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quarta-feira, setembro 29

Pó dos livros - 8

O teatro ocupou um lugar importante na formação da minha sensibilidade e cultura cívica. Fui iniciado, no liceu de Faro, pelo Prof. Joaquim Magalhães tendo prosseguido uma intensa experiência teatral, no Grupo de Teatro do Círculo Cultural do Algarve, sob a orientação do médico Emílio Campos Coroa, oriundo da escola do TEUC de Coimbra, dirigido por Paulo Quintela.
A todos eles, grandes figuras da cultura portuguesa, esquecidos mas nem por isso menos grandes, fiquei a dever, pela via do teatro, uma perspectiva humanista dos homens e do mundo.

Não admira que o “pó dos livros” revele a presença dos livros de teatro.
Aqui vão dois e um apontamento de uma experiência particular.

- “Teatro de Novos”“Consultório” de Augusto Sobral e “O Pescador à Linha” de Jaime Salazar Sampaio – Arcádia, edição de 1961. Peças estreadas a 2 de Junho de 1961 no Teatro Nacional D. Maria II, com encenação de Artur Ramos. (Talvez o livro de teatro mais antigo que comprei por 15$00.) ;

- “Teatro Contemporâneo” – “problemas do jogo e do espírito” – Mário Vilaça, “um livro seleccionado por Vértice”, edição de autor – Coimbra, 1967.

Neste último, encadernado a “papel ferro”, com abundantes fotos, a preto e branco, se reúnem textos publicados em diversas revistas e publicações fazendo referências a autores, peças, escolas de teatro e técnicas. Reparo, em particular, num texto dedicado ao teatro moderno norte-americano em que se fala, entre outros, de Thornton Wilder.

Retenho que encenei e representei, num trabalho colectivo, no que chamávamos o “Teatro Sarrapilheira”, em Faro, a peça, em um acto, “A Longa Ceia de Natal”, desse grande autor norte-americano. A empresa foi levada a cabo com o beneplácito de Campos Coroa e sem autorização prévia do Governo Civil, cujo pedido tornaria a tarefa impossível. Uma representação única, clandestina, com a sala cheia.
Foi uma das experiências mais importantes da minha vida e ainda hoje, passados decénios, convivo mentalmente com os bastidores da acção, revejo os meus gesto em cena, assim como as faces e os corpos dos meus companheiros de aventura. Dessa experiência guardo, aliás, uma foto que sempre coloco em lugar de destaque.

terça-feira, setembro 28

Pó dos livros - 7

Os livros que me caem nas mãos não cessam de me surpreender e, por vezes, inquietar. Ou porque deles já não me lembrava, ou porque no seu corpo descubro detalhes inusitados, sublinhados surpreendentes, notas manuscritas, cartões com apontamentos, enfim, um mundo de descobertas.

- “Escrito Póstumos” Pier Paolo Pasolini – Morais Editores – edição de 1979; extensamente sublinhado a lápis observo um artigo intitulado: “O coito, o aborto, a falsa tolerância do Poder e o conformismo dos progressistas” (19 de Janeiro de 1975, publicado no “Corriere della Sera”, com o título: “Eu sou contra o aborto”). Muito interessante.

- “O Príncipe”Nicolau Maquiavel (comentado por Napoleão Bonaparte) – Livros de Bolso da “Europa América” – edição de 1972.
Reproduzo um sublinhado da minha leitura: “ Os homens são tão simples e tão obedientes às necessidades do momento, que quem engana encontra sempre quem se deixe enganar”.
E mais à frente: “Convém também notar que um príncipe, sobretudo quando é novo, não pode respeitar singelamente todas as condições segundo as quais se é considerado homem de bem, pois não raro, para conservar os seus Estados, se vê constrangido a agir contra a sua palavra, contra a caridade, a humanidade e a religião. É por isso que deve ter o entendimento treinado para virar conforme os ventos da fortuna e a mutabilidade das coisas lhe ordenem, e, como já disse, não se afastar do bem, se puder, mas enveredar pelo mal, se for necessário.”

segunda-feira, setembro 27

Pó dos livros - 6


As tarefas de arrumação das estantes estão praticamente concluídas. Restam ainda alguns papéis e documentos. Mas nesta faceta a organização da minha pequena biblioteca está facilitada pois nunca segui o hábito de trazer para casa cópias dos dossiers dos meus vários exercícios profissionais.

