubar a ditadura, até que a ditadura decidiu elimina-lo fisicamente, e assim foi. Em 13 de fevereiro de 1965, atraído a uma cilada, foi assassinado por uma brigada da PIDE, em Espanha junto à raia. Os criminosos, e seus inspiradores, após um julgamento interminável e cheio de peripécias indignas, ficaram impunes. Honra à sua memória.
segunda-feira, maio 9
Agostinho Roseta
Agostinho Roseta morreu no dia 9 de Maio de 1995, na plena pujança das suas faculdades humanas, intelectuais e políticas. A sua morte prematura impediu que tivesse, muito provavelmente, exercido influência ainda mais marcante, a partir de 1995, no movimento sindical, no Partido Socialista e, quiçá, no governo.
Ele foi, no movimento operário e sindical, o activista mais importante do MES associando juventude (ou talvez melhor, jovialidade), capacidade teórica e sentido prático de organização sendo, ao mesmo tempo, persuasivo, sedutor e desprendido do poder.
Falar de pessoas é sempre muito delicado mas não receio cometer qualquer injustiça destacando a influência marcante de Agostinho Roseta na formação pessoal e política de um vasto e influente conjunto de dirigentes políticos e sindicais portugueses.
Lembro-o, além do mais, pela amizade sincera que sempre por ele nutri, aliás, retribuída, e porque foi ele o primeiro, entre todos nós, que mais cedo compreendeu o fracasso do projecto político do MES optando por dedicar as suas imensas capacidades de liderança ao movimento sindical.
O dia da sua morte coincide, ironicamente, com o dia de aniversário de minha mulher a quem pedi para reconstruir a última imagem que dele possuo: uma fotografia de grupo registada, certamente, em 27 de Outubro de 1994 na celebração do 4º aniversário de meu filho.
domingo, maio 1
1º de Maio - o MES saiu à rua
Passaram 42 anos. Hoje. A sigla do MES surgiu pela 1ª vez num pano improvisado, na manifestação do 1º de maio de 1974. Ideia do César de Oliveira, segundo Rosário Belmar da Costa (autora das fotografias).
quinta-feira, abril 28
ANIVERSÁRIO
“ – Meu corpo, quem mais receias?
- Receio quem não escolhi.”
Jorge de Sena, in Vilancete “Amor” – “Pedra Filosofal” – Poesia I
- Receio quem não escolhi.”
Jorge de Sena, in Vilancete “Amor” – “Pedra Filosofal” – Poesia I
terça-feira, abril 26
25 de abril - um dia depois
Ontem, dia 25 de abril, quer queiram ou não queiram, na efeméride da restauração da democracia e da liberdade, foi o dia de Marcelo, Presidente da República. Para muitos foi a surpresa, para alguns o engano, para a maior parte o reconforto. Por palavras, e gestos, Marcelo (como sempre será chamado) foi o reverso das ideias, e posturas, da direita revanchista. Num só dia assumiu, com meridiana clareza, o seu compromisso com o regime democrático – plural e dialogante – assim como honrou os ideais dos que lutaram, quase cinco décadas, contra a ditadura. E ainda mais homenageou, por inteiro, sem cinismo, alguns dos que encarnam essa luta: os militares de abril, Salgueiro Maia, Manuel Alegre e António Arnaut. Acham pouco? Eu acho muito! Em poucas palavras, não lhe tendo dado o voto, aqui lhe deixo a minha homenagem.
segunda-feira, abril 25
25 de Abril - uma cerimónia
Pela primeira vez desde o 25 de abril de 1974 assisti hoje ao vivo, na Assembleia da República à celebração oficial do seu 42º aniversário. Na verdade nunca havia desejado partilhar a celebração formal de uma revolta, que o povo transformou em revolução, no ambiente formal de um parlamento. Mas o Presidente da AR, Eduardo Ferro Rodrigues, no exercício das suas funções, decidiu por amizade antiga e forjada na luta politica contra a ditadura, ter a delicadeza de me endereçar o convite. Não o podia recusar e não me arrependo. Neste dia, tantos anos passados, pude apreciar a energia, moldada ao ambiente institucional da AR, de uma evocação do 25 de abril pela voz, e presença simbólica, de alguns dos seus mais destacados protagonistas. Muitas faces presentes, muitas memórias de ausentes, e sempre a liberdade forjada por uma multidão de gestos generosos que se não podem, nem devem, esquecer. A liberdade fica mais forte quando os democratas a cortejam e exaltam. Uma cerimónia onde fiquei a saber, quase sem margem de engano, que as duas mais altas figuras do estado, por caminhos diferentes, convergem na defesa dos valores da democracia politica e da liberdade, valores que o 25 de abril, que eu próprio vivi, restituiu à comunidade.
DIA 25 DE ABRIL DE 1974
No interior da “porta de armas” do quartel do Campo Grande (2º GCAM) – João Mário Mascarenhas (à esquerda) e eu próprio. Outras imagens inesquecíveis destes dias:
Os soldados deitados nas camaratas do quartel, em posição defensiva, vigiando a rua ou o recital de poesia do alferes Mário Viegas no refeitório do quartel.
O popular, de bicicleta, levantando nas mãos a bandeira nacional aos gritos: Liberdade, Liberdade, Portugal, Portugal!
Os soldados deitados nas camaratas do quartel, em posição defensiva, vigiando a rua ou o recital de poesia do alferes Mário Viegas no refeitório do quartel.
