segunda-feira, julho 21

O PECADO NA BRASILEIRA


Pelo menos no tempo de aulas, frequentando o Liceu e morando na Rua de Santo António, eu entrava na Brasileira quase todos os dias. Na descida no caminho de casa no tempo do calor – e o tempo do calor durava muito tempo – entrava na Brasileira, passava pelo balcão, tomava na mão um copo de água fresca dos que repousavam em cima de uma bandeja, bebia-a sofregamente e desandava. Lembro-me do ambiente como se fosse hoje: dos empregados, do patrão, do ar fresco do interior, pelo menos para mim, e do fascínio dos gelados que não eram para comer a toda a hora, nem sequer todos os dias, mas somente nos dias de festa. Foi na Brasileira que, pela primeira vez, de forma vibrante, senti um revés na minha formação católica. Após uma cerimónia na Sé – não sei se o crisma se a comunhão solene – transgredi com as regras que me haviam, dolorosamente, sido ensinadas. Escapei-me sozinho – não sei porquê – dirigi-me à Brasileira e não resisti: comi o gelado que não deveria ter comido e assumi o sentimento de culpa que guardei bem guardado. A verdade é que, no momento, me reconciliei com a vida terrena caindo numa das suas armadilhas.
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Ciganos lançam ultimato

Ferdinando Scianna

Este processo mistura todas as vicissitudes dos processos de realojamento (vindos dos anos 80/90), questiona os princípios clássicos da integração social (tão caros à esquerda) e faz emergir as questões da criminalidade e segurança pública (transversal a todos os estratos sociais). Começa a dar a imagem de uma questão mal enquadrada pelas autoridades que pode vir a criar um problema de proporções imprevisíveis. Espera-se que não tenha que ser o primeiro-ministro a lançar mão à resolução do problema que se não compadece com simplificações administrativas pois não é tolerável que qualquer parte do território nacional não seja livre de ser frequentado, e habitado, por qualquer cidadão seja qual for o seu estrato social, etnia ou estado de alma.
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"The Dark Knight"

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BERLIM


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sábado, julho 19

Borislaw Geremek

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REFLEXÃO ACERCA DO TEMPO

Regressemos à infância feliz
(dos dias sem tempo perdido)
Oiçamos o ruído imperceptível
(das vozes do nosso sangue)
Adivinhemos a força do vento
(do segredo bem guardado)
Cuidemos da memória pura
(dos amantes da liberdade)

30/4/2008
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sexta-feira, julho 18

MENEZES VOLTA A ATACAR

Luís Filipe Menezes, para quem não se lembre, o anterior líder do PSD, passou à táctica de guerrilha. Tendo abandonado a liderança do partido sob uma chuva de críticas, em forma de campanha organizada, que sempre denunciou, e volta a denunciar, Menezes anunciou retirar-se para a pacatez da gestão do município de Gaia mas, a partir de hoje, tornou claro que está pronto para o combate pela liderança do partido. Senão qual o sentido do parágrafo com que encerra o artigo publicado no DN?

Menezes irá flagelar a liderança de Manuela Ferreira Leite com críticas tanta mais duras e certeiras quanto o PS, e Sócrates, se mantiverem confortáveis nas sondagens, descendo devagar mas não o suficiente para que o PSD ameace, de forma credível, a sua maioria nas eleições legislativas. Menezes torna-se um aliado de Sócrates partilhando ambos, cada um à sua maneira, um velho, e brilhante, lema de António Gramsci: “O nosso pessimismo aumentou, mas permanece vivo e cheio de actualidade o nosso lema: pessimismo da inteligência, optimismo da vontade”. (L´Ordine Nuovo, 4 de Março de 1921).
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NELSON MANDELA



Pelo 90º aniversário de Nelson Mandela Sequência de fotografias de Ian Berry

1961. Nelson Mandela.
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Nelson MANDELA, soon to become President MANDELA, at the election night victory celebration in the Carlton Hotel in Johannesburg. Here he receives a hug from Mrs Chris HANNI, widow of ex MK leader Chris HANNI, assassinated before the election.1994. The MK is the military wing of the ANC.
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Nelson MANDELA and F.W. DE KLERK. 1994.
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quinta-feira, julho 17

