sexta-feira, setembro 11

EM MEMÓRIA DE JORGE DE SENA NO DIA DO SEU REGRESSO A PORTUGAL

NÃO, NÃO, NÃO SUBSCREVO, ...
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Não, não, não subscrevo, não assino
que a pouco e pouco tudo volte ao de antes,
como se golpes, contra-golpes, intentonas
(ou inventonas - armadilhas postas
da esquerda prá direita ou desta para aquela)
não fossem mais que preparar caminho
a parlamentos e governos que
irão secretamente pôr ramos de cravos
e não de rosas fatimosas mas de cravos
na tumba do profeta em Santa Comba,
enquanto pra salvar-se a inconomia
os empresários (ai que lindo termo,
com tudo o que de teatro nele soa)
irão voltar testas de ferro do
capitalismo que se usou de Portugal
para mão-de-obra barata dentro ou fora.
Tiveram todos culpa no chegar-se a isto:
infantilmente doentes de esquerdismo
e como sempre lendo nas cartilhas
que escritas fedem doutras realidades,
incompetentes competiram em
forçar revoluções, tomar poderes e tudo
numa ânsia de cadeiras, microfones,
a terra do vizinho, a casa dos ausentes,
e em moer do povo a paciência e os olhos
num exibir-se de redondas mesas
em televisas barbas de falácia imensa.
E todos eram povo e em nome del' falavam,
ou escreviam intragáveis prosas
em que o calão barato e as ideias caras
se misturavam sem clareza alguma
(no fim das contas estilo Estado Novo
apenas traduzido num calão de insulto
ao gosto e à inteligência dos ouvintes-povo).
Prendeu-se gente a todos os pretextos,
conforme o vento, a raiva ou a denúncia,
ou simplesmente (ó manes de outro tempo)
o abocanhar patriótico dos tachos.
Paralisou-se a vida do país no engano
de que os trabalhadores não devem trabalhar
senão em agitar-se em demandar salários
a que tinham direito mas sem que
houvesse produção com que pagá-los.
Até que um dia, à beira de uma guerra
civil (palavra cómica pois que
do lume os militares seriam quem tirava
para os civis a castanhinha assada),
tudo sumiu num aborto caricato
em que quase sem sangue ou risco de infecção
parteiras clandestinas apararam
no balde da cozinha um feto inexistente:
traindo-se uns aos outros ninguém tinha
(ó machos da porrada e do cacete)
realmente posto o membro na barriga
da pátria em perna aberta e lá deixado
semente que pegasse (o tempo todo
haviam-se exibido eufóricos de nus,
às Áfricas e às Europas de Oeste e Leste).
A isto se chegou. Foi criminoso?
Nem sequer isso, ou mais do que isso um guião
do filme que as direitas desejavam,
em que como num jogo de xadrez a esquerda
iria dando passo a passo as peças todas.
É tarde e não adianta que se diga ainda
(como antes já se disse) que o povo resistiu
a ser iluminado, esclarecido, e feito
a enfiar contente a roupa já talhada.
Se muita gente reagiu violenta
(com as direitas assoprando as brasas)
é porque as lutas intestinas (termo
extremamente adequado ao caso)
dos esquerdismos competindo o permitiram.
Também não vale a pena que se lave
a roupa suja em público: já houve
suficiente lavar que todavia
(curioso ponto) nunca mostrou inteira
quanta camisa à Salazar ou cueca de Caetano
usada foi por tanto entusiasta,
devotamente adepto de continuar ao sol
(há conversões honestas, sim, ai quantos santos
não foram antes grandes pecadores).