O popular, de bicicleta, levantando nas mãos a bandeira nacional aos gritos: Liberdade, Liberdade, Portugal, Portugal!
sábado, abril 23
sexta-feira, abril 15
Os dias após estado de graça
Passados os primeiros meses é sempre difícil para qualquer governo manter a áurea flamejante do sucesso. Sempre assim foi, e será, ainda para mais quando as soluções politicas de governo são originais e exigem debate permanente e concertação afinada, em democracia no pleno exercício das liberdades públicas. As diferenças de opinião, e a expressão livre das mesmas, é mil vezes melhor do que a tirania. Os governos democráticos, eleitos pelo voto popular, sob diversos modelos de representação, estão sempre sob escrutínio da opinião pública, da imprensa e da oposição politica. Assim deve ser. O que os distingue entre si, além das opções politicas, doutrinárias e ideológicas, é a capacidade de lidar com as diferenças não perdendo nunca a capacidade de fazer delas a sua força e não a sua fraqueza. Uma liderança forte não cede perante a maledicência. Para ser forte tem que ser capaz de manter intato o núcleo duro no qual repousa a sua força, ou seja a credibilidade dos seus principais dirigentes. Raras vezes estou de acordo com Fernando Ulrich que disse, numa entrevista recente, que o mais importante para a credibilidade da banca é a qualidade humana dos seus gestores. Assim é para tudo na vida e também, por maioria de razão, na politica.
segunda-feira, abril 11
Os amantes obscuros
Nossos sentidos juntos fazem chama:
e as fantasias nossas vão soltar
os desejos desertos de quem ama
e em verso ou coração se quis tornar.
Nossos sentidos são matéria prima
de um canto que é mais leve do que o ar;
o mundo todo não nos adivinha:
somos sombra sem luz, sequer luar.
Que o corpo quebre a noite desolada,
que o corvo ceda a voz à escuridão:
mil luzes são o nome da amada;
quem se perdeu no verso é sem perdão.
Luís Filipe Castro Mendes
(Poema para o projeto "A Poesia Está na Rua" - pelo 25º aniversário do 25 de abril de 1974 - de iniciativa do INATEL. Em homenagem ao cidadão e ao poeta que vai assumir a função de Ministro da Cultura.)
Fotografia de Hélder Gonçalves
e as fantasias nossas vão soltar
os desejos desertos de quem ama
e em verso ou coração se quis tornar.
Nossos sentidos são matéria prima
de um canto que é mais leve do que o ar;
o mundo todo não nos adivinha:
somos sombra sem luz, sequer luar.
Que o corpo quebre a noite desolada,
que o corvo ceda a voz à escuridão:
mil luzes são o nome da amada;
quem se perdeu no verso é sem perdão.
Luís Filipe Castro Mendes
(Poema para o projeto "A Poesia Está na Rua" - pelo 25º aniversário do 25 de abril de 1974 - de iniciativa do INATEL. Em homenagem ao cidadão e ao poeta que vai assumir a função de Ministro da Cultura.)
Fotografia de Hélder Gonçalves
sexta-feira, abril 8
Contas e contagens
Entre tantas minudências da nossa vida em sociedade deixamos, muitas vezes para trás, questões nas quais reparamos mas que, por uma qualquer razão, não tomamos a sério mesmo quando sentimos que nos prejudicam. Sei que um dos pontos do memorando da Troika, de má memória, se referia aos chamados bens e serviços não transacionáveis. Buscando, de forma expedita, uma definição são a maior parte dos serviços prestados a particulares, o fornecimento de bens públicos tais como o saneamento, a iluminação pública ou o fornecimento domiciliário de água, telecomunicações, etc.... Sempre que reparo mais atentamente nas faturas que os respetivos operadores fazem religiosamente chegar-me às mãos, me espanto, e comigo a maioria se espanta, com o elenco dos itens que respeitam ao bem ou serviço fornecido bem assim como às alcavalas que nada têm a ver com ele. Não dou exemplos que não vale a pena. Mais recentemente tem vindo a tornar-se escandaloso a meus olhos o modelo de faturação assente nas estimativas de consumo. Ora imagina uma casa com contador de consumo de água, no exterior e com acesso livre, que durante 6 meses não é contada pelos respetivos serviços municipalizados. Ao fim de um tempo surge uma conta astronómica para pagar. O cidadão paga, sob pena de corte e, mais tarde, repara, após a contagem, que, na prática, fez um empréstimo forçado aqueles serviços que durante meses beneficiam a seu belo prazer do dinheiro alheio. Estes bens e serviços são fornecidos a milhões de cidadãos por fornecedores, incluindo municípios, ou serviços municipalizados, a preços exorbitantes, em paridade de poder de compra, contas faturadas de formas pouco transparentes, e passam os anos, os governos, as vereações, sem se ouvir bulir uma agulha no caminho. Falem-me mais do panamá...
terça-feira, abril 5
O nosso tempo
As pessoas honestas, aquelas que ao longo da vida, com suas virtudes e defeitos, vivem e trabalham segundo princípios de convivência cidadã assentes no respeito pelo outro e por si próprias, sentem fugir-lhe o chão debaixo dos pés. Sei que as pessoas honestas são a maioria e não aceito os maniqueísmos que colocam os pobres no altar da probidade e os ricos na antecâmara do crime. Onde está a raiz do mal? A razão do aumento das desigualdades económicas e sociais? Do saque da riqueza alheia sob a capa da aplicação de regras impostas pelos mais fortes? Da guerra e do desrespeito pelas diferenças? Dizem alguns, ostentando estudos e pareceres que, afinal, hoje, o mundo até está melhor. Não creio que existam critérios de medida que permitam comparar as conquistas da ciência e da tecnologia de nossos dias, e sua apropriação pelas sociedades, com as grandes fomes e pestes do passado. O progresso só vale se medido pelo avanço da qualidade de vida do homem no seu espaço de vida natural e social. Se uma ultra minoria de cidadãos do mundo acumula riqueza material à conta da exploração, e em prejuízo, da esmagadora maioria todo os apelos à revolta podem ser apresentados como legítimo mesmo contra a democracia e a liberdade. Como fazer? Mantendo firme, em permanência e por todo o lugar, a luta contra a ignorância, o populismo, o fanatismo, o racismo, a xenofobia, a violência e o medo. O homem, sendo parte da natureza, sempre encontrou solução para os males do homem regenerando-se a si próprio e a natureza com ele. O nosso tempo será para os vindouros, como em todos os tempos, um tempo passado com seus defeitos e virtudes.
