Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
segunda-feira, fevereiro 12
domingo, fevereiro 11
KANT - PELO ANIVERSÁRIO DO SEU FALECIMENTO
Kant, "o filósofo dos direitos humanos", morreu a 12 de fevereiro de 1804. Pelo aniversário da sua morte vou voltar a contar uma "pequena história" pessoal na qual Kant tem o lugar de protagonista. Foi uma das maiores humilhações da minha vida. Explico em duas palavras. No meu 7º ano de liceu, à época, ano terminal do secundário, faziam-se exames finais em algumas disciplinas incluindo filosofia. A nota da prova escrita necessária para dispensar da oral era 16. Obtive, na escrita, 15. Estranho! Na realidade ninguém obtinha, na escrita, 15. Ou se obtinha 14 ou então 16. Fui, assim, "condenado" a ir à oral com 15. Na oral fui confrontado com a primeira (e única) pergunta: fale-me do "imperativo categórico" de Kant. Iniciei uma dissertação acerca do tema! A examinadora considerou a resposta insuficiente. Insistiu no tema. Eu titubeie. Não era (nem sou) um especialista em Kant mas - que diabo - tinha estudado a matéria. Mas a examinadora é que não mudava de tema! Fale-me do "imperativo categórico" de Kant! Se bem me lembro tentei de novo satisfazer a exigência. Em vão! Percebi, então, que nada iria resultar. Estava condenado a chumbar fosse qual fosse o meu desempenho! Levantei-me e saí da sala perante o espanto dos meus colegas que assistiam à cena. Desci a avenida e fui tomar um café na esplanada da Gardy, que ainda lá está apesar dos factos se terem passado à quase 40 anos, na baixa de Faro. O chumbo era certo! Não valia a pena ir ver a pauta. Eu era um pouco irreverente (talvez mesmo bastante irreverente) é verdade! Não dominava de cor as matérias todas! É verdade! Mas na segunda época de exames obtive na escrita a nota de 18 na mesmíssima disciplina de filosofia! Assunto arrumado. A professora que me sujeitou aquela humilhação oral já faleceu. Nunca cheguei a saber, nem saberei, das verdadeiras razões daquele inusitado chumbo! Mais tarde ao ler um trabalho, limpo e clarividente, no Público, acerca de Kant, a minha memória retomou o caminho da explicação para o chumbo: "Com o seu "Imperativo Categórico" Kant estabeleceu um novo princípio ético: introduziu a ideia de que a moral é algo inerente à estrutura da razão, não decorrendo portanto, por exemplo, de imperativos religiosos. Segundo ele, cada homem deverá actuar de forma a que cada um dos seus actos possa ser tomado como princípio universal. Cada um desses gestos é um objectivo e um fim em si mesmo, não um meio para um outro fim (como o "Bem" praticado na religião católica que surge como uma forma de atingir a salvação). Para Kant, o gesto imoral acontece quando alguém tenta estabelecer para os outros um padrão de comportamento diferente daquele que ele próprio adopta." Hoje estou convicto (não me atrevo a dizer: estou certo!) que a razão do chumbo naquela oral está sintetizado neste texto, de Vanessa Rato, no Público, acerca do "imperativo categórico". Hoje, como ontem, o mundo está repleto de "gestos imorais", ou seja, de gente que julga o comportamento do outros por critérios que se dispensam de aplicar a si próprios.
PALPITES XXXLIV
Em Portugal após a ditadura que se designou por "Estado Novo" cujo cinquentenário da queda se celebra no próximo 25 de abril, a direita, herdeira do "Estado Novo", é multifacetada, em torno de uma raíz comum. Falo de hoje e não do imediato pós 25 de abril. Mas o dado mais curioso no tempo em que Trump anuncia que, se chegar a presidente, vai deportar massivamente os imigrantes, é o fato do lider da extrema direita em Portugal se declarar discípulo de Sá Carneiro - um social democrata autêntico - e ser um dessidente do PSD, sem ideias e doutrina próprias. No presente debate acerca de alianças pós eleitorais é necessário entender que os jogadores da direita, nas suas diversas facetas, orbitam em torno de um eixo central, o PSD. Ou seja os interesses em jogo em todas as disputas politicas em Portugal, em particular os do capital financeiro, dispõem na direita de um partido charneira que é o PSD. O resto são ornamentos de ocasião.
