terça-feira, abril 6

25 de Abril - notas pessoais

Do MES à "Nova Esquerda"


Nas reuniões e discussões prévias ao I Congresso lembro-me de ter, em diversos momentos, divagado a sós, angustiado pela percepção da "quadratura do círculo" que constituía, naquelas circunstâncias, conciliar a democracia representativa com a democracia directa, ou "poder popular".

Uma síntese impossível. Era necessário ganhar tempo, mas a gestão do tempo não era o nosso forte, nem o "espírito da época" favorecia as esperas sábias e pacientes.

As revoluções criam uma especial escala do tempo em que nos sentimos atraídos pela acção e a acção exige mais acção. A única saída possível para tornar o MES um Partido útil, na construção da democracia representativa e participativa, tinha-se esfumado com o desenlace daquele Congresso.

Os que romperam prepararam pacientemente a sua integração no PS. Os que ficaram, por convicção ideológica ou devoção a amizades autênticas, forjadas nas lutas do passado, foram absorvidos pela voragem dos acontecimentos e foram saindo, em levas sucessivas, até à extinção do movimento no célebre jantar do Mercado do Povo.

Após a extinção do MES alguns de nós dinamizaram, no início dos anos 80, a criação da "Nova Esquerda" em cuja declaração de princípios se preconizava o "desenvolvimento de um novo pensamento de esquerda que, assentando fundamentalmente na ideia do socialismo democrático, clarifique as suas fronteiras, encare os valores da liberdade individual, da solidariedade social e da iniciativa modernizadora (tanto ao nível económico como cultural), como elementos constitutivos essenciais."

Defendia-se, num notável documento de Julho de 1984, que mantém plena actualidade, entre outros objectivos, o debate "aberto e inconformista que envolva todos os sectores interessados na modernização do país", o "reforço da democracia" e a "adesão à CEE".

Esse documento preparado para a criação de uma abortada "Cooperativa Nova Esquerda" foi assumido por Afonso de Barros, Agostinho Roseta, Eduardo Ferro Rodrigues, Eduardo Graça, Eurico de Figueiredo, Jofre Justino, José Leitão, Júlio Dias, Margarida Marques, Sara Amâncio, Tereza de Sousa e Vitor Wengorovius.

Em 21de Abril de 1986 a Comissão Coordenadora da "Nova Esquerda", constituída por Afonso de Barros, Agostinho Roseta, Eduardo Ferro Rodrigues, Eduardo Graça e Vitor Wengorovius anuncia que, após seis anos, a "atitude de solidariedade crítica externa ao PS se esgotou e deve ser superada por uma intervenção política concreta que, para a maioria dos membros desta comissão, pode e deve ser realizada, desde já, dentro do PS."

Em consequência, no decurso do ano de 1986, todos os membros da Comissão da "Nova Esquerda", com excepção de Vitor Wengorovius, entre outros ex-activistas do MES, aderiram colectivamente ao PS.

(17 de 32 continua)

segunda-feira, abril 5

Abandono Escolar - uma emergência nacional (I)

A Comissão Europeia divulgou um "projecto de relatório intercalar" acerca dos objectivos da "Estratégia de Lisboa" para os sistemas de educação e de formação na Europa.

Esse relatório revela que, considerando os jovens com idades compreendidas entre os 18 e os 24 anos, a "taxa média de casos de abandono escolar, precoce, na União é de 18,8 %".

Surpreendente, ou talvez não, os dez países aderentes apresentam melhor desempenho que os actuais Estados membros da União com uma taxa de 8,4 %.

Outro facto relevante é que Portugal apresenta a mais alta taxa de abandono escolar da União Europeia com 45,5%. Ainda mais preocupante é o facto de Portugal (com a Dinamarca) ter invertido, a partir de meados da década de 90, a tendência para a melhoria deste indicador, encetada no início dessa mesma década.

Mesmo que se tente suavizar a situação, questionando os critérios adoptados para construir estes indicadores, são notícias preocupantes para a Europa e, em particular, para Portugal.

É uma situação reveladora da profunda "desvantagem competitiva" de Portugal face aos restantes países da EU. Não está em causa a estatística mas a economia e as vidas que se escondem por detrás da estatística.

Os jovens, na maior parte dos casos, abandonam a escola por razões económicas no quadro de situações familiares à beira do limiar da sobrevivência.

(Artigo publicado no "Semanário Económico" - 2 de Abril de 2004)

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PT - II

Nova notícia excitante acerca da PT.

Na anterior soube-se que a PT não pagava IRC. Não vi nem ouvi qualquer comentário, desmentido, referência crítica, enfim, tudo normal…

Agora uma venda das acções próprias a um Banco que afirma que não quer exercer os seus direitos... Altruísmo!

"Banco holandês detém 4,54% do capital e direitos de voto
A Portugal Telecom vendeu a totalidade das suas acções próprias ao banco holandês ABN Amro. O banco, que passou a deter 4,54 por cento do capital da PT, diz que não pretende exercer influência na gestão da empresa."

"Quem a tem..."


Não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.

Eu não posso senão ser
desta terra em que nasci.
Embora ao mundo pertença
e sempre a verdade vença,
qual será ser livre aqui,
não hei-de morrer sem saber.

Trocaram tudo em maldade,
é quase um crime viver.
Mas, embora escondam tudo
e me queiram cego e mudo,
não hei-de morrer sem saber
qual a cor da liberdade.

Jorge de Sena

Fidelidade (1958)

25 de Abril - notas pessoais

O I Congresso do MES - II


A ruptura política operada no 1º Congresso, e a consequente saída de Jorge Sampaio do nascente MES, não foi inesperada. Ela resultou de um longo processo de debate que durou semanas, ou meses, ao longo dos quais não se estabeleceram as pontes pessoais e políticas que poderiam ter inflectido aquele desenlace.

Recebi, pela minha parte, abundantes avisos e missivas alertando para a gravidade da ruptura que se adivinhava no horizonte. Tenho em minha posse os originais de duas cartas que me foram dirigidas, a título pessoal, que testemunham a consciência daquela situação.

Uma foi-me enviada, do Porto, por José Galamba de Oliveira, datada de 7 de Novembro de 1974, afirmando: " (...) Parece-me que estamos numa encruzilhada. Não prevejo que futuro está traçado a curto e médio prazo para este país nem vejo claro o que deveremos e poderemos fazer para inflectir favoravelmente o desenrolar do processo histórico. Embora não pense que a luta de classes se desenrole nas cúpulas, gostava de saber o que está arquivado nas gavetas das secretárias de Ford, Brejnev e companhia. Cada vez mais o que se passa num país é menos independente do panorama internacional, e continuo sem ver claro qual o projecto do PCP cá para o burgo lusitano."

E afirma a propósito do Congresso que se avizinhava: "Não estamos suficientemente fortes para depurações. Toda a flexibilidade e diplomacia são poucas para preservar o essencial".

Numa longa carta, de 15 de Dezembro de 1974, que me enviou de Moçambique, Luís Salgado de Matos adverte: "...rezo aos meus santinhos para que não façam cisões - sobretudo a cisão na confusão. Corre-se mais o risco da grupuscularização sem dogma que da social democratização derrapante: não defendo a síntese da carne e do peixe (...) mas julgo que é um risco grave cortar o pano sem ver o tecido. Cisão, a haver - pelo que se pode desenhar - afastará o social democratismo (...) mas reduzirá o MES ao nível do grupinho necessariamente sectário mas sem um conjunto rígido de princípios (que costuma ser a safa destes grupinhos)."

Sábias palavras...

(16 de 32 continua)

domingo, abril 4

Teresa Dias Coelho

Tomei nota pelo Causa Nossa que a Teresa Dias Coelho prestou um depoimento ao Público acerca da sua experiência de presa política às mãos da PIDE/DGS. Conheci a Teresa no rescaldo dos anos quentes de 74/75 e sempre admirei a sua pintura. Não conhecia os detalhes da sua experiência de prisão. Dá-me prazer recordar, com esse pretexto, a sua figura e recomendar a sua pintura.

Citação

"Quantos esforços desmedidos para ser apenas normal!"

Albert Camus

sábado, abril 3

Saramago

A discussão pública acerca da participação popular em eleições acendeu-se com a posição de Saramago acerca do voto em branco. Parece ser uma campanha de publicidade ao seu livro colocado, recentemente, no mercado. Lamentável! Colocar em discussão uma questão de tamanha importância a reboque do puro comércio.

Saramago mostra-se actualizado nesta matéria. É um carácter, no mínimo, um pouco estranho. Do livro não falo porque ainda não o li.

A questão do voto já tinha sido suscitada, recentemente, com a divulgação de sondagens anunciando uma fortíssima abstenção nas próximas eleições para o Parlamento Europeu. No entanto, nas recentes eleições em Espanha e em França, a abstenção caiu e ninguém ouviu falar do voto em branco. Mas a campanha publicitária de Saramago já estava em marcha.

As minhas desculpas mas vou dizer umas frases muito pouco sofisticadas a propósito deste magno tema da democracia representativa. Eu sei que na história da democracia houve ditadores que chegaram ao poder pela via eleitoral. Mas a defesa da democracia representativa vale a pena mesmo correndo os riscos do seu desvirtuamento.

A democracia e a liberdade admitem aperfeiçoamentos desde logo porque aceitam ouvir a voz daqueles que se lhes opõem; as ditaduras só aceitam o silêncio do consentimento e só sobrevivem através da supressão violenta das diferenças. A contestação da democracia cabe dentro da própria democracia. Estou aí nesse espaço em que se possa lutar para acrescentar mais democracia à democracia e mais liberdade à liberdade.