sexta-feira, abril 1
O FUTURO INCERTO
Toda a gente já entendeu que se adensam as nuvens no horizonte no que respeita à paz no mundo. É difícil, sem entrar em especulações, saber quais as origens da crise que ameaça os equilíbrios herdados no pós 2ª guerra. Há muita literatura séria acerca do tema e não quero elaborar teses simplistas. Mas a crise financeira mundial pós 2008, a reemergência do terrorismo como fenómeno banal, as guerras civis da Síria, Líbia, ..., com suas terríveis consequências, incluindo as ondas migratórias, as crises politica em grandes países emergentes como o Brasil, a "bolha" em enchimento na China, que um dia destes rebentará, o crescimento da extrema direita na Europa ocidental (em países da UE, vide Hungria e Polónia, por ex.), o fenómeno Donald Trump nas eleições presidenciais americanas, faz-me temer o pior. Qualquer vaga esperança de um paraíso decalcado nos 30 anos gloriosos acabou. Preparemos-nos para um tempo de violências e de incertezas, a não ser que uma nova vaga de dirigentes políticos, com envergadura de verdadeiros homens de estado, se revele entre as novas gerações nascidas após o inicio dos anos 90, e ganhe as rédeas do poder.
terça-feira, março 29
A força do simbólico
A propósito destes primeiros dias da presidência de Marcelo Rebelo de Sousa notam-se sinais de perplexidade em todos os setores da nossa sociedade. Nem a direita nem a esquerda politicas são capazes de calibrar o discurso acerca do que já se conhece do desempenho do presidente. A única apreciação que não merece contestação: é diferente. Não é só uma questão de discurso. Aconteça o que acontecer mais tarde, mesmo após secarem as pétalas do estado de graça, Marcelo representa uma mudança na relação do presidente com o povo, da Presidência com o país. Marcelo executa uma politica que vai para além da rotina própria das instituições. Ele conhece a força da componente simbólica da função presidencial e da força dos símbolos na projeção externa de um país periférico com uma longa história universalista. E isso faz toda a diferença.
sábado, março 26
AQUI
Aqui onde estou, no sítio onde nasci, mistura-se no ar o cheiro do mediterrâneo com a aragem do continente, temperado, numa mistura de gentes que me remete para a memória da meninice. O procissão do "senhor morto" correu, ontem pela noite, as ruas cheias de gente, nos parapeitos das janelas bastantes colchas (retomando uma tradição quase perdida), a música e o compasso. Sempre me abeiro dela sentindo a terra para além da fé, o sagrado para além da religião. Cumprindo meu desejo, e prazer, e a fé antiga dos meus.
segunda-feira, março 21
DIA MUNDIAL DA POESIA
Os dias evocativos valem o que valem. Foi em 2004 a primeira vez que publiquei neste blog um poema evocando o Dia Mundial da Poesia. Escolhi um poema que muito me marcou aquando da leitura inicial da obra poética de Jorge de Sena.
UMA PEQUENINA LUZ
Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una piccola ... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta
que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indefectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não iluminam também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui.
no meio de nós.
Brilha.
1950
Jorge de Sena
In Fidelidade (1958)
UMA PEQUENINA LUZ
Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una piccola ... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta
que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indefectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não iluminam também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui.
no meio de nós.
Brilha.
1950
Jorge de Sena
In Fidelidade (1958)
sexta-feira, março 18
quinta-feira, março 17
CARANGUEJOLA
- Ah, que me metam entre cobertores,
E não me façam mais nada!...
Que a porta do meu quarto fique para sempre fechada,
Que não se abra mesmo para ti se tu lá fores.
Lã vermelha, leito fofo. Tudo bem calafetado...
Nenhum livro, nenhum livro à cabeceira -
Façam apenas com que eu tenha sempre a meu lado,
Bolos de ovos e uma garrafa de Madeira.
Não, não estou para mais; não quero mesmo brinquedos.
Pra quê? Até se mos dessem não saberia brincar...
- Que querem fazer de mim com estes enleios e medos?
Não fui feito pra festas. Larguem-me! Deixem-me sossegar...
Noite sempre plo meu quarto. As cortinas corridas,
E eu aninhado a dormir, bem quentinho- que amor!
Sim: ficar sempre na cama, nunca mexer, criar bolor -
Plo menos era o sossego completo... História! Era a melhor das vidas...
Se me doem os pés e não sei andar direito,
Pra que hei-de teimar em ir para as salas, de Lord?
- Vamos, que a minha vida por uma vez se acorde
Com o meu corpo - e se resigne a não ter jeito...
De que me vale sair, se me constipo logo?
E quem posso eu esperar, com a minha delicadeza?...
Deixa-te de ilusões, Mário! Bom édredon, bom fogo -
E não penses no resto. É já bastante, com franqueza...
Desistamos. A nenhuma parte a minha ânsia me levará.
Pra que hei-de então andar aos tombos, numa inútil correria?
Tenham dó de mim. Co'a breca! levem-me prà enfermaria! -
Isto é, pra um quarto particular que o meu Pai pagará.
Justo. Um quarto de hospital - higiénico, todo branco, moderno e tranquilo;
Em Paris, é preferível, por causa da legenda...
De aqui a vinte anos a minha literatura talvez se entenda -
E depois estar maluquinho em Paris fica bem, tem certo estilo...
- Quanto a ti, meu amor, podes vir às quintas-feiras,
Se quiseres ser gentil, perguntar como eu estou.
Agora no meu quarto é que tu não entras, mesmo com as melhores maneiras...
Nada a fazer, minha rica. O menino dorme. Tudo o mais acabou.
