De regresso de umas pequenas férias, voluntariamente, sem computador. Nestes
dias nada queria inscrever nestas páginas dedicadas às viagens na nossa terra a
propósito das tradicionais festas de família que a época convoca. Fazem-se
envios de votos de Natal Feliz. Tomam-se refeições demais (os que podem ter
aceso a elas) e escondem-se, o melhor possível, os dramas do quotidiano. Em Faro
uma mulher passa por mim na rua, a chorar, enquanto fala ao telemóvel: deixem-me
ficar só, só…e sente-se o frio da rua entrar dentro de nós. Nesta quadra
festiva, este ano, respira-se um ar mais pesado que é difícil de esconder.
[Um post de 28 de dezembro de 2003 que poderia ser escrito aquando do regresso das férias de Natal deste ano da graça de 2012 que deverão ser passadas na mesma cidade, como sempre, toda a vida, a minha cidade Natal.]
Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
quarta-feira, novembro 21
terça-feira, novembro 20
A SOLIDARIEDADE
Ideias para o futuro-2
Uma ideia para o futuro em Portugal é a
criação, na estrutura do Governo de uma “Secretaria de Estado para as Pessoas
Idosas”.
O envelhecimento da população é um forte desafio que se coloca à sobrevivência das sociedades democráticas. Todos os indicadores apontam no sentido da população idosa se tornar, a médio prazo, maioritária nas sociedades ocidentais. Trata-se de um fenómeno que impõe a adopção de medidas inovadoras em diversas áreas cruciais da organização das nossas sociedades.
O modelo de financiamento da segurança social ocupa o centro dessas mudanças. Um dos grandes desafios das políticas sociais, que valorizem a dignidade do homem acima dos interesses financeiros da banca e das seguradoras, é a criação de um novo modelo de solidariedade intergeracional.
Este desafio exige que sejam repensadas questões tais como a idade de reforma, a duração da jornada de trabalho e sua flexibilização, assim como políticas de imigração, integradas, justas e aceitáveis por todos os cidadãos.
Muitos acontecimentos recentes – desde a persistência de João Paulo II, ostentando em público a sua velhice, até aos efeitos calamitosos das “vagas de incêndios e de calor” - colocaram em destaque a urgência da definição de políticas autónomas para os cidadãos idosos.
O combate à tragédia silenciosa da solidão e abandono dos idosos exige a serena coragem de mudanças em que o Estado, os empresários e as entidades de vocação social, estabeleçam pactos de solidariedade honrando a dignidade da vida, vivida até ao fim, por todos os cidadãos.
O Estado, em particular, tem de assumir plenamente a sua responsabilidade na criação de condições para o desenvolvimento de políticas activas de integração dos mais idosos numa sociedade em que o culto da juventude impera, cada vez mais competitiva, xenófoba, insensível às diferenças, hipócrita e hostil aos idosos.
O envelhecimento da população é um forte desafio que se coloca à sobrevivência das sociedades democráticas. Todos os indicadores apontam no sentido da população idosa se tornar, a médio prazo, maioritária nas sociedades ocidentais. Trata-se de um fenómeno que impõe a adopção de medidas inovadoras em diversas áreas cruciais da organização das nossas sociedades.
O modelo de financiamento da segurança social ocupa o centro dessas mudanças. Um dos grandes desafios das políticas sociais, que valorizem a dignidade do homem acima dos interesses financeiros da banca e das seguradoras, é a criação de um novo modelo de solidariedade intergeracional.
Este desafio exige que sejam repensadas questões tais como a idade de reforma, a duração da jornada de trabalho e sua flexibilização, assim como políticas de imigração, integradas, justas e aceitáveis por todos os cidadãos.
Muitos acontecimentos recentes – desde a persistência de João Paulo II, ostentando em público a sua velhice, até aos efeitos calamitosos das “vagas de incêndios e de calor” - colocaram em destaque a urgência da definição de políticas autónomas para os cidadãos idosos.