sábado, fevereiro 10
RACISMO
Já contei esta pequena história. Um dia faz anos, deve ter sido por volta de 2015, num restaurante pela hora do pós almoço passava na TV reportagem na qual apareceu António Costa. Dois sujeitos ao balcão vociferaram "monhé". Tomei a inicitiva de lhes chamar a atenção que as suas palavras era uma manifestação racista. Ripostaram e ripostei, veio à baila o 25 de abril. No meio da guerra de palavras não sei a razão disse-lhes que no 25 de abril tinha participado como militar. Aí baixaram de tom e desistiram. No dia seguinte percebi a razão. O gerente informou-me que eram policias. O rancor racista é estrutural na nossa sociedade. António Costa continua a ser um alvo fácil.
sexta-feira, fevereiro 9
DA POLÍTICA
Um simples exercício de bom senso explica a razão de não ser favorável à democracia o chamado bloco central. O atual contexto da relação de forças a nível nacional, europeu e mundial mostra a ascensão - ou manutenção - dos populismos radicais. No caso português se o PS e o PSD, partidos do centro esquerda e centro direita, estabelecessem coligação, ou acordo politico com incidência parlamentar, tendo em vista a viabilização de governos minoritários, deixariam livre o espaço da oposição para os partidos populistas radicais. Os governos poderiam, a curto prazo, aparentar fortaleza mas o inevitável descontentamento popular tornaria a direita populista e radical mais forte a médio e longo prazo.
PALPITES XXXLIII
Os humanos têm um fascínio extraordinário em apoiar politicos que, tempos depois, abjuram, odeiam, desprezam ou, simplesmente, esquecem. Mas apesar da hipocrisia e ingratidão reinantes sempre é melhor apoiar ou desprezar os que elegemos de forma livre e democática. E precavermo-nos dos golpes de estado de que já se tem falado mas que ninguém leva a sério. Os sinais são preocupantes.
quarta-feira, fevereiro 7
POLÍCIAS - JUNHO DE 2005
Não me apeteceu escrever nada acerca das manifestações dos policias. Mas reparei nelas. Toda a gente reparou. É para serem reparadas que as manifestações se fazem. São demonstrações. Manifestação e demonstração são mesmo sinónimos.
Eu gosto muito de demonstrações. Quando se faziam contra a ditadura e contra guerra colonial, então nem se fala! E pelos legítimos direitos dos trabalhadores! E pela paz autêntica. Era uma adrenalina maluca quando sabíamos que eles vinham para cima de nós. Quando vinham no nosso encalço e nos perseguiam. Nos batiam com bastões e nos ameaçavam a cavalo ou com cães que espumavam pela boca. Drogados. Os cães.
Os polícias já não são o que eram. Agora são eles que fazem demonstrações. A imaginação ao poder! A primeira demonstração foi uma procissão simulada com um padre a abrir, na frente, o cortejo. A "procissão do ministro morto"! A segunda demonstração foi fardada e ilegal. Digo bem ou digo mal?
Antes fazíamos manifestações apesar das proibições. Agora fazem-se proibições apesar das manifestações. O chefe do sindicalismo policial disse no meio da manifestação ilegal: “agora vale tudo”.
Um dia ainda vamos ter de nos organizar para repor a ordem pública. Colocar os polícias a fazer ordem unida. A desfilar alinhados ao som da música de fanfarra. A ajudar o cidadão indefeso. A dar o exemplo de civilidade e de apego ao cumprimento da lei.
