Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
segunda-feira, outubro 3
O QUE EU QUERIA
Teresa Dias Coelho - CLOUDS 2000 [Oil on canvas 46 x 73 cm]
O que eu queria não posso pedir que escapa
À sem razão de não obter o que eu queria era
Neste dia assim aberto um olhar liso e claro
Na direcção do meu sorriso que espera longo.
Aguento, aguento-o, dia após dia, abro e fecho
A mão e agarro o que eu queria num momento
Mas no outro se me cava a ruga funda no meio
Da testa e se me enche o fundo da pele de suor.
O que eu queria não posso dizer senão talvez
A alguém que és tu que já o sabes bem melhor
Do que eu quando digo que não falo mais nisso.
O que eu queria me desses neste dia maduro
Era o teu sorriso vibrante fixado para sempre
Na vida para além de mim e do que eu queria.
22/9/81
(Um dos primeiros poemas que escrevi, com intencionalidade,
dedicado à G.)
domingo, outubro 2
LUIZ PACHECO
Acabei de ler o “Diário Remendado (1971-1975)” de Luiz Pacheco, da D. Quixote. Uma diário autobiográfico, ou algo que se aproxima do género. Não se trata, certamente, de uma obra-prima mas é leitura muito interessante para aqueles que se interessam pelo percurso de alguns dos chamados escritores portugueses malditos do nosso tempo.
Ao que consta do posfácio de João Pedro George, “biógrafo improvável” de Pacheco, segundo as palavras do próprio, este texto “é um fragmento de um diário muito mais vasto”. O que supõe que outros diários possam vir a surgir no futuro.
Retenho duas curiosidades que me tocaram pessoalmente: a descrição dos acontecimentos do dia 25 de Abril de 1974, por Pacheco, que termina com estas duas frases esplêndidas: “Foi bonito e foi rápido. Já posso morrer mais descansadinho.”
Ainda a revelação de que Aldina, uma “pintora com biografia”, mulher de António José Forte, segundo Pacheco, votou no MES nas eleições para a Assembleia Constituinte de 25 de Abril de 1975. Uma boa companhia.
Veja aqui uma parte da obra de Luiz Pacheco.
sábado, outubro 1
ALGO DE PODRE NO REINO DE GEORGE W.
Leia no NEW YORK ON TIME Algo de podre no reino de George W.
Agora que tanto se fala de corrupção em Portugal, para não falar do Brasil, vale a pena conhecer os mais recentes escândalos de corrupção no "reino de Bush" ou, de como “o exemplo vem de cima”.
O PAÍS DO AMOR
Fotografia de Delphine Le Berre Apresentando Xupacabras
“O desejo físico brutal é fácil. Mas o desejo ao mesmo tempo que a ternura exige tempo. É preciso atravessar todo o país do amor antes de encontrar a chama do desejo. Será por isso que, ao princípio, desejamos tão dificilmente o que amamos?”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
Sei-os de cor
E deus criou a mulher
Sei-os de cor (em quatro andamentos e um poema) - Desculpem lá qualquer coisinha mas este é um post absolutamente extraordinário
FARO - O PS VAI GANHAR?
Faro - Cidade Velha
O desenlaçe das eleições autárquicas em Faro interessam-me muito, além do mais, por ser a minha cidade.
A última sondagem conhecida da universidade católica, bastante credível, pela sua metodologia, fazem crer que o PS pode mesmo ganhar.
Ver em Margens de erro
sexta-feira, setembro 30
AI!
Sabor – Fotografia de Hélder Gonçalves
O grito deixa no vento
Uma sombra de cipreste.
(Deixai-me neste campo
chorando.)
Tudo se perdeu no mundo.
Não ficou mais que silêncio.
(Deixai-me neste campo
chorando.)
O horizonte sem luz
está mordido de fogueiras.
(Já vos disse que me deixeis
neste campo
chorando.)
Federico Garcia Lorca
Traduzido por Eugénio de Andrade
AY!
El grito deja en el viento
una somba de ciprés.
(Dejadme en este campo
llorando.)
Todo se ha roto en el mundo.
No queda más que el silencio.
(Dejadme en este campo
llorando.)
El horizonte sin luz
está mordido de hogueras.
(Ya os he dicho que me dejéis
en este campo
llorando.)