Paris, Novembro de 1915
Mário de Sá-Carneiro
domingo, março 13
OS PRIMEIROS DIAS DO PRESIDENTE
Passaram pouco dias após a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa e muita gente abre a boca de espanto pela sua projeção mediática. O que espanta é o espanto daqueles que não haviam entendido ainda que o atual PR é uma personalidade que, no plano politico, deve a sua notoriedade aos media. Pois quantos grandes juristas, catedráticos ou não, dispõem de alta competência na sua profissão? Muitos. Mas quantos destes são conhecidos, e reconhecidos, pela opinião pública? Poucos. Nada de espantar esta postura do PR que entendo como um sinal de abertura tendo em vista contribuir para a recuperação da autoestima dos portugueses. Gostei da ida a pé para a tomada de posse com ressonâncias de atitude à maneira da 1ª República. Gostei da abertura das portas do Palácio de Belém ao povo, da sua visita ao Porto e das suas afirmações na senda da aproximação do poder à rua sem tiradas demagógicas e populistas. Não chegou ainda a hora da tomada de decisões com importância politica a que o PR será sujeito desde logo o OE após ser aprovado pela AR. Mas ninguém acredita que Marcelo Rebelo de Sousa se comporte como elemento desestabilizador do nosso sistema politico-constitucional. A personalidade do PR em funções terá seus pontos fracos, sabemos que sim (não vem agora ao caso dissecá-los), mas permite encarar com normalidade o estabelecimento de uma relação de confiança entre os portugueses e o PR, que havia sofrido forte deterioração nos últimos anos. Nada mau como balanço dos primeiros dias. De resto, a ver vamos.
quinta-feira, março 10
CAVACO SILVA - FIM
Acabou-se a era de Cavaco Silva enquanto politico. Que viva em paz. Foi um politico que governou no período dourado dos fundos europeus, desde 1985 a 1995, ou seja, herdando o processo de preparação dessa adesão fruto da obra politica de Mário Soares e financeira de Hernâni Lopes. Criou uma elite à sua sombra que se transformou numa nuvem tóxica que contaminou o ambiente empresarial e financeiro. Fez obra, tomando opções, orientadas para a criação das infraestruturas que quase não existiam até 1985. Na educação, com Roberto Carneiro, relançou o ensino profissional processo no qual eu próprio participei. Ninguém pode dizer que Cavaco enquanto governante não fez nada ou que tudo o que fez foi mal feito. Seria de uma injustiça brutal diabolizar os seus governos. O que me afasta radicalmente dele, e das suas opções politicas, é uma espécie de autoritarismo tecnocrático que caraterizou a sua ação. É uma faceta da personalidade de Cavaco Silva que já havia conhecido enquanto seu aluno ainda na minha juventude (e na juventude dele). Ao contrário do que alguns têm afirmado nos últimos tempos, em forma de caricatura, Cavaco Silva não é fascista, não foi nem será. Conforme escrevi faz 10 anos Cavaco Silva é um “amorfocrata”: um democrata com ausência de forma definida. Tolera os partidos e aceita a constituição. Passamos agora, com Marcelo, para um modelo de presidente democrata, com forma definida que considera os partidos e respeita a Constituição. É como o antevejo hoje, sujeito à prova do tempo.
domingo, março 6
CAVACO - A TRÊS DIAS DO FIM
A três dias do fim do magistério presidencial de Cavaco Silva após dez anos de marcha lenta para o abismo - sei das competências do PR e suas responsabilidades - deixo um comentário que escrevi aqui, em 2005, no início daquela marcha:
Cavaco é um “amorfocrata”: um democrata com ausência de forma definida. Tolera os partidos e aceita a constituição. Assume o silêncio como programa político. Como diria o filósofo José Gil tenta encarnar a “não inscrição”, tipicamente portuguesa. Vamos ver até onde nos levará esta deriva amórfica.
Cavaco é um “amorfocrata”: um democrata com ausência de forma definida. Tolera os partidos e aceita a constituição. Assume o silêncio como programa político. Como diria o filósofo José Gil tenta encarnar a “não inscrição”, tipicamente portuguesa. Vamos ver até onde nos levará esta deriva amórfica.
terça-feira, março 1
domingo, fevereiro 28
OS EXTREMISMOS EM PORTUGAL
Vamos escrever duas ou três palavras acerca de um tema raras vezes abordado, de forma séria, no espaço público. Escrevo-as a propósito dos termos utilizados por alguns políticos, e líderes de opinião, para qualificar os partidos que se posicionam à esquerda do PS. Deixo de lado a história desses partidos que em Portugal, dispondo de expressão parlamentar, se designam por BE e o PCP. O desconhecimento, pela maioria dos políticos no ativo, da história conduz à asneira discursiva e ao erro politico. No contexto europeu tem vindo a acentuar-se uma radicalização politica como resultado da crise do sistema financeiro que emergiu por volta do ano 2008. O populismo ganhou terreno como resultado do descontentamento, incerteza e desconfiança, de cada vez mais largos setores populares, nas politicas conduzidas pelos partidos do centro que, no pós guerra assumiram o poder de governo. Os eleitorados têm vindo a desertar do centro politico deslocando-se para apoiar partidos que antes, nalguns casos, ou não existiam ou tinham uma expressão politica irrelevante. Esses partidos situam-se à esquerda e à direita oferecendo uma alternativa na qual se juntam a defesa de valores em que avulta o retorno aos nacionalismos e, em alguns casos, à xenofobia e ao racismo. O fenómeno está à vista de todos, sem margem para ser escondido, com jogos de palavras, sendo ainda mais radicalizado com a crise dos migrantes. Em Portugal este processo tem sido amplamente atenuado quer pelo efeito da nossa situação de país periférico com duas fronteiras únicas - Espanha e o Atlântico - quer pelo posicionamento dos partidos, e sindicatos, que têm tido a capacidade de absorver, e canalizar, o descontentamento popular para o interior do regime democrático minorando as manifestações radicais desse descontentamento. Quer o PCP, quer o BE, com suas diferenças, sempre tomaram a opção, após o 25 de novembro de 75, de jogar o jogo democrático optando, no presente, por apoiar um governo socialista, de cariz reformista, mantendo embora a sua autonomia. Apelidar o BE e o PCP de partidos de extrema-esquerda é um erro de quem não sabe, ou finge não saber, o que é a extrema esquerda, as suas ideologias e os seus métodos políticos ao longo da história. Em Portugal poder-se-á dizer, sem correr excessivos riscos de errar, que não existe nem extrema esquerda, nem extrema direita, com expressão politica organizada relevante. O 25 de abril está demasiadamente perto, no plano histórico e pessoal, para que os fenómenos extremistas, ao contrário das democracias parlamentares dos países do centro de Europa, tenham terreno para vencer. Mas virá o tempo, se os democratas não cuidarem de adotar politicas que respondam aos anseios populares, em que os extremismos possam romper as barreiras nas quais, no nosso país se manifestam de forma politicamente irrelevante.