E que fazer agora? Choro e lágrimas?
Meter avestruzmente a cabeça na areia?
Pactuar na supremíssima conversa
de conciliar a casa lusitana,
com todos aos beijinhos e aos abraços?
Ir ao jantar de gala em que o Caetano,
o Spínola, o Vasco, o Otelo e os outros,
hão-de tocar seus copos de champanhe?
Ir já fazendo a mala para exílios?
Ou preparar uma bagagem mínima
para voltar a ser-se clandestino usando
a técnica do mártir (tão trágica porque
permite a demissão de agir-se à luz do mundo,
e de intervir directamente em tudo)?
Mas como é clandestina tanta gente
que toda a gente sabe quem já seja?
Só há uma saída: a confissão
(honesta ou calculada) de que erraram todos,
e o esforço de mostrar ao povo (que
mais assustaram que educaram sempre)
quão tudo perde se vos perde a vós.
Revolução havia que fazer.
Conquistas há que não pode deixar-se
que se dissolvam no ar tecnocrata
do oportunismo à espreita de eleições.
Pode bem ser que a esquerda ainda as ganhe,
ou pode ser que as perca. Em qualquer caso,
que ao povo seja dito de uma vez
como nas suas mãos o seu destino está
e não no das sereias bem cantantes
(desde a mais alta antiguidade é conhecido
que essas senhoras são reaccionárias,
com profissão de atrair ao naufrágio
o navegante intrépido). Que a esquerda
nem grite, que está rouca, nem invente
as serenatas para que não tem jeito.
Mas firme avance, e reate os laços rotos
entre ela mesma e o povo (que não é
aqueles milhares de fiéis que se transportam
de camioneta de um lugar pró outro).
Democracia é isso: uma arte do diálogo
mesmo entre surdos. Socialismo a força
em que a democracia se realiza.
Há muito socialismo: a gente sabe,
e quem mais goste de uns que dos outros.
É tarde já para tratar do caso: agora
importa uma só coisa - defender
uma revolução que ainda não houve,
como as conquistas que chegou a haver
(mas ajustando-as francamente à lei
de uma equidade justa, rechaçando
o quanto de loucuras se incitaram
em nome de um poder que ninguém tinha).
E vamos ao que importa: refazer
um Portugal possível em que o povo
realmente mande sem que o só manejem,
e sem que a escravidão volte à socapa
entre a delícia de pagar uma hipoteca
da casa nunca nossa e o prazer
de ter um frigorifico e automóveis dois.
Ah, povo, povo, quanto te enganaram
sonhando os sonhos que desaprenderas!
E quanto te assustaram uns e outros,
com esses sonhos e com o medo deles!
E vós, políticos de ouro de lei ou borra,
guardai no bolso imagens de outras Franças,
ou de Germânias, Rússias, Cubas, outras Chinas,
ou de Estados Unidos que não crêem
que latinada hispânica mereça
mais que caudilhos com contas na Suíça.
Tomai nas vossas mãos o Portugal que tendes
tão dividido entre si mesmo. Adiante.
Com tacto e com fineza. E com esperança.
E com um perdão que há que pedir ao povo.
E vós, ó militares, para o quartel
(sem que, no entanto, vos deixeis purgar
ao ponto de não serdes o que deveis ser:
garantes de uma ordem democrática
em que a direita não consiga nunca
ditar uma ordem sem democracia).
E tu, canção-mensagem, vai e diz
o que disseste a quem quiser ouvir-te.
E se os puristas da poesia te acusarem
de seres discursiva e não galante
em graças de invenção e de linguagem,
manda-os àquela parte. Não é tempo
para tratar de poéticas agora.