SARAMAGO NA "CASA DOS BICOS"

Jean Gaumy – Lisbon. October 1990

Não sou um apreciador entusiasta da obra e da personalidade de José Saramago. Mas há algo de incompreensível e irracional na posição daqueles que disseram não à cedência da "Casa dos Bicos" à Fundação José Saramago. Os que se opuseram, não só pela palavra como pelo voto, foram Carmona Rodrigues (ex-presidente da CML, apoiado pelo PSD) e, mais significativo, o próprio PSD. É esta uma consequência prática da política preconizada por Manuela Ferreira Leite seguindo o lema “não há dinheiro para nada”.

A importância desta decisão da CML, para a cidade de Lisboa e para o país, é tão óbvia que entra pelos olhos dentro de qualquer cidadão normal. A "Casa dos Bicos" – goste-se ou não da sua arquitectura – associada à biblioteca de Saramago e às actividades que a Fundação, certamente, desenvolverá, tornar-se-á uma referência cultural da baixa de Lisboa e do país. O essencial do investimento da CML neste projecto é de natureza imaterial e tem um valor cultural muito apreciável. O resto é mesquinharia.
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quarta-feira, julho 16

INFLAÇÃO - BOM RESULTADO (RELATIVO) PARA PORTUGAL

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NEIL YOUNG (PELO MEU FILHO MANUEL)


Apareceu em palco com um blazer salpicado de tinta verde fluorescente e logo se percebeu que aquilo não ia ser, à semelhança de bob dylan, uma deprimente espécie de concerto de um gajo envelhecido... Ao contrário de bob dylan, que se revelou uma múmia cansada destas andanças e mt arrogante, neil young revelou td a sua juventude do alto dos seus 62 anos.

Interacção qb, muitos saltos e grandes guitarradas deixaram os fãs realizados... sem medo nem vergonha do seu estatuto de "dinossauro" aproveitou-se dele tanto para apresentar o seu mais recente álbum como também para tocar todos os clássicos em grande estilo... (faltando apenas o "Hey Hey, My My"o que nos deixou tristes...)!

Com imensos instrumentos em palco todos os membros da banda foram rodando nos instrumentos estando assim o concerto em constante mudança...mantendo sempre a energia do público. Os pontos altos foram sem duvida o "Rockin' in the Free World" que pôs td o público a cantar e, para mim, "The Needle and the Damage Done"...

Neil terminou o concerto, como se esperava, com um cover dos Beatles no qual foi completamente à loucura destruindo a sua guitarra...por fim abandonou o palco entre muitos aplausos para dar lugar a Ben Harper!

[Segunda posta do meu filho Manuel desta vez acerca do concerto de Lisboa de Neil Young! – este é um fenómeno interessante: o gosto das novas gerações cruza-se, muitas vezes, com o das mais velhas!]
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BISBILHOTICE

Eric Percher

O meu coração balança entre o fascínio d´O admirável mundo dos ‘chips’ e o velho mundo das pegadas e impressões digitais. A devassa da nossa vida íntima está à mão de qualquer aprendiz de feiticeiro. Quando me aproximo de um terminal multibanco já sei que estou a ser filmado; quando meto a chave à porta de casa idem; quando estabeleço uma comunicação telefónica, pela rede fixa ou móvel, quando envio uma mensagem electrónica ou acedo a um site, sei que posso estar a ser vigiado! Para não falar das bases de dados da administração fiscal, dos bancos e por aí fora … Já li, há muito, os livros que anteciparam o “big brother”. Uma brincadeira de crianças … Mas ainda pior que todos os dispositivos mecânicos disponíveis para o homem se vigiar a si próprio é o “chip” que o homem incorpora na sua natureza que dá pelo nome de bisbilhotice (uma saudação para o Matias Alves!).
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ILDA