sexta-feira, fevereiro 26
NAS VÉSPERAS DA POSSE DE UM NOVO PR
A doze dias da tomada de posse do PR que estará a informar-se acerca das questões mais relevantes com as quais se confrontará. Não me atrevo a fazer um elenco delas muito menos uma hierarquia da sua importância para o país e para os portugueses. A opinião publicada reproduz as ideias, projetos e ambições dessa realidade que é designada por mercados. Uma estranha mescla de avençados que opinam conforme as ideias de quem lhes paga em prejuízo das suas próprias ideias. Uma das mais trágicas consequência desta realidade é a morte do jornalismo livre com a criação de um quase unanimismo no que se refere às politicas a seguir para esconjurar a crise financeira. Como muito bem diz Pacheco Pereira, faz muito tempo, tem vindo a ser criado um ambiente típico de pensamento único através do qual todas as soluções que não sejam alinhadas com as politicas austeritárias são diabolizadas. Abrir um trilho através do qual seja viabilizada uma outra e diferente solução para a crise é uma tarefa ciclópica. É esse o trabalho do governo de Costa não tanto para consumo interno mas mais no confronto com as estruturas eurocratas dominadas pelo pensamento dominante da chamada austeridade virtuosa, mesmo após a evidência do seu rotundo fracasso. Vamos ver até que ponto as circunstâncias da politica europeia e global e a competência do governo em funções - com a originalidade de se apoiar à esquerda - se conjugam para tornar possível demonstrar a viabilidade prática de uma alternativa politica às soluções preconizadas pelos partidos do PPE e seus aliados descoloridos de todas as matizes. A ver também como se posicionará o novo PR face a esta solução de governo no cotejo com o posicionamento do seu antecessor.
domingo, fevereiro 21
NOTAS NAS VÉSPERAS DA POSSE DO NOVO PR
Na politica, como em todos os aspetos da vida, não dá para adivinhar o futuro. Diz o povo que "o futuro a Deus pertence". Mas a arte da adivinhação é mister de quem se não libertou da estupidez mas já se não pode dizer o mesmo da previsão. E, antes de tudo, na politica a arte está na gestão das expetativas. Todos participamos deste jogo uns como criadores (poucos) outros como espetadores (a maioria). Quanto à situação politica na Europa toda, dentro e fora da UE, dentro e fora do €, as expetativas são crescentemente negativas, se considerarmos o modelo idealizados pelos pais fundadores. Poucos acreditam que a UE se está a fortalecer, a maioria crê que se está desmoronar. A leste medram os populismos de direita, nalguns casos protofascista, a sul agigantam-se os medos de novos resgates, no centro encarniça-se a luta pela disputa dos despojos de uma batalha perdida pela hegemonia do caos. A ameaça de saída do Reino Unido é somente um sinal, historicamente anunciado, de rebeldia contra a hegemonia da potência continental que, sob diversas formas, ao longo da história, foi dominante - hoje designada por Alemanha. Em termos simples ao que se assiste nos nossos dias é a uma velha disputa entre potências continentais e potências marítimas com suas variantes e condicionantes. Nada de estranhar, pois, que o Reino Unido se separe, ou aprofunde as distâncias, da potência continental dominante (Alemanha) e dos seus aliados. Portugal, mesmo com a sua dimensão física reduzida pela perda do "império colonial", faz parte da constelação das potências marítimas. Está mais próxima, no plano geoestratégico, do Reino Unido e dos USA (as potências marítimas) do que da Alemanha e seus aliados continentais. Não nos resta outra solução se não manter os laços da aliança forte com os aliados que hoje, pelas vicissitudes da adesão à UE e ao €, parecem ser os que estão mais distantes. Vem aí um novo PR por um período, no mínimo, de 5 anos coabitando com um governo socialista, apoiado à esquerda, ao qual a direita quer colar a expetativa de uma duração de breve prazo, quando o mais certo é que dure por um prazo mais alargado (sob esta ou outra fórmula politica). A reformulação do sistema de alianças (internas e externas) nunca se faz no curto prazo e as medidas para que possa ser alicerçada em bases sérias, e sólidas, requer estabilidade o que não é sinónimo de "paz podre". É preciso mudar muita coisa e o PR num contexto de mudanças profundas é mais importante do que nas soluções de pura continuidade.
sábado, fevereiro 20
quarta-feira, fevereiro 17
sábado, fevereiro 13
PELO 51º ANIVERSÁRIO DO ASSASSINATO DE HUMBERTO DELGADO
No dia do 51ª aniversário do assassinato do General Humberto Delgado deixo algumas notas, escritas em 2008, que resultaram da leitura de uma obra notável de autoria de seu neto Frederico Delgado Rosa, intitulada "Biografia de Humberto Delgado".
Honra à sua memória.