Santa Bárbara, Fevereiro 1976

(aniversário de uma tentativa heróica de conter uma noite que duraria décadas)
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Jorge de Sena, in POEMAS “POLÍTICOS E AFINS” (1972-1977) - 40 ANOS DE SERVIDÃO
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11 DE SETEMBRO EM NOVA YORQUE

11 de Setembro de 2001 - Nova Iorque por Francisco Seixas da Costa
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A LUTA DOS BLOGGERS CUBANOS PELA LIBERDADE

Em Cuba os blogger deram mais um passo para romper o cerco à liberdade com a realização do primeiro concurso de bloggers. Sob o impuldo de Yoani Sánchez o concurso Una Isla virtual atribuiu o prémio do melhor blogue a Octavo Cerco de Claudia Cadelo. Pequenos passos de uma grande, autêntica e corajosa luta pela liberdade de expressão. Acta del jurado del primer concurso blogger cubano Una Isla Virtual
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quinta-feira, setembro 10

LOUÇÃ: "ANGÚSTIA PARA O JANTAR"

Quando o MES acabou (por lá passaram Sampaio e Ferro Rodrigues, entre outros) deu um jantar para anunciar: acabámos. O jantar limpou a cabecinha dos militantes, ajudou-os a fazer o luto de uma luta política, revolucionária, passando para outra, democrática (burguesa, diriam antes). Fez-lhes bem o jogo limpo: ontem íamos por ali, agora, vamos por aqui. Muitos deles foram depois ministros e patrões (o que antes combatiam radicalmente). Os que continuaram agarrados às antigas ideias chamarem-lhes vira-casacas, mas não puderam acusá-los de mentir na sua evolução. Não se passou o mesmo com o Bloco de Esquerda. Essencialmente, este é formado pelos trotskistas do PSR e os maoístas da UDP, correntes revolucionárias. Ora nem o PSR nem a UDP fizeram a proclamação política do seu fim, só deixaram estiolar as siglas. Mas Francisco Louçã apresentou-se no debate com Sócrates assim: "Sou socialista, laico e republicano." Então, quando é que deixou cair o "revolucionário"? Não tenho dúvidas de que, no fundo, tenha deixado, e que talvez venha a ser ministro num governo a que chamaria burguês há poucos anos. Mas parece-me que lhe falta, a ele que dá tanta importância à ideologia, que o diga na teoria, antes de ser definitivamente comprovado, na prática, que mudou.
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FERREIRA FERNANDES, in DN
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quarta-feira, setembro 9

HARTZ


Desenho de meu filho Manuel (em criança)

A HARTZ – Revista Digital Española de Poesía, de René Letona, inclui uma referência ao meu último livro de poesia. Obrigada. Quase todos os poemas que integram esse livro podem ser lidos a partir daqui seguindo a etiqueta com o título do livro. Na edição digital dos poemas acrescentei um pouco mais de informação. Para o final do ano de 2009 haverá novidades.

GRAÇA, EDUARDO. Há um momento en que a juventude se perde …, concepção gráfica de Isabel Espinheira, Lisboa, edição de autor, 2008. Conjunto, precedido de un prólogo del autor, de poemas inspirados en breves fragmentos de los Carnés de Albert Camus que constituyen el título, primer verso o línea de cada poema. Lástima que no sea edición comercial: corre el riesgo de pasar totalmente indavertida.
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SÓCRATES: TORNAR EM FRAQUEZA A FORÇA DE LOUÇÃ


Vou ser sincero quanto se pode ser sincero nestas matérias de apreciação de debates políticos. Sempre se fica com a sensação que cada um dos contendores poderia ir mais além. Observado de qualquer ângulo o treinador de bancada não perdoa qualquer hesitação, imprecisão, erro ou omissão. Nem deixa sequer passar em claro um esgar inapropriado que a televisão, implacável, amplia de uma forma brutal. O que me apetece dizer, após este debate entre Sócrates e Louçã, é que mais subiu o meu apreço, e admiração, por Sócrates. Fazer o balanço da política do governo que chefia, de peito aberto, no meio dos efeitos de uma crise financeira e económica brutal não é mais do que o seu dever. Certo! Mas tomar a iniciativa de puxar as questões da política económica no confronto com um adversário especialista na matéria é mais do que o cumprimento de um dever, é assumir um pesado risco. Mas Sócrates, no campo das questões técnicas que Louçã domina, não perdeu, antes ganhou, tornando a força na fraqueza de Louçã. Afinal Sócrates mostrou que a fraqueza de Louçã é o seu próprio programa. É obra! E remato com uma citação, de 1974, que fui buscar a um velha brochura do extinto MES: “O socialismo é a associação livre de produtores livres e iguais, a sociedade em que aos produtores e apenas a eles caiba decidir o que se produz, como se produz e para que se produz”. É esta a utopia que Loução balbucia mas não é capaz de transformar em programa político pois nunca ninguém foi capaz, nem nunca será, pela razão simples de se tratar de uma utopia. Mal dos povos que dêem ouvidos a dirigentes que queiram transformar as utopias em experiências políticas pois essas experiências sempre acabam em tiranias.
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terça-feira, setembro 8

A AGENDA OCULTA DO BLOCO DE ESQUERDA


Após assistir ao debate entre José Sócrates e Francisco Louçã apeteceu-me sublinhar o parágrafo final do texto de Jorge Nascimento Rodrigues publicado, hoje, no SIMPLEX:

