sexta-feira, novembro 7

60 CITAÇÕES DE ALBERT CAMUS


No dia 101º aniversário do nascimento de Albert Camus republico as 60 citações que eu próprio e a Prof ª Maria Luísa Malato seleccionamos para publicação no semanário Expresso faz um ano, pela celebração do centenário. 

ABSURDO/ ANTI-ABSURDO: “E assim nos tornamos profetas do absurdo! […] De que me servia depois afirmar que, na experiência que me interessava e sobre a qual aconteceu escrever, o absurdo não era senão um ponto de partida, ainda que a sua lembrança e emoção acompanhem os caminhos seguintes?” (O Verão)
 
 
AMIZADE: “Os deveres da amizade ajudam a suportar os prazeres da sociedade.” (Cadernos)
 
 
ARTE/ FILOSOFIA: “Porque sou eu um artista e não um filósofo? É porque penso segundo as palavras e não segundo as ideias.” (Cadernos)
 
 
ARTE/ FINALIDADE: “A finalidade da arte não é de legislar ou reinar, mas em primeiro lugar, a de compreender. […] Por isso o artista, ao chegar ao fim do caminho, absolve em vez de condenar. Não é juiz, mas defensor. É o advogado perpétuo da criatura viva. Porque está viva. Exorta verdadeiramente ao amor ao próximo, que não é esse amor longínquo que degrada o humanismo contemporâneo do catecismo de tribunal.” (Discursos da Suécia)
 
 
ARTE: “A arte não é para mim um prazer solitário É uma maneira de comover o maior número possível de homens, oferecendo-lhes uma imagem privilegiada dos sofrimentos e alegrias comuns.” (Discursos da Suécia)
 
 
BOMBA ATÓMICA: “O mundo é o que é, isto é, pouca coisa é. Eis o que cada um pode concluir depois de ontem, depois de ouvir o formidável concerto que a rádio, os jornais e as agências de informação harmoniosamente acabam de difundir sobre a bomba atómica. Podemos concluir com efeito, entre os numerosos comentários entusiastas, que qualquer cidade de importância mediana pode ser totalmente destruída por uma bomba com o tamanho de uma bola de futebol. Vai ser preciso escolher, num futuro mais ou menos próximo, entre o suicídio coletivo e a utilização inteligente das conquistas científicas.” (Atuais)
 

CONHECIMENTO: “Não creio suficientemente na razão para subscrever o progresso. Nem em nenhuma filosofia da História. Creio, porém, que os homens não deixaram de aumentar a consciência que tinham do seu destino. Não ultrapassámos a nossa condição, e, no entanto, conhecemo-la melhor.” (O Verão)


CRISTIANISMO: “Se o Cristianismo é pessimista quanto ao homem e otimista quanto ao destino da humanidade, pois bem, eu direi que, embora pessimista quanto ao destino da humanidade, sou otimista quanto ao homem.” (Atuais)


DESESPERO: “A primeira coisa é não desesperar. Não prestemos ouvidos demasiadamente àqueles que gritam, anunciando o fim do mundo. As civilizações não morrem assim tão facilmente; e mesmo que o mundo estivesse a ponto de vir abaixo, isso só ocorreria depois de ruírem outros. É bem verdade que vivemos numa época trágica. Contudo, muita gente, confunde o trágico com o desespero. ‘O trágico’, dizia Lawrence, ‘deveria ser uma espécie de grande pontapé dado na infelicidade’. Eis um pensamento saudável e de aplicação imediata. Hoje em dia, há muitas coisas que merecem esse pontapé.” (Núpcias)


DETERMINISMO: “Vivemos no terror porque a persuasão já não é possível, porque o homem se entregou inteiro à História.” (Atuais)


DEUS: “O segredo do meu universo: imaginar Deus sem a imortalidade humana.” (Cadernos)


DIÁLOGO: “Não há vida sem diálogo. Mas o diálogo foi, hoje, na maior parte do mundo, substituído pela polémica. O século XX é o século da polémica e do insulto. Eles ocupam, entre as nações e os indivíduos, e mesmo ao nível das disciplinas outrora desinteressadas, o lugar que tradicionalmente cabia ao diálogo refletido. Dia e noite, milhares de vozes, empenhadas, cada uma por seu lado, num tumultuoso monólogo, lançam sobre os povos uma torrente de palavras mistificadoras, de ataques, de defesas, de exaltações. Mas qual é o mecanismo da polémica? Consiste em considerar o adversário como inimigo, por conseguinte a simplificá-lo e a recusar vê-lo. Aquele que insulto, já não sei de que cor são os seus olhos, ou se acaso sorri, e como o faz. Tornados quase cegos por obra e graça da polémica, já não vivemos entre os homens, mas num mundo de sombras.” (Atuais)