Sempre votei em todas as eleições livres (era esta a reivindicação dos tempos da ditadura, lembram-se?) que tiveram lugar após o 25 de Abril. Já tinha mais de 18 anos. E também votei nas farsas eleitorais, antes do 25 de Abril, quando a oposição democrática chegou até às urnas.

Nunca votei em branco. Votar em branco não representa uma escolha, representa a renúncia a uma escolha. As eleições existem para fazer escolhas. É esse o princípo em que se fundamenta o sufrágio universal. Para se chegar a este sistema, desprezado por Saramago, travaram-se muita lutas, fizeram-se muitos sacrifícios, muita gente se enganou, muitos foram humilhados e outros morreram...lembremo-nos da conquista do voto das mulheres e do voto dos negros...

Sempre que haja uma oportunidade para participar num acto eleitoral das duas uma: ou cada um de nós assume a sua responsabilidade individual pelos destinos do governo da comunidade votando no Partido ou Candidato da sua predilecção, ou, não exercendo esse dever, se demite de ser cidadão.

Pela parte que me toca só tive pena de não ter votado em Humberto Delgado. Mas, em 1958, tinha 11 anos. Nessa época só pude sentir o ambiente de forte apoio popular ao General conduzido, nas manifestações da sua campanha no Algarve, pela mão de meu pai.

Tenho a convicção que em Portugal se deverá adoptar, com urgência, o voto electrónico permitindo que todos possam votar, no limite, sem sair de casa. Questiono-me se não será de adoptar, também, como sucede noutros países, o voto obrigatório com penalização para quem não votar.

A democracia e a liberdade são o bem mais precioso da nossa comunidade. Devem pois ser defendidas e preservadas com a maior firmeza e determinação.

Se assim for os discursos dos Saramagos, com todo o respeito, não têm importância nenhuma.

Se assim não for ficam abertam as portas para que os aspirantes a tiranos sonhem com o poder. Eles esvoaçam por cima das nossas cabeças!


sexta-feira, abril 2

Um Estudo

O Público divulga um estudo realizado nos EUA que apresenta conclusões aparentemente banais mas muito interessantes para o debate do papel do investimento público e da qualidade dos serviços públicos como incentivos ao desenvolvimento.

"A melhoria da qualidade dos serviços públicos é um factor de captação de investimento superior ao da baixa de impostos ou concessão de incentivos, conclui um estudo agora divulgado pelo Instituto norte-americano de Política Económica (IPE)."

25 de Abril - notas pessoais

O I Congresso do MES - I


O Movimento de Esquerda Socialista, forjado no período ante-25 de Abril, rompeu-se no seu 1º Congresso, realizado na Aula Magna, em Lisboa, a meio do mês de Dezembro de 1974.

Nesse congresso estavam em confronto duas concepções do papel de um Partido da esquerda socialista no "processo revolucionário".

Uma maioria, fortemente radicalizada, sentia-se legitimada, pelo curso dos acontecimentos, para impor, ao futuro MES, uma orientação política anti-capitalista que, em si mesmo, não tinha originalidade, não fora ser fortemente influenciada pela ideologia da democracia directa que, no caso do MES, tomaria a designação de Poder Popular.

Ficava assim subalternizada a aceitação programática do modelo de democracia representativa vigente na maioria dos países da Europa ocidental.

A minha participação nesse congresso foi marcada pela dilaceração de ter percebido que não seria possível, na prática, evitar uma ruptura entre o grupo liderados por Jorge Sampaio e o grupo majoritário dos delegados ao Congresso.

Alguns dirigentes com responsabilidades, nos quais me incluía, tomamos, pelo silêncio, o partido da maioria, deixando que o coração vencesse a razão, abrindo, assim, a porta a uma deriva esquerdista com a qual, apesar de tudo, tempos mais tarde, tivemos a capacidade de cortar de forma original.

(15 de 32 continua)

quinta-feira, abril 1

"Quisera Adormecer"


Quisera adormecer
como a criança acorda,
à beira de outro tempo, que é o nosso.

Só quero o que não posso.

Jorge de Sena

8/4/53

O "Efeito Espanhol"


"As próximas eleições europeias vão-se realizar num ambiente político particularmente hostil aos partidos da coligação. Até há duas semanas esse ambiente prendia-se essencialmente com a conjuntura económico-social interna, mas a esses factores já de si muito negativos junta-se agora uma conjuntura externa fluida, depressiva e perigosa."

Pacheco Pereira reflecte hoje no Público acerca do "efeito espanhol". Aliás todos os comentadores políticos reflectem acerca do mesmo tema. No caso de JPP a sua reflexão é um alerta ao PSD: não se permita que o PSD "seja cada vez mais apresentado pelos seus adversários, sem qualquer protesto, como a "direita" ou um "partido de direita"".

Há caminhos que levam a becos sem saída. JPP já percebeu, e não foi agora, que o PSD sacrificou a sua "identidade social-democrata e reformista" quando optou pela aliança com o PP. Não foram as bombas de Madrid que provocaram, no caso de Portugal, o "forte mal-estar" e a agudização das críticas ao governo da coligação PSD/PP. Somente revelaram a profundidade desse mal-estar social, a fragilidade da estratégia reformista do governo, os interesses que nela se acobertam, os métodos autoritários, que mal se escondem, e a consciência do carácter transitório do poder.

Um dia se fará o balanço e o julgamento político do modelo político institucional e da governação da coligação PSD/PP. Só nessa altura JPP poderá conhecer os meandros desta governação, os seus beneficiários, enfim, a sua herança.

O estranho sentimento de "mal-estar" cujas razões agora lhe escapam, e que a sua argúcia lhe permite intuir, surgirão, nesses dias, em todo o seu esplendor nos destroços de um "arranjo político" de ocasião.

Nesse dia todos ficaremos a compreender a razão dos perigos que JPP hoje assinala: o PSD é um partido de direita, tem uma imagem pública de direita, os seus dirigentes não se demarcam da direita, tendo abandonado o programa reformista social-democrata.

Tenho uma solução para o quebra-cabeças de JPP: considere o PSD um "partido reformista de direita". Talvez seja uma inevitabilidade histórica.


25 de abril - notas pessoais

Uma base programática


Os subscritores do livro "Classes, Política Políticas de Classe" sublinham, na versão inicial da introdução, de Março de 74, a importância da intervenção do General Spínola e do seu livro "Portugal e o Futuro", "anunciando porventura uma maior acutilância da terceira força no xadrez político do País...", o que demonstra uma expectativa positiva face à hipótese de uma saída negociada para a crise do regime.

Demarcam-se, por outro lado, cuidadosamente, do conteúdo integral dos textos que integram o livro afirmando que "...esta selecção não representa plena adesão ao que os textos a seguir apresentados exprimem, mas sim o reconhecimento da importância dos mesmos para a análise da realidade nacional."

Ganham, dessa forma, tempo para um debate que estava por fazer. O movimento tinha sido surpreendido pela queda do regime, numa fase atrasada da sua estruturação orgânica, e não possuía um corpo coeso de ideias que lhe permitisse avançar para a criação de um partido político.

Mas naquele livro estava esboçada a base programática possível do futuro MES que a primeira Declaração política formal, redigida posteriormente, plenamente confirma. Nos seus diversos capítulos se abordam, entre outras, as questões da luta sindical, operária e "da previdência", as "questões urbanas", "escolar e estudantil" e "questão da CDE", assim como a luta da "TAP de Julho 73".

Mas para viabilizar a implantação popular de um partido socialista de esquerda, emergente do entusiasmo das lutas de base, o radicalismo teria que ser temperado pelo contributo doutrinário e pragmático dos quadros mais experientes e mais velhos.

Essa simbiose, na qual alguns de nós guardavam esperanças, fracassou. A ruptura de Jorge Sampaio, e do grupo que viria a constituir o GIS, impediu que o MES disputasse o espaço político que o recém-criado Partido Socialista, de Mário Soares, parecia incapaz de preencher.

Os meses que se seguiram ao 25 de Abril foram vividos num inevitável turbilhão de acontecimentos que ainda mais estimularam, em crescendo, as posições radicais inviabilizando todas as hipóteses de evitar a ruptura fatal no seio do projecto inicial do MES.

(14 de 32 continua)

quarta-feira, março 31

Os nossos compromissos

O Joaquim Paulo Nogueira, editor do respiraromesmoar, que entrou hoje nos meus favoritos, presenteou-me com uma prosa que, porventura, resulta das nossas comuns preocupações com os valores da criação artística.

A minha é mais discreta mas ele é já um dramaturgo quase maduro. Nos aproximam questões de gosto e de sensibilidade. De preocupação pela qualidade da escrita e de aproximação à realidade do outro. Comigo colaborou e eu colaborei com ele.

Gostei da sua ousadia em falar das nossas afinidades. Mesmo das políticas. De afinidades assumidas é que o mundo precisa e, mesmo na diferença, é o que precisa a gestão da coisa público e, ainda mais alto, é o que precisa a política entendida na mais nobre das acepções. Fidelidades e ousadias fraternais. Bem hajas.


TAXAS DE CONCLUSÃO DO ENSINO SECUNDÁRIO NA UE

(% da população, de 22 anos, que completou com êxito, pelo menos, o ensino secundário, dados de 2002)

Portugal, no contexto da UE, apresenta indicadores do desempenho do sistema de educação e formação, a fazer fé nas estatísticas do EUROSTAT, medíocres. No que respeita à taxa de abandono escolar Portugal apresenta o pior desempenho da UE. O mesmo sucede com a taxa de conclusão do ensino secundário. Eis uma síntese dos resultados referentes á conclusão do ensino secundário:

Média da UE : 75,4 %
Média dos 10 Países aderentes à UE: 90,1 %
Média de Portugal : 44,9 %, último classificado. O Relatório assinala, no entanto, que Portugal realizou, nos últimos anos, progressos significativos.
País melhor classificado: Suécia - 89,3%

Relatório referente aos objectivos dos sistemas de educação e de formação na Europa - "Estratégia de Lisboa"

(A desenvolver em próximas entradas)

PT não paga IRC

"Portugal Telecom Não Pagará IRC em 2004 e 2005"

"A Portugal Telecom (PT) não pagou IRC em 2003, apesar de ter registado lucros e ter apresentado nas suas contas 377,9 milhões de euros de imposto sobre o rendimento do exercício. Esta situação decorre do facto de a empresa ter afectado às suas contas as menos-valias geradas em 2002 com os seus investimentos no Brasil."

