segunda-feira, março 6

GOVERNO - UM ANO (II)

Posted by Picasa Ron Mueck

Por vezes parece que o governo ostenta demasiadas certezas. Outras vezes parece que enceta fugas para a frente. As certezas inabaláveis apresentam-se, por vezes, à mistura com convicções profundas.

Mas sabemos como, na política, as certezas, quase sempre, eliminam as convicções enquanto, por regra, as convicções eliminam as certezas. Sei que nenhum governo gosta de ostentar as suas dúvidas. Os governos preferem que se lhes reconheçam as virtudes e, tanto mais, as convicções.

Compreendo o mecanismo mas deveria ser possível a um ministro expor publicamente as suas dúvidas ou desalinhar do “autorizado” consenso. Falo de Freitas do Amaral mas podia falar também de Correia de Campos. Ou então ao governo deveria ser concedida a dádiva de dispor de uma espécie de “alto-comissário para a dúvida”.

Não se governa nem com as dúvidas próprias nem com as dores alheias. Eu sei. O país é pequeno e o governo, em funções, é maioritário e de um só partido. O que talvez exigisse um pouco mais de distanciamento político e de reflexão critica face às tendências intempestivas de uma liderança voluntariosa.

Um ano é pouco tempo para um governo. Mas pode ser uma eternidade para um cidadão injustiçado ou uma família desempregada.

No nosso modelo de sociedade, fundado na tradição do estado centralista, das prebendas e favores, a sorte não bafeja a iniciativa dos audazes nem o desempenho dos mais capazes.

A sorte está como que resguardada para uma plêiade de predestinados que a recebem por respeito e consideração a uma tradição que enraíza no obscurantismo autoritário do salazarismo e na lógica perversa do vazio a que José Gil chamou a “não inscrição”.

Estamos nas vésperas da entrada em funções de um novo Presidente da República com a legitimidade de uma eleição democrática e as fragilidades de um perfil pessoal autoritário.

Talvez seja aconselhável ao governo, socialista e maioritário, sem deixar de se afirmar pela iniciativa, em prol das mudanças reformistas, ser capaz de corrigir, sem parcimónia, os seus enganos e de assumir, com mais frequência, as suas dúvidas.

É a velha questão do diálogo que, sem honra nem glória, foi tornada a origem de todos os males pela anterior governação socialista em favor do prestígio da deriva autoritária que se tornou na panaceia universal que haverá de salvar a pátria da decadência. A ver vamos!

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