“ (…) O fundo das correntes da "esquerda radical" em Portugal continua a ser o mesmo de há trinta anos atrás, apesar do aggiornamento, da simpatia do sorriso, da presença no parlamento, do uso das eleições democráticas e do recurso aos chamados temas fracturantes (com os quais, eu, por exemplo, estou 100% de acordo) em virtude da incapacidade política do centro-esquerda. Essas correntes - sem com isso querer meter todos os seus aderentes nesse saco - continuam a ser estruturalmente totalitárias quanto ao sentido de sociedade, do exercício do poder e da economia, apesar de alguns segmentos derivarem de políticos que acabaram por sentir na pele o efeito da longa mão do totalitarismo. Em Portugal, a glasnot política e ideológica dessas correntes nunca foi feita. O eurocomunismo foi sempre um epifenómeno em Portugal e a antiga extrema-esquerda pró-albanesa ou trotskysta nunca fez uma cura de desintoxicação ideológica séria."
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IR À MADEIRA E VOLTAR

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ALERTA LARANJA
























As imagens criadas pelo autor João Coisas apenas poderão ser utilizadas em blogues sem objectivo comercial, e desde que citada a respectiva origem.
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segunda-feira, setembro 7

JORGE DE SENA REGRESSA A PORTUGAL

Na próxima 5ª feira (10 de Setembro de 2009) Jorge de Sena regressa a Portugal. A cerimónia de homenagem, em presença dos seus restos mortais, decorre na Basílica da Estrela, a partir das 10 horas, a que se seguirá a trasladação para o Cemitério dos Prazeres.

Este é um acontecimento do maior significado, de justiça e reconciliação, em benefício da cultura nacional honrando a memória de um seus maiores vultos.
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«O Ministro da Cultura, José António Pinto Ribeiro, estará presente na cerimónia de homenagem a Jorge de Sena, em presença dos seus restos mortais, que se efectuará em Lisboa no dia 11 de Setembro de 2009, sexta-feira, pelas 10h00, na Basílica da Estrela, seguida de trasladação para o Cemitério dos Prazeres.A cerimónia, acompanhada de uma celebração musical executada pela soprano Raquel Alão e pelo organista Nuno Lopes, do Teatro Nacional de São Carlos, contará ainda com a declamação de um poema do autor, por Eunice Muñoz.Jorge de Sena será evocado através de breves intervenções de um representante da família, do ensaísta Eduardo Lourenço, do Ministro da Cultura e do ex-presidente da República, General Ramalho Eanes.»

Comunicado de imprensa do Ministério da Cultura
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Liberdades ...
























A democracia mede-se pelo grau de respeito pelas liberdades fundamentais que radicam no direito de escolha. Escolher é o contrário de ser forçado. Escolher é poder, perante várias alternativas, decidir qual é a que se adequa aos interesses e valores de cada um. O direito de escolha não limita ninguém. A sua impossibilidade condiciona. A ausência do direito de escolha contraria a liberdade, legitimando ditaduras e discriminações. Os cidadãos têm direito de escolher entre casar ou viver em união de facto; têm direito a decidir, perante a sua consciência, divorciar-se ou sujeitar-se à violência de uma relação insatisfatória; têm direito a escolher a pessoa com quem querem viver e a forma como o querem fazer, sem discriminações em função do sexo, da etnia, da orientação sexual, da deficiência ou da religião; têm direito a decidir se querem ou não ter filhos; têm direito de errar e de não ser condenados a viver ou a condenar outrem a viver os efeitos desse erro. Ajudar os cidadãos a ter a liberdade de escolher (o casamento, a união de facto, o aborto, o divórcio, a transmissão dos bens) é uma das funções mais nobres do Estado Democrático. Não o compreender, não o aceitar e não o defender deixa dúvidas sobre o grau de tolerância e de respeito pela dignidade dos seres humanos.

(Este artigo foi publicado hoje, 7 de Setembro de 2009, no jornal Diário Económico)

Ana Paula Fitas, in A Nossa Candeia / Fotografia Marina Edith Calvo
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Liberdade, liberdade, tem cuidado que te matam.

