sexta-feira, setembro 1

EL ZARPAZO DE DIOS

Posted by Picasa Diego Valverde Villena

De un zarpazo Dios te muestra el mundo.
Él lo hace así, como jugando,
y te inocula el veneno de la percepción.
Ya toda la belleza se ofrece ante tus ojos
y el amor posible
y la fe necesaria para que hagas milagros.
Tu piel muta y también tus colmillos
y la caza menor te deja insatisfecho.
Dios con su zarpazo te ha hecho de los suyos
y estás absoluta, tremendamente solo.

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DIEGO VALVERDE VILLENA (Lima, 1967)

Licenciado en Filología Hispánica, Filología Inglesa y Filología Alemana. Ha realizado estudios de especialización en Lengua y Literatura en las universidades de Edimburgo, Dublín, Wroclaw y Salamanca, y estudios de Doctorado en Literatura Medieval en las universidades de Oxford, Heidelberg, Tubinga, Chicago y Complutense de Madrid.

Ha sido profesor de literatura en diversas universidades de Europa y América. Colabora habitualmente con numerosas revistas literarias españolas e hispanoamericanas, y también con instituciones como el Instituto Cervantes, la Agencia Española de Cooperación Internacional, la Casa de América y la Residencia de Estudiantes.

Ha traducido, entre otros, a Arthur Conan Doyle, Rudyard Kipling, George Herbert, Nuno Judice y Paul Éluard, y ha llevado a cabo ediciones críticas de la poesía de Álvaro Mutis y de Luis Alberto de Cuenca.

Ha publicado los poemarios El difícil ejercicio del olvido (1997), Chicago West Barry 628 (2000), No olvides mi rostro (2001), Infierno del enamorado (2002) y El espejo que lleva mi nombre escrito (2006), y han aparecido poemas suyos en antologías y revistas de Europa, América y Asia. En su vertiente de ensayista ha prestado especial atención a Borges, Álvaro Mutis, la literatura medieval y la literatura comparada.
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[Quase dois anos passados sobre a publicação do poema Libros, Diego Valverde Villena acaba de me enviar um poema inédito que publico com uma pequena biografia do autor. A colaboração, que muito me honra, realiza-se a meu pedido e o atraso na correspondência é de minha responsabilidade. Os meus agradecimentos.]

quinta-feira, agosto 31

GLENN FORD

"BLOG DAY"


O “Catatau” incluiu o absorto na sua lista de preferidos a propósito do “dia do blog” – “blog day”, que se cumpriu hoje. Obrigado. Ao interagir conhecemo-nos mesmo sem nunca nos termos ”conhecido”. A blogosfera é uma comunidade com as suas regras próprias. Uma rede com virtualidades comunicacionais aparentemente ilimitadas. É o futuro que nos ultrapassa a cada momento. É o confronto brutal com a realidade da nossa própria ignorância. É o utensílio de trabalho. É a carta com a palavra. A grafonola com a música. O telegrama com a frase. A TV com a imagem. O filme com o enredo. Tudo isso, e muito mais, numa fusão de meios e de sinais que já mudaram a vida da comunidade mesmo quando o fogo da mudança arde e não se sente.

quarta-feira, agosto 30

CAMUS E A GUERRA CIVIL DE ESPANHA

Posted by Picasa Guernica (1937)

“…porquê a Espanha? Confesso que sinto uma certa vergonha da fazer tal pergunta em seu lugar. Porquê Guernica, Gabriel Marcel? Porquê este ponto de encontro onde, pela primeira vez, face a um mundo ainda adormecido no seu conforto e na sua moral miserável, Hitler Mussolini e Franco demonstraram a umas crianças o que era a técnica totalitária? Sim, porquê esse encontro que nos dizia respeito também a nós? Era a primeira vez que os homens da minha idade viam a injustiça triunfar na História. O sangue da inocência corria então no meio de um imenso palavreado farisaico que, de facto, ainda hoje continua. Porquê a Espanha? Porque poucos são os que não têm que lavar esse sangue das mãos. Sejam quais forem as razões do anticomunismo, e eu conheço algumas boas razões, nunca nós o poderemos aceitar se ele vai ao ponto de esquecer essa injustiça, que se perpetua com a cumplicidade dos nossos governos. Já declarei o mais alto possível a ideia que tenho dos campos de concentração russos. Mas não é isso que me fará esquecer Dachau, Buchenwald e a inominável agonia de milhões de homens, nem a hedionda repressão que dizimou a República Espanhola. Sim, apesar da comiseração dos nossos grandes políticos, tudo isso terá de ser denunciado em conjunto. E não perdoarei esta peste horrível ao Ocidente, só porque ela lavra no Leste em mais ampla extensão. Escreveu você que, para quem estiver bem informado, não é da Espanha que neste momento chegam as notícias mais capazes de desesperar os que prezam a dignidade humana. Está mal informado, Gabriel Marcel. Ainda ontem cinco opositores políticos foram, em Espanha, condenados à morte. Você, porém, cultivando o esquecimento, já se preparava para estar mal informado. Esquece-se que as primeiras armas da guerra totalitária foram ensopadas no sangue espanhol. Esquece-se de que, em 1936, um general rebelde sublevou, em nome de Cristo, um exército de Mouros, que lançou contra o governo legal da República Espanhola, fez triunfar uma causa injusta, depois de inexplicáveis massacres, e deu início a uma repressão atroz que durou dez anos e ainda não acabou. De facto, é verdade. Porquê a Espanha? Porque você e muitos outros perderam a memória.”