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terça-feira, julho 15

MICHELLE BRITO

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BANCO DE PORTUGAL - REVISÃO EM BAIXA


Foi tornado público o Boletim Económico Verão 2008 do Banco de Portugal. Como seria de esperar uma revisão em baixa da previsão de crescimento da economia, em 2008, desta feita, para 1,2%. Deixo, de seguida, os dois primeiros parágrafos da Conclusão:

As actuais projecções apontam para um fraco crescimento da economia portuguesa em 2008 e 2009, contemplando desta forma a interrupção do processo de recuperação gradual da actividade económica verificado nos anos anteriores, o qual tinha sido caracterizado por uma evolução mais favorável das exportações a partir de 2006 e por uma expressiva aceleração do investimento em 2007.

Na segunda metade de 2007, ocorreram vários choques de origem externa, nomeadamente a eclosão de uma turbulência sem precedentes nos mercados financeiros internacionais, associada a uma rápida e significativa reavaliação do risco pelos investi dores. As indicações mais recentes apontam para uma maior persistência desta situação de turbulência face ao inicialmente esperado, afectando em especial a evolução dos mercados de exportação e as condições de financiamento dos agentes económicos. Ao mesmo tempo, verificou-se uma intensificação do aumento do preço do petróleo nos mercados internacionais, para níveis historicamente elevados em termos nominais e reais.
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Não resisto a anotar este curioso subtítulo na notícia da RTP (on-line) acerca da previsão da inflação em Portugal e na Zona Euro (é o serviço público no seu melhor!):

Taxa de inflação superior à da Zona Euro
O governador do Banco de Portugal disse aos deputados que o país conquistou competitividade externa nos últimos nove meses, porque tem uma taxa de inflação inferior à da Zona Euro. Temos tido uma inflação mais baixa do que a área euro, o que acontece pela primeira vez”, disse Constâncio. Uma inflação mais baixa que a da Europa a 15 traduz-se “por um ganho de competitividade externa”, explicou na comissão de Orçamento e Finanças. Portugal mantém o ritmo de crescimento de preços inferior aos seus parceiros do euro desde Setembro de 2007, acrescentou Constâncio.
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MAU SENTIMENTO

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segunda-feira, julho 14

CAMINHOS DA MEMÓRIA (II)

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UM CONCERTO MEMORÁVEL (VISTO PELO MEU FILHO MANUEL)


As expectativas eram altíssimas...e foram ainda assim excedidas! Quando ao fim de varias horas de espera começou a soar a sirene e se viu a carismática estrela vermelha a subir pelo palco acima...começou-se a pressentir o que se ia passar ali..."sangue, suor e lágrimas"!

E assim foi: Abriram com "Testify" que gerou o caos e a anarquia total por entre o publico, a ponto do próprio Zack ficar surpreendido com a loucura que se vivia. Com Tom Morello a fazer magia com a guitarra e Zack de la Rocha cheio de energia seguiram-se 70 minutos de constante e brutal mosh...Tive lá bem no meio da loucura até começar a ver uns quantos guerreiros a ficar K.O. e aí pareceu-me que tava na altura de recuar um pouco para o bem da minha saúde.

Todos fomos surpreendidos com o entoar da internacional socialista ... que mais uma vez revelou a constante presença da política nos RAGE, que faz deles não só uma banda intervencionista como também "a voz da revolução"!

Num concerto em que o moshe e a guerra foram praticamente constantes é difícil escolher o momento alto da noite...mas para mim, e para muitos outros, foi "Killing in the name"! No fim todos se arrastaram exaustos para casa para ir recuperar das costas, das pernas e dos vários hematomas...

[Texto do meu filho Manuel a propósito de um concerto memorável.]
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"ops!"

Saiu o número inaugural da revista “ops!” de iniciativa da Corrente de Opinião Socialista, ou seja, para falar claro, da corrente de opinião liderada por Manuel Alegre. Uma boa ideia por vários motivos: - o debate é preciso; - nada pior para os governos do que o amorfismo dos partidos que os apoiam; - nada pior para a política do que o unanimismo; – nada pior para a democracia política do que o silenciamento das discordâncias ou divergências.

