Sempre a pensar que bateu no fundo a política nacional não deixa de nos surpreender. Neste caso pela positiva.
Assinalo o artigo hoje publicado no Público por Correia de Campos. Ele, no fundo, aconselha prudência na inversão das políticas e das medidas tomadas pelos governos de direita no caso de uma vitória socialista nas próximas eleições.
O PS, no caso de formar governo, não pode cair na tentação de tudo por em causa e tudo revirar. Nem políticas nem pessoas.
Seria dramático, para o país e para o PS, assistir a uma versão socialista do discurso da “pesada herança”, ou da “tanga”, ou ao espectáculo degradante de perseguição a dirigentes honestos e competentes.
Que o PS cuide de acautelar que não se pratiquem injustiças. Mesmo que delas tenhamos sido vítimas.
Sem perder, certamente, de vista as mudanças e rupturas inevitáveis. Mas para que tudo aconteça é, antes, necessário que o PS apresente o seu programa e que ele seja mobilizador, apresente os seus candidatos e que eles sejam credíveis e que, finalmente, ganhe as eleições de 20 de Fevereiro.
Não é pouca coisa.
Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
sexta-feira, dezembro 17
Amargo estilo novo
Tudo é fácil quando se está brincando com a flor entre os dedos,
quando se olham nos olhos as crianças,
quando se visita no leito o amor convalescente.
É bom ser flor, criança, ou ser doente.
Tudo são terras donde brotam esperanças,
étalas, tranças,
a porta do hospital aberta à nossa frente.
Desde que nasci que todos me enganam,
em casa, na rua, na escola, no emprego, na igreja, no quartel
com fogos de artifício e fatias de pão besuntadas com mel.
E o mais grave é que não me enganam com erros nem com falsidades
mas com profundas, autênticas verdades.
E é tudo tão simples quando se rola a flor entre entre os dedos!
Os estadistas não sabem,
mas nós, os das flores, para quem os caminhos do sonho não guardam segredos,
sabemos isso e todas as coisas mais que nos livros não cabem.
António Gedeão
Linhas de Força - 1967
Obra Poética
Edições João Sá da Costa
2001
quando se olham nos olhos as crianças,
quando se visita no leito o amor convalescente.
É bom ser flor, criança, ou ser doente.
Tudo são terras donde brotam esperanças,
étalas, tranças,
a porta do hospital aberta à nossa frente.
Desde que nasci que todos me enganam,
em casa, na rua, na escola, no emprego, na igreja, no quartel
com fogos de artifício e fatias de pão besuntadas com mel.
E o mais grave é que não me enganam com erros nem com falsidades
mas com profundas, autênticas verdades.
E é tudo tão simples quando se rola a flor entre entre os dedos!
Os estadistas não sabem,
mas nós, os das flores, para quem os caminhos do sonho não guardam segredos,
sabemos isso e todas as coisas mais que nos livros não cabem.
António Gedeão
Linhas de Força - 1967
Obra Poética
Edições João Sá da Costa
2001
Ir ao Vaticano para Compreender
Uma das experiências mais interessantes da minha vida pública, nos últimos anos, foi a participações na “Pastoral da Saúde”, conclave, de nível mundial, realizado no Vaticano.
O Padre Feytor Pinto dirigia a representação portuguesa e eu resolvi aceitar os convites movido pela curiosidade de observar e participar na reflexão acerca de um tema que, aparentemente fechado, se estende a todas as questões de natureza social.
O convite deve ter resultado da colaboração encetada entre o INATEL e o patriarcado aquando da EXPO-98. Confirmei e reforcei as minhas expectativas iniciais: a igreja dispõe de um conhecimento profundo e alargado acerca das condições de vida das populações mais desfavorecidas do planeta.
Salvaguardando os aspectos formais e a liturgia que decorrem da entidade organizadora – a Santa Sé – que, para mim, católico não praticante, não foram sequer maçadoras, tive oportunidade de ouvir testemunhos impressionantes da situação social, em particular, dos povos africanos e da América Latina.
E para meu espanto as palavras mais duras, que fariam corar o mais radical dos dirigentes dos partidos da esquerda europeia, vinham da boca de altos dignitários, cardeais e bispos, que se não coibiam de atacar a ganância das multinacionais e a injustiça das políticas da maior parte dos governos.
A minha visão da Igreja católica mudou, a partir destas experiências de participação, tendo aprendido que nela coabitam, de facto, uma pluralidade de sensibilidades na abordagem das questões da pobreza, da doença e do papel da igreja e da comunidade na defesa dos direitos humanos.
Não sei se alguma outra instituição tem tantos recursos humanos, homens e mulheres, envolvidos na ajuda humanitária e na defesa da dignidade dos mais desfavorecidos, nos quatro cantos do mundo, desde a mais remota comunidade dos confins da selva amazónica aos arrabaldes das grandes metrópoles urbanas.
Fiquei, sinceramente, a pensar, tal como tinha acontecido na minha adolescência, acerca da utilidade da nossa vida quotidiana, em regra, afastada da defesa das verdadeiras causas humanitárias.
E ainda mais quando verifiquei, por experiência própria, que, muitas vezes, a ostentação da fé não corresponde, em nada, à prática que decorre dos ensinamentos essenciais da doutrina da igreja.
Fui ao Vaticano, participei, por duas vezes nos trabalhos desta Pastoral, incluindo uma comovente cerimónia colectiva de recepção da comitiva pelo Papa, e voltei compreendendo melhor a prática da Igreja. Percebi que os valores da solidariedade, liberdade e igualdade, que vi bailarem nos olhos de muitos dos religiosos participantes daqueles conclaves, não são património exclusivo dos movimentos laicos.
O Padre Feytor Pinto dirigia a representação portuguesa e eu resolvi aceitar os convites movido pela curiosidade de observar e participar na reflexão acerca de um tema que, aparentemente fechado, se estende a todas as questões de natureza social.
O convite deve ter resultado da colaboração encetada entre o INATEL e o patriarcado aquando da EXPO-98. Confirmei e reforcei as minhas expectativas iniciais: a igreja dispõe de um conhecimento profundo e alargado acerca das condições de vida das populações mais desfavorecidas do planeta.