Assisti, ontem, à Convenção do PS no Coliseu dos Recreios. O que me surpreendeu? O funcionamento sem falhas da Convenção (pelo menos visíveis) que os detractores do PS devem considerar uma maleita mas que me deixou antever uma organização profissional, ou seja, o que se espera dos Partidos que são associações pagas, em boa parte, com o dinheiro dos contribuintes; o elevado nível, político e intelectual, das intervenções dos dirigentes e dos convidados, oriundos dos mais variados quadrantes da sociedade, na sua maioria, independentes; algumas referências a matérias, outrora polémicas, que foram varridas, como por encanto, da agenda política nacional. Como por exemplo: a questão europeia (que coisa mais estranha!), a regionalização, a revisão constitucional, a co-incineração (quantas manifestações!) … Em contrapartida, para meu contentamento, falou-se muito de liberdade e democracia. É pela política que o PS vai lá! É pela política que o PS ganhará as eleições! Uma das linhas distintivas do PS em relação aos restantes partidos é a questão da liberdade. A defesa da liberdade pode ser penosa para outros partidos, menos para o PS. É a bandeira da liberdade que o PS não pode, em circunstância alguma, deixar de levantar porque é ela que distingue o PS, pela história e pela acção quotidiana, dos restantes partidos, à sua esquerda e à sua direita. Albert Camus, no conturbado período do pós guerra (1945) escreveu: “Finalmente, escolho a liberdade. Pois que, mesmo se a justiça não for realizada, a liberdade preserva o poder de protesto contra a injustiça e salva a comunidade.” (…) [In Cadernos nº 4]. E Jorge de Sena, nos alvores da Revolução de Abril, em 4 de Junho de 1974, escreveu no magnífico poema “Cantiga de Maio” este verso emblemático: “Liberdade, liberdade, tem cuidado que te matam.” Será o eleitorado de esquerda capaz de compreender o que está em jogo nestas eleições?
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domingo, setembro 6

ACERCA DO DISCURSO POPULISTA DO PSD


A campanha eleitoral do PSD, é penoso para qualquer pessoa de bom senso admiti-lo, caiu na linguagem própria da extrema-direita. Não sei que diabo se passa na cabeça de Manuela Ferreira Leite e de um intelectual do calibre de Pacheco Pereira para jogarem mão de argumentos próprios dos políticos populistas. Todos sabemos, pela história e pela experiência, para quem conheça um pouco de história e tenha alguma experiência dos meandros do poder, com seus vícios e virtudes, que o PS é, no nosso sistema político partidário, um baluarte da defesa da liberdade e da democracia. Nele convivem, aliás, diversas correntes ideológicas debatendo-se entre diferenças políticas, tensões geracionais e cambiantes doutrinárias. O PS ocupa o lugar do centro-esquerda no nosso sistema político partidário. Uma banalidade. Mas serve para dizer que não há outro lugar a partir do qual se possa gerar uma alternativa de governo viável. Não é sequer uma questão de ser um governo de esquerda, é de ser um governo viável, capaz de conciliar interesses antagónicos e de gerar políticas de superação da crise (mais profunda do que muitos possam pensar) do sistema capitalista tal como o conhecemos. A direita sabe isso melhor do que ninguém. Por isso o seu discurso populista só pode ser interpretado como um ensaio para a criação de um modelo de governo autoritário que abra caminho à liquidação da Constituição cuja matriz incorpora os valores do 25 de Abril. Todo o discurso populista do PSD, e do PP, em defesa das liberdades não é mais do que uma paliçada por detrás da qual se acoitam os inimigos da liberdade. Alguns deles já deram provas do que são capazes quando acederam ao governo no período de 2002 a 2005. A memória é curta mas haverá sempre quem não esqueça. A social-democracia de Sá Carneiro, e a Democracia Cristã de Freitas do Amaral, estão mortas e enterradas e os seus poucos herdeiros perderam a audácia de se levantarem em sua defesa. Será o eleitorado de esquerda capaz de compreender o que está em jogo nestas eleições?
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sábado, setembro 5