Não é preciso concordar com todas as ideias que a revista veiculará para que concordemos com a sua criação. Esta é, por outro lado, uma revista digital o que representa uma não negligenciável inovação no panorama político nacional.

Alegre escreve a encerrar o seu curto editorial: “Todos somos responsáveis pelo nosso mundo e pelo nosso país. Chegou a hora de resistir ao condicionalismo e à colonização ideológica. A hora de sermos nós próprios e de propormos soluções que se baseiem nos valores e não nos interesses que confiscaram o Estado e minam a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas. Hora de resistir, debater e de assumir e divulgar a nossa opinião socialista.”

Todos podemos estar de acordo com ideias gerais mas seria muito útil que Manuel Alegre, em breve, esclarecesse o conceito de “condicionalismo e colonização ideológica” assim como indicasse quais os “interesses que confiscaram o Estado e minam a confiança dos cidadãos nas instituições democráticas”. Para princípio de debate …
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D. ANTÓNIO FERREIRA GOMES

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sábado, julho 12

MEU POEMA


Meu poema é um silêncio aceso
que me alumia o caminho da fala
e se derrama na palavra escrita
à mão teclada ou manuscrita

Meu poema só existe quando escapa
ao exacto momento que o suscita
e nada mais tem para dizer
senão o que a própria mão lhe dita

15/3/2008

[25 Poemas. Selecção de poemas escritos, a lápis, nas páginas do livro “Toda a Poesia”, de Ferreira Gullar, 15ª edição, José Olympio, Editora. Este é o último poema desta série que foi publicada no Caderno de Poesia.]
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sexta-feira, julho 11

JORGE DE SENA (HOMENAGENS)

Jorge de Sena

Em El descanso, Fidel Castro homenageando a sua amizade com García Marques, omite Saramago, no dia em que a Fundação Saramago homenageia Jorge de Sena. Do mal, o menos mas vá lá saber-se o que Sena seria capaz de pensar, e escrever, se fosse vivo, acerca desta homenagem. Aqui há uns anos atrás propus que fosse dado o nome de Jorge de Sena à nova sede do INATEL no Porto que assim ficou a chamar-se CASA JORGE DE SENA. Muitos se interrogaram, e interrogam, acerca da razão de ser de tal homenagem. Paciência! O ministro da cultura, ontem, comprometeu-se a diligenciar para trazer o espólio de Jorge de Sena para Portugal. Mas o que seria uma verdadeira homenagem a Jorge de Sena, e um acto de coragem, seria o Estado português reparar as injustiças que lhe fez e trazê-lo de volta a Portugal. Mas acerca disso ninguém fala. A Pátria continua a viver na penumbra de todos os medos!
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CAMINHOS DA MEMÓRIA

Pano de fundo do I Congresso do MES (Aula Magna da Cidade Universitária de Lisboa)

Hoje nos Caminhos da Memória: I Congresso do MES - algumas reflexões tardias
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O ESTADO DA NAÇÃO


Li, atentamente, o discurso que o primeiro-ministro proferiu hoje no Parlamento porque atribuo relevância ao debate político em geral e, em particular, quando se trava nos momentos em que os governos enfrentam crises graves. Para o que me havia de dar! Para falar, ou escrever, concordar ou criticar, é necessário conhecer minimamente as matérias sobre as quais se fala ou se escreve. Parece elementar, mas não é!

O discurso do primeiro-ministro está bem construído. Defende os aspectos centrais da política do governo, como seria de esperar, reconhece a crise mundial, com forte incidência nacional, que se pode sintetizar como “3º choque petrolífero”, é determinado e corajoso, quanto baste, e apresenta, de forma clara e perceptível para o comum dos cidadãos, medidas de natureza social que se resumem numa frase quase no final do discurso:

Não seria de esperar que o primeiro-ministro, num debate deste tipo, se arriscasse a tocar todas as matérias do arco da governação mas parece-me que ficou aquém das expectativas quanto, pelo menos, à abordagem das matérias da economia, com um desejável enfoque nas pequenas e médias empresas, assim como na reforma da justiça cuja “marcha lenta” condiciona, de forma brutal, o “ambiente envolvente” do desenvolvimento socioeconómico do país.