ENCANTAMENTO: “É nisso precisamente que reside um dos elementos de sedução da música: ela representa a perfeição de uma maneira suficientemente fluida e ligeira para podermos prescindir do esforço.” (Escritos de Juventude)


ESCREVER/ VIVER: “Viver, claro, é um pouco o contrário de exprimir.” (Núpcias)


ESCRITA: “É para brilhar depressa que não tentamos reescrever.” (Cadernos)


ESTILO: “Quando o grito mais dilacerante encontra a sua linguagem mais rigorosa, a revolta satisfaz a sua verdadeira exigência, e extrai dessa fidelidade a si mesma uma força de criação. Se bem que isso vá contra os preconceitos da época, o mais belo estilo em arte é a expressão da mais viva revolta.” (O Homem Revoltado)


EXISTENCIALISMO/ EXISTÊNCIA: “Onde descobrir a essência senão ao nível da existência? Mas nós não podemos dizer que o ser não é senão existência. […] O ser não pode manifestar-se senão no devir, o devir nada é sem o ser.” (O Homem Revoltado)


EXISTENCIALISMO/ SARTRE: “Não aceitamos a filosofia existencialista só porque afirmamos que o mundo é absurdo. Se assim fosse, 80% dos passageiros do metro, a acreditar nas conversas que ouço, seriam existencialistas. O existencialismo é uma visão completa, uma visão do mundo que pressupõe uma metafísica e uma moral. Se bem que me aperceba da importância histórica do movimento, não tenho suficiente confiança na razão para aderir a um sistema. Isto é tão verdade que o manifesto de Sartre, publicado no primeiro número dos Temps Modernes, me parece inaceitável.” (Carta à revista Le Nef, 1/ 1946)


EXISTENCIALISMO/ SARTRE: “Não, não sou existencialista. Sartre e eu surpreendemo-nos sempre quando vemos os nossos dois nomes associados. Pensamos mesmo um dia publicar um pequeno anúncio em que os abaixo assinados afirmarão nada ter em comum, e recusarão responder pelas dívidas contraídas pelo outro.” (Entrevista a Nouvelles Littéraires, 15/11/1945)


EXISTENCIALISMOS: “Se as premissas do existencialismo se encontram, como creio, em Pascal, Nietzsche, Kirkegaard ou Chestov, então estou de acordo com elas. Se as suas conclusões são as dos nossos existencialistas, não concordo com elas, pois são contrárias às premissas.” (Última entrevista de Albert Camus, 20/12/1959)


FORÇA: “Aprendemos à nossa custa que, contrariamente ao que por vezes pensamos, o espírito nada pode contra a espada, mas também que o espírito unido à espada sempre vence a espada que se ergue em prol de si mesma.” (Carta a um Amigo Alemão, I)


GÉNIO: “O génio é a inteligência que conhece as suas fronteiras” (O Mito de Sísifo)

 
GLOBALIZAÇÃO: “Sabemos hoje que não há ilhas, e que são vãs as fronteiras. Sabemos que, num mundo em constante aceleração, quando o Atlântico se atravessa em menos de um dia ou Moscovo contacta com Washington em poucas horas, estamos obrigados à solidariedade ou à cumplicidade, segundo os casos. O pão fabricado na Europa vende-se em Buenos Aires, e as máquinas que trabalham na Sibéria foram fabricadas em Detroit. Hoje, a tragédia é coletiva. Sabemos pois todos, sem sombra de dúvida, que a nova ordem que buscamos não pode ser somente nacional, ou sequer continental, e muito menos ocidental ou oriental. Ela só pode ser universal.” (Atuais)

 
HELENISMO: “O mundo em que mais á vontade me sinto: o mito grego.” (Cadernos)

 
HETERONÍMIA/ ROMANCE : «Com efeito, o romance exige o estilo mais complexo de todos : o que se submete por inteiro ao objeto descrito. Podemos pois conceber um autor que escrevesse cada um dos seus romances num estilo diferente.” (Cadernos)

 
HISTÓRIA/ POLÍTICA: “É por demais evidente que o pensamento político se encontra cada vez mais ultrapassado pelos acontecimentos. […] Bem entendido, o espírito segue arrastado pelo mundo. A História corre, enquanto o espírito medita. Mas esse atraso inevitável aumenta hoje na proporção da aceleração histórica. O mundo mudou mais nos últimos cinquenta anos do que tinha mudado nos duzentos anteriores. E vemos hoje o mundo empenhado em regulamentar problemas de fronteiras, quando todos sabemos que as fronteiras são hoje abstratas.” (Atuais)