Eis uma notícia hoje publicada no Público, no mínimo, preocupante para aqueles que pagam todos os seus impostos. Então o Estado "isenta" a PT de pagamento de IRC para "cobrir" as menas valias dos investimentos da PT no Brasil ? Esta modalidade de "incentivo" é aplicda a todas as empresas portuguesas que investem no estrangeiro? Isto é verdade? As autoridades, ou seja o Governo, terá alguma palavra a dizer acerca do assunto? E a PT? Está tudo legal, não é?

25 de Abril - notas pessoais

Uma confluência


A esquerda socialista, forjada no período ante-25 de Abril, na sua versão original, resulta de confluência de activistas de diversos movimentos sociais e cívicos.

Neste processo foi determinante a experiência da CDE de 1969. Um livro publicado já depois do 25 de Abril de 74, mas preparado antes, retracta de forma bastante fiel os contornos ideológicos do movimento e identifica a origem dos dirigentes que nele confluíram.

O livro em questão, editado pela Afrontamento, intitula-se "Classes, Política/Políticas de Classe", sendo a sua introdução subscrita, por ordem alfabética, pelos seguintes activistas do MES, em gestação: Agostinho Roseta, António Rosas, António Santos Júnior, Augusto Mateus, Edilberto Moço, Francisco Farrica, Jerónimo Franco, Jorge Sampaio, Manuel Lopes, Marcolino Abrantes, Paulo Barcia e Vitor Wengorovius.

Na primeira "Declaração do Movimento de Esquerda Socialista (M.E.S.)", entretanto divulgada, explicitam-se os princípios fundadores do Movimento sob o lema: "A emancipação dos trabalhadores tem de ser obra dos próprios trabalhadores", abrangendo os campos "da luta de fábrica e sindical", "luta anti-colonial", "luta estudantil", "luta urbana" e, muito interessante, nos seus termos, luta "pelo aumento dos tempos livres" título sob o qual se aborda, de facto, a temática laboral..

Esta primeira Declaração do MES é subscrita, em nome de uma "Comissão Organizadora", por activistas identificados, desta vez, pela sua área de intervenção, com variantes em relação ao grupo anterior e já não por ordem alfabética: Manuel Lopes, António Rosas, António Santos Júnior (militantes sindicalistas); Rogério de Jesus, António Machado, Francisco Farrica, Edilberto Moço, Luís Filipe Fazendeiro, Luís Manuel Espadaneiro (militantes operários); Carlos Pratas e José Galamba de Oliveira (militantes estudantis); Víctor Wengorovius, Joaquim Mestre e José Manuel Galvão Teles (candidatos da CDE de Lisboa, em 1969); Eduardo Ferro Rodrigues (consultor sindical e ex-dirigente estudantil); Nuno Teotónio Pereira (militante cristão) e César Oliveira (historiador do movimento operário).

Os subscritores destes documentos confirmam a confluência na designada esquerda socialista de uma nova vaga de dirigentes, não comunistas, dos movimentos operário, sindical, católico progressista e estudantil que se tinham destacado, desde o início dos anos 60, na contestação aberta à ditadura. Outros nomes não surgem por meras razões circunstanciais.

(13 de 32 continua)

terça-feira, março 30

ABANDONO ESCOLAR PRECOCE NA UE

(% da população com idade entre os 18 e os 24 anos cujas habilitações correspondem apenas ao ensino básico e que não continua a estudar nem segue qualquer formação, dados de 2002)

UE: 18,8%
Novos Países aderentes à UE: 8,4%
UE+novos países aderentes: 16,4%
Objectivo a alcançar em 2010: 10%
Portugal: 45,5% (último classificado)
País melhor classificado dos 15: Áustria - 9,5%
Taxas médias

Relatório referente aos objectivos dos sistemas de educação e de formação na Europa - "Estratégia de Lisboa"

(A desenvolver em próximas entradas)


25 de Abril - notas pessoais

Jorge Sampaio


Na primeira fase do MES, que decorreu até ao 1º Congresso, de Dezembro de 1974, a mais importante personalidade que integrou o processo da sua criação foi Jorge Sampaio que tinha emergido como o mais destacado dirigente estudantil da crise académica de 1961/62.

Ele é, desde essa data, uma referência cívica e política incontornável da esquerda portuguesa. Afirmou-se pela sua inteligência, cultura e capacidade de liderança. Jorge Sampaio é alguém que gera confiança, racional e generoso, culto e emocional, organizado e consensual, um conjunto de características fora do comum na cultura meridional.

É um facto que não integrou o MES, enquanto partido político formal, criado após o 1º Congresso. Jorge Sampaio, com um grupo de activistas, havia de constituir o GIS (Grupo de Intervenção Socialista), tendo abandonado o movimento logo no acto da sua institucionalização em Partido no decurso daquele Congresso fundador.

Foi a primeira morte política do MES. Também Alberto Martins, o mais importante dirigente estudantil da crise académica de 1969, em Coimbra, aderiu ao MES e nele se manteve, após 1º Congresso, tal como um conjunto alargado de dirigentes e ex-dirigentes estudantis que tinham assumido papéis relevantes em todas as crises académicas, a partir do início dos anos 60.

Entre eles não posso deixar de destacar Afonso de Barros, já falecido, que sempre me apoiou, pessoalmente, nos momentos mais difíceis.

(12 de 32 continua)

segunda-feira, março 29

Todos já vimos

Todos já vimos
Nos livros, nos jornais, no cinema e na televisão
Retratos de meninas e meninos
A defender a liberdade de armas na mão.
Todos já vimos
Nos livros, nos jornais, no cinema e na televisão
Retratos de cadáveres de meninos e meninas
Que morreram a defender a liberdade de armas na mão.
Todos já vimos!
E então?

Fernando Sylvan




25 de Abril - notas pessoais

Vítor Wengorovius e Nuno Teotónio Pereira


No movimento católico progressista os activistas mais importantes, que integraram o MES, foram o Arquitecto Nuno Teotónio Pereira e o advogado Vítor Wengorovius.

O primeiro foi, desde sempre, a principal referência cívica do movimento. Oriundo da geração de 50, profissional brilhante, com uma carreira consolidada, à época da criação do MES, Nuno Teotónio Pereira, desempenhou um papel de inegável importância na oposição à ditadura. Foi uma referência determinante da credibilização intelectual do movimento.

Mas o mais importante activista do MES, oriundo do movimento católico progressista, foi Vítor Wengorovius. Tendo desempenhado um papel determinante no movimento estudantil, aquando da crise de 61/62, é um brilhante orador e conduziu-se, em todas as circunstâncias, como um hábil, infatigável e maduro negociador, capaz de gerar consensos e fazer pontes em todas as direcções.

Foi sempre prejudicado, nos planos pessoal e político, pelo seu excesso de talento, na formulação de propostas e soluções de consenso, e pelas manifestações do seu temperamento fulgurante.

A estas duas personalidades devemos todos, os jovens quadros dos anos 60 e 70, uma imensidade de ensinamentos, gestos de desprendida solidariedade e humanidade que jamais poderemos retribuir com a mesma intensidade e sentido de dádiva.

(11 de 32 continua)

Vitória da Esquerda em França

"Esquerda francesa impõe pesada derrota à direita nas regionais"

"A esquerda venceu as eleições regionais em França, cuja segunda volta se realizou hoje, passando a controlar 21 regiões administrativas. A penalização da direita nas urnas deverá acelerar a prevista remodelação governamental.

Segundo as projecções reveladas após o fecho das urnas, as listas da esquerda — resultantes da fusão de socialistas, comunistas e Verdes — obtiveram 50 por cento dos votos a nível nacional, enquanto a coligação de direita — unindo o partido conservador UMP e os centristas da UDF — não foi além dos 37 por cento dos votos. A extrema-direita, que conseguiu aceder à segunda volta em 17 regiões, terá conseguido 12,5 por cento dos votos." - Público on line

Os conservadores perderam o Governo em Espanha e, em França, deverão ficar com maioria em apenas 2 de 23 Regiões. A situação política na Europa está em mudança acelerada. A esquerda recupera o que significa que os cidadãos estar fartos das políticas liberais e autoritárias. Será possível gerar alternativas que não reproduzam à esquerda muitas das políticas da direita? É esse o grande desafio da esquerda, na Europa, nos próximos anos.

domingo, março 28

Fogos

"Fogos de Viseu e Aveiro em fase de rescaldo"

"O primeiro grande incêndio deste ano no país, que lavrou ontem nos distritos de Viseu e Aveiro, entrou esta noite em fase de rescaldo e vigilância, informou hoje o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil (SNBPC)."

Uma notícia banal? Em que mês estamos nós? Agosto? Maio? Em que mês estamos nós? Que lições se retiraram dos incêndios do ano passado? A notícia é dada a "seco"! Ninguém questiona o acontecimento. O Governo não explica! A comunicação social não questiona! Estamos mortos?

sábado, março 27

Patriotas!