Aqui identifico mais alguns livros marcantes que me surgiram a uma nova luz neste trabalho de arrumação:

“O Físico prodigioso” -novela – Jorge de Sena – Edições 70, 1979. (Uma das mais extraordinárias leituras da minha vida);

“O Fenómeno da Guerra”Gaston Bouthoul – Ideias e Formas – Estúdios Cor, Edição de 1966; (repleto de sublinhados e anotações pois me lembro de ter sido uma leitura apaixonante da minha juventude – carece de restauro);

“Lenine, seguido de um texto de André Breton”Trotsky – Edições “& etc”; (com uma nota manuscrita assinalando que deve ter sido comprado, em Faro, no verão de 1978);

“O Judeu – Narrativa dramática em três actos”Bernardo Santareno – Edições Ática, edição de 1966; (livro que sempre me acompanhou desde a época das minhas práticas teatrais contemporâneas desta primeira edição).

Para os menos relacionados com o conhecimento do teatro português e com o teor desta obra, que versa o sacrifício às mãos da inquisição de António José da Silva – o Judeu, aqui reproduzo um excerto do final do 3º Acto:

“Olhai que o Santo Tribunal da Inquisição mais não é que o corpo visível, a aparência mortal dum espírito de trevas, e que este espírito … vivo por certo persistirá, neste Nação, muito tempo ainda após a morte do Santo Ofício!”

E, ainda, o último parágrafo da narrativa: “À medida que a obscuridade vai tomando o palco, ilumina-se o vitral de fundo: este deixar-nos-á ver as chamas duma fogueira, cada vez mais altas, até que por inteiro o enchem. Atingem o máximo, o canto inquisitorial e o ódio sanguinário do povo.”

Dedico esta evocação ao meu amigo Eduardo Ferro Rodrigues que, por estes dias, cessou as funções de Secretário-geral do Partido Socialista.

sexta-feira, setembro 24

Pó dos livros - 5

Não foi uma descoberta nem um reencontro. É o livro dos livros. Era a biblioteca da casa dos meus avós (maternos). Camponeses de um Algarve seco e pobre das primeiras décadas do Sec. XX. Tempos atrás mandei-o encadernar. Ficou como novo.

É uma edição de 1867 impressa em Lisboa pela Typographia Universal de Thomaz Quintino Antunes, Rua dos Calafates, 110.

É a Bíblia Sagrada: “O Novo e o Velho Testamento traduzida em portuguez segundo a vulgata latina por António Pereira de Figueiredo”.

Noutros tempos foi um livro grosso para o meu olhar juvenil. Mais de mil páginas, a duas colunas, letras miúdas e bem arrumados em capítulos e começa assim:

GENESIS - Em Hebraico Beresith
Capítulo I

“1. No princípio creou Deus o Ceo e a Terra. 2. A terra porém era vã e vazia: e as trevas cobriam a face do abysmo: e o espirito de Deus era levado sobre as águas. 3. E disse Deus: faça-se a luz; e foi feita a luz. ...”

Este livro é o sinal de uma cultura e civilização a cuja matriz fundadora não pude escapar.

segunda-feira, setembro 20

O pó dos livros - 4

Não foi propriamente uma descoberta surpreendente. A novidade foi ter confirmado que o livro estava lá. É um dos livros que mais prazer me deu ler. Foi há muitos anos. Mas, a certa altura, perdi-o. Alguém deve ter achado muito interessante a mesma leitura. E esqueceu-se de mo devolver.

Fiquei com uma pena de morte. Reconheço que não é propriamente um clássico que prestigie intelectualmente o leitor. Mas foi uma leitura de época. Daquelas que nos marcam, vá lá saber-se porquê!

Um dia, passados para aí uns 20 anos, ao descer a rua da Trindade, vindo da Cotovia, onde tinha ido comprar "Bagagem", de Adélia Prado, para oferecer a um amigo, resolvi entrar no "Rei dos Livros". Dirigi-me ao balcão e disparei: "Não terá, por acaso, por aí um livro, assim e assim, uma edição antiga, julgo que de uma editora brasileira, ando atrás dele vai para 20 anos...".

O homem olhou para mim com um ar de estranha compaixão que me deu esperanças! Emitiu um monossílabo do género "Um momento...".