 
HONRA: “De resto, como fazer compreender que uma criança pobre pode por vezes ter vergonha sem nunca invejar coisa alguma?” (O Primeiro Homem)


JORNALISMO: “É importante pensarmos no que é o jornalismo de opinião. A concepção que a impressa francesa tem de informação podia ser melhor, já o dissemos. Queremos informar depressa em vez de querer informar bem. A verdade não fica a ganhar. […] Como vemos, tal equivaleria a perguntar se os artigos de fundo têm algum fundamento, e que se evitasse publicar como verdadeiro o que é falso ou duvidoso. É a esse procedimento que eu chamo ‘jornalismo crítico’. Uma vez mais, nada disto se faz sem inflexão e sem o sacrifício de muitas outras coisas. Mas talvez bastasse começar a pensar nisto.” (Atuais)

 
JUSTIÇA: “ (...) amo os que vivem hoje na mesma terra que eu, e são esses que saúdo. É por eles que luto e é por eles que estou disposto a morrer. E por uma cidade longínqua, de que não tenho sequer a certeza, não irei contra os meus irmãos. Não aumentarei a injustiça viva em nome de uma justiça morta.” (Os Justos)

 
LIBERALISMO/ MARXISMO: “Estas ideologias, nascidas há um século, no tempo da máquina a vapor e do ingénuo otimismo científico, são hoje caducas, e incapazes, nas suas formas atuais, de resolver os problemas que se põem ao século do átomo e da relatividade.” (Atuais)

 
LIBERDADE E JUSTIÇA: “Não o devemos ignorar: é difícil conciliá-las. A crer na História, pelo menos, nunca foi possível. Como se houvesse nestes dois princípios uma intrínseca incompatibilidade. Como poderiam não a ter? A liberdade para cada um é também a liberdade do banqueiro, ou do ambicioso: depressa a injustiça se instala. A justiça para todos é a submissão da personalidade ao bem coletivo: como falar então de liberdade absoluta? […] Devemos pois renunciar a esse esforço inútil? Não, não devemos renunciar. É preciso simplesmente tomarmos consciência dessa imensa dificuldade em as conciliar e tornar essa dificuldade evidente para aqueles que, ainda que animados de boa-fé, tudo querem simplificar. Para o demais, saibamos somente que é esse o único esforço pelo qual, nos dias de hoje, vale a pena viver e lutar.” (Atuais)
 
 
LIBERDADE: “Esquecei os vossos mestres, aqueles que tanto vos mentiram, disso tendes vós a certeza agora, e também os outros, pois não souberam persuadir-vos. Esquecei todos os mestres, esquecei todas as ideologias moribundas, os conceitos gastos, os slogans vetustos de que vos querem ainda alimentar. Não vos deixeis intimidar por nenhuma chantagem, de direita ou de esquerda. E finalmente não aceitai lições senão daqueles jovens combatentes de Budapeste dispostos a morrer pela liberdade. Esses de certeza vos não mentiram ao gritar que o espírito livre e o trabalho livre, numa nação livre, no seio de uma Europa livre, são os únicos bens deste mundo por que vale a pena lutar e morrer.” (Atuais)

 
LITERATURA/ FILOSOFIA: “Não sou um romancista no sentido em que normalmente se entende. Mas antes um artista que cria mitos à medida da sua paixão e da sua angústia.” (Cadernos)

 
LITERATURA/ FILOSOFIA: “Os grandes romancistas são romancistas filósofos.” (O Mito de Sísifo)
 
 
LITERATURA/ FILOSOFIA: “Um romance não é senão uma filosofia em imagens.” (Recensão ao livro de Sartre, A Náusea, 10/ 1938)

 
LITERATURA/ VIDA: “[…] o erro de uma certa literatura é acreditar que a vida é trágica porque é miserável. Ela pode ser surpreendente e magnífica, eis toda a sua tragédia.” (Recensão ao livro de Sartre, A Náusea, 10/ 1938)


MAL: “Estancamos diante do mal. E para mim é bem verdade que me sinto um pouco como esse Santo Agostinho que, antes da sua conversão ao Cristianismo, dizia: ‘Procurava donde vinha o mal e não saía nunca dele’. Mas é também verdade que eu sei, como outros, o que é preciso fazer, se não para diminuir o mal, pelo menos a forma de o não aumentar.” (Atuais)