Salvaguardando os aspectos formais e a liturgia que decorrem da entidade organizadora – a Santa Sé – que, para mim, católico não praticante, não foram sequer maçadoras, tive oportunidade de ouvir testemunhos impressionantes da situação social, em particular, dos povos africanos e da América Latina.
E para meu espanto as palavras mais duras, que fariam corar o mais radical dos dirigentes dos partidos da esquerda europeia, vinham da boca de altos dignitários, cardeais e bispos, que se não coibiam de atacar a ganância das multinacionais e a injustiça das políticas da maior parte dos governos.
A minha visão da Igreja católica mudou, a partir destas experiências de participação, tendo aprendido que nela coabitam, de facto, uma pluralidade de sensibilidades na abordagem das questões da pobreza, da doença e do papel da igreja e da comunidade na defesa dos direitos humanos.
Não sei se alguma outra instituição tem tantos recursos humanos, homens e mulheres, envolvidos na ajuda humanitária e na defesa da dignidade dos mais desfavorecidos, nos quatro cantos do mundo, desde a mais remota comunidade dos confins da selva amazónica aos arrabaldes das grandes metrópoles urbanas.
Fiquei, sinceramente, a pensar, tal como tinha acontecido na minha adolescência, acerca da utilidade da nossa vida quotidiana, em regra, afastada da defesa das verdadeiras causas humanitárias.
E ainda mais quando verifiquei, por experiência própria, que, muitas vezes, a ostentação da fé não corresponde, em nada, à prática que decorre dos ensinamentos essenciais da doutrina da igreja.
Fui ao Vaticano, participei, por duas vezes nos trabalhos desta Pastoral, incluindo uma comovente cerimónia colectiva de recepção da comitiva pelo Papa, e voltei compreendendo melhor a prática da Igreja. Percebi que os valores da solidariedade, liberdade e igualdade, que vi bailarem nos olhos de muitos dos religiosos participantes daqueles conclaves, não são património exclusivo dos movimentos laicos.
Absorto - 1º Aniversário (16 de 17)
quinta-feira, dezembro 16
Profundamente
Quando ontem adormeci
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?
— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci.
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Manuel Bandeira
Na noite de São João
Havia alegria e rumor
Vozes cantigas e risos
Ao pé das fogueiras acesas.
No meio da noite despertei
Não ouvi mais vozes nem risos
Apenas balões
Passavam errantes
Silenciosamente
Apenas de vez em quando
O ruído de um bonde
Cortava o silêncio
Como um túnel.
Onde estavam os que há pouco
Dançavam
Cantavam
E riam
Ao pé das fogueiras acesas?
— Estavam todos dormindo
Estavam todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Quando eu tinha seis anos
Não pude ver o fim da festa de São João
Porque adormeci.
Hoje não ouço mais as vozes daquele tempo
Minha avó
Meu avô
Totônio Rodrigues
Tomásia
Rosa
Onde estão todos eles?
— Estão todos dormindo
Estão todos deitados
Dormindo
Profundamente.
Manuel Bandeira
Toda a Raia
Um dia por necessidade de conhecer os problemas do chamado “Portugal Profundo”, no âmbito de uma instituição que servia, o INATEL, e, por espírito de descoberta de uma realidade ignorada, resolvi visitar todos os concelhos raianos de Portugal.
Assim pus-me a caminho. Em duas etapas percorri, acompanhado por um responsável técnico e pelo motorista, toda a faixa do território português que confina com Espanha. Desde Vila Real de Santo António a Caminha.
Ficaram-me na memória as imagens de uma paisagem natural praticamente intocada, gente escassa e boa, lugares perdidos no tempo, vontades de mudança e de acomodação, uma região partilhada por dois países cuja fronteira física se desvaneceu mas em que o tempo acentuou as diferenças do desenvolvimento.
Mais Espanha na componente de progresso, mais Portugal na componente de atraso. Na época, finais dos anos 90, as redes de telecomunicações operacionais eram espanholas, as melhores estradas eram espanholas, os melhores serviços eram espanhóis, os melhores produtos, idem aspas...
O território raiano, do lado de cá da fronteira, é português por razões da língua, da história, da tradição e da administração, mas é espanhol por razão da economia, dos serviços, do consumo, da diversão e da cultura. Uma cidadania partilhada a pender para o lado da lá.
Do lado de cá as gentes, em idade activa, ao longo dos últimos decénios, “emigraram” do interior para o litoral, em busca de trabalho, e os que ficaram envelheceram inexoravelmente deixando uma longa faixa do território nacional ao abandono. Nada que tivesse sido uma surpresa e contra a qual não se pudesse ter travado um combate que, afinal, apesar das promessas, nunca foi consequente nem eficaz.
Visitamos todos os municípios raianos nos quais fomos acolhidos, em regra, com amizade e esperança. Aqui deixo o relato de dois episódios comezinhos que me impressionaram.
Num dos concelhos mais pequenos, em pleno Alentejo profundo, a presidente de Câmara, comunista, pediu-nos para interromper a reunião, na hora do almoço, pois tinha que ir a casa dar de comer à mãe. Assim se fez e a reunião prosseguiu após cumprida a missão familiar da aguerrida e humana presidente.
Num outro concelho, o de Campo Maior, após a partida para norte, fui surpreendido por um telefonema de casa a informar-me de um telefonema da GNR local. Tinham com eles a minha carteira cujo extravio eu próprio não me tinha ainda dado conta. Foi recolhida num banco do jardim principal da vila por um popular que, gentilmente, a entregou na GNR local.
Soube-me bem confirmar, ao vivo, que o povo da raia e, em especial, o povo do Alentejo mantém intacta a sua profunda capacidade de ser solidário. O que designamos no jargão sócio-económico por atraso tem esta inusitada componente humana o que nos deve fazer duvidar da natureza exacta e definitiva das estatísticas. Assim haja gente.
Assim pus-me a caminho. Em duas etapas percorri, acompanhado por um responsável técnico e pelo motorista, toda a faixa do território português que confina com Espanha. Desde Vila Real de Santo António a Caminha.
Ficaram-me na memória as imagens de uma paisagem natural praticamente intocada, gente escassa e boa, lugares perdidos no tempo, vontades de mudança e de acomodação, uma região partilhada por dois países cuja fronteira física se desvaneceu mas em que o tempo acentuou as diferenças do desenvolvimento.