Dirigiu-se à sala dos fundos. Pouco depois surgiu com um volume nas mãos. Eu não queria acreditar. Era mesmo o livro que eu, em vão, tinha procurado durante tantos anos: "A minha vida com Picasso", de Françoise Gilot e Carlton Lake.

Vieram-me as lágrimas aos olhos. Agradeci, não sei com que palavras. Paguei 15 euros, uma ninharia. Saí. Senti o ar mais leve e perfumado. Agora só tenho que o mandar encadernar e nunca mais o emprestar a ninguém.

(Françoise Gilot foi companheira de Picasso entre 1943 e 1953. A edição original é da "Europa América" (portuguesa) a partir de uma edição americana da McGraw-Hill Book Company. A tradução do inglês é de Cármen Gonzalez e de António Ramos Rosa. Mas a edição que encontrei é uma reprodução integral da edição portuguesa realizada pela "Editôra Somabaia" e foi impresso no Brasil.)

quarta-feira, setembro 15

O Pó dos Livros - 3

Um dos livros reencontrados mais sublinhados (a lápis) o que denota uma leitura extensiva e atenta.

"O Pós-Socialismo", de Alain Touraine, Edições Afrontamento (1981). Uma nota indica que foi comprado na Feira do Livro de Lisboa em 7 de Junho de 1983 por 200$00.

Reproduzo, pela sua actualidade, pelo menos aparente, um excerto sublinhado da página final:

"Alguns acreditam ainda que a crise da esquerda pode ser superada por um apelo aos partidos, lançado por uma opinião pública que se resuma a uma massa inorganizada de eleitores desiludidos. É contentar-se com pouco e ter medo de reflectir. Já não é preciso apelar aos partidos mas às forças que trabalham uma sociedade nova. Os partidos políticos devem ser apenas representantes do povo. Quem é o povo hoje, e qual é o nome dos seus inimigos? A esquerda parece ter medo de sair da antecâmara do poder; melhor faria em olhar para baixo e para cima, e reencontrar a inspiração de todos os movimentos sociais: lutar com os que são oprimidos, libertar os que estão presos, dar esperança aos que suportam a submissão. (…) É preciso portanto definir claramente a nossa situação para encontrar a coragem de pensar livremente e de agir consoante as nossas convicções mais profundas. Que importam as resistências das ideias gastas e dos aparelhos egoístas! Os que recusam a decadência devem trabalhar para reconhecer e tornar habitável um futuro que criámos, mas que só agora começamos a descobrir."

Aqui pode ler uma curta entrevista concedida ao "Público" em 2001

Aqui uma entrevista em Lisboa e uma breve biografia de Touraine

terça-feira, setembro 14

O pó dos livros - 2

Mais alguns livros que me têm passado pelas mãos ao arrumar as estantes. Escolhas sem critérios pré-definidos.

"A formação dos Intelectuais", de António Gramsci - Colecção 70, edição de 1972 (profusamente sublinhado e anotado);

"Obra Completa de Cesário Verde " - Colecção Poetas de Hoje, Portugália - organizada, prefaciada e anotada por Joel Serrão; 2ª edição de 1969;

"Memórias e Trabalhos da Minha Vida", de Norton de Matos - 2 volumes, Editora Marítimo Colonial, Lda. (edição de 1944) - muito bem conservados mas a necessitarem de encadernação. Em ambos os volumes existem abundantes sublinhados a lápis, à margem; no segundo uma marca a água indica que o livro foi originariamente comprado na Livraria Inglesa, em Portimão. Foram publicados 4 volumes. Vou agora em busca dos restantes dois.

Encontrei ainda outros dois volumes de Norton de Matos :

"Os dois primeiros meses da minha candidatura à Presidência da República" e " Mais quatro meses da minha candidatura à Presidência da República", edições do autor, referentes a intervenções e acontecimentos ocorridos de 9/7/48 a 9/1/49, editados em 1949. Ambas as edições ostentavam na contracapa o "preço mínimo", 10$00 e 12$50, respectivamente, e uma interessante inscrição: "O produto da venda deste livro é destinado aos fundos da candidatura".