Albert Camus: “Porquê a Espanha” – Resposta a Gabriel Marcel, in “Combat”, Dezembro de 1948. – “Actualidades” – Contexto. (A propósito de duas passagens de um artigo de G M, publicado em “Les Nouvelles Littéraires”, criticando o facto da acção de “O Estado de Sítio” se situar em Espanha.)

A guerra civil de Espanha (1936/39) teve início no mês de Julho de 1936. Passam agora setenta anos. Este fragmento de “Porquê a Espanha?” é muito elucidativo das posições políticas de Camus. É também por isso que o escolhi sendo conhecida a sua militância, desde a juventude, em prol dos republicanos e a sua oposição, de toda a vida, à ditadura de Franco.

Foi o que o Joaquim Diabinho quis acentuar quando me enviou este link. Retribuo, pela minha parte, com este que contém muita matéria cinéfila.

IDENTIDADE

Posted by Picasa Fernando Pessoa com treze anos

Hoje foi o dia da renovação do BI (Bilhete de Identidade). O meu filho tinha-o perdido uns tempinhos atrás numa festa popular nas Azenhas do Mar. Fiz a respectiva participação mas ele não voltou a aparecer (o BI). Lá ficou também o cartão do Sporting esse sim verdadeiramente importante para ele. Aprendizagens da vida. E esta é a época de estágio para o início do ano lectivo. Treina-se a aterragem suave dos prazeres do ócio para a dura realidade do trabalho. Nestes dias de final de Agosto Lisboa tresanda de calor. Ontem pela hora de almoço o termómetro marcava 36º. O episódio presente está bem de ver não tem a emoção dos anteriores. O arquivo de identificação ali para o areeiro é um espaço conhecido e frequentado por todos ao contrário de uma esquadra de polícia ou mesmo de um SAP. Vou sempre lá quando se trata de assuntos de BI’s. A loja do cidadão tem as suas virtualidades mas neste caso sempre me mereceu mais confiança a sede do serviço. Crenças! O espaço é antigo mas tem sido remodelado ao longo do tempo. Amplo e organizado. A secção das renovações estava sobrecarregada. Senha 549! Qualquer sociológico encontraria ali as delícias para o seu mister. É uma quase perfeita representação social do país em busca da uma senha individual que torne cada um dos nós formalmente reconhecível perante cada um dos outros, as autoridades, o estado. Já sabia que é possível obter um BI no próprio dia desde que se apresente uma explicação plausível. No caso em apreço sem urgência demora uma semana. O modelo ainda é o antigo. Sem novidade ao contrário do passaporte. As fotografias tipo passe banalizaram-se. Fernando Pessoa fotografado com treze anos um pouco mais novo que meu filho ilustra uma verdadeira fotografia que tinha como um dos destinos o BI de outros tempos. Não sabia que em caso de roubo ou extravio para efeitos de renovação é necessário apresentar a certidão de nascimento. Erro meu que me devia ter previamente informado. Mas foi possível rapidamente resgatar a dita. Não sabia que o meu filho já mede mais de 1,70 cm. Não sabia que esta é uma época de ponta na procura deste serviço. Mas apesar da forte pressão do público o serviço funcionava com bastante fluência e eficácia. Ainda não foi desta que me foi dado o pretexto para falar mal de um serviço público. Próximo …!

terça-feira, agosto 29

ESQUADRA DE POLÍCIA

Posted by Picasa Fotografia de Angèle

Ao início da tarde um telefonema do meu filho: havia sido assaltado no polidesportivo à porta de casa. O telemóvel foi à vida. Buscava conselho se havia de telefonar para o 112. Que sim. Mais uma peripécia do quotidiano envolvendo uma entidade de serviço público. O carro patrulha surgiu pouco depois mas o alerta tinha sido tardio. Seguiu-se, já com a minha presença, a apresentação da respectiva queixa na esquadra da PSP. Atendimento correcto e eficiente. Os agentes são jovens e demonstram agilidade a lidar com a informação, a informática e as pessoas. Uma diferença abissal em relação a um passado não muito longínquo. Não adianto mais detalhes que não interessam para aqui. Mas tal como no serviço público de saúde mostramos ser uma família de sortudos. Também neste caso os reparos possíveis são amplamente compensados pelos aspectos positivos.
……