Mas o mais relevante na minha apreciação do “estado da nação”, certo que apreciei de forma positiva o discurso, é a distância entre as intenções anunciadas e a capacidade para as concretizar de forma adequada à realidade concreta da nossa sociedade.

O governo não se resume à figura do primeiro-ministro, nem as políticas dos governos se resumem a discursos e anúncios. Há uma miríade de dirigentes intermédios, a todos os níveis da administração, e uma multiplicidade de decisões e processos de trabalho, altamente exigentes, cuja qualidade de execução tem estado muito aquém das boas ideias, intenções e propostas do primeiro-ministro.

Um comandante determinado pode não ser suficiente para levar à vitória, ainda para mais numa conjuntura adversa, um exército pejado de oficiais incompetentes, que se comprazem em dar tiros nos pés ou se atropelam no afã de apresentar trabalho, assegurando lugares e prebendas, sem cuidar de administrar as políticas com a parcimónia, ousadia e eficácia que o “estado da nação” exige.

[Uma nota de rodapé para o novo líder do PSD em cujas inflexões discursivas se insinuam, sem desprimor, ecos da inconfundível e melíflua voz de Salazar.]
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quinta-feira, julho 10

A (IN) JUSTIÇA FISCAL

Miguel Rio Branco

A injustiça fiscal – que consiste numa administração fraca para com os fortes e forte para com os fracos – vai contribuir para o afundamento do governo socialista e da sua liderança. Pelo que conheço não há volta a dar! As iniquidades são mais do que muitas e flagrantes! A falta de sentido de justiça e a desproporcionalidade das sanções – na área fiscal – aplicadas a muitos milhares de cidadãos honestos e a empresas no limiar da sobrevivência – ou que já nem sequer existem – é, ao que parece, irreversível. O governo socialista assume-se, cada vez mais, nas questões que tocam a vida quotidiana dos cidadãos e das empresas, como uma espécie de produto “marca branca”. E em política, como em tudo, a perda de identidade, em particular nas questões de justiça, paga-se cara. A ver vamos como dizia o cego!
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GUERRILHEIRO SENTIMENTAL

Vi, de longe, Eurico de Figueiredo, um exilado, na verdadeira acepção da palavra e também da política contemporânea (como o compreendo!) numa visita a Cuba, faz agora um ano. Viajamos em grupos diferentes e não nos chegámos a falar. Encontrei-o mais tarde numa exposição de pintura e mostrou-me o seu desencanto com o que havia visto e sentido naquela viagem. No tempo de todos os desencantos é um bálsamo ser confrontado com este título: “Guerrilheiro Sentimental”. [A partir daqui.]

quarta-feira, julho 9

fazer tudo o que se exige a um homem fazer.


Não posso deixar mais tempo esta folha em branco por assinalar com um rabisco qualquer, o desejo de participar, estar presente, testemunhar, o medo da folha em branco, por esquecimento de nela assinar a palavra, uma palavra, qualquer palavra, o desejo de pertencer a um espaço, comunidade, lugar, escrever depressa, sem errar, sem entrar no trilho da escrita automática de que tenho ouvido falar e da qual às vezes sinto que passo mesmo a rasar, como agora, cansado, ao fim da noite, com a cabeça a tombar no teclado, num último estertor de energia, no fim do dia, cansado, como o meu pai se devia sentir cansado no fim do seu tempo, MANTENDO A VONTADE DE SE MOSTRAR DIGNO, RECOLHENDO-SE, REZANDO, REGRESSANDO AO TEMPO DAS ÁRVORES DE FRUTOS EM CUJA SOMBRA DESFRUTAVA DE TODO O TEMPO DO MUNDO, PARA PENSAR COMO FUGIR À MISÉRIA E CRIAR FAMÍLIA, QUE CRIOU, como tantos homens e mulheres do seu tempo que aprendi a admirar, DEIXANDO-ME A MIM QUASE PARA O FIM, como me sinto ligado a todas as tradições que os meus em mim depositaram sem saber e interrogo-me se serei capaz de legar a mesmo doce áurea de uma vida impoluta de fazer tudo o que se exige a um homem fazer. 8/7/2008