O combate à tragédia silenciosa da solidão e abandono dos idosos exige a serena coragem de mudanças em que o Estado, os empresários e as entidades de vocação social, estabeleçam pactos de solidariedade honrando a dignidade da vida, vivida até ao fim, por todos os cidadãos.
O Estado, em particular, tem de assumir plenamente a sua responsabilidade na criação de condições para o desenvolvimento de políticas activas de integração dos mais idosos numa sociedade em que o culto da juventude impera, cada vez mais competitiva, xenófoba, insensível às diferenças, hipócrita e hostil aos idosos.
[Poste de 29 de dezembro de 2003 abordando o envelhecimento demográfico, uma faceta da tão decantada questão da reforma do estado social, afinal, um tema recorrente e antigo.]
segunda-feira, novembro 19
domingo, novembro 18
OS PRIMEIROS POSTES EM VÉSPERAS DO NONO ANIVERSÁRIO
Fim do ano 2003
Como sempre, nos últimos anos, à vista do mar
nas proximidades do ponto mais ocidental da Europa. O oceano atlântico, em toda
a sua plenitude, à nossa vista. O cheiro intenso a maresia. O mar nestas costas
é forte quando batido pelo vento. Não havemos de olhar demasiado para trás.
Faltam alguns amigos mas juntaram-se outros novos. A vida é feita de mudança. E
a olhar o futuro o mundo avança. Eduardo Lourenço fala numa entrevista recente
que os portugueses se preocupam mais com parecer bem e menos com fazer obra. Têm
medo de tomar posição. Arriscar nas empreitadas do progresso. Esperam que a obra
surja feita. As palavras são minhas. Não tenho a entrevista na minha frente.
Lourenço não diz, mas digo eu, que fazer obra para os portugueses é algo
estranho e potencialmente perigoso. Pode por em causa o equilíbrio necessário ao
triunfo do espírito conservador. Esta filosofia de vida está devidamente
documentada pela nossa história ? salvo em raros períodos ? e pela pena dos
nossos maiores: Camões (Luís), Pessoa (Fernando), Sena (Jorge de) ? Os governos
querem-se modestos nos grandes desígnios e sem vistas largas não vá o
engrandecimento do País ferir as cordatas relações de poder com as grandes
famílias instaladas e fazer perigar as dependências face aos interesses
estrangeiros. Dizem os tecnocratas, mais cultos, que falta músculo ao capital e
massa crítica à inteligência. Dito do ponto de vista do humanismo o que falta,
em regra, é decência aos dirigentes, civismo, educação e cultura ao povo.
Certamente se encontrarão formas originais e renovadas de trilhar, no futuro, um
novo caminho de progresso. Mas este simples blog confirma, como tantas outras
formas de expressão, em finais de 2003, um princípio que convém preservar, a
todo o custo, que Camus sintetizou numa frase que nunca mais
esqueci:
?Finalmente, escolho a liberdade. Pois que, mesmo se a justiça não for realizada, a liberdade preserva o poder de protesto contra a injustiça e salva a comunidade.
?Finalmente, escolho a liberdade. Pois que, mesmo se a justiça não for realizada, a liberdade preserva o poder de protesto contra a injustiça e salva a comunidade.
[A um mês de fazer nove anos de vida, com atividade ininterrupta, revisito alguns dos postes mais antigos deste blogue e, mais próximo de 19 de dezembro, colocarei também os mais visitados.]
sexta-feira, novembro 16
quarta-feira, novembro 14
terça-feira, novembro 13
segunda-feira, novembro 12
domingo, novembro 11
sexta-feira, novembro 9
quinta-feira, novembro 8
quarta-feira, novembro 7
ALBERT CAMUS - 99º ANIVERSÁRIO
Havia uma porta embutida na parte argamassa na qual se podia
ler: “Cantina agrícola Mme. Jacques.” Filtrava-se luz pela frincha inferior. O
homem imobilizou o cavalo junto dela e, sem descer, bateu. Acto contínuo, uma
voz sonora e decidida inquiriu: “Quem é?” “Sou o novo gerente da propriedade do
Santo Apóstolo. A minha mulher vai dar à luz. Preciso de ajuda.” Ninguém
respondeu. Passado um momento, foram levantados ferrolhos e a porta
entreabriu-se. Descortinou-se a cabeça negra e ondulada de uma europeia de
faces cheias e nariz um pouco abaulado acima dos lábios grossos. “Chamo-me
Henri Carmery. Pode ir junto de minha mulher? Tenho de chamar o médico.” (…) O
médico olhou-o com curiosidade. “Não tenha medo, que tudo há-de correr bem.”