Mais tarde já noite o meu filho desceu para se reunir com os amigos e estar de olho vivo à envolvente. Os agentes tinham-nos dito que eles voltariam de novo ao local. Tinha acabado de escrever a primeira parte deste post quando tocou a campainha. Um jovem pelo inter comunicador pedia-me para descer. Dois polícias precisavam de falar comigo. Desci. Os agentes que à tarde tinham tomado conta da ocorrência acabavam de prender os presumíveis ladrões. Acontecera que uma jovem tinha avistado nas redondezas do prédio o que lhe pareceu ser um dos assaltantes da tarde que, uns dias atrás, a tinha assaltado a ela. Especialidade: telemóveis. Idade: dezasseis anos. Tez da pela: branca. O meu filho ligou rápido do telemóvel de um amigo para o 112 e os agentes em poucos minutos “voaram” da esquadra e lançaram-lhes a mão. Eram mesmo eles como se veio a comprovar pelas diligências seguintes que não vou descrever. Os dois telemóveis foram recuperados. O do meu filho poucas horas após o furto.
…….

Suponho que estas situações positivas na relação com os serviços públicos só me acontecem a mim e à minha família. Os factos são reais e acabaram de ocorrer tal qual um episódio de uma célebre série americana. Mais uma vez o serviço público neste caso de polícia funcionou como deve. Os jovens que foram os protagonistas dos factos de um lado e de outro vão reter na memória uma polícia que já não é a mesma de outros tempos. Não relato mais detalhes que dariam para uma longa e interessante conversa. Há dias de sorte! Durou umas horas e desta vez não paguei taxa.

segunda-feira, agosto 28

O texto político

Posted by Picasa Frank Grisdale

Ressonância de 28 de Agosto de 2004 dos meus fragmentos de leitura de “Roland Barthes por Roland Barthes”, vertidos para um livro artesanal que, desta vez, incorpora uma frase da minha lavra que, aparentemente, nada tem a ver com o texto. É, pelo menos, surpreendente até para mim próprio.

“O político é, subjectivamente, uma fonte permanente de aborrecimento e/ou de prazer; é, além disso e de facto (isto é, a despeito das arrogâncias do sujeito político), um espaço obtinadamente polissémico, a sede privilegiada duma interpretação perpétua (uma interpretação, se for suficientemente sistemática nunca será desmentida, até ao infinito). Poderíamos concluir a partir destas duas constatações que o Político é textual puro: uma forma exorbitante, exasperada, do Texto, uma forma inaudita que, pelos seus extravasamentos e pelas suas máscaras, talvez ultrapasse a nossa compreensão actual do Texto. E, tendo Sade produzido o mais puro dos textos, julgo compreender que o Político me agrada como texto sadiano e me desagrada como texto sádico."
Escrevi nesta pagina: "visitam-se lugares e acontecimentos mas, de facto, visitamo-nos a nós próprios apertando os contactos entre os "viajantes". Quando assim não sucede a viagem reduz-se à excursão."