[Transcrito do Diário]
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O AUTOMÓVEL ELÉCTRICO

A construção do automóvel 100% eléctrico vai mesmo avançar. Em Portugal foi hoje formalmente apresentado o projecto da parceria Nissan-Renault, após a Dinamarca (o primeiro país da UE que entrou em recessão técnica) e Israel. Resta saber onde será construído o carro eléctrico: talvez em Marrocos (mais certo no Japão). Sócrates tenta colocar Portugal na linha da frente das soluções energéticas do futuro. Perguntará atónita a Dra. Manuela: haverá dinheiro para um investimento destes? E estudos custo/benefício? É um novo mundo que se abre à nossa frente e, sem prejuízo dos mesmos, há mais vida para além dos estudos!
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terça-feira, julho 8

LETRA DE FORMA

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OS CALORES DO VERÃO



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SEDES: NOVIDADE=0

Sophie Thouvenin

Depois de ler as notícias que anteciparam o mais recente documento da SEDES pensei que se tratasse de uma tomada de posição política arrasadora da acção do governo. Assim uma espécie de manifesto da oposição contra as políticas dos governos de Salazar e Caetano com as tonalidades próprias de um combate pela mudança de regime. Alguma coisa verdadeiramente estimulante. Afinal não! Esperei para ler o documento na íntegra e o que dele transparece são comentários razoáveis ao “estado da nação” apontando desvios em cada uma das áreas abordadas à medida das orientações ideológicas dos autores. Trata-se, pois, mais de um conjunto de recados dirigidos ao governo e, em particular, ao ministro A ou B do que uma crítica estruturada à acção do governo que para tal seria necessário pegar no seu programa e escalpelizá-lo. A SEDES não envereda por esse caminho e fica-se, com mérito, pelo comentário político permitindo, por demérito comunicacional, que a opinião pública não se sinta absolutamente nada chocada com a denúncia de um abrandamento da densidade das reformas promovidas pelo governo porque vêm aí eleições. Estavam à espera que o governo, em véspera de eleições, desencadeasse uma “guerra civil”?
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FIDEL: PRINCÍPIOS ELEMENTARES DE POLÍTICA QUE O PCP NÃO APREENDE

Rene Burri

A sua imagen no diploma escolar é uma surpreendente faceta do culto da personalidade que o regime cubano, apesar de todos os disfarces, presta a Fidel Castro. Mas acerca da Colômbia, Fidel, no fim da vida activa, dá uma elementar lição de política aos dirigentes do PCP que estes não apreendem. Vale a pena ler o artigo “La paz romana” na íntegra.

Expresé con claridad nuestra posición en favor de la paz en Colombia, pero no estamos a favor de la intervención militar extranjera ni con la política de fuerza que Estados Unidos pretende imponer a toda costa y a cualquier precio a ese sufrido y laborioso pueblo.

Critiqué con energía y franqueza los métodos objetivamente crueles del secuestro y la retención de prisioneros en las condiciones de la selva. Pero no estoy sugiriendo a nadie que deponga las armas, si en los últimos 50 años los que lo hicieron no sobrevivieron a la paz. Si algo me atrevo a sugerir a los guerrilleros de las FARC es simplemente que declaren por cualquier vía a la Cruz Roja Internacional la disposición de poner en libertad a los secuestrados y prisioneros que aún estén en su poder, sin condición alguna. No pretendo que se me escuche; cumplo el deber de expresar lo que pienso. Cualquier otra conducta serviría sólo para premiar la deslealtad y la traición. [Sublinhado meu.]
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segunda-feira, julho 7

CULTO DA PERSONALIDADE

Un diploma y mucha confusión, ou seja, o diploma de 7º ano do filho de Yoani Sanchez
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TGV

Martine Franck
The new train at the station "L'Homme de Fer."

