quinta-feira, dezembro 30

Revisitação

No outro dia na visita de Natal aos lugares da minha infância desci o caminho do monte à estrada. Estava um frio de rachar no campo entre as árvores dos frutos secos. Revisitei a figueira, defronte ao poço, e encontrei-a, nesta época, descarnada.

Revisitaram-me as descrições impressivas dos campos da Argélia de Camus e a figueira gelada de René Char. Neste meu caminho nem havia gelo, nem sol escaldante. Senti frio, somente frio. Por ironia na partida do monte o velho vizinho despediu-se fechando o punho como sinal da esperança.

No tempo em que aquele caminho era, para mim, novidade percorri-o acompanhado pelos meus primos Gervásio e Ezequiel. Eles nasceram na casa velha lá no cimo do monte e nela cresceram e se fizeram homens. O Gervásio permanece fiel à terra e ao seu mester de agricultor. O Ezequiel morreu já homem maduro.

Eu sempre fui um jovem visitante urbano ao qual "os primos do campo" lançavam ousados desafios aos meus pudores sexuais. Corava e mudava de conversa tanto quanto me deixavam as suas insistências.

Hoje nenhum primo desafia o meu filho que desce o caminho esperançoso a meu lado. Ele opina que devia levantar-se aquele telhado ... arranjar-se a “charrete” abandonada ... cuidar dos pormenores mais descuidados. Tem razão. Mas se o campo morreu deixado ao abandono pela maioria dos homens nele nascidos como dar-lhe esperanças de um novo dia.

Rumamos à cidade. Com a certeza de que as figueiras, agora descarnadas, resistem e, apesar de nós, no próximo verão, darão frutos suculentos.

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