domingo, agosto 27

ESPERANÇA

MISTÉRIOS

A FOLHAGEM DA PALMEIRA E OS SERVIÇOS PÚBLICOS DE SAÚDE

Posted by Picasa Fotografia do Dias com árvores

Um mês atrás o meu filho caiu à noite aqui perto de casa em cima da folhagem de uma palmeira. Apareceu-me à porta com um amigo que vinha com cara de caso. Depois entendi que ficou preso à folhagem e imaginem que o amigo de correria levava consigo uma tesoura e libertou-o da prisão. Mas uma farpa tinha-se atravessado de lado a lado no seu dorso. Uma vizinha brasileira que se apercebeu do caso imaginem que tinha em casa um spray anestesiante. Ela própria retirou a farpa sem dor nem sequelas. Uma pequena cirurgia doméstica perfeita. Era sábado. No domingo pela manhã meu filho verificou que tinha um braço ferido havendo sinais de outra farpa que o podia ter trespassado. Resolvi socorrer-me do Centro de Saúde mais perto a que antigamente se chamava SAP (Serviço de Atendimento Permanente). Ouvi dizer que o Correia de Campos (que para quem não saiba é o Ministro da Saúde) teria dito um dia destes que no SAP nunca ninguém o apanharia. Eu não ouvi nem li nada a esse respeito! E lá fui. Era domingo. No Centro de Saúde encontrei um serviço de urgências a funcionar. Primeiro andar. Apresentei a situação a quem recebia. Simpatia. É urgência? Sim senhor! Espere na sala pelo senhor doutor. Esperamos. Surpresa das surpresas demorou pouco o atendimento. A médica era jovem loura bonita e eslava. Talvez russa. A enfermeira sisuda pela fala espanhola. O diagnóstico foi fácil e se sentir alguma dor volte cá se faz favor. Passados uns dias o meu filho insistiu em ser visto pois o braço apresentava como que um traço em relevo com forma de farpa. Telefonei para o SAP. A consulta ficou marcada para meados de Setembro. Achei cedo para o serviço mas tarde para a necessidade. Pelo sim pelo não pusemo-nos a caminho mesmo sem consulta marcada. A médica de família é no quinto andar. Esperem um pouco que ela deve estar a chegar. Inscrição. São dois euros e cinco cêntimos. Ela atende de certeza. E atendeu mesmo. Diagnosticou a olho nu que a farpa estava lá. Um momento veja se há vaga na cirurgia. Havia. No intervalo da próxima consulta passo a requisição. A consulta demorou. Ser médica e confessora é muito exigente. A doente já não era vista há muito tempo e as vidas são pesadas. No meio uma senhora já de idade nervosa insistia na consulta marcada. Tinha sido para ontem. Um homem jovem e negro insistia que morria se não fosse visto na hora e ria. No fim resignado aceitou e saiu com ar gozado. A médica de família é uma simpatia. O dossier do meu filho entre centenas estava arrumado e foi destacado à primeira. Já tinha sido visto tempos atrás. Requisição passada. Cirurgia no Quarto andar. Havia que esperar pela hora e sobrava tempo. Fomos almoçar. De caminho à estação dos CTT’s levantar uma encomenda à cobrança. Os óculos novos que se lhe cansou a vista. Surpresa. Nos balcões dos CTT’s serviço com fama de público apreço não chegou ainda o terminal Multibanco. Em Lisboa só nos Restauradores. Fiquei com a boca ao lado e a menina coitada também com o que me veio à cabeça dizer-lhe com simpatia. Agora compreendo a fama de todos os seus presidentes. Deixar passar o tempo e saltar para outro lugar… Saí e fui fazer o levantamento. Missão cumprida. Lá fomos de novo a caminho da cirurgia. Quarto andar o médico estava mesmo a chegar. Dois euros e cinco cêntimos. Só não entendo os cinco cêntimos. Chegou e sem demora mandou-nos entrar. A intrusão da farpa foi confirmada. Devia ter ido logo à urgência hospitalar aqui não posso operar isso pode inflamar todos os cuidados são poucos... Vou passar uma requisição para o Pulido Valente. A recepção trata do resto. Depois telefonamos para confirmar a consulta hospitalar. Surpresa das surpresas no dia seguinte a consulta foi confirmada. Dia seis de Setembro a horas tantas. Será o Agosto? Parece uma história inventada mas é real e mostra que ao contrário do que é voz popular pode o ministro descansar. Pela minha experiência o serviço de atendimento permanente é de excelência.

sábado, agosto 26

TANGO

CAMÕES - SETE SONETOS

Posted by Picasa "Croce del Sud" - opera di Jorge Colaço (1922)

Uma ressonância de 26 de Agosto de 2004. Nesse dia publiquei o último de sete sonetos de Camões, segundo a “Edição de Lobo Soropita de 1595”, por sinal um dos menos conhecidos:

Oh! Como se me alonga de ano em ano
A peregrinação cansada minha!
Como se encurta e como ao fim caminha
Este meu breve e vão discurso humano!
Vai-se gastando a idade e cresce o dano;
Perde-se-me um remédio que inda tinha;
Se por experiência se adivinha,
Qualquer grande esperança é grande engano.
Corro após este bem que não se alcança;
No meio do caminho me falece;
Mil vezes caio e perco a confiança.
Quando ele foge, eu tardo; e na tardança,
Se os olhos ergo, a ver se inda parece
Da vista se me perde e da esperança.

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Ou restantes seis podem ser lidos clicando em baixo no respectivo primeiro verso:

Sete anos de pastor Jacob servia

Tanto de meu estado me acho incerto,

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,

Busque Amor novas artes, novo engenho

Aquela triste e leda madrugada,

Alma minha gentil, que te partiste

sexta-feira, agosto 25

MES - UM CARTAZ DA REVOLUÇÃO

Posted by Picasa Imagem cedida por Margarida Boto
Clicar no cartaz para aumentar

Cartaz do MES – Lisboa, Ano: 1975, Arquivo: BN

Uma imagem mais impressiva da deriva leninista do MES, breve mas pungente, como antes a defini, e que atingiu o auge nas vésperas do 25 do Novembro.