"Soponata vendida à General Maritime por 340 milhões euros"

"O Grupo José de Mello acordou hoje (sexta-feira) a venda da transportadora marítima Soponata aos norte-americanos da General Maritime (GM) por 415 milhões de dólares (340 milhões de euros), revelou à Lusa fonte ligada ao processo.

A mesma fonte adianta que as negociações foram fechadas esta madrugada, adquirindo a GM cinco navios da empresa portuguesa especializada no transporte de produtos petrolíferos.

O negócio vai ser concluído até Maio deste ano e os norte- americanos ficam também com quatro contratos de construção de navios e a equipa de gestão técnica da Soponata."


A General Maritime compra cinco navios de transporte de petróleo e fica com quatro contratos de construção de novos navios."

Uma notícia banal? O patriotismo económico dos nossos industriais é uma lenda. Eles vendem tudo, eles vendem tudo e não deixam nada! Viva o Compromisso Portugal!

sexta-feira, março 26

LA CASADA INFIEL


Y yo que me la lleve al río
creyendo que era mozuela,
pero tenía marido.

Fue la noche de Santiago
y casi por compromiso.
Se apagaron los faroles
y se encendieron los grillos.
En las últimas esquinas
toque sus pechos dormidos,
y se me abrieron de pronto
como ramos de jacintos.
El almidón de su enagua
me sonaba en el oído
como una pieza de seda
rasgada por diez cuchillos.

Sin luz de plata en sus copas
los árboles han crecido
y un horizonte de perros
ladra muy lejos del río.

*

Pasadas las zarzamoras,
los juncos y los espinos,
bajo su mata de pelo
hice un hoyo sobre el limo.
Yo me quité la corbata.
Ella se quito el vestido.
Yo, el cinturón con revólver.
Ella, sus cuatro corpiños.
Ni nardos ni caracolas
tienen el cutis tan fino,
ni los cristales con luna
relumbran con ese brillo.

Sus muslos se me escapaban
como peces sorprendidos,
la mitad llenos de lumbre,
la mitad llenos de frío.
Aquella noche corrí
el mejor de los caminos,
montado en potra de nácar
sin bridas y sin estribos.

No quiero decir, por hombre,
las cosas que ella me dijo.
La luz del entendimiento
me hace ser muy comedido.
Sucia de besos y arena,
yo me la llevé del río.
Con el aire se batían
las espadas de los lirios.

*

Me porté como quien soy.
Como un gitano legítimo.
Le regalé un costurero
grande, de raso pajizo,
y no quise enamorarme
porque teniendo marido
me dijo que era mozuela
cuando la llevaba al río.


Federico García Lorca

Antología Poética (Romancero Gitano)
Selección de Guillermo de la Torre y Rafael Alberti.
Editorial Losada, Buenos Aires 1980

Um livro de Lorca (IV)

Neste último excerto, José Viale Moutinho, no texto de apresentação do livro de Federico García Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS", conclui:

Recomendando-lhes uma visita à casa natal de Federico García Lorca em Fuentevaqueros, nos arredores de Granada, recordo-lhes também a leitura do seu livrinho "Seis Poemas Galegos", que ele escreveu como reflexo das duas vezes que esteve na Galiza. Este livro foi publicado por Anxel Casal, editor e que foi o último alcaide republicano de Santiago de Compostela.

Quis a sorte que Lorca e o seu editor galego fossem assassinados no mesmo dia, eles e centenas, milhares de outros republicanos espanhóis. E foram mortos apenas porque eram gente de bem, homens para quem a II República constituía um instrumento para construir a felicidade dos seus povos.

Um dia pude deixar um cravo na campa de Anxel Casal, porém, como disse, não se sabe onde efectivamente se encontram os restos mortais de Federico García Lorca, os restos deles e de uns quantos que no mesmo dia, à mesma hora e no mesmo secreto sítio, foram abatidos pela sanha dos fascistas incondicionais de Queipo de Llano, esbirro sinistro do tenebroso Franco que se fez enterrar no monumento Valle de los Caídos, arredores de Madrid, uma construção onde foi utilizado o trabalho escravo de republicanos condenados à miséria.

Para que conste."

José Viale Moutinho: excerto da apresentação do livro ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS, de Federico Garcia Lorca, editado pelo Sector Intelectual da DORP do PCP, Auditório da Junta de Freguesia de Massarelos.


Obrigada!

O Público assegura que o governo garante que as "Comemorações do 25 de Abril não vão substituir a diversidade ideológica"

Por outro lado vejo na Lusa uma referência ao Diário de Notícias:" Sondagem apresenta socialistas perto da maioria absoluta e PSD em queda.
Os socialistas estão à beira da maioria absoluta, com 43,9% das intenções de voto, de acordo com uma sondagem divulgada sexta-feira pelo Diário de Notícias que aponta ainda para uma quebra no PSD (34,9%).Em relação às intenções de Fevereiro, em Março o PS subiu 1,7% e o PSD desceu 3,8%. Se as eleições legislativas de 2006 fossem hoje, o CDS-PP subia 1,5%, para 3,8%, o PCP alcançaria 6,9% dos votos e o Bloco de Esquerda 5,7%."

Aparentemente o governo não tem razões para ficar preocupado porque a diversidade ideológica está assegurada. De qualquer maneira obrigada pelos cuidados!



25 de Abril - notas pessoais

António Santos Júnior


No movimento operário de base destacou-se, emergindo das lutas da TAP, que antecederam o 25 de Abril, António Santos Júnior. Ele liderou um movimento de novo tipo, associando as reivindicações tradicionais do operariado urbano com os novos desígnios da participação do movimento operário na acção política.

É um admirável homem de acção e de organização, persuasivo e generoso. Aliás Santos Júnior deveria ter discursado na grande manifestação, em Lisboa, do 1º de Maio de 1974, em representação do MES, mas tal objectivo foi impedido pela aliança PCP-PS.

Foi nessa manifestação que surgiu, pela primeira vez, em público a sigla MES inscrita num pano onde se podia ler "Movimento de Esquerda Socialista - em organização".

Outros dois destacados activistas do movimento operário e sindical, com relevante participação no MES, foram Manuel Lopes (sindicalista que aderiu à CGTP, já falecido) e o ideólogo das lutas da TAP, Jerónimo Franco.

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quinta-feira, março 25

LLANTO POR IGNACIO SÁNCHEZ MEJÍAS (1935)


La cogida y la muerte

A las cinco de la tarde.
Eran las cinco en punto de la tarde.
Un niño trajo la blanca sábana
a las cinco de la tarde.
Una espuerta de cal ya prevenida
a las cinco de la tarde.
Lo demás era muerte y sólo muerte
a las cinco de la tarde.

El viento se llevó los algodones
a las cinco de la tarde.
Y el óxido sembró cristal y níquel
a las cinco de la tarde.
Ya luchan la paloma y el leopardo
a las cinco de la tarde.
Y un muslo con un asta desolada
a las cinco de la tarde.
Comenzaron los sones del bordón
a las cinco de la tarde.
Las campanas de arsénico y el humo
a las cinco de la tarde.
En las esquinas grupos de silencio
a las cinco de la tarde.
¡ Y el toro solo corazón arriba !
a las cinco de la tarde.
Cuando el sudor de nieve fue llegando
a las cinco de la tarde,
cuando la plaza se cubrió de yodo
a las cinco de la tarde,
la muerte puso huevos en la herida
a las cinco de la tarde.
A las cinco de la tarde.
A las cinco en punto de la tarde.

Un ataúd con ruedas es la cama
a las cinco de la tarde.
Huesos y flautas suenan en su oído
a las cinco de la tarde.
El toro ya mugía por su frente
a las cinco de la tarde.
El cuarto se irisaba de agonía
a las cinco de la tarde.
A lo lejos ya viene la gangrena
a las cinco de la tarde.
Trompa de lirio por las verdes ingles
a las cinco de la tarde.
Las heridas quemaban como soles
a las cinco de la tarde,
y el gentío rompía las ventanas
a las cinco de la tarde.
A las cinco de la tarde.
¡ Ay qué terribles cinco de la tarde !
¡ Eran las cinco en todos los relojes !
¡ Eran las cinco en sombra de la tarde !

Federico García Lorca

Um livro de Lorca (III)

Neste terceiro excerto, José Viale Moutinho, no texto de apresentação do livro de Federico García Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS", afirma:

"Ora queria ainda falar-lhes de outra coisa, de algo tão idiota como o propalado apoliticismo de Federico Garcia Lorca. Ian Gibson, seu biógrafo mais atento, nas vésperas de apresentar uma reedição da sua obra "El asesinato de Garcia Lorca", creio que em finais dos anos 70 do século passado, ainda nas provas desse livro mostrou-me documentos que me surpreenderam porque revelavam um Lorca a intervir directa e politicamente.

Eu conhecia alguma correspondência sua a Teixeira de Pascoais, tanto mais que era amigo do sobrinho, o pintor João Teixeira de Vasconcelos.

Porém uma notícia intitulada Comité de Amigos de Portugal, editada no "El Socialista", de 6 de Maio de 35, dava nota da recente constituição de um Comité de Amigos de Portugal "que se propunha popularizar em Espanha os métodos brutais de repressão da ditadura fascista de Salazar em Portugal, organizando uma campanha de protesto entre as massas populares espanholas, assim como a ajuda em todas as suas formas às vítimas do fascismo português".

Entre outros, integravam o comité Ramón J. Sender, Rafael de Olmo, Victoria Kent, Pasionaria, Teresa Leon, Ortega y Gasset e Federico Garcia Lorca. O segundo documento a que me queria referir data de 4 de Julho de 1936 e é considerado como o último que ele assinou, pois foi fuzilado em 19 de Agosto seguinte.