Mais Espanha na componente de progresso, mais Portugal na componente de atraso. Na época, finais dos anos 90, as redes de telecomunicações operacionais eram espanholas, as melhores estradas eram espanholas, os melhores serviços eram espanhóis, os melhores produtos, idem aspas...
O território raiano, do lado de cá da fronteira, é português por razões da língua, da história, da tradição e da administração, mas é espanhol por razão da economia, dos serviços, do consumo, da diversão e da cultura. Uma cidadania partilhada a pender para o lado da lá.
Do lado de cá as gentes, em idade activa, ao longo dos últimos decénios, “emigraram” do interior para o litoral, em busca de trabalho, e os que ficaram envelheceram inexoravelmente deixando uma longa faixa do território nacional ao abandono. Nada que tivesse sido uma surpresa e contra a qual não se pudesse ter travado um combate que, afinal, apesar das promessas, nunca foi consequente nem eficaz.
Visitamos todos os municípios raianos nos quais fomos acolhidos, em regra, com amizade e esperança. Aqui deixo o relato de dois episódios comezinhos que me impressionaram.
Num dos concelhos mais pequenos, em pleno Alentejo profundo, a presidente de Câmara, comunista, pediu-nos para interromper a reunião, na hora do almoço, pois tinha que ir a casa dar de comer à mãe. Assim se fez e a reunião prosseguiu após cumprida a missão familiar da aguerrida e humana presidente.
Num outro concelho, o de Campo Maior, após a partida para norte, fui surpreendido por um telefonema de casa a informar-me de um telefonema da GNR local. Tinham com eles a minha carteira cujo extravio eu próprio não me tinha ainda dado conta. Foi recolhida num banco do jardim principal da vila por um popular que, gentilmente, a entregou na GNR local.
Soube-me bem confirmar, ao vivo, que o povo da raia e, em especial, o povo do Alentejo mantém intacta a sua profunda capacidade de ser solidário. O que designamos no jargão sócio-económico por atraso tem esta inusitada componente humana o que nos deve fazer duvidar da natureza exacta e definitiva das estatísticas. Assim haja gente.
Absorto - 1º Aniversário (15 de 17)
quarta-feira, dezembro 15
Património Imobiliário de Institutos Públicos
Era previsível. As decisões acerca do património imobiliário do Estado, em particular, envolvendo instituições prestigiadas, pela tradição e funções que desempenham, desencadeia a indignação ou, ao menos, a incomodidade da maioria dos cidadãos. Para já não falar dos respectivos dirigentes e funcionários.
O Estado não benefícia senão na justa medida em que, no curto prazo, arrecada receitas que podem ser levadas em consideração para efeitos de redução do déficit.
É evidente que nada haveria a opor se o patrimonio imobiliário em questão estivesse devoluto, fora de serviço, ou em situação que dele pudessem prescindir os serviços dos organismos públicos nele sediados.
Não é o caso da maioria dos edifícios da lista divulgada. Seja qual for a solução, atento o teor da Resolução, o Estado, a prazo, suportará encargos superiores aqueles que resultam dos benefícios desta operação. Isso parece claro e tem sido assinalado, com insistência, por todos os comentadores abalizados que se pronunciaram durante o dia de hoje.
É este o sumário da autorização referida e que foi consagrada em forma de Resolução:
“Autoriza a alienação ou a constituição de outros direitos reais ou obrigacionais sobre os bens imóveis pertencentes ao património próprio de determinados institutos públicos, bem como o posterior arrendamento desses bens imóveis pelos referidos institutos públicos e a despesa inerente”.
A mesma pode ser consultada, na íntegra, no blog especializado em questões de natureza jurídica e que aconselho Cum grano salis
O Estado não benefícia senão na justa medida em que, no curto prazo, arrecada receitas que podem ser levadas em consideração para efeitos de redução do déficit.
É evidente que nada haveria a opor se o patrimonio imobiliário em questão estivesse devoluto, fora de serviço, ou em situação que dele pudessem prescindir os serviços dos organismos públicos nele sediados.
Não é o caso da maioria dos edifícios da lista divulgada. Seja qual for a solução, atento o teor da Resolução, o Estado, a prazo, suportará encargos superiores aqueles que resultam dos benefícios desta operação. Isso parece claro e tem sido assinalado, com insistência, por todos os comentadores abalizados que se pronunciaram durante o dia de hoje.
É este o sumário da autorização referida e que foi consagrada em forma de Resolução:
“Autoriza a alienação ou a constituição de outros direitos reais ou obrigacionais sobre os bens imóveis pertencentes ao património próprio de determinados institutos públicos, bem como o posterior arrendamento desses bens imóveis pelos referidos institutos públicos e a despesa inerente”.
A mesma pode ser consultada, na íntegra, no blog especializado em questões de natureza jurídica e que aconselho Cum grano salis
O Lanche de Natal
Ontem foi o dia do lanche de Natal em casa da Teresa. Reuniu uma parte da equipa que, em 1989, levantou o projecto das escolas profissionais.
Passaram 15 anos e a equipa, embora dispersa, resiste. A parte de Lisboa que a do Porto é mais difícil de juntar. Mas todos se lembram de todos. Passados estes anos é sempre assim. Umas faltas em rotação mas a fé da Teresa remove montanhas.
Desta vez a crise política dominou os temas de conversa. Todos esperam uma nova esperança para a educação em Portugal. Soube que há ministros que continuam a encomendar diplomas para aprovar à pressa. Os técnicos aconselham cuidado mas o desespero é mau conselheiro.
Passaram 15 anos e a equipa, embora dispersa, resiste. A parte de Lisboa que a do Porto é mais difícil de juntar. Mas todos se lembram de todos. Passados estes anos é sempre assim. Umas faltas em rotação mas a fé da Teresa remove montanhas.
Desta vez a crise política dominou os temas de conversa. Todos esperam uma nova esperança para a educação em Portugal. Soube que há ministros que continuam a encomendar diplomas para aprovar à pressa. Os técnicos aconselham cuidado mas o desespero é mau conselheiro.