Não sei o que levou a que se tivessem produzido dois cartazes para um mesmo evento. O primeiro mantém uma contida sobriedade em torno da exploração das virtualidades gráficas do símbolo e este dá livre curso ao imaginário da esquerda revolucionária associado, à época, ao chamado “movimento popular de massas”.

Ambos bastante depurados, no que respeita ao design, estes cartazes reflectem, se bem me lembro, a influência do MIR chileno após o golpe militar que, em 11 de Setembro de 1973, derrubou Salvador Allende acontecimento que exerceu um forte impacto político e emocional em todos os sectores da esquerda.

Sou dos que pensam que as imagens e os factos não se podem apagar a não ser quando os protagonistas se querem fazer passar por outrem, que não eles próprios, rasurando a sua biografia em benefício das glórias do presente. Há muitos casos desses, como comprovam alguns acontecimentos recentes.

Por mim defendo, com respeito pela intimidade e o bom senso, chamar o passado ao presente, assumir os riscos de uma reflexão, individual ou colectiva, mesmo que despertando fantasmas que, ao contrário do que muitos possam pensar, não estão enterrados. Tenho mesmo como certo que ainda hoje, na política, e não só, se continuam a perpetrar vinganças póstumas tomando como referência antigas paixões e fidelidades.

O que nos pode salvar de todas as tentações é a defesa da Liberdade palavra que escolhi para titular, em 2004, um post, publicado no dia do meu aniversário, último de uma série que dediquei ao MES. (E ao 25 de Abril, ouviram falar?)

A pessoa dividida ?

Posted by Picasa Fotografia de Philippe Pache

Dos meus fragmentos de “Roland Barthes por Roland Barthes” publicados num livro artesanal vai para muitos anos. Ressonância de 25 de Agosto de 2004.

"Como é que você explica, como é que tolera essas contradições? Filosoficamente, parece ser materialista (se é que esta palavra não soa muito a velho); eticamente, você divide-se: quanto ao corpo, é edonista; quanto à violência, talvez seja antes budista ! Não gosta da fé mas sente uma certa nostalgia dos ritos, etc. Você é uma miscelânea de reacções: haverá em si alguma coisa primeira ?
Qualquer classificação que você leia dá-lhe logo vontade de se encaixar nela: onde é o seu lugar? Julga primeiro que o encontrou: mas pouco a pouco, como uma estátua que se desagrega, ou um relevo que se desgasta, se estira e perde a forma, ou melhor ainda, como Harpo Marx ao perder a barba postiça por acção da água que está beber, deixa de ser classificável, não por excesso de personalidade mas, pelo contrário, porque percorre todas as faixas do espectro: reúne em si traços pretensamente distintivos, que portanto já nada distinguem; descobre que é ao mesmo tempo (ou alternadamente) obsessivo, histérico, paranóico e além disso perverso (sem falar das psicoses amorosas), ou que adiciona todas as filosofias decadentes: o epicurismo, o eudemonismo, o asianismo, o maniqueísmo, o pirronismo.
"Tudo se fez em nós porque nós somos nós, sempre nós e nem por um minuto os mesmos" (Diderot, Refutação de Hevetius.)"

quinta-feira, agosto 24

CAMUS - OLHARES E SUBLINHADOS

Posted by Picasa Fotografia de Angèle

O Eugénio Alves enviou-me um artigo, muito interessante, de MANUEL VICENT publicado no “El País”, do passado dia 6 de Agosto, que pode ser lido, na íntegra, no IR AO FUNDO E VOLTAR. Trata-se de uma estimulante, e sintética, introdução à obra e personalidade de Camus. Os espanhóis sempre atentos!

Deixo aqui, a propósito, a minha sexta colaboração nos “Cadernos de Camus” que consiste na reprodução dos sublinhados da primeira leitura, pelos meus vinte anos, dos “Carnets”.

Tal como assinala Manuel Vicent: "Al principio fue sólo una emoción estética por su forma de estar en el mundo lo que me atrajo de este escritor, pero llegó un momento en que, en medio del naufragio de todas las ideas, lo elegí como un buen guía frente a mis propias dudas y contra toda clase de infortunio."

"ESQUERDA SOCIALISTA"

Posted by Picasa Imagem cedida por Margarida Boto
Clicar no cartaz para aumentar

Cartaz do MES – Lisboa, Ano: 1975, Arquivo: BN

Nas vésperas do 25 de Novembro de 1975. Os últimos estertores da deriva leninista do MES – curta mas pungente – foram, ainda assim, sempre acompanhados pelo símbolo que assinalou o acto fundador do Movimento.

Lembro-me muito bem do pano de fundo do I Congresso, realizado em Dezembro de 1974, na Aula Magna da Cidade Universitária de Lisboa [desse é que precisava de uma fotografia!], a bola vermelha, a estrela de cinco pontas e a sigla. A mancha de fundo foi desenhada com os pés – literalmente – e visto de longe o símbolo ostentava aquele jeito de ter sido esculpido pelos nossos corpos que seríamos capazes de sacrificar por uma causa nobre. (Seríamos?)