(1) É do mais elementar bom senso desconfiar das ideias feitas acerca da história, em particular, da “história oficial”, quando envolve personagens carismáticos e acontecimentos com forte carga política e emotiva;
(2) Os protagonistas que marcam, pelo seu pensamento e acção, a história das nações são homens com suas virtudes e defeitos transformando-se a si próprios a par das transformações que suscitam;
(3) O General Humberto Delgado foi um distinto militar de carreira, apoiante do golpe militar do 28 de Maio, e da ditadura entre 1926 e o dealbar dos anos 50, tendo acabado por sacrificar a carreira, e a própria vida, no combate sem tréguas ao regime fascista, após a ruptura política com Salazar, a partir das eleições presidenciais de 1958, às quais se candidatou, como independente, por vontade própria;
(4) Foi ele o verdadeiro precursor do 25 de Abril de 1974 pois defendeu (quase sempre) que a ditadura só cairia através da acção militar, que haveria de ser protagonizada pelas forças armadas, apoiadas pelo povo, o que viria, de facto, a acontecer pouco menos de nove anos após o seu assassinato que ocorreu em 13 de Fevereiro de 1965;
(5) Delgado foi, politicamente, um liberal democrata, fortemente influenciado pela cultura anglófona, e pela sociedade americana (o que lhe valeu o magnífico epíteto de “General Coca Cola”) influências assumidas ao longo de várias missões profissionais – em representação do estado português - na Inglaterra, Estados Unidos e também no Canadá;
(6) Delgado foi um político que nunca deixou de ser General e de cuja áurea anti-salazarista a esquerda, do seu tempo, se quis apropriar sem, na verdade, partilhar das suas ideias e acções, que desprezava apodando-as, pelo menos, de aventureiras;
(7) O General Humberto Delgado foi atraído a uma cilada e assassinado pela PIDE, por espancamento, e não a tiro, com conhecimento de Salazar, que sempre encobriu este hediondo crime, sob as mais variadas artimanhas, no plano interno e da diplomacia, entrando, inclusive, em rota de colisão com Franco;
(8) O julgamento dos autores materiais do crime – que não dos seus autores morais que sempre foram poupados pela democracia – em Tribunal Militar – foi uma triste farsa que não permitiu apurar a verdade e muito menos punir os criminosos;
(9) Todo o processo desde o assassinato de Delgado, passando pelo encobrimento do crime, à descoberta dos corpos, à investigação judicial e perícias forenses, realizadas pelas autoridades espanholas, até à condução do processo judicial em Portugal, julgamento e recursos judiciais, constitui um caso exemplar que permite, nos planos político e judicial, entender muitos aspectos da realidade contemporânea portuguesa e as peripécias de processos que ainda correm os seus trâmites;
(10) Este livro deveria ser de leitura obrigatória para todos os políticos, militares, juízes, magistrados, jornalistas e decisores de todos os escalões da hierarquia do estado a começar pelo Senhor Presidente da República;
(11) Espero que o autor, cuja coragem não pode ser só uma herança de sangue, prossiga as suas investigações para que os portugueses possam conhecer todos os meandros do assassinato de Humberto Delgado, para que sejam identificados os seus autores, materiais e morais, assim como os encobridores, localizados os que ainda possam estar vivos, reabrindo, eventualmente, o processo, levando a que os criminosos paguem pelos seus actos e contribuindo, dessa forma, para que os portugueses se reconciliem com a justiça do seu país.
(12) Nunca nenhum processo-crime está definitivamente encerrado enquanto subsistirem fundadas suspeitas de que se não fez justiça. É o caso.
Honra à sua memória.
(1) É do mais elementar bom senso desconfiar das ideias feitas acerca da história, em particular, da “história oficial”, quando envolve personagens carismáticos e acontecimentos com forte carga política e emotiva;
(2) Os protagonistas que marcam, pelo seu pensamento e acção, a história das nações são homens com suas virtudes e defeitos transformando-se a si próprios a par das transformações que suscitam;
(3) O General Humberto Delgado foi um distinto militar de carreira, apoiante do golpe militar do 28 de Maio, e da ditadura entre 1926 e o dealbar dos anos 50, tendo acabado por sacrificar a carreira, e a própria vida, no combate sem tréguas ao regime fascista, após a ruptura política com Salazar, a partir das eleições presidenciais de 1958, às quais se candidatou, como independente, por vontade própria;
(4) Foi ele o verdadeiro precursor do 25 de Abril de 1974 pois defendeu (quase sempre) que a ditadura só cairia através da acção militar, que haveria de ser protagonizada pelas forças armadas, apoiadas pelo povo, o que viria, de facto, a acontecer pouco menos de nove anos após o seu assassinato que ocorreu em 13 de Fevereiro de 1965;
(5) Delgado foi, politicamente, um liberal democrata, fortemente influenciado pela cultura anglófona, e pela sociedade americana (o que lhe valeu o magnífico epíteto de “General Coca Cola”) influências assumidas ao longo de várias missões profissionais – em representação do estado português - na Inglaterra, Estados Unidos e também no Canadá;
(6) Delgado foi um político que nunca deixou de ser General e de cuja áurea anti-salazarista a esquerda, do seu tempo, se quis apropriar sem, na verdade, partilhar das suas ideias e acções, que desprezava apodando-as, pelo menos, de aventureiras;
(7) O General Humberto Delgado foi atraído a uma cilada e assassinado pela PIDE, por espancamento, e não a tiro, com conhecimento de Salazar, que sempre encobriu este hediondo crime, sob as mais variadas artimanhas, no plano interno e da diplomacia, entrando, inclusive, em rota de colisão com Franco;
(8) O julgamento dos autores materiais do crime – que não dos seus autores morais que sempre foram poupados pela democracia – em Tribunal Militar – foi uma triste farsa que não permitiu apurar a verdade e muito menos punir os criminosos;
(9) Todo o processo desde o assassinato de Delgado, passando pelo encobrimento do crime, à descoberta dos corpos, à investigação judicial e perícias forenses, realizadas pelas autoridades espanholas, até à condução do processo judicial em Portugal, julgamento e recursos judiciais, constitui um caso exemplar que permite, nos planos político e judicial, entender muitos aspectos da realidade contemporânea portuguesa e as peripécias de processos que ainda correm os seus trâmites;
(10) Este livro deveria ser de leitura obrigatória para todos os políticos, militares, juízes, magistrados, jornalistas e decisores de todos os escalões da hierarquia do estado a começar pelo Senhor Presidente da República;
(11) Espero que o autor, cuja coragem não pode ser só uma herança de sangue, prossiga as suas investigações para que os portugueses possam conhecer todos os meandros do assassinato de Humberto Delgado, para que sejam identificados os seus autores, materiais e morais, assim como os encobridores, localizados os que ainda possam estar vivos, reabrindo, eventualmente, o processo, levando a que os criminosos paguem pelos seus actos e contribuindo, dessa forma, para que os portugueses se reconciliem com a justiça do seu país.