DEMOCRACIA
La Nueva Democracia (1945) – David Siqueiros
Muita gente é execrável. É a nossa observação que torna execráveis muitas personagens. Para nós são execráveis. No entanto, para outros, são possuidores de excelsas virtudes.
A democracia é podermos rejeitar livremente os que nos repugnam na vida pública. É o exercício individual da livre escolha que encerra, em si mesma, extraordinárias vantagens. Porque do outro lado permanecem livres aqueles que rejeitam os que nós escolhemos.
É nesse jogo múltiplo de rejeição e escolha, sem censura, que reside a vantagem da democracia. Ela permite corrigir os seus próprios erros embora com um cortejo enorme de jogos no seu seio.
Não perder de vista esta vantagem pois, além do mais, resulta do sacrifício da vida e liberdade de gerações inteiras.
Mais vale a angústia de vermos escolhido, em eleições livres, alguém que julgamos execrável do que suportar o peso do silêncio sepulcral da tirania.
O BELO E O AZUL
Imagem daqui
“O belo diz Nietzche depois de Stendhal, é uma promessa de felicidade. Mas se ele próprio não é a felicidade, que poderá afinal prometer?”
*
“...Foi quando tudo ficou coberto de neve que reparei que as portas e as janelas eram azuis.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
quinta-feira, setembro 29
Portugal no Global Competitiveness Report
NO ANO DE EINSTEIN- Fotografia de Hélder Gonçalves
Portugal ocupa a 22ª posição no ranking do Global Competitiveness Report tendo subido dois lugares face a 2004. Olhando para desagregação dos indicadores verificam-se alguns dados surpreendentes face à tradicional maledicência nacional. Imaginem que me senti recompensado.
Afinal sempre vale a pena trabalhar para a modernização do país contra ventos e marés. E, apesar de todos os pontos fracos, Portugal sempre é melhor do que os portugueses o pintam. Haja deus!
Veja o quadro com a classificação dos países (Comparação 2004/2005)
O SILÊNCIO
Fotografia de Hélder Gonçalves
Ouve, meu filho, o silêncio.
É um silêncio ondulado,
um silêncio
donde resvalam ecos e vales,
e que inclina a fronte
para o chão.
Federico Garcia Lorca
Traduzido por Eugénio de Andrade
El silencio
Oye, hijo mío, el silencio.
Es un silencio ondulado,
un silencio
donde resbalan valles y ecos
y que inclina las frentes
hacia el suelo.
quarta-feira, setembro 28
Os Eleitores São Todos Iguais
Fotografia daqui
Um dos acontecimentos mais notáveis desta campanha eleitoral para as autarquias é o surgimento de candidatos independentes que concorrem "contra" os respectivos partidos. São candidatos que estão a ser alvo de investigação e que, por via disso, são arguidos.
Um deles foi mesmo condenado (tendo recorrido) e o(a) outro(a) fugiu para o Brasil para se subtrair à chamada “prisão preventiva”. Aliás nasceu no Brasil e, ao que suponho, goza de dupla nacionalidade. A campanha eleitoral, não fora um debate televisivo que se resumiu a um não aperto de mão, está concentrada nestes quatro (4) candidatos independentes.
Nada de mais. O que surpreende é o facto de inúmeros comentadores e politólogos (policromos, dá-me aqui o corrector …) terem desatado a defender a tese do “mau eleitorado”. A tese é velha e encaixa na perfeição nas teorias, mais ou menos encapotadas, dos hodiernos detractores da democracia. Estão enganados.
Não existem eleitores maus e eleitores bons! Eleitores bestas e eleitores bestiais! Existem simplesmente eleitores. O que distingue a democracia de um qualquer arremedo dela é o princípio de os eleitores serem todos iguais. Pobres, ricos, brancos, pretos, cristãos, muçulmanos, homens, mulheres, direita, esquerda, centro, intelectuais, analfabetos, patrões, empregados, velhos, jovens, presos, doentes, entrevados, drogados, comparsas, tolos … Uma cabeça, um voto!
Ou seja toda a minha gente é livre de votar. O voto, em Portugal, não é obrigatório mas é secreto e universal. Algo em que a modernidade pegou de estaca. Algo em que somos desenvolvidos, modernos e exemplares.