É uma carta aberta do referido comité a Salazar formulando "um enérgico protesto em nome dos direitos e sentimentos que constituem a conquista mais apreciada da civilização: o direito e a liberdade de análise e de crítica e o sentimento de defesa e amparo da dignidade humana." diz depois a mensagem: "calam os escritores e os homens de pensamento em Portugal que não podem iludir a coacção brutal das suas armas, Sr. Salazar. Mas outros portugueses fazem a partir de fora do seu país a melhor homenagem ao seu próprio patriotismo e à sua cidadania, chamando a nossa consciência e a de todos os homens livres do mundo a favor dos lares portugueses desfeitos, dos milhares de concidadãos presos em condições desumanas, de centenas de homens inermes, cujo martírio se renova cada dia, e de milhões de seres humanos, a grande massa do povo português, que você procura envilecer na escravidão e na miséria".

Com Lorca, assinam este documento Largo Caballero, Ramón J, Sender, António Machado, Rafael Alberti, bem como milhares de outros antifascistas espanhóis."

(3 de 4 continua)

Um grito

"Senhor Aznar, é responsável pela morte do meu filho" gritou alguém na cerimónia fúnebre de Madrid.

Uma mãe disse, num telefonema, á rádio SER: "Não me sinto capaz de estar face a face com Aznar, Power e Blair, o meu filho colou um cartaz contra a guerra na janela do seu quarto." Daniel tinha 20 anos e morreu no atentado. Pilar, a mãe, não foi a Almudena. Como não foram os fiéis adventistas e muçulmanos, familiares de muitos mortos, por considerarem que a diferença da sua fé não foi respeitada". Vem no Público.

Espero que o Director do Público leia o Público de hoje como um simples cidadão. Um dia, de vez em quando, os directores dos órgãos de comunicação social deviam ser demitidos. No dia seguinte podiam retomar funções se provassem que tinham lido as suas próprias notícias e editoriais, do dia anterior, com os olhos de um vulgar cidadão.

E hoje leia também a entrevista de Saramago no Diário de Notícias. Os ideólogos da direita, de todos os matizes, têm de suportar aquilo que não gostam de ouvir. E, por favor, tenham contenção nas comparações com o nazi/fascismo. Assassinos há muitos e nem todos usam ostensivamente farda, religião ou ideologia ...basta serem fanáticos.

25 de Abril - notas pessoais

Agostinho Roseta


No movimento operário e sindical o activista mais importante do MES foi Agostinho Roseta, já falecido. Ele associava juventude (ou talvez melhor, jovialidade), capacidade teórica e sentido prático de organização, era persuasivo, sedutor e desprendido do poder.

Morreu num 9 de Maio, muitos anos depois do MES ter sido extinto, na plena pujança das suas qualidades humanas e intelectuais A sua morte prematura impediu que tivesse, muito provavelmente, exercido uma influência marcante, a partir de 1995, no movimento sindical (UGT) e no Partido Socialista.

Falar de pessoas é sempre muito delicado. Mas não é possível falar do 25 de Abril sem referir o papel daqueles que foram decisivos na nossa própria formação pessoal e na conformação do nosso percurso político. Sempre que hajam referências pessoais cingir-me-ei às personalidades que, no meu ponto de vista, foram as mais relevantes.

Farei referência a um número restrito de pessoas pois, dessa forma, reduzo os riscos de ser injusto ou mal interpretado. Além do mais o MES foi uma escola de quadros políticos que ocupam, e continuarão a ocupar, no futuro próximo, posições de grande destaque na vida pública portuguesa.

Julgo que isso se deve ao facto, incontroverso, de se terem reunido no MES, na volúptia política dos anos 70, um escol de quadros de grande qualidade humana e intelectual que, discretamente, se orgulham do seu passado de empenhamento cívico e político.

(9 de 32 continua)

quarta-feira, março 24

Romance Sonambulo


Verde que te quiero verde.
Verde viento. Verdes ramas.
El barco sobre la mar
y el caballo en la montaña.
Con la sombra en la cintura
ella sueña en su baranda,
verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Verde que te quiero verde.
Bajo la luna gitana,
las cosas la están mirando
y ella no puede mirarlas.

Verde que te quiero verde.
Grandes estrellas de escarcha,
vienen con el pez de sombra
que abre el camino del alba.
La higuera frota su viento
con la lija de sus ramas,
y el monte, gato garduño,
eriza sus pitas agrias.
¿Pero quién vendrá? ¿Y por dónde?
Ella sigue en su baranda,
verde carne, pelo verde,
soñando en la mar amarga.

-Compadre, quiero cambiar
mi caballo por su casa,
mi montura por su espejo,
mi cuchillo por su manta.
Compadre, vengo sangrando,
desde los puertos de Cabra.
-Si yo pudiera, mocito,
este trato se cerraba.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
-Compadre, quiero morir,
decentemente en mi cama.
De acero, si.puede ser,
con las sábanas de holanda.
¿No ves la herida que tengo
desde el pecho a la garganta?
-Trescientas rosas morenas
lleva tu pechera blanca.
Tu sangre rezuma y huele
alrededor de tu faja.
Pero yo ya no soy yo,
ni mi casa es ya mi casa.
-Dejadme subir al menos
hasta las altas barandas,
dejadme subir!, dejadme
hasta las verdes barandas.
Barandales de la luna
por donde retumba el agua.

Ya suben los doscompadres
hacia las altas barandas.
Dejando un rastro de sangre.
Dejando un rastro de lágrimas.
Temblaban en los tejados
farolillos de hojalata.
Mil panderos de cristal
herían la madrugada.

Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
Los dos compadres subieron.
El largo viento dejaba
en la boca un raro gusto
de hiel, de menta y de albahaca.
-¡Compadre! ¿Dónde está, dime?
¿Dónde está tu niña amarga?
¡Cuántas veces te esperó!
¡Cuántas veces te esperara,
cara fresca, negro pelo,
en esta verde baranda!

Sobre el rostro del aljibe
se mecía la gitana.
Verde carne, pelo verde,
con ojos de fría plata.
Un carámbano de luna
la sostiene sobre el agua.
La noche se puso íntima
como una pequeña plaza.
Guardias civiles borrachos
en la puerta golpeaban.
Verde que te quiero verde,
verde viento, verdes ramas.
El barco sobre la mar.
Y el caballo en la montaña.

Federico García Lorca

(Há uma magnífica tradução em português
deste poema de autoria de
Eugénio de Andrade em "Trinta
e Seis Poemas e Uma Aleluia Erótica",
Editorial Inova, 1968)

Federico García Lorca

Federico García Lorca fue un poeta, en el sentido más determinante y profundo que puede tener esta afirmación. Fue un poeta porque la poesía condicionó toda su vida e incluso su misma muerte: de no ser el escritor triunfante que era y la criatura radicalmente libre que la poesía le enseñó a ser, es probable que la barbarie no lo hubiera asesinado. Él lo dijo en una ocasión: "...yo no como, ni bebo, ni entiendo más que en la Poesía".

Su poesía fue, en efecto, su médula y su raíz, su supremo y cotidiano alimento terrestre. Lejos de toda torre de marfil, para él ser poeta era ante todo ser fiel a la voz de la muerte, a la voz del arte, a la voz del amor: las tres voces que escuchaba el poeta, según reclamó. La voz de la muerte, "con todos sus presagios" llamaba al canto exasperado y agudo de la vida; la voz del arte decía la superior verdad de las formas, el equilibrio cenital en el que la palabra del poeta se llena de sentido y trasciende el tiempo, sin dejar de ser tiempo, la voz del amor hacía llamear la plenitud de los cuerpos y las almas, la belleza divina de la creación. Nunca hubo en él oposición entre poesía y vida. Por eso hablaba de "la inmensa alegría consciente de crear".

Porque la poesía no era una huida del mundo; bien al contrario, representaba la inmersión en el mundo.

(De la monografía de Miguel García-Posada en la Agenda Cultural 1998)

Um livro de Lorca (II)

Continuando, José Viale Moutinho, no texto de apresentação do livro de Federico García Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS", afirma:

"Ora em Setembro de 1931, cinco meses já desde que Manuel Azaña, outro grande escritor da língua castelhana, tivesse tomado posse como primeiro presidente da II República de Espanha, Lorca, com 33 anos, está em Fuentevaqueros, num acto público.

Folheando as actas municipais nota-se uma actividade vertiginosa. O ministro Fernando de los Rios, primeiro-ministro da Justiça da jovem Republica, é distinguido com o título de "filho adoptivo de Fuentevaqueros". Militante do Partido Socialista Operário, com os seus camaradas Indalecio Prieto e Largo Caballero formavam a ala esquerda do Governo Provisório.

A 9 de Maio, Fuentevaqueros pede a abolição da pena de morte no Estado Espanhol e a expulsão das ordens religiosas, que controlavam grande parte da economia espanhola. Por outro lado, na natural mudança das placas toponímicas, foi deliberado que a Rua da Igreja passaria a chamar-se Rua de Federico García Lorca, que ele agradece nesta alocução.

E verdade é que a sugestão de 1929, a da biblioteca popular, transformara-se, entretanto, em obra prioritária da autarquia republicana em 1931. E isso entusiasmava Federico. Conta o irmão Francisco que este discurso foi pronunciado a coberto do sol por uns toldos, rodeado por balancés e barracas de tiro ao alvo da feira de Fuentevaqueros, estando mudos os músicos enquanto Lorca falava. Informa-nos ainda que o produto daquela festa, que metia bailes e verbenas se destinava à biblioteca popular e que a organização era da Juventude Socialista.

Ora esta segunda alocução não a percam, não deixem de a ler, leiam-na em voz alta, aos vossos amigos, aos vossos filhos, que terão gosto em sentir tão maravilhosamente a história do livro, dos livros de pedra aos livros de papel.