(12) Nunca nenhum processo-crime está definitivamente encerrado enquanto subsistirem fundadas suspeitas de que se não fez justiça. É o caso.
terça-feira, fevereiro 9
Presidente (1)
De hoje a um mês, a 9 de março de 2016, toma posse Marcelo Rebelo de Sousa eleito nas eleições presidenciais, realizadas no passado dia 24 de janeiro. Os mais prudentes esperam para ver o perfil do desempenho do novo PR usando o velho aforismo dos melões. Não sou adepto do quanto pior melhor e tenho esperança que às palavras do candidato eleito corresponda a prática do futuro PR em funções. Um moderador, disponível para todos ouvir e decidir, o que houver a decidir, no estrito âmbito das suas funções, com equilíbrio e sentido de estado. Em qualquer caso,aconteça o que acontecer, teremos na presidência uma personalidade, com origem na mesma área politica de Cavaco Silva, mas diametralmente oposta no que respeita à origem social, formação e temperamento pessoal. A ver vamos ....
sábado, fevereiro 6
Orçamento de Estado - (4)
Nestas questões da economia e finanças - a elaboração de um OE é uma delas - não contam somente os constrangimentos do lado de receitas e despesas. Contam também as conceções de sociedade dos seus proponentes, a própria formação técnica e personalidade dos mais altos responsáveis políticos a quem incumbe formular e defender as propostas. Num orçamento de estado o que está em causa, entre a imensa quantidade de tecnicidades, de forma sintética, é uma opção acerca da distribuição de rendimentos. No OE de 2016, em discussão, o governo apoiado pela esquerda, conforme é das regras básicas e da tradição, teria sempre que travar a queda do rendimento disponível das famílias com baixos rendimentos que sofreram uma forte erosão desde 2011. A originalidade da situação está em fazê-lo num contexto de negociação com os chamados credores, que se apresentam sob diversas designações, e que defendem uma orientação diametralmente oposta. Os ganhos de causa para o governo do PS, apoiado pela esquerda, nesta negociação parecem marginais mas, na verdade, são substanciais pois representam um sinal inequívoco de que é possível negociar, e negociar em continuo, sem abandonar o essencial da linha politica traçada, e aprovada, nas eleições pelo eleitorado que apoia o governo. Nos tempos que correm a formulação de politicas, sua negociação e execução correm em simultâneo pelo que os políticos da linha da frente têm que ter forte capacidade negocial, resiliência, ou "casca dura", para suportar as pressões em todas as fases, e facetas, do processo de governação que se desdobra numa multiplicidade infindável de detalhes com a participação de um conjunto de equipas formadas por pessoas das mais diversas formações técnicas e sensibilidades (a técnico-estrutura da administração, em Portugal, apesar de todas as dificuldades, evoluiu muito nos últimos anos). A proposta de orçamento de estado para 2016 terá o seu teste de ferro no processo de execução. No entretanto ouvem-se muitos comentadores a ostentar uma ignorância confrangedora acerca desse processo parecendo desconhecer que, nos nossos dias, o controle da execução do orçamento de estado é muito rigorosa e pouco suscetível de admitir desvios.
quarta-feira, fevereiro 3
Orçamento de Estado - (3)
Após uma negociação que terá sido, certamente, dura o orçamento de estado para 2016 deverá ter sido acordado entre todas as partes. Interna e externamente. Restará o rescaldo de um combate que nunca deixou de ser de natureza politica. O governo de Portugal mudou, após as últimas eleições legislativas, sendo apoiado numa maioria de esquerda. O debate que se segue assenta num balanço de ganhos e perdas resultantes do confronto com a comissão e seus apoiantes na frente interna. Mas o que mais interessa a partir de inícios de abril, quando chegar ao fim o regime de duodécimos agora em vigor na administração pública, assumidas as consequências do modelo de orçamento aprovado, é trabalhar a sério de forma organizada e num ambiente politico estável. É esse o sentimento que recolho em toda a parte entre aqueles que se dedicam a trabalhar seja qual for o setor. O país precisa de um período de, pelo menos, dois anos (para não ser excessivamente otimista)de trabalho intenso nas várias frentes, desde a reforma do estado, à reanimação da economia. A politica não vai desaparecer, e ainda bem, mas deverá centrar-se no debate das grandes questões nacionais, realizado de forma estruturada e com objetivos de médio/ longo prazo, no centro das quais está o próprio modelo de desenvolvimento do país em todas as frentes e facetas mais relevantes. Acabou um longo ciclo eleitoral, deverá seguir-se um longo ciclo de trabalho que busque reunir as energias de todas as forças vitais que acreditam num futuro mais próspero, e feliz, para todos os portugueses.
terça-feira, fevereiro 2
Orçamento de Estado - (2)
Uns dias passados venho aqui escrever umas palavras acerca do tema do orçamento de estado. Sei muito bem dos Tratados europeus, subscritos por Portugal, da qualidade de Portugal como membro pleno da UE e integrante da moeda única, país fundador da NATO, membro de quase todas as organizações transnacionais, sem falar da história (mas seria bom que os comentadores encartados, e todos os outros, a estudassem um pouco), sei muito bem das obrigações e do dever de as cumprir, na vida das Nações e dos cidadãos (cumpro as minhas), mas "o que é demais não presta" como diz o povo. O que se está a passar a respeito da tutela da comissão (europeia), e respetivos funcionários (não eleitos), sobre o desenho da proposta de OE para 2016, parece mais uma matéria de contornos, e com objetivos, políticos do que uma discussão, de boa fé, acerca da questão orçamental. Todo a gente sabe disso, não é? A comissão (europeia) não aceita que um governo de um país membro de pleno direito da UE se desvie da ortodoxia orçamental austeritária que é a marca de água do poder ainda dominante na UE. Não tanto pelos números que, no caso de Portugal, representam uma minudência no contexto do PIB do conjunto dos países da UE, mas pelo exemplo que poderia ser dado ensaiando um caminho, mesmo que moderadamente, diferente. O poder, em democracia, quando é exercido sem equilíbrio abre o caminho aos extremismos, e no fim de tudo, à tirania. Haja paciência, capacidade e vontade de negociar, mas tudo tem o seus limites!