Os eleitores são todos iguais. Os candidatos é que são todos diferentes. Os eleitores escolhem, não são escolhidos. Os candidatos, se a lei lhes dá a faculdade de concorrer, concorrem, são votados e correm o risco de ser eleitos. É a verdadeira soberania popular. Ponto final.
Não estraguem o mais importante da nossa vida colectiva. A liberdade de escolher e ser escolhido. Desculpem lá a maçada destas banalidades.
"...o domingo para um homem pobre que trabalha."
O Grito – Edvard Munch (1863-1944)
“Saint-Étienne.
Sei o que é o domingo para um homem pobre que trabalha. Sei sobretudo o que é o domingo à noite e se eu pudesse dar um sentido e uma figura ao que sei, poderia fazer de um domingo pobre uma obra de humanidade.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
terça-feira, setembro 27
As Contas ... dos Grandes!
As contas referentes à execução orçamental de 2004, apresentadas por Portugal em Bruxelas, carecem de rectificações. Suscitaram dúvidas ao Eurostat.
As contas dos anos de 2002 e 2003, todas sob gestão dos governos da direita (PSD/PP), também não estarão certas. Conspiração de Bruxelas contra a direita portuguesa? Conspiração superiormente dirigida por um ex-primeiro responsável supremo pelo menos pelas contas de 2002 e 2003?
Acontece aos melhores! Diz o nosso povo: “Em casa de ferreiro espeto de pau”. A Dra. Manuela Ferreira Leite e o Dr. Bagão Félix, afivelando uma máscara de severidade e competência, não param de nos surpreender!
“A Comissão Europeia pediu ao Governo português explicações sobre as operações referentes às dotações de capital dos hospitais SA, constituídas em 2002, e sobre a venda ao Citigroup de dívidas fiscais realizada em 2003. Em causa estão as contas orçamentais da ex-ministra das Finanças, Manuela Ferreira Leite.
Para além disso, o Eurostat não validou as contas públicas portuguesas de 2004 - da responsabilidade do então ministro das Finanças, Bagão Félix - alegando também dúvidas em relação à contabilização de um dividendo pago ao Estado pela Empresa de Desenvolvimento Mineiro (EDM), no montante de 0,03% do produto interno bruto (PIB).
O Governo português já se disponibilizou a investigar a "natureza" deste dividendo. Caso essa verba seja retirada, o défice ficará em 3,03% do PIB, sendo convicção das Finanças que não viola o limite de 3%. Bruxelas não aceitou ainda validar as contas da Grécia e República Checa. Para este grupo de países, incluindo Portugal, a Comissão Europeia diz que tem "reservas" sobre a "qualidade dos dados" fornecidos.”
O FIM DO VERÃO
“Mar, Mar, há tanto mar no meu país” - Fotografia de Hélder Gonçalves
O fim do verão o cansaço do fim do descanso
O descanso do fim do cansaço o fim do verão
O fim do verão é onde estou sentado em cima
O ar do fim do mar que se torna na fotografia
O fim do dia no fim do verão não esquece não
Lisboa, 26 de Setembro de 2005
segunda-feira, setembro 26
É TARDE, MUITO TARDE DA NOITE ..."
Paul Gauguin (1848-1903)
É tarde, muito tarde da noite,
trabalhei hoje muito, tive de sair, falei com vária gente,
voltei, ouço música, estou terrivelmente cansado.
Exactamente terrivelmente com a sua banalidade
é o que pode dar a medida do meu cansaço.
Como estou cansado. De ter trabalhado muito,
ter feito um grande esforço para depois
interessar-me por outras pessoas
quando estou cansado demais para me interessarem as pessoas.
E é tarde, devia ter-me deitado mais cedo,
há muito que devera estar a dormir.
Mas estou acordado com o meu cansaço
e a ouvir música. Desfeito de cansaço,
incapaz de pensar, incapaz de olhar,
totalmente incapaz até de repousar à força de
cansaço. Um cansaço terrível
da vida, das pessoas, de mim, de tudo.
E fumo cigarro após cigarro no desespero
de estar tão cansado. E ouço música
(por sinal a sonata para violino e piano
de César Franck, e depois os Wesendonck Lieder)
num puro cansaço de dissolver-me
como Brunhilda ou como Isolda
no que não aceitarei nunca,
l' amor che muove il sole e l' altre stelle.
