25 de Abril - notas pessoais
A rendição de um PIDE
Entramos, ia alta a noite, no Quartel e desde essa madrugada de 24 de Abril até ao 1º de Maio de 1974, inclusivé, não saí do quartel senão uma única vez. Não vivi na rua a verdadeira festa do 25 de Abril após a consumação da vitória da revolução.
Não assisti à enxurrada de manifestações populares nem participei, com muita pena minha, na manifestção do 1º de Maio. Os soldados ficaram horas a fio alinhados nas casernas, por detrás das janelas que davam para a rua, de armas apontadas para o que desse e viesse. Alguém tinha que cuidar desses detalhes da "cozinha" de qualquer revolução.
Muitos de nós, salvo as pacatas manifestções domésticas e aquelas que tinham lugar na rua, defronte do quartel, tiveram de se dar por satisfeitos com as imagens, a preto e branco, que passavam na televisão.
Num desses dias, estava de oficial-de-dia o António Dias, quando foi procurado por alguém que da rua pretendia falar. Era um agente da PIDE que se queria entregar. Foi recebido com deferência. Identificou-se e fez a entrega da arma. Uma bela pistola que me suscitou cobiça e nunca mais esqueci.
De seguida coube-me a tarefa de o escoltar a caminho da Ajuda onde o entreguei em "Cavalaria 7" ou "Lanceiros 2". Foi a minha única saída do quartel em todos aqueles dias de brasa.
No percurso, realizado em jeep, nem uma palavra se trocou. Lembro-me de ter cumprido a missão, com rapidez, respeitando e defendendo, do primeiro ao último momento, a dignidade de um homem aterrorizado que tinha passado, de um dia para o outro, de agente do poder a prisioneiro do poder.
(29 de 32 continua)
Sem comentários:
Enviar um comentário