Cormery volveu para ele os olhos claros, fitou-o calmamente e declarou com uma
ponta de cordialidade: “Não tenho medo. Estou habituado aos golpes duros do
destino.” (…) A chuva tombava com mais intensidade no telhado antigo e velho. o
médico procedeu a um exame sob os cobertores. Em seguida, endireitou-se e
pareceu sacudir algo na sua frente. Soou um pequeno grito. “É um rapaz”,
anunciou. “E bem constituído.” “Começa bem”, disse a dona da cantina. “Com uma
mudança de casa.” A mulher árabe riu no canto e bateu as palmas duas vezes.
Albert Camus, in O Primeiro Homem
segunda-feira, novembro 5
ALBERT CAMUS - NAS VÉSPERAS DO 99º ANIVERSÁRIO DO SEU NASCIMENTO
“São raros aqueles que continuam a ser pródigos depois de
terem adquirido os seus meios. Esses são os reis da vida, que se devem saudar
com discrição.”
(…)
“ – a miséria é uma fortaleza sem ponte levadiça.”
(…)
“De resto, como fazer compreender que uma criança pobre pode
por vezes ter vergonha sem nunca invejar coisa alguma?”
(…)
“E, à noite, deitado, morto de cansaço, no silêncio do
quarto onde a mãe dormia levemente, ainda ouvia uivar dentro dele o tumulto e
furor do vento que amaria ao longo de toda a vida.”
(…)
“ … a criança morrera naquele adolescente magro e vigoroso,
de cabelos revoltos e olhar arrebatado, que trabalhara todo o Verão para levar um
salário para casa e acabava de ser nomeado guarda-redes titular da equipa do
liceu e, três dias antes, saboreara pela primeira vez, quase desfalecido, o
contacto com a boca de uma jovem.”
Albert Camus, in O Primeiro Homem
[Depois de amanhã, 7 de novembro, faz 99 anos que nasceu Camus. Está prestes a iniciar-se o ano do centenário do seu nascimento. Espero que, em Portugal, alguma coisa aconteça. A ver. ]
domingo, novembro 4
A MINHA TURMA DO 1º ANO
Tenho na minha frente a
fotografia da turma que frequentei nesse 1º ano em cujo verso a minha mãe
escreveu: "Recordação do 1º ano – Faro – 10-4-1959".
Naquela fotografia dos
professores que ilustra uma crónica de Lina Vedes pareceu-me, a
um primeiro olhar, reconhecer onze (11) professoras e professores que me
calharam em sorte. O tempo é traiçoeiro e a legenda, colocada posteriormente,
permitiu-me identificar mais professores do que aqueles 11 que, no primeiro
relance, tinha reconhecido.
O envio da fotografia da minha
turma do 1º ano, adornada com uma surpreendente legenda, que mão cuidada se deu
ao trabalho de fixar, permitiu-me mergulhar na memória de um convívio distante e
reconhecer muitos rostos que nunca mais vi.
Na verdade entrei para o 1º ano
do Liceu de Faro no ano lectivo de 1958/59. Um ano recheado de muitos, e
significativos, acontecimentos políticos dos quais destaco, por curiosidade, as
eleições presidenciais, às quais se candidatou Humberto Delgado (1958), e a
chamada “Revolta da Sé” (1959).
Hoje sou capaz de associar o meu
quotidiano juvenil, as ambiências familiares e escolares, com os acontecimentos
de um tempo político, do qual guardo viva recordação, e que marcam, com nitidez,
os antecedentes de um percurso pessoal que só a memória pode revelar de forma
tão coerente e fiel.