Nada há de comum entre esse amor de que estou cansado,
e o outro que não ama, apenas queima e passa , e de cuja
dissolução no espaço e no tempo em que vivo
estou mais cansado ainda. Dissolvam-se essas damas
que eram princesas ou valquírias, se preferem, no eterno.
Eu estou cansado de não me dissolver
continuamente em cada instante da vida,
ou das pessoas, ou de mim, ou de tudo.
Qu' ai-je à faire de l' eternel? I live here.
Non abbiamo confusion. E aqui é que
morrerei danado de cansaço, como hoje estou
tão terrivelmente cansado.
Jorge de Sena
Dez. 22/70
In “Visão Perpétua” [1982]
ALAIN DELON
1962 - Monica Vitti e Alain Delon, In "L'Eclipse"
A entrevista com Alain Delon ao “Paris Match”, referida pelo “Expresso”, foi a única leitura que me comoveu no fim-de-semana. Veja aqui uma síntese.
domingo, setembro 25
Presidenciais, Quarteto à Esquerda e So(u)lista à Direita?
“Heróis do mar …” – Fotografia de Hélder Gonçalves
Sempre estive convencido que, descartadas as hipóteses Ferro Rodrigues, Medeiros Ferreira e outras, cada uma por sua razão, o candidato apoiado pelo PS seria Manuel Alegre. A candidatura de Mário Soares era uma hipótese aventada, à laia de provocação, mas não suscitava mais do que sorrisos complacentes.
Finalmente o mercado dos candidatos fechou ontem, à esquerda, com quatro – quatro – candidatos: Mário Soares (apoiado formalmente pela direcção do PS); Manuel Alegre (apoiado, certamente, por independentes de esquerda, dirigentes intermédios e militantes do PS); Jerónimo de Sousa (PCP) e Francisco Louçã (BE).
Paradoxalmente, a esta hora, não há nenhum candidato credível que represente o campo da direita pois Cavaco Silva não declarou formalmente a sua candidatura.
Mas nada nos diz que não possa haver uma surpresa neste campo. Como muito bem reflecte o TUGIR parecem estar criadas as condições para o surgimento da candidatura de Santana Lopes que poderia aglutinar à sua volta uma multidão de descontentes e inimigos ferozes de Cavaco, até hoje em silêncio, no campo do PSD e, em particular, no do PP. Lembremo-nos, a título de exemplo, de Alberto João Jardim e Paulo Portas. Não há fome que não dê em fartura.
Acerca da minha opção política ela já foi anteriormente expressa. Apoio Mário Soares por razões de fidelidade, pois sempre nele votei, enquanto candidato presidencial (em todas as voltas de todas as eleições) e por razões políticas na medida em que confio na sua capacidade para o exercício da função presidencial.
A história do percurso político que me leva até aqui fica para depois mas pode ser interessante para refrescar algumas memórias mais preguiçosas.
Outubro
"Estrada do Poço do Inferno..." - Fotografia de José Branco In Olhares
“Outubro
Os grandes bosques vermelhos sob a chuva, os prados cobertos de folhas amarelecidas, o cheiro dos cogumelos que secam, as fogueiras (as pinhas reduzidas a brasas luzem como diamantes do inferno), o vento que geme em redor da casa, onde encontraríamos um Outono tão convencional? Os camponeses marcham agora um pouco inclinados para a frente – contra o vento e a chuva.
Na floresta de Outono, as faias criam nódoas de um amarelo-ouro onde se isolam na orla dos bosques como que grandes ninhos gotejantes de um mel loiro.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
FICAR
Fotografia de Margarida Delgado in sabor a sal
O que gostas de mim, o que mais desejas
Que me sintas por perto, que me protejas
Desejas adivinhar donde venho ao chegar
De que forma se forma o prazer de gostar
O que mais desejas, o que gostas de mim
Saberás o que não sei, deixa-te estar aqui
Preciso de uma mão aberta na minha face
Ler suas linhas e deixar o corpo ficar laço
É certo que nada ficou igual com o tempo
Deixa-te ficar comigo, espera o momento
Em que somente as nossas vozes ecoem
No ar e nossas memórias no tempo voem
Lisboa, 12 de Julho de 2005
sábado, setembro 24
CAVACO
Fotografia de a mega fauna
“Parece que os portugueses preferem ter como “chefe no trabalho” Mário Soares e como “professor do filho” Cavaco Silva, …”
Pacheco Pereira, tradicional apoiante do Dr. Soares nas suas anteriores candidaturas presidenciais, sem esquecer que na segunda Soares foi apoiado também por Cavaco (esse mesmo …), reflecte e inflecte, com decência e clarividência, no sentido do seu apoio à próxima candidatura de Cavaco.