Os livros de Norton de Matos surgem, para mim próprio, de forma surpreendente. A sua aquisição em alfarrabistas (não me lembro bem) deve-se, certamente, ao meu interesse (antigo) pelos acontecimentos do imediato pós-2ª guerra mundial em Portugal. A azul um link com uma biografia, muito interessante, do Norton de Matos maçon.


segunda-feira, setembro 13

Os livros arrumados

Os livros estão quase todos arrumados nas prateleiras. Os reencontros e as redescobertas foram gratificantes. Darei conhecimento de mais algumas. Segue-se o arrumo de outros papéis e documentos antigos. Nada que constitua uma tarefa hercúlea. Mas as férias acabaram. O tempo, a partir de agora, tem de ser repartido de outra maneira. Olhar a pequena biblioteca, depois de limpo o "pó dos livros", é estimulante para encetar outras tarefas e encarar novos desafios.

quinta-feira, setembro 9

"Alocução aos Socialistas" (2)

Limpar o pó dos livros tem esta faceta extraordinária de nos fazer redescobrir livros, opúsculos, panfletos, e outros documentos, que estiveram dezenas de anos fora do nosso olhar.

A minha mulher é que é responsável por esta empreitada ao tomar a iniciativa de mandar pintar a casa toda. Foi assim que surgiu, entre outros, este opúsculo, muito bem conservado, contendo a "Alocução aos Socialistas", de António Sérgio. Editado pela "Editorial Inquérito" contém a seguinte anotação, a lápis, no cimo da primeira página: "60475=11/7/47=709 6$00".

Por coincidência está a decorrer a campanha para o Congresso do PS. Tenho ouvido, com atenção, Manuel Alegre. Sem menosprezo pelos outros candidatos ouço com prazer Manuel Alegre. Ele próprio explicou o porquê da importância da palavra.

Estou convicto que a diferença entre os candidatos não está tanto nos programas, mas nos protagonistas. Sem menosprezo pelos programas. Mas, convenhamos, que, na política, é muito mais fácil elaborar e apresentar um "bom programa" do que fazer emergir e afirmar, face à nação, um bom candidato, ou seja, um verdadeiro protagonista.

Manuel Alegre é um protagonista autêntico tanto quanto se pode ser autêntico na política. É um homem da palavra. Com espessura humana e intelectual. Veja aqui uma biografia sua.

E o blog da sua candidatura

Ainda a propósito da sua entrevista de ontem, à SIC- Notícias, aqui deixo uma nova transcrição da "Alocução aos Socialistas", proferida por António Sérgio, no 1º de Maio de 1947.

Nela surge a abrir, curiosamente, a frase que, em 1974, encimava a declaração de princípios do extinto MES (Movimento de Esquerda Socialista) cuja adopção deve ter resultado, certamente, da iniciativa de César de Oliveira.

""A emancipação dos trabalhadores" (escreveu ainda Antero naquele mesmo artigo - O Socialismo e a Moral) "deve ser obra do próprio esforço dos trabalhadores; por conseguinte, antes de tudo, e como primeira condição, da sua energia moral, da sua perseverança, da sua firme dignidade; numa palavra: não somente da agitação colectiva (muitas vezes superficial e inconsistente) mas da sólida virtude dos indivíduos".

Tal pensava o poeta: da sólida virtude dos indivíduos. E se assim sucedia naquele tempo dele, meus amigos; se era assim há sessenta anos, - com maioria de razão o devemos pensar neste nosso, quando a ideia socialista já tanto avançou no seu rumo, já tanto se impôs como ideia. Sim, já tanto se impôs como ideia: e, por isso, o importante, na nova fase em que estamos, é que se imponham os indivíduos em que tal ideia encarna, - pela sua firme dignidade, pela sua energia moral."

"Alocução aos Socialistas"

Para o Manuel Alegre que acabei de ouvir na "SIC - Notícias"

"Na política, como sabeis, o comportamento rectilíneo, sem argúcia alguma, - sincero, aberto, desartificioso, claro, - usa ser censurado, como sendo ingénuo: e, nessa sua qualidade de comportamento ingénuo, como prejudicial, ou pateta. Paciência. Seja. (…) Os essencialmente habilidosos (não faço empenho em negá-lo) alcançam a sua hora de simulacro e de vista. Mas é uma hora e nada mais; mas é simulacro, e só vista. Logo a seguir a esse instante, comunica-se-lhes o fogo da sua iluminação de artifício, e fica tudo em fumaça, que pouco depois não é nada."

"Aos nossos socialistas, quanto a mim, compete-lhes resistirem ao tradicional costume de se empregarem espertezas e competições de pessoas para apressar o momento em que há-de chegar ao poder…"

"Antes de tudo, buscai prestigiar-vos ante a nação inteira pelo timbre moral da vossa alma cívica; porque (como acreditais, creio eu) não é indispensável conquistar o poder para se influir de facto na orientação do estado."