Vejo os meus professores de
liceu, entre os finais da década de 50 e inícios de 60, como uma mistura de
conservadorismo pardo e de progressismo ilustrado encontrando-se gente de ambos
os campos entre os "novos" e os "velhos" professores. A certa altura, no início
dos anos 60, no Liceu de Faro, esquecendo os pardos, juntaram-se, por exemplo,
no campo do progressismo ilustrado, os “velhos” Neves Júnior e Joaquim
Magalhães, com os “novos” Gastão Cruz e Luísa Neto Jorge.
Já entre os alunos, além das
marcas próprias da juventude de todas as épocas, é mais difícil vislumbrar, ou
adivinhar, o resultado, nas suas vidas, da mistura das influências de mestres e
funcionários, ilustrados ou pardos. O que é certo é que os jovens estudantes
retratados ostentam uma pose compenetrada e, não lhes sendo permitido o convívio
com as meninas, era-lhes imposta a “autoridade professoral” através de duas
mulheres/professoras.
A fotografia foi tirada no
Ginásio, onde todas eram tiradas, e no meio do grupo lá estão a Prof. ª Isabel
Madruga e a Prof. ª Maria José Santos, a primeira das quais, por boas razões,
nunca esquecerei. No Natal de 2007 ofereci uma cópia desta fotografia ao meu
amigo Bexiga (António) e era bem capaz de mandar fazer tantas cópias quantos os
personagens retratados, fazendo renascer em cada um de nós a memória de um tempo
feliz.
[Republicação.]
segunda-feira, outubro 29
“Homenagem ao Papagaio Verde e outros contos de Jorge de Sena”
(...)
“Um
dia, quando, arquejante da rua e das escadas, cheguei à varanda, o Papagaio
Verde estava inerte no canto da gaiola, com o bico pousado no chão. Peguei-lhe,
aspergi-o com água, sacudi-o, com a mão auscultei-o longamente. Não morrera
ainda. Levei-o para a sala, deitei-o nas almofadas, puxei a cadeira para junto
do piano, e, enquanto com os dedos da mão esquerda lhe apertava a pata, toquei
só com a direita a música de que ele gostava mais. As lágrimas embaciavam-me as
teclas, não me deixavam ver distintamente. Senti que os dedos dele apertavam os
meus. Ajoelhei-me junto da cadeira, debruçado sobre ele, e as unhas dele
cravaram-se-me no dedo. Mexeu a cabeça, abriu para mim um olho espantado,
resmoneou ciciadas algumas sílabas soltas. Depois, ficou imóvel, só com o peito
alteando-se numa respiração irregular e funda. Então abriu descaidamente as
asas e tentou voltar-se. Ajudei-o, e estendeu o bico para mim. Amparei-o
pousado no braço da cadeira, onde as patas não tinham força de agarrar-se. Quis
endireitar-se, não pôde, nem mesmo apoiado nas minhas mãos. Voltei a deitá-lo
nas almofadas, apertou-me com força o dedo na sua pata, e disse numa voz clara
e nítida, dos seus bons tempos de chamar os vendedores que passavam na rua: -
Filhos da puta! – Eu afaguei-o suavemente, chorando, e senti que a pata
esmorecia no meu dedo. Foi a primeira pessoa que eu vi morrer.”
Jorge de Sena
domingo, outubro 28
Em homenagem a minha mãe
Em homenagem a minha mãe pelo 11º aniversário de sua morte.
Era o tempo da natureza esplendorosa, a seiva assomando por
todos os poros da vida. A terra e o mar beijavam-se num longo beijo sem fim sob
o céu azul. A terra dava frutos que me pareciam divindades na perfeição da sua casca.
As melancias fascinavam-me pela sua grandeza esférica e pela névoa dos seus
açúcares. Era o vermelho do prazer contra o sangue, vermelho da dor.
[20/1/2008]
sexta-feira, outubro 26
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