JUSTIÇA

LEITURAS ACERCA DA JUSTIÇA:
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O PREC DE MANUELA MOURA GUEDES

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MERKEL E FERREIRA LEITE


Manuela Ferreira Leite viajou para a Alemanha para um encontro com Merkel. Até aí tudo bem. São da mesma família política, ou aparentada, ambas lideram partidos envolvidos em eleições que decorrem no próximo dia 27 de Setembro. Mas Merkel chegou meia hora atrasada ao encontro (alemães!), o encontro durou meia hora, sem direito a recolha de imagens, nem declaração conjunta, seguido do regresso à Pátria. Mais extraordinário é o facto da única declaração política relevante de MFL ter sido a de que “está fora de causa um entendimento com o PS no pós eleições", ao contrário do que acontece na Alemanha onde existe uma coligação de governo SPD/CDU. O mais interessante é que o resultado, provável, dessa coligação de governo na Alemanha será, segunda as sondagens, nas próximas eleições, fortemente desfavorável ao SPD e favorável à CDU. Se alguma extrapolação política é legitimo fazer para o caso de Portugal, se o resultado das eleições alemãs for o que se espera, é que um "bloco central", em Portugal, seria mais problemático para o PS do que para o PSD. Pois em Portugal a esquerda da esquerda retiraria, muito provavelmente, benefícios extra de uma coligação PS/PSD em desfavor do PS. Mas adiante que essa é outra discussão. O que torna ainda mais penosa a situação é o facto de uma candidata a primeira ministra de Portugal se colocar numa posição política insuportável ao admitir a quase clandestinidade do encontro com a líder da CDU, e do governo alemão, através desta espantosa declaração: “em primeiro lugar, era importante ter um encontro pessoal com a senhora Merkel e, em segundo lugar, em termos de provas temos as fotografias". Importa-se de repetir?
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sexta-feira, setembro 4

SER DE ESQUERDA

Etre de gauche, c'est s'interdire de penser à la création de richesses sans se soucier, dans le même élan, de leur redistribution. Etre de gauche, c'est trouver intolérable et immoral une disparité scandaleuse des revenus entre les citoyens. C'est ne pas identifier la liberté au droit de profaner, au laisser-faire et au tout-est-permis. Etre de gauche, c'est se soucier autant de bien traiter les étrangers que de les accueillir. C'est juger qu'un délinquant arrêté est davantage un malheureux à récupérer qu'un malfaiteur à punir. C'est ne pas prendre le culte de la transparence pour la liberté de nuire et de dénigrer.

Jean Daniel, in Le Nouvel Observateur
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OUTROS MUNDOS


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DIA DE ANIVERSÁRIO

É sempre possível encontrar gente ruim em qualquer tempo, estatuto, posição ou lugar. Gente ressabiada, invejosa, cruel, maledicente, … é sempre possível, mas o meu pai ensinou-me, quase sem palavras, um código de honra o qual, meu irmão e eu, cada qual à sua maneira, tudo fizemos por cumprir. Trilhar um caminho recto cujas voltas inevitáveis da vida nunca haveria de torcer, nem torcerá. Era um homem honrado e encantador. Nunca hei-de esquecer o seu cuidado em não molestar a minha liberdade mesmo quando não concordava com as minhas opções. Em silêncio esperava pacientemente o auto reconhecimento das razões diferentes que nos assistiam. Enquanto viva jamais esquecerei a sua crença na bondade dos homens. Nem as suas mãos quentes, e carinhosas, que me seguravam na vertigem da minha impaciência juvenil. Guardo comigo a mágoa de saber que não lhe dei a atenção suficiente. Hoje é o dia do seu aniversário. É um dos poucos dias que nunca esqueço. Lá no assento etéreo onde subiste guarda a paciente dolência dos teus gestos. Eu guardo-te no meu coração.
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quinta-feira, setembro 3

ACUSAÇÕES ASSASSINAS

Não é surpreendente o teor de certas acusações assassinas dirigidas, hoje, à liderança do PS que estão em linha com outras proferidas no passado recente, sob diferentes pretextos; nem sequer, apesar de chocantes, são novidade como se pode verificar pelo pequeno excerto de uma alocução de Albert Camus datada de 1948:

(…) Não há vida sem diálogo. Mas o diálogo foi, hoje, na maior parte do mundo, substituído pela polémica. O século XX é o século da polémica e do insulto. Eles ocupam, entre as nações e os indivíduos, e mesmo ao nível das disciplinas outrora desinteressadas, o lugar que tradicionalmente cabia ao diálogo reflectido. Dia e noite, milhares de vozes, empenhadas, cada uma por seu lado, num tumultuoso monólogo, lançam sobre os povos uma torrente de palavras mistificadoras, de ataques, de defesas, de exaltações. Mas qual é o mecanismo da polémica? Consiste em considerar o adversário como inimigo, por conseguinte a simplificá-lo e a recusar vê-lo. Aquele que insulto, já não sei de que cor são os seus olhos, ou se acaso sorri, e como o faz. Tornados quase cegos por obra e graça da polémica, já não vivemos entre os homens, mas num mundo de sombras.” (…)

Albert Camus – alocução feita na sala Pleyel em Novembro de 1948, in Actualidades - Contexto
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