Fotografia de Angèle
Hesita a mão, a voz, o pensamento;
Vacila o querer, o próprio desejar
Nem sequer exprime o lamento
De às cegas algo procurar.
Se preciso paz, desejo guerra;
Dão-me batalha, tréguas peço;
Vendo certo que meu pensar erra
Calculo em zero o erro que meço.
Que vejo em volta sempre julgo estranho,
Admiro muito, e maravilhado,
Mas avassala-me o enorme tamanho
Da podridão do mundo afogado
Em busca de terrena vã fortuna:
Ri-se de mim a vida inoportuna.
Até agora o que fiz
Em tempos mais descuidados?
Livrinhos que por um triz
Não ficaram embrulhados
Na papelada que jaz
Pela casa baralhada
Onde só descansa em paz
Essa mesma papelada.
Mais mil linhas de escrituras
Que valem mais do que nada:
O que sobra às criaturas
Depois de bem depenada
A invenção que tiveram,
Quando meiada par´cer
Vida que de ter houverem
Conta bem pouco avondada.
Dos trigais orlados de olivedo
Aos imbondeiros para além do mar,
Do jardim das donas e seu lago ledo,
Ao charco dos jacarés a atravessar
Da Estrela às serras onde nasce o Nilo
Arderam meus pés na força da sazão.
O que havia de fazer eu fi-lo
Certo no rumo, incerto na razão
Das rotas que a sorte me indicava:
Debuxo dos Fados bem traçado
Faltava-lhe a linha que o terminava
Quando o portulano me foi dado.
……............................................
José Blanc de Portugal
Hesita a mão, a voz, o pensamento;
Vacila o querer, o próprio desejar
Nem sequer exprime o lamento
De às cegas algo procurar.
Se preciso paz, desejo guerra;
Dão-me batalha, tréguas peço;
Vendo certo que meu pensar erra
Calculo em zero o erro que meço.
Que vejo em volta sempre julgo estranho,
Admiro muito, e maravilhado,
Mas avassala-me o enorme tamanho
Da podridão do mundo afogado
Em busca de terrena vã fortuna:
Ri-se de mim a vida inoportuna.
Até agora o que fiz
Em tempos mais descuidados?
Livrinhos que por um triz
Não ficaram embrulhados
Na papelada que jaz
Pela casa baralhada
Onde só descansa em paz
Essa mesma papelada.
Mais mil linhas de escrituras
Que valem mais do que nada:
O que sobra às criaturas
Depois de bem depenada
A invenção que tiveram,
Quando meiada par´cer
Vida que de ter houverem
Conta bem pouco avondada.
Dos trigais orlados de olivedo
Aos imbondeiros para além do mar,
Do jardim das donas e seu lago ledo,
Ao charco dos jacarés a atravessar
Da Estrela às serras onde nasce o Nilo
Arderam meus pés na força da sazão.
O que havia de fazer eu fi-lo
Certo no rumo, incerto na razão
Das rotas que a sorte me indicava:
Debuxo dos Fados bem traçado
Faltava-lhe a linha que o terminava
Quando o portulano me foi dado.
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José Blanc de Portugal
In “ENÉADAS – 9 Novenas”
Imprensa Nacional – Casa da Moeda