Quando conheci este texto, vindo do entusiasmo do Francisco Duarte Mangas, também me empolguei porque, raio de feitio, também acho que um discurso como este vale tanto como As filhas de Bernarda Alba ou qualquer poema. Apesar de ser um texto pequeno, que escapou aos lorquianos até meio século depois da morte do seu autor."

(Foi introduzida uma correcção necessária a um erro de minha responsabilidade:
o nome do poeta é: Federico García Lorca.)

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25 de Abril - notas pessoais

Independentes e rebeldes


A nossa visão do papel da luta operária e do movimento sindical era muito diferente da perspectiva do PCP. Defendíamos a "auto organização" dos trabalhadores e a emancipação do movimento sindical fora do controle político partidário do PCP ou de qualquer outra formação partidária.

A raiz da nossa concepção da organização operária e sindical bebia da tradição anarco-sindicalista e dos ideais auto-gestionários. As diferenças entre as nossas concepções da vida, da luta de emancipação dos trabalhadores e da organização do Estado, tornaria muito difícil qualquer tentação de aliança estratégica com o PCP e, por maioria de razão, tornava-nos imunes a ser absorvidos pela sua reconhecida vocação hegemónica.

No MES confluíram quadros intelectuais e operários cujos destinos pessoais não eram compatíveis com a submissão a qualquer autoridade. Éramos (e somos!) ferozmente independentes e rebeldes.

Por isso não admira que o MES tenha sido o único Partido, criado na aurora do 25 de Abril, que se extinguiu, por vontade da maioria dos seus militantes, com uma festa.

Nem sequer admira que sejam raros os ex-activistas do MES que tenham, algum dia, aderido ao PCP, ou às teses neoconservadoras, ao contrário do que aconteceu com muitos ex-activistas dos movimentos políticos marxistas-leninistas que se reivindicavam do maoismo.

Anti-autoritários e de esquerda toda a vida...

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terça-feira, março 23

Um livro de Lorca (I)

O José Viale Moutinho enviou-me, gentilmente, o texto de uma sua apresentação de um livro de Frederico Garcia Lorca intitulado: "ALOCUÇÃO AO POVO DA ALDEIA DE FUENTEVAQUEROS".

O assunto interessa-me, não só pelo autor, e sua obra, como pelo enquadramento político no qual laborou, pelo que decidi divulgar, apesar da sua extensão, em quatro posts, uns excertos deste trabalho de JVM. As escolhas dos excertos são de minha responsabilidade assim como algumas pequenas correcções, de detalhe, ao texto que o autor não levará a mal tenham sido efectuadas e que está sempre a tempo de corrigir.


"Este texto de Lorca devemo-lo ao poeta andaluz, naturalmente, mas a sua descoberta entre nós, ou para nós, é honra e glória de um excelente escritor e jornalista, (…) que, um dia, vai para uns quinze anos, fazendo a ronda das livrarias madrilenas, o Francisco Duarte Mangas, que é dele que falo, encontrou um pequeno livro, aliás numa edição muito bonita de Alocución al pueblo de Fuentevaqueros, combinando o nome de Lorca, que ele já admirava, à surpresa de um seu título novo, titulo este que tinha a bondade dessa maravilhosa expressão "Alocução ao Povo", povo este que era Fuentevaqueros, topónimo arvoradamente rural, tão ao seu gosto.

Pois abriu-o, viu referência a biblioteca popular, naquela aldeia, enfim tudo apelava a que o comprasse. (…)

Então, começamos por saber que Fuentevaqueros é a aldeia natal de Frederico Garcia Lorca. A 21 de Maio de 1929, quando, com retumbante êxito, era representada em Granada a peça de Lorca "Mariana Pineda", a população dos patrícios do poeta decidiu oferecer-lhe um jantar de homenagem.

O alcaide de Fuentevaqueros, Rafael Sánchez, em nome da terra saudou o poeta, seguindo outros dois entusiásticos oradores. Respondeu-lhe Lorca num pequeno texto, que foi publicado apenas num jornal granadino na época e, em 1994, no primeiro tomo das prosas do escritor, reunidas e anotadas por Miguel Garcia-Posada.

Dado que está este texto relacionado com o que aqui se apresenta em volume, entendo traduzi-lo no que se conhece em discurso directo.

É que o jornalista que fez a notícia resumiu a entrada do discurso de Lorca dizendo que "o senhor Garcia Lorca agradeceu a oferta desta homenagem, fazendo um brilhante elogio de Fuentevaqueros. E acrescentou já pela pena do poeta:

E já que estamos juntos, não quero deixar de elogiar a vossa maravilhosa fonte de água fresca. A fonte de água é um dos motivos que mais definem a personalidade desta aldeiazinha. As aldeias que não têm fonte pública são insociáveis, tímidas, apoucadas.

A fonte é o sítio de reunião, o ponto onde convergem todos os vizinhos e onde trocam impressões e arejam os espíritos. A propósito da fonte falam as mulheres, encontram-se os homens, e à beira da água cristalina crescem os seus espíritos e aprendem, não só a amarem-se, como a compreender-se melhor.

A aldeia sem fonte está fechada, como que escurecida, e cada casa é um mundo aparte que se defende do vizinho.
Fonte se chama esta aldeia, fonte que tem o seu coração na fonte da água benfazeja.

Diz a notícia que transcreve esta primeira alocução de Lorca na sua terra, que o orador foi ovacionado. Prossegue a notícia dizendo que Ricardo Rodríguez Garcia leu uma "formosa poesia", também aplaudida, tendo ainda falado Fernando de los Rios e Miguel Molinero.

E diz ainda o anónimo repórter que o alcaide Rafael Sánchez, dando execução a uma proposta de Lorca para criar naquela autarquia uma biblioteca popular ofereceu trezentos livros da sua propriedade. Reparem que isto acontece no penúltimo ano do reinado de Alfonso XIII, um ano e um mês antes de implantada a II República de Espanha.

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25 de Abril - notas pessoais

O PCP


Ao longo da década de 60 travaram-se duras lutas contra a ditadura. Nessas lutas surgiram novas ideias e novos protagonistas. O PCP tinha estratégia e táctica alicerçadas numa apreciável implantação popular, embora circunscrita ás zonas operárias e rurais do sul. A sua organização clandestina era experimentada tendo mesmo, nas vésperas do 25 de Abril, criado a ARA, organização vocacionada para a luta armada.

O MES nunca aderiu à luta armada embora chegasse a desfrutar de uma razoável implantação nas Forças Armadas. Mas participou em organizações de natureza frentista, vocacionadas para a luta política legal, animadas pelo PCP, a mais importante das quais foi, antes do 25 de Abril, o MDP/CDE e, no período pós-25 de Abril, a "coligação", contra o PCP, apoiante da candidatura presidencial de Otelo, em 1976.

Participei, entre muitas outras iniciativas, com o Víctor Wengorovius, no início da década de 70, em diversas reuniões, numa casa da Av. Duque de Loulé, em Lisboa, com um alto dirigente do PCP, na clandestinidade, para tentar encontrar os caminhos de uma coordenação política entre o embrionário MES e o PCP.

É preciso ter presente que naquela época ninguém pensava ou agia, na oposição política portuguesa, escapando à influência do PCP.

(7 de 32 continua)

segunda-feira, março 22

Guerra à vista?

Parece que vivemos num tempo de assassinos. Um tempo de fanatismo. De todas as cores e credos. A propósito dos acontecimentos, de hoje, na Palestina lembrei-me de uma frase que Albert Camus escreveu no seu Caderno, em plena 2ª Guerra Mundial:

"1 de Setembro de 1943.
Aquele que desespera dos acontecimentos é um cobarde, mas aquele que tem esperança na condição humana é um louco."


Livro incómodo para George W. Bush

Uma notícia da SIC On Line


"Presidente dos EUA tem feito um "péssimo trabalho" na luta contra o terror, revela Clarke

O antigo assessor para as questões de segurança dos EUA, Richard Clarke, veio dizer que George W. Bush não tem lidado da melhor forma com o terrorismo, que ignorou as ameaças da Al-Qaeda antes do 11 de Setembro e que Bush queria ligar Saddam Hussein aos ataques de 2001. Críticas no dia em que é publicado o livro de Clarke "Contra Todos os Inimigos".

A polémica lançada com a publicação do livro de Richard A. Clarke (esta segunda-feira) vem na pior altura para George W. Bush dada a caminhada para as presidenciais de 2 de Novembro deste ano.

Neste livro "Against All Enemies" (Contra Todos os Inimigos), o antigo assessor para as questões de segurança propõe-se contar "a verdade" sobre a guerra ao terror levada a cabo pela Administração Bush. E, de acordo com Richard A. Clarke - que durante 11 anos fez parte do núcleo duro da Casa Branca para a prevenção do terrorismo - a resposta que o actual Presidente dos Estados Unidos tem vindo a dar é "terrível".

Em entrevista à rede de televisão norte-americana CBS, Clarke afirma que Bush ignorou as ameaças da Al-Qaeda antes do 11 de Setembro de 2001, não soube lidar com o terrorismo e revela que, no dia seguinte aos ataques, o líder norte-americano queria, por força, que fossem encontradas ligações entre os atentados terroristas e Saddam Hussein, quando elas não existiam.

- "Revejam tudo, tudo. Vejam se Saddam fez isto
- Mas, senhor Presidente, foi a Al-Qaeda que fez isto
- Eu sei, eu sei, mas... vê se Saddam está envolvido. Procura. Eu quero alguma prova"

Este é um excerto de uma alegada conversa entre George W. Bush e Richard Clarke na noite de 12 de Setembro de 2001 e que vem publicada no livro que hoje chega às livrarias dos Estados Unidos. Mesmo com todos os responsáveis pela segurança a afirmar que os atentados eram da responsabilidade da organização de Bin Laden, o Presidente norte-americano queria mostrar que o então líder iraquiano também estava envolvido.