Ir a Canal Caveira na Passagem do Século
Há muitos anos atrás fiz uma combinação com a F. Um daqueles compromissos do género “daqui a vinte anos – após a conclusão do curso vamos encontrarmo-nos aqui, no pátio da escola, aconteça o que acontecer.” Assim, eu e a F., no meio de muitas cumplicidade, decidimos que haveríamos de ir a Canal Caveira no dia da passagem do século.
Somos da mesma idade. As relações entre ambos entrelaçaram-se com amigos, solidariedades, trabalho, militância, ajuntamentos, casamentos, separações, sucessos retumbantes e fracassos terríveis. Vidas intensas de empenhamento nas mudanças sociais e políticas.
Ainda estamos a caminho do futuro no selim da mota que nos haverá de conduzir a Canal Caveira. Ninguém nos derrubará. Com o tempo ficámos mais resistentes às ilusões do sonho de uma vida para além da miséria do sofrimento humano.
Essa viagem que não fizemos não tem importância nenhuma. Foi uma forma de manter, anos sem fim, um objectivo de partilha de uma aventura que não cumprimos. Outras aventuras surgirão para que os nossos, em primeiro lugar, os mais novos, se possam orgulhar de nós.
Somos da mesma idade. As relações entre ambos entrelaçaram-se com amigos, solidariedades, trabalho, militância, ajuntamentos, casamentos, separações, sucessos retumbantes e fracassos terríveis. Vidas intensas de empenhamento nas mudanças sociais e políticas.
Ainda estamos a caminho do futuro no selim da mota que nos haverá de conduzir a Canal Caveira. Ninguém nos derrubará. Com o tempo ficámos mais resistentes às ilusões do sonho de uma vida para além da miséria do sofrimento humano.
Essa viagem que não fizemos não tem importância nenhuma. Foi uma forma de manter, anos sem fim, um objectivo de partilha de uma aventura que não cumprimos. Outras aventuras surgirão para que os nossos, em primeiro lugar, os mais novos, se possam orgulhar de nós.
Absorto - 1º Aniversário (14 de 17)
A estratégia do PP
A coragem faz falta para tomar posições, abrir caminhos, ousar decisões, assumir responsabilidades, exercer o poder, abdicar do poder, afrontar os poderes, desmascarar a mentira. Faz falta nos momentos difíceis mas também nos outros.
Penso sempre no que terá pensado e sentido Federico Garcia Lorca quando foi preso pelos fascistas espanhóis (sob inspiração do “caudilho”) e fuzilado.
O que fazer perante a barbárie, mansa ou brutal, dos aspirantes a tiranos. A coragem da resistência. Não a velha resistência dos heróis da 2ª guerra mundial. Mas a resistência ao populismo mediático que propagandeia a ideia de que é a direita que defende os pobres e os desprotegidos.
Quem derrubou Santana Lopes foi o PP e Bagão Félix. Não foi o PR. Metam isto na cabeça. Por isso foi o PP que impôs a Santana uma separação de águas e a ida às urnas a “solo”. A sua estratégia é a de crescer à custa dos votos dos deserdados de todas as condições, derrotando o seu parceiro de ocasião no exercício do poder.
Não há qualquer autenticidade no proclamado acordo pós eleitoral que encobre a separação dos parceiros da coligação da direita. É uma mera manobra de diversão para credibilizar uma herança vazia de solidariedade mas prenhe de disputas e hostilidades.
É assustador, nos últimos dias, observar o olhar chispando ódio dos dirigentes dos partidos de direita. É penoso ouvir o seu discurso de indisfarçável ressentimento face ao PR. Paulo Portas, em particular, tem personificado uma vontade impotente de golpear um regime político que, no fundo, não lhe atribui todos os poderes de que se considera merecedor.
Um chefe. Exagero nos meus receios? Queira Deus que me engane. O futuro o dirá.
Penso sempre no que terá pensado e sentido Federico Garcia Lorca quando foi preso pelos fascistas espanhóis (sob inspiração do “caudilho”) e fuzilado.
O que fazer perante a barbárie, mansa ou brutal, dos aspirantes a tiranos. A coragem da resistência. Não a velha resistência dos heróis da 2ª guerra mundial. Mas a resistência ao populismo mediático que propagandeia a ideia de que é a direita que defende os pobres e os desprotegidos.
Quem derrubou Santana Lopes foi o PP e Bagão Félix. Não foi o PR. Metam isto na cabeça. Por isso foi o PP que impôs a Santana uma separação de águas e a ida às urnas a “solo”. A sua estratégia é a de crescer à custa dos votos dos deserdados de todas as condições, derrotando o seu parceiro de ocasião no exercício do poder.
Não há qualquer autenticidade no proclamado acordo pós eleitoral que encobre a separação dos parceiros da coligação da direita. É uma mera manobra de diversão para credibilizar uma herança vazia de solidariedade mas prenhe de disputas e hostilidades.
É assustador, nos últimos dias, observar o olhar chispando ódio dos dirigentes dos partidos de direita. É penoso ouvir o seu discurso de indisfarçável ressentimento face ao PR. Paulo Portas, em particular, tem personificado uma vontade impotente de golpear um regime político que, no fundo, não lhe atribui todos os poderes de que se considera merecedor.
Um chefe. Exagero nos meus receios? Queira Deus que me engane. O futuro o dirá.
terça-feira, dezembro 14
Jornalismo Promíscuo
Assinalo a denúncia do Clube de Jornalistas sublinhada no abrupto. O ministro Morais Sarmento, no fundo, naquela entrevista ao "Diário Económico" (a do “caudilho”), entrevistou-se a si próprio.
Não vale a pena chover no molhado acerca dos abusos verificados no passado ou previsíveis para o futuro. O que é preciso é denunciar todas as situações de promiscuidade entre os gabinetes do poder e a comunicação social. Já dei, recentemente, o meu contributo.
E já agora que seja criada, com urgência, uma entidade reguladora que acautele a existência de mecanismos dissuasores de tais práticas e, se possível, penalizadores das mesmas ao menos perante a opinião pública.
Não vale a pena chover no molhado acerca dos abusos verificados no passado ou previsíveis para o futuro. O que é preciso é denunciar todas as situações de promiscuidade entre os gabinetes do poder e a comunicação social. Já dei, recentemente, o meu contributo.