"Não tenhais a ânsia de vos alcandorar no poleiro com prejuízo das qualidades a que se tem chamado "ingénuas". As habilidades dissipam-se; os caracteres mantêm-se."

"Não existam ciúmes e invejas recíprocas entre os vários componentes da vossa grei socialista: nem tampouco os ciúmes, nem tampouco as invejas, para com os homens que compõem as outras facções da esquerda. Seja vosso lema a unidade. Por mim, quero trabalhar pela unidade, pelo entendimento recíproco, pela existência de convivência amável entre os homens políticos de orientações discordes. Incorrigivelmente "ingénuo", fraterno, cordial."

António Sérgio, In "Alocução aos Socialistas", No Banquete do Primeiro de Maio de 1947".

Acerca de António Sérgio veja aqui e aqui.




O pó dos livros

Ao arrumar estantes surgem muitas surpresas. Livros que nos marcaram. Por diversas razões, em variadas épocas. De todos os géneros. O pó dos livros faz parte dos cheiros que nos marcam para sempre.

Alguns reencontros ao acaso:

"1968 - A Revolução Que tanto Amámos", Daniel Cohn-Bendit (D. Quixote -1988);

"Angústia Para o Jantar", Luís de Sttau Monteiro (Ática, 6ª Edição, 1970);
(No seu interior encontro uma prata, impecavelmente conservada, com um pai natal, em tons de vermelho vivo, daquelas que embrulham as sombrinhas de chocolate.);

"Memórias" - "Vale de Josafat", Volume III, Raul Brandão (Perspectivas e Realidades, sem data de edição);
(Ostenta uma nota que informa ter sido comprado na Feira do Livro de Lisboa, em 6 de Junho de 1984, 3 volumes - 500$00);

"Hiroxima - Antologia de Poemas", vários, (Nova Realidade, 1967);

"Cartas de Fuzilados"Edições "aov" - Colecção "Vitória", 2ª edição, sem data;
(O mais antigo destes livros, a carecer de restauro, certamente do período imediato à 2ª Guerra Mundial. Cartas de resistentes franceses antes de serem fuzilados. É um documento impressionante.);

"Comunidade" - Luiz Pacheco, Desenhos de Teresa Dias Coelho (Contexto-1980);
(6ª edição de "Comunidade" com os belos desenhos de T.D.C.);

"Dores" - Maria Velho da Costa e Teresa Dias Coelho; (D. Quixote, 1994).

segunda-feira, setembro 6

Ao arrumar as estantes

Ao arrumar as estantes os papéis sobejam. E saltitam os livros. Por todo o lado surgem surpresas. As decisões são difíceis. É pragmático lançar para o lixo todos os papéis que ostentem uma aparência inútil. E arrumar fora do alcance directo da mão os livros que se não esperam ler. Mesmo os nunca lidos.

Suspendem-se as decisões vezes sem conta. É uma tarefa de governo autêntica. Mesmo quando a biblioteca é pequena. Mas como definir a dimensão de uma biblioteca? Na casa dos meus avós (maternos), para além do "borda de água", havia um só livro. Tenho-o agora comigo. Era a Bíblia Sagrada. Uma edição antiga. Era uma grande biblioteca, a dos meus avós.

Hoje, ao arrumar as estantes, caiu de dentro da primeira edição de "O Canto e as Armas", de Manuel Alegre, (1967, Colecção Nova Realidade, Impresso na Tipografia do Carvalhido - Porto), um poema. Numa folha A5, muito bem dobrada e conservada, dactilografado à máquina, eis o poema, de qualidade discutível, mas cuja mensagem é o espelho de uma época de resistência à ditadura:

ENTENDER

Entender
mas sem falar,
é fundamental.
E em silêncio
há braços e mãos
que ajudam corpos
movem montanhas,
esperam p´los dias…

Sempre entendendo
sem falar,
tal e qual.

Assinado à mão: Carlos.


Por mais que puxe pela cabeça não sou capaz de identificar o autor. Por vezes a memória fixa os acontecimentos mas omite os protagonistas. A memória, salvo os Santos (e em Portugal não os há) e as multidões anónimas (e em Portugal só as há, por vezes, no futebol), é injusta para os homens que fazem a história.
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