Não tenho qualquer receio em dar público testemunho desse tempo e das circunstâncias que o envolveram mostrando mesmo – se for o caso – as entranhas de um processo que foi marcado por muitas situações típicas dos “amanhãs que cantam”.

Ainda agora o “Didas” me enviou uma crónica, “em memória do Zé Trigo que faria 50 anos este ano”, e que morreu a 27 de Novembro de 1981, na qual descreve com bastante detalhe o percurso, ideológico e vivencial, dessa geração a que ele pertence – a do “Todo o Poder aos Cursos” – que seria um dos esteios da própria criação do MES.

Mas o que eu queria dizer verdadeiramente, aqui e agora, é que – mesmo hoje – me espanta a qualidade gráfica e a perenidade do símbolo, resistente a todas as derivas, marca de uma alternativa política utópica que é conhecida, por toda a parte, pela designação de “esquerda socialista” (conhecem?).

quarta-feira, agosto 23

KERBLOG

Posted by Picasa Não resisti! Do lado de Beirute - uma vista sobre a guerra através de ilustrações. Via catatau.

LULA NA FRENTE

Posted by Picasa Fotografia daqui

O “Estados Gerais” apresentou uma sondagem acerca dos resultados das próximas eleições presidenciais no Brasil que originou uma interessante corrente de comentários, em particular, com origem no Brasil.

Incrédulos, com os resultados das sondagens, os adversários de Lula desvalorizam-nas mas a realidade é que o conjunto de todas as sondagens – mesmo as mais actuais - aponta no mesmo sentido – uma vitória de Lula – como podem verificar no “Margens de Erro”.

Sondagens são sondagens mas não vale a pena pensar que os mais credíveis institutos de sondagens estão todos enganados, ao mesmo tempo, ou que estão todos enganando os eleitores, ao mesmo tempo, ou que as eleições ainda estão longe… pois, na verdade, estão muito perto.

O que é um facto é que mesmo com concorrência em crescendo, à esquerda, Lula mais do que se aguenta …Caso não aconteça uma hecatombe nas próximas semanas, Lula ganha mesmo …! Além do mais, julgo que ninguém deve esquecer que, hoje, na América do Sul, surpresa das surpresas, Lula é um Presidente moderado!

FALAR/BEIJAR

Posted by Picasa Imagem daqui

Ressonância de 23 de Agosto de 2004. Do meu livro artesanal dos fragmentos de leitura de “Roland Barthes por Roland Barthes”:

“Segundo uma hipótese de Leroi-Gourhan, terá sido depois de libertar os seus membros anteriores da marcha (e portanto a boca da predação) que o homem terá podido falar. Eu acrescento: e beijar. Pois o aparelho fonador é também o aparelho oscular. Ao passar à posição de pé, o homem ficou livre para inventar a linguagem e o amor: talvez tenha sido o nascimento antropológico duma dupla perversão concomitante: a palavra e o beijo. De acordo com isso, quanto mais os homens se sentiram livres (pela boca) tanto mais falaram e beijaram; e, logicamente, quando, através do progresso, os homens ficarem libertos de todas as tarefas manuais, não farão outra coisa senão discorrer e beijar-se.
Imaginemos para esta dupla função, localizada no mesmo sítio, uma transgressão única, que nasceria duma utilização simultânea da palavra e do beijo: falar beijando, beijar falando. Teremos de acreditar que esta volúpia existe uma vez que os amantes não param de "beber as palavras nos lábios amados". Aquilo que assim experimentam é, na luta amorosa, o jogo do sentido que irrompe e se interrompe: a função que se perturba, numa palavra: o corpo balbuciante."

terça-feira, agosto 22

FELIPÃO - RENOVAÇÃO

Posted by Picasa Fotografia daqui

Uma incursão pelo futebol na hora que antecede o jogo no qual o Benfica decide se vai voar alto (na “Liga dos Campeões”) ou baixinho (por aí …). [Decidiu voar alto!]

Para referir que a primeira convocatória de Felipão, na era pós mundial da Alemanha, mostra toda a sua sabedoria. Assinalo que 12 dos 22 jogadores convocados jogam em Portugal – penso que há muito tempo tal não acontecia – que a média de idades dos convocados deve ter baixado bastante – não fiz as contas – e que, no fundo, promovendo a renovação, Felipão pode manter uma equipa base com a mesma estrutura da anterior.

Com diferenças substanciais que se podem imaginar pensando que, no mesmo onze, podem jogar Cristiano Ronaldo, Quaresma, Carlos Martins e Hugo Almeida … mais um pouco de tudo – técnica, força, juventude e altura – apesar da menor experiência – sem Figo e Pauleta.