E já agora que seja criada, com urgência, uma entidade reguladora que acautele a existência de mecanismos dissuasores de tais práticas e, se possível, penalizadores das mesmas ao menos perante a opinião pública.
O Lugar do Meu Avô em Santos
Conheci os meus avós de forma diferente. Os paternos de memórias. Eram mais velhos e eu, filho tardio, cheguei tarde demais para os conhecer de perto. Compenso-me dessa ausência mantendo perto de mim uma fotografia do meu avô Dimas Eduardo Graça (Dimas é o nome de meu pai e de meu irmão mais velho, Eduardo é o meu).
Tirada em Santos, no Brasil, para onde emigrou no tempo em que os portugueses partiam em busca de uma vida melhor, a foto é majestosa pela qualidade, em si mesma, e pela figura que retrata.
Um dia de visita a S.Paulo quis visitar a rua na qual, em Santos, o meu avô Dimas tinha trabalhado numa fábrica de malas, baús, malões, ao que suponho propriedade de seu irmão.
No SESC de S. Paulo falei alto acerca da minha vontade de visitar a rua e, se possível, a fábrica ou os resquícios que dela tivessem sobrevivido. E eis que uma das presentes me diz ter vivido numa vivenda mesmo em frente da fábrica que eu procurava. E lembrar-se, em criança, das pessoas que nela trabalhavam.
No outro dia lá fui. Em plena zona industrial a rua estava tal e qual com o mesmo nome. E o número da porta também não tinha mudado. Era um armazém de fronte do qual pude observar a vivenda que me tinha sido referida.
Por ser domingo não pude entrar mas era aquele o espaço, agora ao serviço da empresa de celulares que a PT explora na região de S. Paulo, onde o meu avô tinha trabalhado boa parte da sua vida.
Regressei com o sentimento de ter cumprido uma das íntimas missão que, desde há muito, me tinha imposto a mim próprio.
Tirada em Santos, no Brasil, para onde emigrou no tempo em que os portugueses partiam em busca de uma vida melhor, a foto é majestosa pela qualidade, em si mesma, e pela figura que retrata.
Um dia de visita a S.Paulo quis visitar a rua na qual, em Santos, o meu avô Dimas tinha trabalhado numa fábrica de malas, baús, malões, ao que suponho propriedade de seu irmão.
No SESC de S. Paulo falei alto acerca da minha vontade de visitar a rua e, se possível, a fábrica ou os resquícios que dela tivessem sobrevivido. E eis que uma das presentes me diz ter vivido numa vivenda mesmo em frente da fábrica que eu procurava. E lembrar-se, em criança, das pessoas que nela trabalhavam.
No outro dia lá fui. Em plena zona industrial a rua estava tal e qual com o mesmo nome. E o número da porta também não tinha mudado. Era um armazém de fronte do qual pude observar a vivenda que me tinha sido referida.
Por ser domingo não pude entrar mas era aquele o espaço, agora ao serviço da empresa de celulares que a PT explora na região de S. Paulo, onde o meu avô tinha trabalhado boa parte da sua vida.
Regressei com o sentimento de ter cumprido uma das íntimas missão que, desde há muito, me tinha imposto a mim próprio.
Absorto - 1º Aniversário (13 de17)
segunda-feira, dezembro 13
À memória de Fernando Pessoa
Se eu pudesse fazer com que viesses
Todos os dias, como antigamente,
Falar-me nessa lúcida visão -
Estranha, sensualíssima, mordente;
Se eu pudesse contar-te e tu me ouvisses,
Meu pobre e grande e genial artista,
O que tem sido a vida - esta boémia
Coberta de farrapos e de estrelas,
Tristíssima, pedante, e contrafeita,
Desde que estes meus olhos numa névoa
De lágrimas te viram num caixão;
Se eu pudesse, Fernando, e tu me ouvisses,
Voltávamos à mesma: Tu, lá onde
Os astros e as divinas madrugadas
Noivam na luz eterna de um sorriso;
E eu, por aqui, vadio de descrença
Tirando o meu chapéu aos homens de juízo...
Isto por cá vai indo como dantes;
O mesmo arremelgado idiotismo
Nuns senhores que tu já conhecias
- Autênticos patifes bem falantes...
E a mesma intriga: as horas, os minutos,
As noites sempre iguais, os mesmos dias,
Tudo igual! Acordando e adormecendo
Na mesma cor, do mesmo lado, sempre
O mesmo ar e em tudo a mesma posição
De condenados, hirtos, a viver -
Sem estímulo, sem fé, sem convicção...
Poetas, escutai-me. Transformemos
A nossa natural angústia de pensar -
Num cântico de sonho!, e junto dele,
Do camarada raro que lembramos,
Fiquemos uns momentos a cantar!
António Botto
Poema de Cinza
As Canções de António Botto
Editorial Presença1999
Todos os dias, como antigamente,
Falar-me nessa lúcida visão -
Estranha, sensualíssima, mordente;
Se eu pudesse contar-te e tu me ouvisses,
Meu pobre e grande e genial artista,
O que tem sido a vida - esta boémia
Coberta de farrapos e de estrelas,
Tristíssima, pedante, e contrafeita,
Desde que estes meus olhos numa névoa
De lágrimas te viram num caixão;
Se eu pudesse, Fernando, e tu me ouvisses,
Voltávamos à mesma: Tu, lá onde
Os astros e as divinas madrugadas
Noivam na luz eterna de um sorriso;
E eu, por aqui, vadio de descrença
Tirando o meu chapéu aos homens de juízo...
Isto por cá vai indo como dantes;
O mesmo arremelgado idiotismo
Nuns senhores que tu já conhecias
- Autênticos patifes bem falantes...
E a mesma intriga: as horas, os minutos,
As noites sempre iguais, os mesmos dias,
Tudo igual! Acordando e adormecendo
Na mesma cor, do mesmo lado, sempre
O mesmo ar e em tudo a mesma posição
De condenados, hirtos, a viver -
Sem estímulo, sem fé, sem convicção...
Poetas, escutai-me. Transformemos
A nossa natural angústia de pensar -
Num cântico de sonho!, e junto dele,
Do camarada raro que lembramos,
Fiquemos uns momentos a cantar!