Em declarações à CBS, Clarke adiantou ainda que no dia a seguir aos atentados, o secretário norte-americano da Defesa, Donald Rumsfeld apelou a ataques de retaliação no Iraque, mesmo sabendo que a Al-Qaeda estava sediada no Afeganistão.

Richard Clarke - assessor para as questões de segurança até Fevereiro de 2003 - diz ter ficado tão espantado que pensou, inicialmente, tratar-se de uma brincadeira.

Em relação à conselheira para a Segurança Nacional, Clarke conta que Condoleezza Rice mostrou-se "céptica" quando foi avisada, no início de 2001, para a ameaça que a Al-Qaeda constituía e pareceu-lhe que ela nunca devia ter ouvido falar naquela organização terrorista.

Clarke critica ainda a resposta dada por Bush aos atentados terroristas de Nova Iorque e Washington e diz ser "revoltante" que o combate ao terrorismo seja uma das bandeiras da campanha eleitoral de Bush, quando ele não soube lidar com o assunto desde o início.

A Casa Branca nega as acusações contra o Presidente e adianta que Richard Clarke entendeu as coisas "de forma errada". A mesma fonte sugere que as alegações de Clarke têm uma motivação política. Ou seja, pretendem prejudicar George W. Bush- que procura a reeleição.

No entanto, Clarke é uma figura respeitada no meio e as suas afirmações, provavelmente, irão causar algum constrangimento à Casa Branca."

Ainda esta semana, o antigo assessor para as questões de segurança será interrogado pela comissão independente que investiga dos atentados de 11 de Setembro.












25 de Abril - notas pessoais


O MES (Movimento de Esquerda Socialista)


Em 1971 o país ainda vivia na esperança de uma solução política para a crise do Estado Novo. Sabíamos que o futuro não podia esperar muito mais. Mas não sabíamos quanto iria ainda durar a ditadura apesar das timoratas tentativas de abertura política de Marcelo Caetano.

O MES (Movimento de Esquerda Socialista) nasceu da confluência de três movimentos que despontaram e ganharam corpo ao longo das décadas de 60 e 70. O movimento operário e sindical, o movimento católico progressista e o movimento estudantil.

A cumplicidade entre um numeroso grupo de activistas que actuavam, com autonomia, contra o regime, nestes diversos movimentos sectoriais, foi sendo reconhecida por alguns de nós o que, a certa altura, desembocou na consciência de que estávamos perante um movimento político informal. Daí até à ideia da sua institucionalização foi um pequeno passo.

Lembro sempre entre os esquecidos criadores do movimento o designer Robin Fior, um estrangeiro em Lisboa. Foi ele que desenhou o símbolo do MES o único, adoptado pelos partidos portugueses, com uma declarada feição feminil; Robin foi também o autor da linha gráfica do jornal "Esquerda Socialista" e concebeu um conjunto de cartazes surpreendentes pela sua ousada modernidade. Quantas horas passadas na sua companhia, e de sua mulher, desenhando uma imagem que ficou gravada, para sempre, na minha memória. Admirável Robin...

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domingo, março 21

Justiça

Juíza pode mandar repetir todos os actos de Rui teixeira

O "Jornal de Notícias" coloca este titulo na sua edição de hoje que vi na versão on line. A leitura da notícia é muito útil para entender o processo. Muito pedagógico nas vésperas do início da chamada instrução.

DIA MUNDIAL DA POESIA

Os dias evocativos valem o que valem. Mas está bem de ver que a poesia marca um espaço relevante no meu espírito e ocupa uma boa parte do meu tempo livre. Resolvi, aquando da criação deste blogue, nele não publicar senão poesia de outros. E, entre todos os poetas portugueses, vivos ou mortos, o meu preferido é Jorge de Sena. Assim não admira que, neste dia, tenha escolhido publicar um dos poemas mais extraordinários de sua autoria e da poesia portuguesa de todos os tempos.


UMA PEQUENINA LUZ


Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una piccola ... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta
que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indefectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não iluminam também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui.
no meio de nós.
Brilha.

1950

Jorge de Sena
In Fidelidade (1958)


Ópera "Os fugitivos"


Fui ver "Os Fugitivos" uma ópera original criada por portugueses e falada em português. Quantas vezes na história recente da nossa cultura foi construída uma ópera por encomenda de uma qualquer entidade? Poucas. Raramente e quase sempre só a propósito de grandes eventos nacionais.

Mas esta foi uma encomenda resultante de um projecto de teatro musical e popular que o Teatro da Trindade, através da iniciativa do seu director, Carlos Fragateiro, concebeu e que o INATEL, em tempo oportuno, sob a minha direcção, aprovou.

É um caso exemplar da "pesada herança" socialista assumida, neste caso, pela actual direcção do INATEL. Ainda bem, pois demonstra bom senso e bom gosto. Vamos a ver as cenas dos próximos capítulos…

Gostei da Ópera. Contemporânea. Aderindo aos problemas do nosso tempo. Aberta ao quotidiano. Estruturada e surpreendente nos planos musical e cenográfico. Sem o aparato das grandes óperas de reportório. Mais na linha da "Ópera de Estúdio". Irreverente e criativa. Com alguns bons interpretes. Uma verdadeira lição de como se pode produzir um espectáculo de qualidade com um pequeno orçamento. Muitos apreciadores do género gostariam de ter participado neste aventura. Tive a felicidade de ter participado e tenho muito orgulho nisso. Obra limpa e séria.

Esta Ópera vai ser gravada pela RTP, ao contrário do que aconteceu com o musical "O Navio dos Rebeldes", o que foi uma pena e uma perda. Estes registos são importantes não só para a história como para a divulgação de obras originais que são produzidas à margem dos teatros nacionais....que, aliás, produzem muito pouco.

sábado, março 20

Setembro de 1941

Albert Camus escreveu no seu Caderno, em Setembro de 1941, uma frase cheia de actualidade:

"Organiza-se tudo: É simples e evidente. Mas o sofrimento humano intervém e altera todos os planos"

"In Caderno n.º 3 - Abril de 1939/Fevereiro de 1942"

Parapente em Linhares acabou?



A notícia de que a Escola de Parapente, dirigida por Vítor Baía, vai abandonar a Aldeia Histórica de Linhares da Beira e passar a funcionar em Manteigas é uma realidade.

A imprensa regional
tinha dado relevo a essa possibilidade.


O INATEL promete manter a actividade do parapente em Linhares mas não parece muito convincente.

O Parapente e, em particular, o Open de Linhares da Beira, são uma realidade que representa muitos anos de trabalho sistemático e estruturado. É o desenvolvimento sustentável…na prática.

O Parapente em Linhares acabou?

(A partir de um alerta do Pedro Pedrosa)

sexta-feira, março 19

19 de Março de 1941

Neste dia Albert Camus escreveu no seu Caderno esta frase primaveril:

"Em cada ano, o florir das raparigas sobre as praias. Elas só têm uma estação. No ano seguinte, são substituídas por outros rostos de flores que, na estação maior, ainda eram garotas. Para o homem que as contempla, são vagas anuais cujo peso e esplendor se derrama sobre a areia amarela."

"In Caderno n.º 3 - Abril de 1939/Fevereiro de 1942"

Aborto - uma lembrança

"O acto sexual é para fazer filhos"

Poema de Natália Correia
a João Morgado (CDS)

"O acto sexual é para ter filhos" - disse, com toda a boçalidade, o deputado do CDS, no debate de 1982, sobre a legalização do aborto. A resposta, em poema, fez rir todas as bancadas parlamentares. Veio da deputada Natália Correia:


Já que o coito - diz Morgado -
tem como fim cristalino,
preciso e imaculado
fazer menina ou menino;
e cada vez que o varão
sexual petisco manduca,
temos na procriação
prova de que houve truca-truca.
Sendo pai só de um rebento,
lógica é a conclusão
de que o viril instrumento
só usou - parca ração! -
uma vez. E se a função
faz o orgão - diz o ditado -
consumada essa excepção,
ficou capado o Morgado.

NATÁLIA CORREIA
Diário de Lisboa, 5 de Abril de 1982.

25 de abril - notas pessoais


O tempo das ilusões


Depois de concluída a especialidade fiquei a dar instrução militar, o tempo todo, no 2º GCAM, no Campo Grande, em Lisboa. Passaram-me pelas mãos muitas centenas de jovens soldados recrutas aos quais industriei, o melhor que sabia, na área da administração militar. Foram sucessivas "semanas de campo" e incessantes sessões de instrução de tiro na Carregueira. Estas davam-me um prazer especial com excepção do "lançamento de granadas".

Assim correu o tempo, desde meados de Abril de 1972, até ao 25 de Abril de 1974. A minha vida fazia-se entre o quartel e encontros de conspiração com os amigos e activistas que haveriam de confluir no MES (Movimento de Esquerda Socialista). Tinha a cabeça povoada de todas as ilusões que resultavam das leituras libertárias e marxistas, liberais e heróicas, sonhadoras e utópicas de Huxley, Camus, Gramsci, Luckac, Lenin, Marx, Rosa Luxemburgo, Mao, José Gomes Ferreira, Aquilino, António José Saraiva...

As ideias da democracia directa, das comunas, da plena participação popular, tinham-se sobreposto à realidade, bem mais prosaica, da democracia representativa. Os ecos próximos da experiência do Maio de 68, em França, tinha dado asas à utopia de que o caminho para a felicidade se poderia encontrar na revolta contra o poder burguês. O tempo das ilusões...