A comunidade, aqueles que trabalham e pagam impostos, os que lutaram pela liberdade, com o sacrifício, às vezes, da sua própria liberdade, e da vida, agradecem a quem de direito que ponha os policias na ordem.
terça-feira, fevereiro 6
7 de março 1808 - uma crise a sério
Em 29 de Novembro de 1807, após um dia chuvoso, o príncipe d. João, d. Carlota, seus filhos, a rainha d. Maria I, vários outros parentes partiram em meio ao outono lisboeta. Do rio Tejo saíram as embarcações. Seguiram, além da família real, nobres, funcionários da Corte, ministros e políticos do Reino. Cerca de 15 mil pessoas. Os franceses ao chegarem à capital portuguesa em 30/11 ficaram a ver navios, frustrados com a não captura dos governantes lusos. Tudo o que era necessário para permanecer governando foi transportado. Insistia, entrementes, uma sensação dúbia: covardia ou esperteza? D. João estava angustiado. Seu país sendo atacado, o povo morrendo e ele seguindo viagem. Desconfortos psicológicos e físicos. Tormentas nos pensamentos e nos vagalhões dos mares que chegou a atrapalhar a travessia. Escassearam os víveres. Natal, Ano Novo e Dia de Reis se passaram. Então, a terra firme finalmente chegou. Em 22 de Janeiro de 1808 os barcos atracaram na antiga primeira capital do Brasil, a ensolarada Salvador. Porém, o abatido e cheio de dúvidas d. João após 54 dias no mar pisou o solo brasileiro apenas 24 hs depois. Foi o primeiro rei europeu a fazê-lo. Revisões nos navios, um pouco de descanso. Seguiram a viagem em 26 de Fevereiro. Dia 7 de Março a família real chegava ao destino final, a cidade do Rio de Janeiro.
PALPITES XXXLII
O cronista Raposo, no Expresso, diz que o PS tem um problema com a democracia. Ignorância ou má fé. A democracia em Portugal é, e será, obra do PS. É por isso que recebe o meu voto!
segunda-feira, fevereiro 5
PALPITES XXXLI
No nosso regime politico de democracia representativa, "uma cabeça um voto", o melhor dos regimes politicos, todos os resultados de eleições livres têm de ser aceites.
sábado, fevereiro 3
sexta-feira, fevereiro 2
PAI
Hoje é um dia marcante na vida do meu filho Manuel: foi pai. Nasceu pela manhã a Sol, nome escolhido porque sim, e se escreve com o mesmo significado em português e norueguês. Nas terras da Noruega neva ao contrário da nossa terra do sul na qual é primavera fora de época. É dia de uma felicidade infinita para todos nós.
quinta-feira, fevereiro 1
NEVE EM LISBOA
Foi através da leitura de “O aprendiz de Feiticeiro” de Carlos de Oliveira que, na minha memória reluziu a data em que, acontecimento raro, caiu neve em Lisboa e também – imaginem - em Faro.
No extremo sul de Portugal, à beira mar, terra de temperatura moderada, o surgimento da neve foi um acontecimento inusitado que perdurou na memória de todos.
Eis o excerto daquele belo livro do grande poeta português - Carlos de Oliveira– nascido no Brasil – a propósito daquele acontecimento memorável:
“Contudo, relato a seguir o que me aconteceu na noite de 1 para 2 de Fevereiro de 1954, quando venci por fim a proibição interior e alinhei sem emendas ou hesitações os sessenta e três versos da primeira fala de “O Inquilino”….”