António Botto
Poema de Cinza
As Canções de António Botto
Editorial Presença1999
Não deixar rasto
Eis uma notícia, da edição de hoje, do "El País" muito interessante para a realidade portuguesa actual.
“El equipo de Aznar borró los archivos informáticos de Presidencia antes de irse
Una empresa especializada fue contratada por 12.000 euros para eliminar todas las copias
Cuenta el ex presidente Leopoldo Calvo-Sotelo que, cuando llegó a La Moncloa para sustituir a Adolfo Suárez, en febrero de 1981, y abrió la caja fuerte que debía contener los secretos de Estado, sólo halló en su interior un papel, en el que estaba anotada la combinación para abrirla.
José Luis Rodríguez Zapatero no se sorprendió menos cuando en abril pasado sustituyó a José María Aznar al frente del Gobierno. Todos los archivos informáticos de Presidencia estaban vacíos. La clave también figuraba en un papel: la factura, por unos 12.000 euros, de la empresa contratada para borrarlos.”
“El equipo de Aznar borró los archivos informáticos de Presidencia antes de irse
Una empresa especializada fue contratada por 12.000 euros para eliminar todas las copias
Cuenta el ex presidente Leopoldo Calvo-Sotelo que, cuando llegó a La Moncloa para sustituir a Adolfo Suárez, en febrero de 1981, y abrió la caja fuerte que debía contener los secretos de Estado, sólo halló en su interior un papel, en el que estaba anotada la combinación para abrirla.
José Luis Rodríguez Zapatero no se sorprendió menos cuando en abril pasado sustituyó a José María Aznar al frente del Gobierno. Todos los archivos informáticos de Presidencia estaban vacíos. La clave también figuraba en un papel: la factura, por unos 12.000 euros, de la empresa contratada para borrarlos.”
Um Búzio e Uma "Água-Forte"
Nos idos de 1976 visitei Cuba. Che tinha sido assassinado, nove anos antes, em 9 de Outubro de 1967. Faço a referência à efeméride para dar a ideia da profundidade e significado de terem já passado 37 anos desde esse acontecimento que tanto marcou a minha juventude.
Ao ver o filme “A Viagem de Che Guevara”, as personagens, os sonhos e as canções que envolvem o mito de Che, lembrei-me desta memorável viagem. Era uma delegação do MES composta por mim, pelo Vítor Wengorovius e pelo Francisco Farrica.
Julgo que não havia um objectivo concreto a alcançar mas tão só dar testemunho do processo político português. Estávamos em plena campanha das eleições presidenciais, em Portugal, e Otelo era, à época, muito popular em Cuba.
Fizemos as visitas da praxe, pisamos os lugares mais emblemáticos da revolução cubana, visitamos uma fábrica de “puros habanos”, uma plantação de cana, fomos recebidos por alguns dirigentes político intermédios, mas não por Fidel.
Lembro-me de ter ficado impressionado com o olhar triste ou, talvez, melancólico das trabalhadoras da fábrica de charutos. Apesar de tudo a viagem foi há quase trinta anos. A situação de Cuba era menos difícil do que na actualidade. O calor humano dos cubanos, a sua amabilidade e companheirismo eram, e são, incomparáveis. E, em muitos casos, disfarçavam a custo as críticas.
Mas lembro-me de ter sentido, de parte do regime, um alheamento que só consigo explicar pela nossa postura intelectual de não cedência à eventual expectativa de uma atitude reverencial que nunca seríamos capazes de assumir. Não tínhamos nada para pedir. Ninguém ousou oferecer-nos nada. Saímos como entramos.
Da minha parte trouxe de Cuba um búzio e uma “água-forte”, escolhida e comprada por mim, no atelier de Lopez-Nussa (*), aquando de um passeio livre por Havana. O búzio enorme que colhi, em plena praia de Camaguey, mereceu uma detalhada análise das desconfiadas (ou interesseiras?) autoridades alfandegárias à chegada ao aeroporto de Lisboa.
São as mais preciosas recordações que guardo dessa viagem. Mas espero lá voltar como simples turista.
(*) Pelas minhas pesquisas trata-se de uma “água-forte” de um consagrado artista plástico cubano, Leonel Lopez-Nussa Carion, 1916, Havana, da série “Música e Músicos”, intitulada “Músicas 5 A”.
Ao ver o filme “A Viagem de Che Guevara”, as personagens, os sonhos e as canções que envolvem o mito de Che, lembrei-me desta memorável viagem. Era uma delegação do MES composta por mim, pelo Vítor Wengorovius e pelo Francisco Farrica.
Julgo que não havia um objectivo concreto a alcançar mas tão só dar testemunho do processo político português. Estávamos em plena campanha das eleições presidenciais, em Portugal, e Otelo era, à época, muito popular em Cuba.
Fizemos as visitas da praxe, pisamos os lugares mais emblemáticos da revolução cubana, visitamos uma fábrica de “puros habanos”, uma plantação de cana, fomos recebidos por alguns dirigentes político intermédios, mas não por Fidel.
Lembro-me de ter ficado impressionado com o olhar triste ou, talvez, melancólico das trabalhadoras da fábrica de charutos. Apesar de tudo a viagem foi há quase trinta anos. A situação de Cuba era menos difícil do que na actualidade. O calor humano dos cubanos, a sua amabilidade e companheirismo eram, e são, incomparáveis. E, em muitos casos, disfarçavam a custo as críticas.
Mas lembro-me de ter sentido, de parte do regime, um alheamento que só consigo explicar pela nossa postura intelectual de não cedência à eventual expectativa de uma atitude reverencial que nunca seríamos capazes de assumir. Não tínhamos nada para pedir. Ninguém ousou oferecer-nos nada. Saímos como entramos.
Da minha parte trouxe de Cuba um búzio e uma “água-forte”, escolhida e comprada por mim, no atelier de Lopez-Nussa (*), aquando de um passeio livre por Havana. O búzio enorme que colhi, em plena praia de Camaguey, mereceu uma detalhada análise das desconfiadas (ou interesseiras?) autoridades alfandegárias à chegada ao aeroporto de Lisboa.
São as mais preciosas recordações que guardo dessa viagem. Mas espero lá voltar como simples turista.