Queria aproveitar para dar o meu testemunho pessoal acerca da preferência dos portugueses em ter como “ professor do filho” Cavaco Silva. É que eu já fui aluno dele.
Cavaco Silva é um péssimo professor, daquele género autoritário e dogmático … pouco atreito a aceitar a palavra dos outros e muito menos a crítica. Suporta mal os conflitos, é rígido, “vai-se abaixo” quando carece de lidar com situações de afrontamento mais duras …
Não me venham com essa história do bom professor e muito menos com a sua capacidade para lidar com os conflitos ao mais alto nível da magistratura política.
É tudo mentira. (A desenvolver).
sexta-feira, setembro 23
Cá Vamos Andando, Graças a Deus ...
Fotografia de José Marafona
Alguns amigos manifestaram a sua perplexidade acerca do meu escrito sobre Fátima Felgueiras. Não fui porventura suficientemente irónico ou a minha ironia não surtiu o efeito desejado.
Suspeito que nunca será possível compreender a coincidência de tantos processos judiciais terem ganho asas no ano de 2002 mesmo que tivessem sido iniciados antes.
Foi esse exactamente o ano em que a direita ascendeu ao governo, através das eleições legislativas de Março de 2002, tendo Ferro Rodrigues como seu principal adversário enquanto líder do PS.
Nesse governo de direita a ministra da Justiça era a militante do PP, Celeste Cardona, sendo ministro da Defesa e Vice-primeiro-ministro o líder do PP, Paulo Portas.
Era ministro da segurança social, pelo PP, Bagão Félix, que sucedeu a Paulo Pedroso, nessa pasta, com a tutela da Casa Pia.
E por aí adiante … Hoje por hoje não se lhes ouve uma palavra. Estão calados como ratazanas...
Tudo o que aconteceu, a partir de uma determinada data, em 2002, nas relações entre algumas instâncias do poder político, judicial e mediático exigia uma mega-investigação que ninguém se atreve a propor quanto mais a concretizar.
Tudo o que está a acontecer agora são as sequelas de algo de muito grave, envolvendo a direita e a extrema-direita, de que há indícios, factos e provas que já vieram a público mas que, aparentemente, ninguém está a investigar a sério. Oxalá me engane ...
Acerca de todos esses acontecimentos, e suas sequelas, acompanho a dor das vítimas inocentes e estou solidário com os caluniados e proscritos de que, eu próprio, ironicamente, faço parte.
Aguardo, ao mesmo tempo, com serenidade, que seja feita justiça embora acompanhado sempre pela lembrança de uma reflexão perturbadora de Camus, que pode ajudar os meus amigos a decifrar a minha amarga ironia acerca do regresso triunfal de Fátima Felgueiras.
Escreveu Camus, citando Flaubert: “Um homem julgando outro homem é um espectáculo que me faria rir à gargalhada se não despertasse, antes, a minha piedade.”
Entretanto quando me falam indagando do meu estado de espírito e, às vezes, da saúde, sempre me apetece dizer: cá vamos andando, graças a Deus …
Há coisas belas para olhar no mundo que nos rodeia e a esperança de um novo dia nunca morre no coração dos homens de boa vontade.
quinta-feira, setembro 22
Nostalgia da vida dos outros.
“Nostalgia da vida dos outros. É que, vista do exterior, forma um todo. Enquanto que a nossa, vista do interior, parece dispersa. Corremos atrás de uma ilusão de unidade.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
Elsa Martinelli
Elsa Martinelli (1956)
Na nossa digressão de verão pelas memórias das actrizes italianas ninguém se lembrou de Elsa Martinelli.
