Este debate radical em torno da ASAE simboliza o debate em torno do modelo de país que queremos ser. O ponto de partida para a abordagem do tema da qualidade de vida na nossa sociedade é o mais baixo que se possa supor. A tradição de que muitos falam não é a verdadeira tradição e cultura populares que as elites urbanas, na verdade, sempre desprezaram. Os hossanas à defesa da tradição e cultura populares, do artesanato, dos pequenos produtores e comerciantes, etc., da ginjinha com elas, da bola de Berlim com creme, da louça de barro, …, não é mais do que, na maioria dos casos, um apelo à lei da selva, um encolher de ombros à economia paralela, à defesa da contrafacção e do contrabando, à comiseração com os mixordeiros e a imundície, ao bloqueio de uma política de defesa dos consumidores, em suma, a glorificação de um passado que nada tem a ver com a verdadeira tradição popular. Sei do que falo. Fui presidente durante 7 anos de uma organização – o INATEL – que, além de ter como seu mister o apoio à cultura popular, sempre menosprezada pelos poderes e ridicularizada pelas elites, (senti-o na pele!) confecciona e serve, anualmente, milhões de refeições tendo sido necessário implementar, muito antes da existência da ASAE, um programa de higiene e segurança alimentar, que foi atacado, sendo essa uma das peças, imaginem, de acusação à minha gestão. É preciso que se diga, alto e bom som, que nenhum governo, antes deste, se atreveu a reunir num só organismo todas as entidades com os poderes de fiscalização agora atribuídos à ASAE. Antes era a impotência e o caos na fiscalização das actividades económicas. Não alinho nem sequer com aqueles que se desdobram em embrulhar os ataques à ASAE não no conteúdo da sua acção mas tão-somente no "exagero" do seu modo de actuação. É preciso que se saiba que a ASAE é um órgão de polícia criminal e não um grupo de escuteiros, com todo o respeito pelos escuteiros. Aqueles que não sabem deviam saber que quando se exige o cumprimento de regras (leis) para benefício do maior número, neste caso, os consumidores, se prejudicam interesses instalados e se beliscam inércias, prejudicando, quase infalivelmente, os infractores. Mas são essas as regras do estado de direito. Por outro lado a omissão da acção, ou a corrupção das entidades fiscalizadoras, beneficia esses mesmos infractores. Nesta polícia, oh céus, parece que não foram detectados quaisquer indícios de corrupção. Imaginem se o tivessem sido! Esse é um dos problemas que mais aflige todos os protagonistas sob a alçada da acção da ASAE e que não é referenciado pelos seus críticos que, por outro lado, estão sempre prontos a preconizar a mais draconiana legislação contra a corrupção. Quando o Sr. deputado Mendes Bota, nessa qualidade ou noutra qualquer, acusa a ASAE de ser igual à PIDE está a passar um atestado de estupidez a si próprio. É a voz do país que se revê no atraso de práticas e costumes prejudiciais à defesa da saúde e integridade física dos cidadãos. São aqueles que clamam por uma luta sem tréguas contra a corrupção a crucificar a acção de uma polícia criminal incorrupta. Em que ficamos heróis da Pátria? Desde Boliqueime a Gaia, desde Loulé ao Freixo? Qualquer um de nós, na sua qualidade de cidadão, tem por obrigação olhar à sua volta e revoltar-se com as práticas que o prejudicam como utente dos mais variados serviços quaisquer que sejam as entidades que os prestam. Revoltemo-nos, pois! Revoltemo-nos contra os mixordeiros! Revoltemo-nos contra a falta de higiene básica! Revoltemo-nos contra a especulação! Revoltemo-nos contra a corrupção! Revoltemo-nos contra o falseamento da concorrência! Revoltemo-nos contra os excessos do mercado! Finalmente existe no nosso país um organismo para apoiar os cidadãos na sua revolta contra os atropelos aos seus direitos enquanto consumidores. Devíamos todos congratularmo-nos com isso. Sinto repugnância pela falsa moralidade dos pequenos e médios artistas de feira em que se transformaram, de forma definitiva, e parece que irreversível, infelizmente, os actuais dirigentes do PSD e do PP. E o Dr. Mendes Bota é um dos mais importantes dirigentes do PSD!
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3 comentários:
Nada como a tradição para manter a cultura de espírito.
O meu APLAUSO para as suas palavras e não se canse de o repetir.
Descordo completamente. A Senhora não conheceu os organismos que antecederam a ASAE, a sua investigação é ligeira, porque não conheceu a IGAE nem os orgãos que a antecederam, a IGAE e os organismos que a antecederam primavam pelo rigor, pela descrição não necessitavam de propaganda o relacionamento com o Ministério Público era excelente. A Asae é uma cópia mal feita da IGAE, começando pelo Dec-Lei que criou a ASAE é uma cópia da Lei orgânica de 2004 da IGAI. A ASAE recuou aos anos oitenta em que não havia especialização, cada inspector fazia de tudo como acontece agora com a ASAE. A ASAE criou o caus, não há especialização, não exiete Segurança Alimentar e na área económica perde-se por questões menores é um facto que a fuga e evasão fiscal aumentou. A colaboração com as outras polícias sempre existiu mas de uma forma discreta, não de estilo "coboiwadas" ou do género de filme, as inspecções não podem ser cenas de filme e a descrição no modo de actuação é uma virtude. Na minha opinião houve um retrocesso e os Portugueses não lucraram nada com a ASAE em termos de defesa do consumidor.
Inspector aposentado
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