(*) Pelas minhas pesquisas trata-se de uma “água-forte” de um consagrado artista plástico cubano, Leonel Lopez-Nussa Carion, 1916, Havana, da série “Música e Músicos”, intitulada “Músicas 5 A”.
Absorto - 1º Aniversário (12 de 17)
sábado, dezembro 11
De Cabeça Perdida
Tinha acordado comigo próprio não abordar mais a questão da dissolução da AR. Vamos para eleições, ponto final.
Mas a manifestação do governo frente às câmaras de TV, realizada hoje à noite, ultrapassa tudo o que seria possível imaginar.
Fez-me lembrar os tempos do PREC. Os rostos patibulares dos Ministros, o gaguejar pretensamente institucional do PM, o discurso em tom retórico e arruaceiro, a tomada de posição do PSD Madeira, proclamando o pretenso “golpe constitucional” do PR.
A direita está de cabeça perdida. A perspectiva da perda do poder fá-los perder a cabeça. Devem possuir indicações, sondagens e estudos de opinião, que aconselham à dramatização e assumpção do papel de vítimas. As sondagens devem ser mesmo muito más. Ou então é um comportamento próprio da sua natureza, ou seja, uma questão de carácter. Como diz o povo, gente má.
O Primeiro-ministro está a arrastar o país para o caos mesmo com um pé e meio fora do governo, Estive a reparar e não vi o Dr. Bagão Félix perfilado na manifestação de demissão do governo. Estranho!
Mas a manifestação do governo frente às câmaras de TV, realizada hoje à noite, ultrapassa tudo o que seria possível imaginar.
Fez-me lembrar os tempos do PREC. Os rostos patibulares dos Ministros, o gaguejar pretensamente institucional do PM, o discurso em tom retórico e arruaceiro, a tomada de posição do PSD Madeira, proclamando o pretenso “golpe constitucional” do PR.
A direita está de cabeça perdida. A perspectiva da perda do poder fá-los perder a cabeça. Devem possuir indicações, sondagens e estudos de opinião, que aconselham à dramatização e assumpção do papel de vítimas. As sondagens devem ser mesmo muito más. Ou então é um comportamento próprio da sua natureza, ou seja, uma questão de carácter. Como diz o povo, gente má.
O Primeiro-ministro está a arrastar o país para o caos mesmo com um pé e meio fora do governo, Estive a reparar e não vi o Dr. Bagão Félix perfilado na manifestação de demissão do governo. Estranho!
Cadernos de Camus
Num período que decorreu até Março deste ano José Pacheco Pereira tomou a iniciativa de criar um blog que, durante algum tempo, consistiu num exercício de diversas leituras de Camus, em particular, dos seus “Cadernos”. Esse blog ainda está disponível.
A minha modesta contribuição ficou lá, parcialmente, depositada e, está disponível, na íntegra, no arquivo do absorto.
Por razões, certamente estimáveis, que o próprio JPP saberá, melhor do que ninguém, explicar o projecto cessou.
No contexto dos primórdios de uma batalha eleitoral que, todos já percebemos, vai ser atravessada pela mais baixa política dos anais da República apetece tratar de temas que dela se afastem mas que estão fortemente ligados à defesa dos valores sagrados da justiça e da liberdade.
Por isso me lembrei, ainda a propósito da intervenção do PR, que tinha arquivado a bibliografia de Albert Camus para posterior utilização no contexto daquele projecto.
No meio das trapalhadas e insultos desta pré-campanha eleitoral coloco essa bibliografia disponível no IR AO FUNDO E VOLTAR .
A minha modesta contribuição ficou lá, parcialmente, depositada e, está disponível, na íntegra, no arquivo do absorto.
Por razões, certamente estimáveis, que o próprio JPP saberá, melhor do que ninguém, explicar o projecto cessou.
No contexto dos primórdios de uma batalha eleitoral que, todos já percebemos, vai ser atravessada pela mais baixa política dos anais da República apetece tratar de temas que dela se afastem mas que estão fortemente ligados à defesa dos valores sagrados da justiça e da liberdade.
Por isso me lembrei, ainda a propósito da intervenção do PR, que tinha arquivado a bibliografia de Albert Camus para posterior utilização no contexto daquele projecto.
No meio das trapalhadas e insultos desta pré-campanha eleitoral coloco essa bibliografia disponível no IR AO FUNDO E VOLTAR .
Eleições - 20 de Fevereiro
Desde a data do anúncio formal, pelo PR, da decisão de convocar eleições legislativas até à sua realização, em 20 de Fevereiro de 2005, vão passar 71 dias.
É muito tempo. É tempo demais. A decisão é, politicamente, inquestionável e, conforme apontam todas as sondagens e o senso comum, era desejada pela maioria dos portugueses.
Mas não se poderiam encurtar todos os prazos? Nenhuma sociedade aguenta tanto impasse, hesitação, “complexidade”, sigilo, sem amargar a sua sorte.
Reparem só no caso particular do combate aos incêndios de verão. Na véspera da decisão formal do PR demitiu-se o responsável máximo dos “Bombeiros e Protecção Civil”.
O responsável governamental não falava com ele. É uma técnica antiga para “despedir” e humilhar os dirigentes da administração.
Chegaremos, assim, ao verão de 2005, de novo, impreparados para a inevitável calamidade dos incêndios.
Previsão: a direita, na oposição, acusará o governo socialista de não ter feito nada para fazer face à situação.
Em Julho de 2005 já ninguém se lembrará de nada do que se está a passar neste momento.
É muito tempo. É tempo demais. A decisão é, politicamente, inquestionável e, conforme apontam todas as sondagens e o senso comum, era desejada pela maioria dos portugueses.
Mas não se poderiam encurtar todos os prazos? Nenhuma sociedade aguenta tanto impasse, hesitação, “complexidade”, sigilo, sem amargar a sua sorte.
Reparem só no caso particular do combate aos incêndios de verão. Na véspera da decisão formal do PR demitiu-se o responsável máximo dos “Bombeiros e Protecção Civil”.
O responsável governamental não falava com ele. É uma técnica antiga para “despedir” e humilhar os dirigentes da administração.
Chegaremos, assim, ao verão de 2005, de novo, impreparados para a inevitável calamidade dos incêndios.