 
MARXISMO: “Contar-se-iam pelos dedos das mãos os comunistas que chegaram à revolução pelo estudo do marxismo. Convertem-se primeiro e só depois leem as Escrituras.” (O Homem Revoltado)

 
MEDO E POLÍTICA: “O século XVII foi o século das Matemáticas, o XVIII das Ciências Físicas, o XIX da Biologia. O nosso século XX é o século do Medo. Dir-me-ão que o medo não é uma ciência. Mas também a Ciência aqui se encontra implicada, já que os últimos progressos teóricos a levaram a negar-se a si própria, e os avanços práticos hoje ameaçam destruir toda a terra. Além do mais, se o medo não pode considerar-se em si uma ciência, não há dúvida que ele é, apesar de tudo, uma técnica. O que mais nos impressiona hoje, com efeito, é que no mundo atual, em geral (e à exceção dos crentes de todas as espécies), a maior parte dos homens se encontra privada da noção de futuro. Ora não há vida vivida sem projeção no tempo, sem esperança de amadurecimento e progresso.” (Atuais)
 
 
MEIOS/ FINS: “Quando um trabalhador, em qualquer ponto do mundo, ergue os seus punhos nus diante de um tanque e grita que não é um escravo, que somos nós se a isso ficarmos indiferentes?” (Atuais)

 
MITO/ ESTILO: A obra de um homem não é senão esse longo caminho para encontrar, pelos desvios da arte, as duas ou três imagens simples e grandes sobre as quais o coração pela primeira vez se abriu.” (Prefácio a O Avesso e o Direito)

 
MULHERES: “As rosas retardatárias de Santa Maria Novella e as mulheres, neste domingo de manhã em Florença. Os seios libertos, os olhos e os lábios que vos fazem bater o coração, a boca seca e um calor nos rins.” (Núpcias)

 
MUNDO: “Todas as gerações, sem dúvida, se julgam fadadas para refazer o mundo. A minha sabe, no entanto, que não poderá refazê-lo. A sua tarefa é talvez maior. Consiste em impedir que se desfaça, partindo unicamente das suas negações.” (Discursos da Suécia)

 
MÚSICA: “A música é a expressão perfeita de um mundo ideal que nos é comunicado através da harmonia. Esse mundo existe. Não a um nível superior ou inferior a ujm mundo real, mas paralelamente a ele. Mundo das ideias? Talvez. Ou então mundo dos números, pois nos é comunicado pela harmonia.” (Ensaio sobre a Música)

 
NIILISMO: “Perante o mais cerrado niilismo, não procurei senão as razões para ultrapassar esse niilismo. E isto não por virtude ou por uma rara elevação de alma, mas por uma fidelidade instintiva à luz em que nasci, e onde, desde há milhares de anos, os homens aprendem a saudar a vida, mesmo na dor.” (Discursos da Suécia)

 
NUANCES: “Lutamos por essa indelével nuance que distingue o sacrifício do misticismo, a energia da violência, a força da crueldade, por essa nuance ainda mais subtil que separa o falso do verdadeiro, e o homem em que nos esperamos tornar dos deuses cobardes com que vós sonhareis.” (Carta a um Amigo Alemão, I)

 
ORDEM SOCIAL: “Fala-se agora muito de ordem. Porque a ordem é uma coisa boa que bem falta nos fez. […] Evidentemente, a ordem de que se fala muito hoje é a ordem social. Mas a ordem social é somente a da tranquilidade nas ruas? Não é certo. […] Talvez ajude para saber o que é a ordem social a comparação com a conduta individual. Quando dizemos nós que um indivíduo pôs a sua vida em ordem? Quando ele vive de acordo com ela e conformou a sua conduta ao que julga verdadeiro. Um insurreto que, sob a desordem das paixões, morre por uma ideia que fez sua, é na verdade um homem de ordem, porque ordenou toda a sua conduta segundo um princípio que lhe parece evidente. Mas não podemos nunca dizer que tem a vida em ordem um privilegiado que faz regularmente, durante toda a sua vida, três refeições por dia, e baseia a sua fortuna em valores seguros, mas que se fecha em casa quando ouve barulho na rua. Trata-se somente de um homem com medo e poupado. E se a ordem francesa fosse a da prudência e a da secura do coração, estaríamos tentados a ver nela a pior das desordens, já que, por indiferença, se passariam a permitir todas as injustiças. De tudo isto se concluiria que não há ordem sem equilíbrio e sem acordo. Não basta exigir ordem para bem governar, porque bem governar é a única forma de atingir uma ordem que faça sentido. Não é a ordem que dá força à justiça, mas a justiça que dá a certeza da ordem.“ (Atuais)