Não sei, só sei
Buscando el Silêncio de Cecilio Colón Guzmán
Não sei se vos vou encontrar todos
Pois não encontro ninguém disposto
A ir além do desencontro esperado
Não sei se vos interessa olhar o lado
Oculto, o gemido da morte iminente
A perda do próprio ser desesperado
Não sei se vos interessa a surpresa
Dos sentidos que se não encomenda
No supermercado mas que se sente
Não sei se sou capaz de sobreviver
Muito mais tempo sem vos acariciar
Os seios imaginários erectos sempre
Não sei mesmo nada de mim enfim
Só a minha voz silenciada e muda
Que oiço no fundo do firmamento
Não sei não, não sei se me entendo
Se me entendem os silêncios nus
Os silêncios musicados de palavras
Só sei o que me palpita no corpo
Que trago a enroupar os sentidos
E que vagamente me surpreende
Lisboa, 23 de Abril de 2005
(Imagem e Poema para o JPN e o seu Dicionário do Silêncio, in Respirar o Mesmo Ar)
quarta-feira, setembro 21
Fátima Felgueiras
Fotografia - Lusa
Apetecia-me dizer que isto não tem nada a ver com política. Mas a verdade é que tem a ver e vai mais além. É uma questão que põe em evidência a maneira portuguesa de viver. Tocata e Fuga. Regresso e Entrega. Candidatura e Afrontamento. Xeque a todos os poderes!
Não digam que é ridículo pois é muito sério. Um caso exemplar. Uma alegoria à acção dos representantes do povo e das instituições do Estado. Uma homenagem aos caricaturistas. Um hino à imaginação. E porque não reconhecê-lo um acto de coragem.
Sempre me quis parecer que Fátima Felgueiras havia de regressar e participar na campanha eleitoral. Na prisão ou em liberdade. Ainda bem que, como tudo leva a crer, não fará a campanha na prisão. Caso se confirme a sua candidatura as TV têm à mão de semear um tema inesgotável, um “reality show”de audiências incomensuráveis. Esperem pelos debates.
O major, o Isaltino, o labrego, o Professor, o Eng.º, vão ser eclipsados por Fátima Felgueiras. São todos candidatos polémicos, mas banais, à vista da nossa Evita. Uma Evita à Portuguesa!
O nosso povo sempre disse, nos momentos de amargura, que temos que estar preparados para tudo! Mas a verdade é que o caso “vende”, os poderes tremem e o povo delira com estas aventuras.
O espectáculo vai começar ...
Abrangente
Apresentando Abrangente
MILESTONE - Quatro anos após o derrube do regime taliban, o povo afgão foi às urnas votar nas eleições para o Parlamento de Cabul. As últimas eleições realizadas naquele país, foram há 36 anos, ainda o Afganistão era um reino.
A afluência às urnas foi baixa, na ordem dos 50 por cento, mas tendo em conta as ameaças da Al-Qaeda e os ataques feitos pelos taliban nas últimas semanas, os 50 por centos de eleitores que votaram, é um número significativo e um desafio aos mentores do terrorismo naquele país.
Porque nas listas, 25 por cento dos candidatos, eram mulheres... e algumas sempre se apresentaram sem burka! Deram a cara pelo futuro... E o futuro agora, é a reconstrução do país arrasado.
As Vozes
Fotografia de José Marafona
As vozes na noite quente
e os passos lá fora,
uma aragem corta o calor
intenso do verão ardente,
ouço o meu tempo passado
ao luar escoar-se
e lembro os rostos gretados
do sol, os braços nus
as veias e o suor salgado
a gotejar na terra seca,
ressequída, revolta
a golpes de enxada
As vozes na noite quente
estou nelas inteiro
e nelas ouço a minha gente.
Faro, 15 de Julho de 2004
terça-feira, setembro 20
Esquecimento
Fotografia de Margarida Delgado
“Este ruído das nascentes ao longo dos meus dias. Correm em volta de mim, através dos prados ensoalhados, depois mais perto de mim ainda e em breve terei este ruído dentro de mim, esta nascente no coração e este ruído de fonte acompanhará todos os meus pensamentos. É o esquecimento.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
Manuais Escolares em Espanha
O "El País", de ontem, 19 de Setembro de 2005, realiza um balanço da situação do processo de introdução da gratuidade dos manuais escolares nos primeiros anos de escolaridade em Espanha. Trancrevo, na íntegra, a notícia. Ver a notícia no IR AO FUNDO E VOLTAR.
segunda-feira, setembro 19
Em Luta
Erotismo na Cidade
Aprendi a usar as palavras
Como defesa e em desafio.