Previsão: a direita, na oposição, acusará o governo socialista de não ter feito nada para fazer face à situação.
Em Julho de 2005 já ninguém se lembrará de nada do que se está a passar neste momento.
sexta-feira, dezembro 10
O Populismo Saiu à Rua Num Dia Assim
A "Ode Triunfal" foi o que me apeteceu, verdadeiramente, publicar a título de comentário à comunicação presidencial. É mais clara. Intemporal. Está sempre actual e não se atrasa. Não é alvo de críticas nas TVs a não ser por especialistas que ninguém sabe quem são e ninguém lê. Excepto outros especialistas igualmente desconhecidos do grande público, ou seja, do povo e que, igualmente, ninguém lê.
Mas a razão comezinha da disputa do poder, ou seja, de uma série de coisas que o poema trata, com meridiana clareza, e que interferem com a nossa vidinha, exige um comentário mais prosaico: resumindo a baralhando vamos para eleições.
Dia 20 de Fevereiro. Porque não 13? Ou mesmo 6? O Carnaval? A camapnha eleitoral não pode coincidir com o Carnaval? Uma boa anedota. O que interessava a toda a gente, aos cidadãos, menos aos partidos da maioria (estão no poder) e ao PC (está "de Jerónimo") era a data mais cedo possível! Tudo demora tanto tempo! Desde 9 de Julho de 2004 a 20 de Fevereiro de 2005 contam-se mais de 7 meses!
A partir deste momento começou a campanha eleitoral. O governo que não-se-sabe-se-é-de-gestão-ou-não, e os partidos que o integram, vão aproveitar, a fundo, as vantagens de disporem do poder e de um Orçamento de Estado aprovado.
O populismo saiu à rua num dia assim...
Mas a razão comezinha da disputa do poder, ou seja, de uma série de coisas que o poema trata, com meridiana clareza, e que interferem com a nossa vidinha, exige um comentário mais prosaico: resumindo a baralhando vamos para eleições.
Dia 20 de Fevereiro. Porque não 13? Ou mesmo 6? O Carnaval? A camapnha eleitoral não pode coincidir com o Carnaval? Uma boa anedota. O que interessava a toda a gente, aos cidadãos, menos aos partidos da maioria (estão no poder) e ao PC (está "de Jerónimo") era a data mais cedo possível! Tudo demora tanto tempo! Desde 9 de Julho de 2004 a 20 de Fevereiro de 2005 contam-se mais de 7 meses!
A partir deste momento começou a campanha eleitoral. O governo que não-se-sabe-se-é-de-gestão-ou-não, e os partidos que o integram, vão aproveitar, a fundo, as vantagens de disporem do poder e de um Orçamento de Estado aprovado.
O populismo saiu à rua num dia assim...
ODE TRIUNFAL
Este poema de Fernando Pessoa pela voz de Álvaro de Campos é, convenhamos, longo para um blog. Hoje, dia 9 de Dezembro, esteve um dia frio em Lisboa e não me pareceu que a noite tivesse aquecido. Seria desapropriado publicar num blog com esta natureza, na íntegra, este belo e longo poema. Mas após ter ouvido a declaração ao País do PR, e os comentários que sobre ela estão a ser produzidos, publico uns versos e aqui deixo o link para quem esteja interessado em o ler na íntegra. A crise política deu-me para isto...
ODE TRIUNFAL
À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.
Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
(...)
(Ah, como eu desejaria ser o souteneur disto tudo!)
A maravilhosa beleza das corrupções políticas,
Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos,
Agressões políticas nas ruas,
E de vez em quando o cometa dum regicídio
Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus
Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana!
Notícias desmentidas dos jornais,
Artigos políticos insinceramente sinceros,
Notícias passez à-la-caisse, grandes crimes --
Duas colunas deles passando para a segunda página!
O cheiro fresco a tinta de tipografia!
Os cartazes postos há pouco, molhados!
Vients-de-paraitre amarelos com uma cinta branca!
Como eu vos amo a todos, a todos, a todos,
Como eu vos amo de todas as maneiras,
Com os olhos e com os ouvidos e com o olfacto
E com o tacto (o que palpar-vos representa para mim!)
E com a inteligência como uma antena que fazeis vibrar!
Ah, como todos os meus sentidos têm cio de vós!
(...)
Ah, e a gente ordinária e suja, que parece sempre a mesma,
Que emprega palavrões como palavras usuais,
Cujos filhos roubam às portas das mercearias
E cujas filhas aos oito anos -- e eu acho isto belo e amo-o!
Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escada.
A gentalha que anda pelos andaimes e que vai para casa
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão.
Maravilhosa gente humana que vive como os cães,
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita,
Nenhuma arte criada,
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim,
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus,
Inatingíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!
(...)
Álvaro de Campos, 6-1914
ODE TRIUNFAL
À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.
Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!
(...)
(Ah, como eu desejaria ser o souteneur disto tudo!)
A maravilhosa beleza das corrupções políticas,
Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos,
Agressões políticas nas ruas,
E de vez em quando o cometa dum regicídio
Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus
Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana!
Notícias desmentidas dos jornais,
Artigos políticos insinceramente sinceros,
Notícias passez à-la-caisse, grandes crimes --
Duas colunas deles passando para a segunda página!
O cheiro fresco a tinta de tipografia!
Os cartazes postos há pouco, molhados!
Vients-de-paraitre amarelos com uma cinta branca!
Como eu vos amo a todos, a todos, a todos,
Como eu vos amo de todas as maneiras,
Com os olhos e com os ouvidos e com o olfacto
E com o tacto (o que palpar-vos representa para mim!)
E com a inteligência como uma antena que fazeis vibrar!
Ah, como todos os meus sentidos têm cio de vós!
(...)
Ah, e a gente ordinária e suja, que parece sempre a mesma,
Que emprega palavrões como palavras usuais,
Cujos filhos roubam às portas das mercearias
E cujas filhas aos oito anos -- e eu acho isto belo e amo-o!
Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escada.
A gentalha que anda pelos andaimes e que vai para casa
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão.
Maravilhosa gente humana que vive como os cães,
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita,
Nenhuma arte criada,
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim,
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus,
Inatingíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!
(...)
Álvaro de Campos, 6-1914
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