A convocatória é inatacável e julgo que também beneficia do facto de os treinadores das três principais equipas portuguesas – Porto, Sporting e Benfica – serem portugueses… A ver os próximos capítulos, até 2008, ou mesmo até ao mundial de 2010. A selecção de Portugal vai continuar a ser muito forte, não só a nível europeu, como mundial … É um facto importante para o país?

Convocados:

Guarda-redes: Quim (Benfica) e Ricardo (Sporting).
Defesas: Fernando Meira (Estugarda, Ale), Caneira (Sporting), Nuno Valente (Everton, Ing), Paulo Ferreira e Ricardo Carvalho (Chelsea, Ing), Ricardo Costa (FC Porto) e Ricardo Rocha (Benfica).
Médios: Deco (FC Barcelona, Esp), Petit (Benfica), Carlos Martins e João Moutinho (Sporting), Costinha (Atlético de Madrid, Esp) e Tiago (Lyon, Fra).
Avançados: Cristiano Ronaldo (Manchester United, Ing), Ricardo Quaresma e Hélder Postiga (FC Porto), Hugo Almeida (Werder Bremen, Ale), Boa Morte (Fulham, Ing) e Simão e Nuno Gomes (Benfica).

Nuestra familia ha perdido la guerra

Posted by Picasa Fotografia de Angèle

Um extraordinário testemunho de DAVID GROSSMAN a propósito da morte de seu filho, Uri, em 12 de Agosto de 2006, na guerra do Líbano. Deixo aqui alguns excertos. O artigo, na íntegra, pode ser lido na edição de ontem do “El País” e no IR AO FUNDO E VOLTAR.

El escritor israelí David Grossman recuerda en este artículo a su hijo Uri, muerto el sábado 12 de agosto en el sur de Líbano cuando el carro de combate en el que avanzaba fue alcanzado por un misil antitanque de Hezbolá. Días antes, David Grossman, junto con los escritores Amos Oz y A. B. Yehoshua, había formulado un llamamiento al Gobierno israelí para que finalizara sus operaciones militares en Líbano.

(…)

En estos momentos no quiero decir nada de la guerra en la que has muerto. Nosotros, nuestra familia, ya la hemos perdido. Israel hará su examen de conciencia, y nosotros nos encerraremos en nuestro dolor, rodeado de nuestros buenos amigos, arropados en el amor inmenso de tanta gente a la que, en su mayoría, no conocemos, y a la que agradezco su apoyo ilimitado.
Me gustaría mucho que también supiéramos darnos unos a otros este amor y esta solidaridad en otros momentos. Ése es quizá nuestro recurso nacional más especial. Nuestra mayor riqueza natural. Me gustaría que pudiéramos mostrarnos más sensibles unos con otros. Que pudiéramos liberarnos de la violencia y la enemistad que se han infiltrado tan profundamente en todos los aspectos de nuestra vida. Que supiéramos cambiar de opinión y salvarnos ahora, justo en el último instante, porque nos aguardan tiempos muy duros.

(…)

Era un chico que tenía unos valores, ese término tan vilipendiado y ridiculizado en los últimos años. Porque en nuestro mundo loco, cruel y cínico, no es cool tener valores. O ser humanista. O sensible al malestar de los otros, aunque esos otros fueran el enemigo en el campo de batalla.

(…)

segunda-feira, agosto 21

BUSH LEITOR

Posted by Picasa G. W. Bush

Ainda a propósito das leituras de Bush, assunto que jamais pensei abordar, uma mão atenta e amiga, fez-me chegar a crónica de João Pereira Coutinho publicada na última edição do “Expresso”.

Estou, neste caso, de acordo com o cronista com o qual quase sempre discordava quando lia, religiosamente, o Expresso vício do qual me curei para bem da minha economia doméstica e bem-estar espiritual.

O que diz Coutinho que me fez regozijar, por uma vez, com as suas reflexões acerca do interesse de Bush pela leitura de "O Estrangeiro"? Pondo de lado a afirmação da preferência do cronista por Machado de Assis, no cotejo com Camus, o que não espanta, Coutinho, no fundo, manifesta a sua perplexidade:

“Estranha escolha…” “Será que Bush partilha com Mersault o mesmo ódio cego pelo árabe errante? Ou, pelo contrário, estará antes Bush interessado em compreender o niilismo da personagem, e a forma como ela procura a redenção através da violência – uma bela metáfora sobre a ameaça terrorista corrente? Águas profundas.”

Pelo meu lado encontro uma explicação menos rebuscada que, em traços largos, se resume numa palavra: propaganda para passar na Europa ou, como hfm referiu num comentário a um post anterior, cosmética. Voltarei, de novo, ao assunto que tem suscitado as mais variadas reacções.