Armas de arremesso
Trocas de tiros verbais.
Hoje
Tento suavizá-las.
Mas saem sempre em luta
Mesmo
Quando a palavra é paz
Mesmo
Quando a palavra é amor.
Foto:Renya Jozwik
As Eleições na Alemanha
Fotografia in a mega fauna
Deu tudo errado com as sondagens nas eleições na Alemanha. Deu tudo errado com a cobertura das televisões portuguesas daquelas eleições. Deu tudo errado para as expectativas da direita europeia e dos EUA.
Quando em eleições dá tudo errado, face às expectativas criadas, e os votos estão bem contados, o que dizer? Desembrulhem-se! Reequilibrem-se! Ponham-se de acordo no essencial! E já agora: dá para entender as vantagens de uma maioria absoluta?
domingo, setembro 18
Napoleão
Napoleão Bonaparte – Imagem e Breve Biografia
As grandes frases de Napoleão. “A felicidade é o maior desenvolvimento das minhas faculdades.”
Antes da ilha de Elba: “Um malandro vivo vale mais do que um imperador morto”.
“Um homem realmente grande colocar-se-á sempre acima dos acontecimentos que originou.”
“É necessário querer viver e saber morrer.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
Comment te dire adieu
Na foto Françoise Hardy in La Vie en blues
Comment te dire adieu
além de ontem
- azul de ladrilhos -
espectra a manhã
num relance:
página em branco,
grito de galo, fogo perpétuo
- despertar é áspero,
poroso
golpe de luz
a frio – alarde de cristais.
Língua dos Versos
E Viva o Porto – Fotografia de Hélder Gonçalves
Língua;
língua da fala;
língua recebida lábio
a lábio; beijo
ou sílaba;
clara, leve, limpa;
língua
da água, da terra, da cal;
materna casa da alegria
e da mágoa;
dança do sol e do sal;
língua em que escrevo;
ou antes: falo.
Eugénio de Andrade
Lengua de los versos
Lengua;
lengua del habla;
lengua recibida labio
a labio; beso
o sílaba;
clara, leve, limpia;
lengua
del agua, de la tierra, de la cal;
materna casa de la alegria
y la amargura;
danza del sol y de la sal;
lengua en que escribo;
o antes: hablo.
Rente ao Dizer/Próximo al Decir
Tradução de José Luís Puerto
Amarú Ediciones
sexta-feira, setembro 16
UM CORPO
Fotografia de Margarida Delgado, in Sabor a Sal
Um corpo desejável envolto em pose despojada
Ser tocado e fazer-se mais desejado entreaberto
Na espera do inesperado sem horas nem tempo
O corpo somente o corpo pontiagudo se derrete
E escorre ao longo dos meus lábios lentamente.
21 de Dezembro de 2004
"Panorama da Educação Nos Países da OCDE"
Serralves – Fotografia de Hélder Gonçalves
Foi divulgada a edição de 2005 do “Panorama da Educação nos países da OCDE”. Este “panorama” consiste, em síntese, num conjunto de indicadores, comparáveis e actualizados, acerca do desempenho do sistemas educativo em 30 países.
Comecemos por assinalar, por via dos equívocos, que os progressos realizados nos últimos anos em muitos países, incluindo Portugal, são assinaláveis. O interesse do relatório concentra-se, no entanto, na apreciação da posição relativa de cada país no que respeita ao desempenho da respectiva política educativa.
E, naturalmente, no enunciado dos indicadores nos quais Portugal surge, em termos comparativos, numa posição desvantajosa.
Eis um enunciado sintético de três desses indicadores que podem ser consultados, na íntegra, através do link que surge no final deste post.
- Portugal surge no último lugar no indicador de frequência do ensino formal, com 8,2 anos, considerando os cidadãos dos 25 aos 64 anos. Quer dizer que cada português adulto frequentou a escola, em média, 8,2 anos.
Nos últimos lugares, neste indicador, surgem também a Itália (10 anos), Turquia e México (menos de 10, mas mais de 8,2 anos). Os primeiros lugares são ocupados pelos EUA, Noruega, Dinamarca e Luxemburgo, com cerca de 14 anos.
