Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
terça-feira, outubro 4
"O Dia do Tempo"
“Correrias da minha infância” – Fotografia de Hélder Gonçalves
O meu filho (14 anos) acabou de ler ontem, quase de um só fôlego, as 800 páginas de “Eldest”, de Christopher Paolini. Boa leitura? Má leitura? Foi escolha dele, leitura dele, prazer dele. Cada um toma as leituras que quer. As leituras não se medem aos palmos mas eu nunca li, de um só fôlego, (ou quase), um livro de 800 páginas.
O mais extraordinário é que ele lê nos intervalos de uma parafernália tremenda de mensagens, imagens e sons. É interessante como a leitura exige, como sempre, recolhimento. Os saberes estratificam-se no silêncio e, ao mesmo tempo, na trepidação de uma cascata de interesses contraditórios.
Nesta estrada, repleta de encruzilhadas, as leituras impostas pela escola são uma espécie de violentação da liberdade de escolha: ele nunca escolheria Camões (“Os Lusíadas”) ou Gil Vicente (“O Auto da Barca do Inferno” e o “O Auto da Índia”). São as leituras “chatas” que, no caso de Gil Vicente, quase sei de cor. Sorte dele.
Os desejos e as obrigações exigem um balanceamento difícil das nossas disponibilidades. Em todas as idades e condições. Na maioria dos casos um balanceamento impossível. É essa a raiz de um dos dramas maiores da nossa sociedade: e escola e suas taxas avassaladoras de insucesso e abandono escolar.
É preciso tempo (em todos os sentidos) para ganhar disponibilidade e nunca há tempo para nada mesmo quando não se tem nada para fazer. É esta uma marca terrível do nosso tempo. Devia ser criado o “dia do tempo”.
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