 
POBREZA: “A miséria impediu-me de acreditar que tudo está bem sob a luz do sol da História; o sol ensinou-me que a História não é tudo.” (O Avesso e o Direito)

 
POLITICA: “Não sou feito para a política pois sou incapaz de querer ou de aceitar a morte do adversário.” (Cadernos)

 
REALISMO: “Todos somos realistas e ninguém o é. A arte não significa nem a recusa total nem o total assentimento daquilo que é. […] Sendo simultaneamente recusa e assentimento, […] o artista encontra-se sempre nesta ambiguidade, incapaz de negar o real e, no entanto, eternamente votado a contestá-lo no que ele tem de eternamente inacabado.” (O Homem Revoltado)


RESPONSABILIDADE: “Não podemos impedir que esta criação seja aquela em que são torturadas crianças. Mas podemos diminuir o número de crianças torturadas.” (Atuais)

 
RETRATO DO ESCRITOR: “[…] não possuindo títulos que não partilhe com os seus companheiros de luta, vulnerável mas persistente, injusto mas apaixonado pela justiça, construindo a sua obra, sem vergonha mas sem orgulho perante todos, sempre dividido entre a beleza e a dor, e votando por fim todo o seu esforço a gerar do seu ser duplo as criações que obstinadamente edifica no movimento destruidor da História.” (Discursos da Suécia)

 
ROMANCE DE TESE: “O romance de tese, a obra que pretende provar, a mais detestável de todas, é aquela que mais frequentemente é inspirada num espírito satisfeito.” (O Mito de Sísifo)

 
SANTA BÁRBARA DE ORÃO: “Sabeis que eu não sou muitas vezes religioso. Mas se acontecer eu sê-lo, sabei que não necessito de Deus e que não o posso ser senão quando quiser fingir que o sou, porque um comboio vai partir e a minha oração não tem amanhã.” (Cadernos)

 
SARTRE: “Não é por acaso que o filósofo que inspira hoje o pensamento europeu é aquele que escreveu que só a vida moderna permite que o espírito tome consciência de si mesmo, e que foi até ao ponto de afirmar que a natureza é abstrata, e que só a razão é concreta.” (Atuais)

 
SOFRIMENTO: “Sim, são as faltas que originam os nossos piores sofrimentos. Mas que importa, na verdade, o que nos falta, quando o que possuímos se não esgotou ainda? Tantas coisas são suscetíveis de ser amadas que nenhum desfalecimento pode ser definitivo. Saber sofrer é saber amar. E quando tudo rui tudo recomeçar, com simplicidade, enriquecidos pela dor, quase felizes com a sensação da nossa infelicidade.” (Escritos de Juventude)

 
SURREALISMO: “A verdadeira destruição da linguagem, que o surrealismo procurou com tanta obstinação, não se encontra na incoerência ou no automatismo. Antes se encontra na palavra de ordem.” (O Homem Revoltado)

 
TERRORISMO: “Se um terrorista lança uma granada no mercado de Belcourt frequentado pela minha mãe e ele a mata, serei responsável se, para defender a justiça, eu tiver igualmente de defender o terrorismo. Amo a justiça, mas amo também a minha mãe.” (Camus a Roblés, testemunho)

 
TRAGÉDIA/ MELODRAMA: “O que é afinal uma tragédia? […] Eis o que me parece distingui-la: as forças que se confrontam na tragédia são igualmente legítimas. No melodrama, ou no drama, pelo contrário, somente uma é legítima. […] Na primeira, cada força é, ao mesmo tempo, boa e má. Nos segundos, uma força representa o bem e outra o mal (por isso, na nossa época, o teatro de propaganda não é senão uma ressurreição do melodrama). Antígona tem razão, mas Creonte não tem menos. Também Prometeu é ao mesmo tempo justo e injusto. E Zeus, que o castiga sem piedade, está no seu direito.” (Sobre o Futuro da Tragédia)
 

 
UTOPIA: “O mundo deve hoje escolher entre o pensamento político anacrónico e o pensamento utópico. O pensamento anacrónico está em vias de nos matar. Por mais desconfiados que sejamos (e que eu seja), o espírito da realidade logo nos reconduz a esta utopia relativa. Quando essa utopia entrar na História, como sucedeu com muitas outras utopias do mesmo género, os homens lhe chamarão realidade. É assim que a História não é senão o esforço desesperado dos homens para dar forma aos seus sonhos mais clarividentes.” (Atuais)

Seleção de Maria Luísa Malato e Eduardo Graça

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