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quinta-feira, março 18

18 de Março de 1941

Neste dia Albert Camus escreveu, em plena 2ª Guerra Mundial, no seu Caderno: "Os montes por cima de Argel trasbordam de flores na primavera. O aroma a mel das flores derrama-se pelas ruazinhas. Enormes ciprestes negros deixam jorrar dos seus cumes reflexos de glicínias e de espinheiros cujo percurso se mantém dissimulado no interior. Um vento suave, o golfo imenso e plano. Um desejo forte e simples - e o absurdo de abandonar tudo isto.

"Santa Cruz e a subida através dos pinheiros. O alargamento contínuo do golfo até ao alto de onde a vista se perde sobre uma imensidade. Indiferença - e eu também tenho as minhas peregrinações."

In Caderno n.º 3 - Abril de 1939/Fevereiro de 1942

25 de Abril - notas pessoais

O serviço militar


A minha entrada para o serviço militar deu-se em 7 de Outubro de 1971. Passei à disponibilidade em 4 de Outubro de 1974. Cumpri 3 anos menos dois dia de serviço militar obrigatório. Apesar daquele incidente no dia 16 de Março a minha folha de serviços está impecávelmente limpa.

Como todos os futuros oficiais milicianos, nessa época, fui incorporado em Mafra. Lembro-me, com nitidez, do primeiro dia do serviço militar. Fui no autocarro da carreira com partida de Lisboa. À chegada a inspecção médica, o corte do bigode, pois já tinha antes cortado a barba que, ao longo da vida de adulto, sempre me tem acompanhado.

Seguiram-se três meses de dura instrução. Os meus companheiros mais próximos foram o José Pratas e Sousa e o Raúl Pinheiro Henriques. Na tropa faziam-se fortes amizades e cumpriam-se as regras estritas da instituição militar. Não me desgostou.

No fim da instrução seguiram-se três meses de "especialidade" cumpridos na EPAM, Lumiar, Lisboa. Por ironia do destino nunca fui mobilizado. A conjugação da classificação no curso com a abundância de oficiais do ramo da administração militar fizeram com que não fosse mobilizado para as colónias.

Fui desta forma poupado à decisão dramática que se colocava a muitos que, como eu, tinham assumido uma opção contra a guerra colonial: desertar ou embarcar. Pessoalmente, ainda bem que assim foi. Os meus pais foram poupados à angústia de ver um filho partir para longe de onde podia não mais regressar.

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quarta-feira, março 17

Música

As notícias acerca do volume de jovens que, em Portugal, abandonam precocemente a escola é preocupante. Sejam os valores apresentados pela UE (quase 50%), ou outros valores mais suaves, é uma situação de emergência nacional.

Não está em causa a estatística mas as vidas que se escondem por detrás da estatística. Os jovens, na maior parte dos casos, abandonam a escola por razões económicas no quadro de situações familiares à beira do limiar da sobrevivência.

Contrariar esta tendência é uma tarefa do Estado, quer dizer, da comunidade. O núcleo essencial para atacar o problema é a escola. A comunidade escolar conhece os problemas dos alunos, as suas dificuldades, as tensões que atravessam as suas vidas concretas.

O combate ao abandono da escola, antes do fim da escolaridade obrigatória, deveria ser considerado um grande desígnio nacional. Assim uma espécie de Euro 2004. Com prazos fatais. E obras emblemáticas. E figuras públicas reconhecidas envolvidas na promoção. Uma campanha a sério com objectivos quantificados e fiscalização da sua execução. Assim uma espécie da campanha, realizada anos atrás, para o uso do cinto de segurança nos automóveis.

Não sei se seremos capazes de planear a médio/longo prazo um projecto de reducção drástica desta hemorragia de recursos que representa o abandono escolar. Seria necessário muita clareza nas medidas e muita determinação e rigor nos procedimentos e nas acções a empreender para as tornar mobilizadoras para toda a comunidade nacional. Não se trata tanto de uma questão de recursos materiais mas de vontade política e de mobilização cívica.

Mas o futuro de Portugal depende de sermos capazes de pôr fim a esta situação anómala de muitas famílias e jovens encararem a escola como uma obrigação que se pode abandonar sem uma fortíssima penalização social. É um projecto que exige uma complexa engenharia de meios financeiros, materiais e humanos. Exige o fim das querelas e disputas entre as instituições que gerem os recursos destinados à formação profissional e à educação. A participação empenhada dos parceiros com papel no terreno: professores, funcionários, sindicatos, associações de pais, autarquias, etc.

Eis uma tarefa gigantesca que exige ambição e vontade de reforma autêntica. O título deste post - música - deve-se ao facto de o ter pensado, inicialmente, para dar notícia que o meu filho, de 13 anos, obteve a nota máxima em mais um teste de música. Uma trivialidade que serve para concluir que o sucesso do processo educativo não passa só pela boa prestação dos alunos nas áreas tradicionais em que assumem papel prepoderante as disciplinas de matemática e português. Atenção às artes, às ciências e ao ensino profissional.

Um debate nacional é urgente. Quem o promove?

ÓPERA

" Os Fugitivos" sobem ao palco do Teatro da Trindade que acolhe, esta quarta-feira, a estreia de "Os Fugitivos", uma ópera em português com libreto escrito por Rui Zink. As récitas vão até ao dia 04 de Abril. Com o objectivo declarado de fazer uma ópera acessível, José Eduardo Rocha e Rui Zink criaram, a convite do Teatro da Trindade, "Os Fugitivos".
Esta notícia tem um especial significado para mim. A ideia de assumir este projecto foi do Carlos Fragateiro, director do Teatro da Trindade, desde 1999. Raros são aqueles que sabem mas o TT é uma estrutura do INATEL.
Quem aprovou a produção desta ópera foi o INATEL quando eu exercia as funções de Presidente da Direcção. Uma ousadia e um risco num país de sacanas onde impera a inveja e a vil baixeza. Felizmente que ninguém foi capaz de atropelar os fugitivos. Este é certamente um espectáculo digno e de qualidade, realizado com poucos recursos.
Onde estão as óperas do Teatro S. Carlos? E o Teatro D. Maria, que é feito?

Aniversário

O Governo ficou, de súbito, muito preocupado com a ameaça terrorista no território português. Ou melhor ficou preocupado com a vitória do PSOE. Os socialistas espanhóis têm na própria sigla um sem número de horrores: PSOE - Partido Socialista Operário Espanhol. Socialista e Operário. Ao fim de dois anos o Governo português tem, certamente, razões para estar preocupado. Mas os portugueses podem ficar descansados. A retoma vem aí. Os Ministros da Administração Interna, da Defesa e da Justiça dão garantias de segurança e o Dr. Delgado, à frente da Lusa, dá garantias de verdade e isenção na informação. Além do mais Portugal não é a Espanha. Aqui quem está no Governo não é o PP, é o PSD. Já repararam?

Soneto VI


De mim não falo mais: não quero nada.
De Deus não falo: não tem outro abrigo.
Não falarei também do mundo antigo,
pois nasce e morre em cada madrugada.

Nem de existir, que é a vida atraiçoada,
para sentir o tempo andar comigo;
nem de viver, que é liberdade errada,
e foge todo o Amor quando o persigo.

Por mais justiça... -Ai quantos que eram novos
em vão a esperaram porque nunca a viram!
E a eternidade...Ó transfusão dos povos!

Não há verdade: o mundo não a esconde.
Tudo se vê: só se não sabe aonde.
Mortais ou imortais, todos mentiram.

Jorge de Sena
In Génesis - Coroa da Terra (1946)

25 de Abril - notas pessoais


Intolerável absurdo


O golpe militar foi a consequência inevitável do predomínio dos ultraconservadores na governação. O Estado Novo, na sua fase terminal, esmagou a "ala liberal" na qual, muitos de nós, tínhamos depositado esperanças de mudança. De facto o grande acontecimento político do século XX português, depois da implantação da República, em 1910, teria sido a transição pacífica da ditadura para a democracia.

Depois da morte política de Salazar o que terá passado pela mente de Marcelo Caetano? Porque não agiu? Por falta de coragem? Por falta de um verdadeira desígnio reformista? A razão de fundo para essa trágica omissão terá sido a política colonial que, desde o início dos anos 60, foi conduzida com o recurso à guerra, em desfavor da negociação com os movimentos de libertação. O regime foi conduzido a um beco sem saída. Os reformistas civis não foram capazes de forjar uma aliança consequente com os reformistas militares.

Ainda hoje está por explicar, por outro lado, o papel da diplomacia das potências ocidentais nesta estranha situação de arrastamento de uma crise que se havia declarado, a partir de 1958, aquando da fracassada candidatura presidencial do General Humberto Delgado. As diplomacias ocidentais, que certamente estavam bem informadas dos acontecimentos em Portugal mantiveram, salvo raras e honrosas excepções, uma plácida e comprometedora inércia, que nem o cruel assassinato de Humberto Delgado desbloqueou. Será possível que os EUA e as potências europeias tenham sido apanhadas desprevenidas pelo 25 de Abril?

Intolerável absurdo!

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Mudança

Hoje processou-se uma mudança na apresentação do absorto. Três meses depois de ter iniciado a sua participaçãp na blogosfera era tempo de encetar uma mudança de visual. Por outro lado o editor do absorto tinha programado assumir plenamente a sua autoria passada uma primeira fase experimental. Apesar da próxima criação de um blogue colectivo, no qual participarei, e que deverá ser apresentado por alturas do dia 25 de Abril, o absorto manter-se-à com autoria individual. As mudanças vão continuar porque acreditamos que, apesar de todas as resistências, enganos e mal entendidos, a internet é o futuro.
Eduardo Graça