Esta direita cujos interesses o PSD acolhe, centrifugando dirigentes a uma velocidade estonteante, consegue deixar de cara à banda qualquer vulgar cidadão. Eu não me queria meter por estes atalhos pois negócios são negócios e o TGV não está à margem dos interesses que se movem à ilharga e por dentro da política.

Mas, se bem entendo, aqueles que hoje são contra o TGV são os mesmos que antes o defendiam, com mais linhas, entre linhas e encargos. (através daqui).

Não se sabe, é certo, se Manuela Ferreira Leite é contra o TGV. O que ela diz é que não há dinheiro para nada e Cavaco parece que começou a mostrar o seu jogo ensaiando jogar o jogo dela, ou vice-versa.

O mais certo é que esta direita ultramontana, dos costumes às realizações materiais, nacional paternalista, clame contra a construção de uma estrada de ferro moderna que nos ligue à Europa, necessária por razões de integração no espaço geoestratégico que é o nosso, por razões de ecologia, por razões de economia, por todas as razões que a direita também conhece mas que, no lugar da oposição, desdenha.

Face a esta deriva, ao governo socialista compete, ponderada a relação custo benefício e o interesse nacional, fazer como Duarte Pacheco em relação a Salazar: realizar a obra que os cépticos e detractores depois se hão-de montar nela (a obra) e tecer-lhe loas como se fora obra sua!
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NUCLEAR

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sexta-feira, julho 4

Fidel, o PCP e a libertação de Ingrid Betancourt -

Burt Glinn - CUBA. CASTRO, Fidel. 2001.

Que mais não seja para efeitos de comparação de estilos a declaração de Fidel Castro, a propósito da libertação de Ingrid Betancourt é, politicamente, bastante cuidada ao contrário da do PCP. A diferença está no parágrafo, que transcrevo a seguir:

No restante não há diferenças de fundo mas há limites que Fidel sabe, por experiência, que não podem, nem devem, ser ultrapassados. E um desses limites é, mesmo descontando o cinismo próprio da diplomacia, o que ele designa como “elementar sentimento de humanidade”.
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quinta-feira, julho 3

PALAVRAS DE ORDEM

Às voltas com uma pesquisa dei de caras com uma listagem de palavras de ordem retiradas da colecção de Murais Artísticos de Abril, de Conceição Neuparth, depositada e tratada pelo Centro de Documentação 25 de Abril. Algumas delas pertencem inexoravelmente ao passado mas outras, à falta de ideias, ainda podem servir de inspiração a algumas lideranças partidárias.


A revolução triunfará
A terra a quem a trabalha
A vitória é difícil mas é nossa
Abaixo a exploração capitalista
Casas sim! Barracas não!
Dá mais força à liberdade
Democracia em Portugal só com Freitas do Amaral
Em frente com a Reforma Agrária
Fora com a canalha o Poder a quem trabalha
GNR fora das cooperativas
Greve ao papel higiénico. Compremos os jornais
Independência Nacional
Já não há eleições. D. Sebastião volta para a semana
Junta a tua à nossa voz
Morte ao fascismo
Não ao aumento do custo de vida
Nato fora de Portugal, Portugal fora da Nato
Nem Deus nem Chefe
Nem mais um faroleiro para as Berlengas
Nem Nato nem Pacto de Varsóvia
Ninguém há-de calar a voz da classe operária
O Chile vencerá
O sol brilhará para todos nós
Operários, camponeses, soldados, marinheiros, unidos vencerão!
Otelo para Presidente
Pão Paz Terra Liberdade, Independência Nacional
Por uma vida melhor
Quem tem medo do comunismo?
Rumo ao Socialismo
Sem cultura não há liberdade
Todos unidos com o MFA
Unir – Organizar – Armar (PRP)
Unir Organizar Vencer (MDP)
Viva o 25 de Abril
Viva Staline eternamente na Sibéria
Voto do povo para a vitória do povo