(…)“E entramos por fim no que mais interessa: acabado o impulso das primeiras palavras, afastei a cadeira distraidamente e levantei-me, tentando delinear o seguimento da peça, cuja ideia me surgira só no acto de escrever. Nenhum plano anterior, nenhum esboço. Levantei-me e andei para a janela, metido na pele do inquilino, perguntando a mim mesmo (ou a ele) se não haveria outras perguntas a fazer antes duma decisão que podia ferir o equilíbrio do mundo ou coisa parecida. Foi quando a madrugada explodiu numa féerie mais ou menos nórdica, como se tivesse realmente bastado mexer na cadeira, na ordem pré-estabelecida do quarto, para desencadear o imprevisto: uma tempestade de neve em Lisboa.” (…)
quarta-feira, janeiro 31
A NEVE A SUL
Na madrugada do dia 1 para 2 de fevereiro de 1954 a meteorologia surpreendeu o sul de Portugal. Para surpresa de todos - pois as previsões não seriam tão meticulosas e divulgadas - nevou a sul. Da janela da casa onde nasci, em Faro, na manhã de dia 2 de fevereiro de 1954, pude ver pela primeira vez neve ainda assim abundante. Foi uma festa que nunca mais esqueci, nem se repetiu pelo menos com aquela intensidade. Vejam só como as surpresas do clima são coisa antiga.
PALPITES XXXVIII
Causa-me a maior perplexidade que o PAN esteja envolvido na teia de compromissos politicos na Madeira. A sua voragem por obter contrapartidas da parte dos aflitos mostra uma faceta obscura, pré democrática. É repugnante o oportunismo por detrás do teatro das causas aparentemente bem intencionadas.
segunda-feira, janeiro 29
MULHERES VI
Os últimos tempos têm sido pejados de processos judiciais mediatizados. São arguidos aos montes trazendo para a ribalta, justa ou injustamente, gestores, politicos e equiparados. Por entre todas as desconfianças acerca de uma eventual conspiração contra o regime democrático a cena não é prometedora de futuros radiosos. Dou por mim a pensar que todos os arguidos conhecidos nos últimos tempos são do género masculino. Sei que as mulheres são minoritárias nos lugares de topo. Mas se existisse paridade na ocupação desses lugares será que o número de arguidos seria o mesmo? Não creio. Há algo de errado na relação do género masculino com o poder.
MULHERES V
A terra e o corpo eram o mundo possível; a terra penetrava os poros, tisnava a pele, sujava as feridas; a terra cantava sob a correria dos pés descalços; a terra e os corpos entoavam as canções de embalar e de trabalho, da eira ao arado, do varejo ao rabisco; olhava as mulheres como se fossem rainhas que um dia haviam de dançar mil danças rodopiando nos braços do seu par; via-as sempre a dançar em seus sorrisos e suas gritas; as mulheres do tempo de as ver somente com uma admiração que me vinha de dentro. Não sabia nada delas mas via-as e amava-as como se fossem a terra que segurava as minhas raízes ao chão da vida. [4/2/2008] - Na imagem Nuvens, pintura de Teresa Dias Coelho-.
domingo, janeiro 28
PALPITES XXXVII
Winston Churchill disse que "a democracia é o pior dos regimes, à excepção de todos os outros". Em democracia todos votam em liberdade. Uma grande conquista da comunidade sobre os horrores da tirania. Mas é preciso cultivar a liberdade de escolha. Uma questão fulcral do nosso tempo, afinal de sempre: até que ponto a democracia é capaz de resistir aos seus inimigos, mesmo aos que fingem defendê-la? Os usurpadores das suas virtualidades estão entre nós. Usam o voto livre como escudo para melhor a combater em beneficio de interesses obscuros.
sábado, janeiro 27
MULHERES IV
Fotografia de família – a minha avó paterna. Ressonâncias de outros tempos com gente povoando os caminhos e as casas habitadas em comum com suas regras horários lugares marcados uma luta pela sobrevivência é assim que me soam as ressonâncias de outros tempos. Nela as mulheres ocupam no meu imaginário o centro do mundo. O ponto cardeal em torno do qual volteiam todos os devaneios. Desfilam pela minha memória os seus rostos, vozes e cheiros. Na família tradicional que era (e é) a minha, as mulheres parece que nunca desertam dos seus deveres, nunca morrem, permanecem no centro da vida, lugar da vida, origem da vida. Se tivesse sido iluminado pelo dom de uma qualquer arte dedicar-lhes-ia um monumento, uma obra-prima, um prolongado aplauso. [24/2/2008]
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