Como, entretanto, tal como Bush, tenho andado a ler, e a reler, Camus o que, no meu caso, não suscitará espanto, aqui vos deixo um fragmento de “A Queda” (1956) – que acabei de reler, dias atrás, aconselhando-vos a imaginar a pergunta dirigida ao próprio Bush:

“É verdade, o senhor conhece aquela cela de masmorra a que na Idade Média chamavam o “desconforto”? Em geral, esqueciam-nos aí para o resto da vida. Esta cela distinguia-se das outras por engenhosas dimensões. Não era suficientemente alta para se poder estar de pé, nem suficientemente larga para se poder estar deitado. Tinha-se adoptado o género tolhido, viver em diagonal; o sono era uma queda, a vigília um acocoramento. (…) Que a inocência seja forçada a viver corcunda, recuso-me a considerar por um único segundo esta hipótese. De resto, nós não podemos afirmar a inocência de ninguém, ao passo que podemos afirmar com segurança a culpabilidade de todos.”

domingo, agosto 20

Carlos Drummond de Andrade


Hipótese

E se Deus é canhoto
e criou com a mão esquerda?
Isso explica, talvez, as coisas deste mundo.

[In Terra Temperamental – uma referência minha.]

sexta-feira, agosto 18

LORCA ASSASSINADO - 70 ANOS

Posted by Picasa Federico Garcia Lorca

No “El País” de hoje, Luís Garcia Montero, assinala o 70º aniversário do assassinato de Federico Garcia Lorca. Reproduzo aqui o título, e sub-título, do artigo evocativo e a sua parte final. Também disponível, na íntegra, no IR AO FUNDO E VOLTAR.

Setenta años de un crimen
En una Granada sangrienta, Federico García Lorca fue ejecutado junto a un maestro de escuela y dos banderilleros.


El poeta fue conducido al Gobierno Civil. Luis Rosales intentó liberar a su amigo, pero en el régimen militar que él y sus hermanos estaban ayudando a imponer no había lugar para ciudadanos como Federico García Lorca. Angelina Cordobilla, una mujer que trabajaba para la familia Lorca, llevó comida al detenido las mañanas del 17 y 18 de agosto. Cuando se presentó en el Gobierno la mañana del 19, le dijeron que el poeta no estaba allí. En efecto, durante la noche del 18 al 19 fue conducido a La Colonia, una cárcel improvisada en una villa de recreo, a las afueras de Víznar.
Al amanecer, como escribió Antonio Machado, se le vio caminar entre fusiles, en Granada, en su Granada. Fue ejecutado junto al maestro Dióscoro Galindo y los banderilleros Francisco Galadí y Joaquín Arcollas. Un enterrador de La Colonia acompañó hace años al escritor Ian Gibson a la fosa donde fueron sepultados los cuerpos. Durante muchos años, el barranco de Víznar ha sido el territorio sagrado de los demócratas granadinos, el lugar en el que hemos rendido culto a nuestros muertos. La democracia urbanizó aquel espacio simbólico que había formado la historia bárbara de España, construyendo allí un parque en recuerdo de las víctimas de la Guerra Civil.

quinta-feira, agosto 17

BUSH E CAMUS


Esta imagem vem a propósito de uma curiosa notícia inserta no “Público” de ontem: Bush terá lido, nas férias, “O Estrangeiro”, de Camus, e terá gostado do que leu. O que mais me pode acontecer!

A minha leitura perversa da coisa é a seguinte: um conselheiro de Bush, mais versado na leitura dos clássicos, conhecendo a obra e a biografia de Camus, face à necessidade urgente de lançar sinais de aproximação com a Europa – Grã-Bretanha à parte – lembrou-se da obra de um autor que não pudesse ser incomodado pela razão simples de estar morto.

Tendo o dito conselheiro lido, na sua juventude, “O Estrangeiro” – obra consagrada, de autor nascido num país árabe, título sugestivo e tema oportuno, no contexto político actual - dela fez uma breve resenha que, na melhor das hipóteses, leu a Bush.

O conselheiro deve saber que Camus era um pacifista, que nunca defenderia as políticas de Bush, nem da actual liderança de Israel, nem do Hezbollah; que se colocaria, inevitavelmente, numa posição “impossível” de conciliação entre as partes em conflito; que sempre defenderia a coexistência pacífica de todas as raças e religiões sob o império da tolerância e da liberdade.

Como acabei de reler “A Queda” aconselharia ao tal conselheiro a preparação de uma resenha desta obra, a apresentar a Bush, na qual colocaria em destaque a seguinte passagem: "Quando se meditou muito sobre o homem, por ofício ou vocação, acontece-nos sentirmos nostalgia dos primatas. Esses ao menos não têm segundas intenções."