quinta-feira, janeiro 28
Orçamento de Estado - (1)
É um tema sempre central no debate politico - o orçamento de estado - desta vez debatido fora de época. Hoje já ninguém aborda a questão do tempo neste processo, ou seja, o facto do PR ter "esticado" o mais possível todos os prazos. As eleições legislativas podiam ter sido realizadas não a 4 de outubro - ainda se lembram? - mas uns 4/5 meses antes permitindo que o governo que delas saísse elaborasse a proposta de orçamento para 2016 nos prazos normais. Mas outros valores, e interesses, mais alto se levantaram e chegados a este ponto levanta-se um coro de pressões em volta da proposta de orçamento de estado. Tudo se resume a uma refrega marginal aos grandes problemas com que se debate a Europa e nela a cúpula politica da UE. O núcleo central dos problemas são em breves linhas: a) a crise do modelo austeritário que será enviado, em breve, para o caixote do lixo da história; b) a emergência de fenómenos de xenofobia e racismo nos países do norte da europa revelados pela vaga migratória com a tomada de decisões anti migração atentatórias dos princípios basilares da própria UE; c) o alargamento, e reforço, de forças politicas extremistas, de perfil anti democrático, senão protofascista; d) a grave crise financeira em Itália e a profunda crise politica em Espanha (as 3ª e 4ª maiores economias da UE) e, para não ir mais longe, e) a manifesta indigência politica da liderança da UE. O tardio debate orçamental em Portugal é um assunto menor, e doméstico, dramatizado no rescaldo de todas as eleições, com resultados incómodos para as forças ainda dominantes na cúpula da UE, que o governo terá de tratar e resolver com pragmatismo.
segunda-feira, janeiro 25
Presidenciais - Finito
Ontem por esta hora estava decidida a eleição presidencial. O vencedor havia sido antecipado restando, somente, uma réstia de dúvida acerca de uma eventual 2ª volta que só uma elevadíssima abstenção poderia tornar possível. Nada de novo a ocidente. O que interessa, na verdade, numa eleição presidencial é o vencedor. Ao contrário do que hoje li numa manchete no Expresso online não é sério fazer comparações entre votações em legislativas e presidenciais sendo certo que nestas, paradoxalmente, nem o PS saiu derrotado, nem o PSD saiu vencedor (melhor dito as respetivas lideranças). O próximo Presidente da República (e não Chefe de Estado, como se dizia no Estado Novo)não obedecerá aos ditamos do partidos de que é originário nem afrontará os partidos que à primeira impressão se lhe deviam opor. Pelo menos assim será, quero crer, ao longo do primeiro mandato ou em grande parte dele. Nestas funções, nos nossos dias, conta muito a personalidade do eleito e menos as suas eventuais obediências partidárias, ideológicas ou outras. Honrando uma tradição desta República, que raramente foi traída, o Presidente, após a sua eleição, torna-se Presidente de todos os portugueses. Mesmo que tenha preferências pessoais, manifestadas nos bastidores, o seu posicionamento institucional e público é o de árbitro/conciliador em prol do interesse nacional. Assim quero continuar a acreditar que será com Marcelo Rebelo de Sousa.
sexta-feira, janeiro 22
Presidenciais - take 14
Na véspera da eleição presidencial escolhi o sentido do meu voto. Nunca senti, em eleições passadas, o sentimento que vem junto à indecisão, ou seja, no meu caso, a desilusão. O naipe de candidatos que se apresentaram, e foram aceites pelo TC, disputaram uma espécie de jogo com o resultado final, aparentemente, marcado à partida. As razões desta circunstância não são claras. Parece estar tudo decidido mas o voto popular, o sufrágio universal, livre e democrático, pode baralhar todos os cálculos. O meu voto irá para Sampaio da Nóvoa. A minha decisão foi muito influenciada pelo facto do apoio que lhe foi manifestado por Eanes, Soares e Sampaio, candidatos presidentes em quem votei no passado. A escolha destes três anteriores presidentes não pode ter sido fruto de acaso, conspiração ou ignorância das qualidade de Nóvoa para o desempenho da função presidencial.
quarta-feira, janeiro 20
NUNO TEOTÓNIO PEREIRA
Faleceu hoje o Nuno Teotónio Pereira, uma personalidade impar, quer pelo seu percurso profissional, enquanto arquiteto, com obra feita, quer como cidadão empenhado em causas nobres em prol da liberdade, contra a tirania, pela dignidade da pessoa. Deixo-lhe, aqui, o meu preito de homenagem pela sua intervenção cívica, exemplo de cidadania ativa, da qual muito beneficiei e, certamente, não agradeci o suficiente. Abraço toda a sua família na perpétua lembrança do seu exemplo.
segunda-feira, janeiro 18
domingo, janeiro 17
Presidenciais - take 13
À distância de uma semana, as eleições presidenciais interessam pouco, mas o pouco que interessam é muito. Não vou descartar mais nenhum candidato para receber o meu voto. É certo que votarei, como sempre. Tudo visto e ponderado restam-me Sampaio da Nóvoa, Maria de Belém e Marisa Matias. É notável, desde logo, a presença de duas mulheres numa "short list" em eleições para Presidente da República.
Art.º 120º da Constituição da República Portuguesa
«O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante
a independência nacional, a unidade do Estado e o regular
funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência,
Comandante Supremo das Forças Armadas.»
Art.º 120º da Constituição da República Portuguesa
«O Presidente da República representa a República Portuguesa, garante
a independência nacional, a unidade do Estado e o regular
funcionamento das instituições democráticas e é, por inerência,
Comandante Supremo das Forças Armadas.»
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