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Ingrid Betancourt em liberdade



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Nota do Gabinete de Imprensa do PCP
Em resposta a várias solicitações dos órgãos de comunicação social sobre a posição do PCP a propósito da operação de resgate de Ingrid Bettencourt por parte do exército nacional na Colômbia, o PCP considera o seguinte:
1. O resgate de Ingrid Bettencourt após um período em que esteve prisioneira na selva colombiana, coloca em evidência a gravidade da situação em que se encontram centenas de prisioneiros em ambos os lados do conflito e a necessidade de encontrar uma solução humanitária entre as partes.
2. Os complexos problemas em presença, exigem uma solução política e negociada de um conflito que se arrasta há mais de 40 anos sem solução, situação que é em si, inseparável da política de agravamento da exploração e de terrorismo de estado praticada pelo governo neo-fascista de Uribe, conforme tem vindo a ser denunciado pelas forças progressistas e democráticas da Colômbia.
3. O Povo colombiano poderá continuar a contar com a solidariedade dos comunistas portugueses na sua luta contra a opressão e exploração, pela justiça social, pela democracia e soberania nacional.

(A partir de um comentário de MFerrer que agradeço fui em busca da posição do PCP acerca da libertação de I.B.. Cada força política, em democracia, é livre de tomar as posições que entender sem o risco de rapto, degredo ou assassinato. Fico, ao menos, a saber que Ingrid Bettencourt foi resgatada “após um período em que esteve prisioneira na selva colombiana …” e que a Colômbia tem um governo “neo-fascista”. Prometo que vou dar mais um pouco de atenção a este conceito no caso em apreço e noutros.)
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quarta-feira, julho 2

Ingrid Betancourt

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MANUELA FERREIRA LEITE - NOCTURNOS (II)

Christine Lebeck - Nocturnes

Ainda a propósito da entrevista de Manuela Ferreira Leite (MFL) à TVI, está fora de causa a necessidade e relevância da oposição actuar segundos os processos que considere mais adequados e eficazes. Mesmo nas ditaduras, como todos sabemos, as oposições, embora actuando nas margens, ou fora da lei, de forma pacífica ou violenta, sempre existiram e existirão. Quanto mais em democracia! A questão está no patamar civilizacional em que se encontra a comunidade ao discutir os regimes políticos e as suas regras, nas quais se integra a questão das oposições. MFL disse que ao governo não compete fazer oposição à oposição. Compete-lhe governar. Estou de acordo. Mas à oposição, em democracia, compete mais do que bloquear as iniciativas e projectos do governo. À oposição compete apresentar alternativas quando as encontre melhores do que os projectos do governo ou concordar com os projectos do governo quando não lhes encontre melhores alternativas. É simples e fácil. MFL não é uma política caída do céu, desconhecedora de tudo e todos, uma virgem ofendida com a clausula dos projectos do governo. O jogo do fingimento de MFL não resistirá, como o debate de ontem mostrou, a um minuto de debate, a sério, com Sócrates. Pela simples razão, entre outras que não cabem neste já longo post, que MFL esteve presente no processo de gestação e decisão de todos os mais importantes projectos cujos estudos hoje afirma desconhecer. O azar de MFL é o facto de ter encontrado um primeiro-ministro – goste-se ou não do estilo – que é difícil de igualar no confronto com a adversidade. Quando antes alguns primeiros-ministros, ressalvados os seus méritos, se puseram ao fresco face às adivinhadas dificuldades da governação e aos expectáveis embaraços das explicações que deviam ao país, este primeiro-ministro parece que está disposto à luta (política, entenda-se) mesmo nas condições adversas que se desenham no horizonte. Ora esta atitude pessoal perante a política, indo além da política, faz toda a diferença!
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