Este indicador é, certamente, um dos mais objectivos e o reverso de outro tipo de indicadores, conhecidos, como o que se refere ao “abandono escolar precoce” em que Portugal ocupa o último lugar entre os países da UE.
- Nalguns países os professores (“a meio da carreira”) têm salários mais do que duas vezes superiores ao PIB per capita do respectivo país, casos da Coreia e do México, ocupando Portugal o lugar imediatamente a seguir, usufruindo os professores portugueses de salários semelhantes aos da Alemanha e da Suíça.
Mesmo considerando que os professores trabalham em contextos diferentes, integrados em processos organizacionais diversos, de país para país, este é um indicador bastante surpreendente que ainda mais se torna impressivo quando se lhe junta o indicador do tempo líquido, em “horas por ano”, passado pelos professores em actividades lectivas na escola.
- Neste indicador Portugal apresenta uma situação que indicia uma relativamente fraca permanência dos professores na escola com um valor ligeiramente superior às 600 horas/ano face à média do conjunto dos países que é de 701 horas/ano, sendo que este valor atinge mais de 1000 horas nos EUA e no México e um valor mínimo de 535 horas no Japão.
Os indicadores disponibilizados por este relatório da OCDE têm o valor que têm, mas, no seu conjunto, representam uma fotografia bastante negativa do estado da educação em Portugal.
A sua leitura por mais benévola que seja face a factores de diferenciação do “caso português” dão uma forte caução às medidas que o governo socialista tem vindo a aplicar na reforma do sistema, em particular, na promoção de um mais extenso e atento acompanhamento pelos professores das actividades lectivas dentro das escolas.
De facto a conjugação, em Portugal, de salários relativamente elevados dos professores com o tempo da sua permanência na escola, em actividades lectivas, abaixo da média do conjunto dos 30 países considerados, deve querer dizer alguma coisa, não é?
Veja aqui o “Panorama da Educação nos países da OCDE”.
Aqui uma notícia a propósito do mesmo assunto.
quinta-feira, setembro 15
A França e a Inglaterra
Fotografia de José Marafona
“Há muitas razões para a hostilidade oficial contra a Inglaterra (boas ou más, políticas ou não). Mas não se fala de um dos piores motivos: a raiva e o desejo mesquinho de vermos sucumbir quem ousou resistir à força que nos esmagou.”
Albert Camus
Caderno n.º 4 (Janeiro 1942/Setembro 1945) – Tradução de António Quadros. Edição “Livros do Brasil”. (A partir da “Carnets”, 1962, Éditions Gallimard).
quarta-feira, setembro 14
VERSOS DESENCONTRADOS
Fernando Pessoa no Martinho da Arcada com Raul Leal, António Botto e Augusto Ferreira Gomes.
Em nada ou em ninguém
Eu deveria acreditar!
Nem no amor, nem na vida. - As ilusões,
Mesmo até quando vêm disfarçadas
E já conhecem o cliente, hesitam,
E chegam a partir envergonhadas...
As ilusões -
Também têm os seus mais preferidos;
E àqueles que ficaram na ruína
Do pensamento, e são - por graça de conquista
Os pálidos mortais desiludidos,
A esses já não correm muito afoitas
Na mentira das grandes fantasias!
- É por isso que eu hoje ainda vivo
À margem das ridículas tragédias
Que lemos nos jornais todos os dias.
Atulham-se os presídios; no degredo,
Atados à saudade, vão ficando,
- Como lesmas ao luar, esses que matam,
E pelo amor tombaram na desgraça:
- Um sonho, um beijo, uma mulher que passa!
Só a guitarra os lembra ao triste fado
Nos ecos diluídos e chorosos
E fundos do lusíada, coitado!
Eu olho para tudo que enxameia
Nesta viela escura da existência
Como quem se debruça num abismo
E fica revolvendo a consciência
Na tristeza infinita de um olhar!...
- A humanidade é vil e o seu egoísmo
Tem base na vileza de vexar.
Sim;
Por qualquer coisa os homens tudo vendem:
Palavra, dignidade, a própria vida,
Só porque desconhecem a doutrina
Bendita de Jesus; - esse tesoiro,
Essa fonte de luz onde aprendi
A ser leal e amigo e a respeitar
Aquela que nos risos do meu lar
Desembaraça os fios de uma queixa
No mistério que cinge o verbo amar.
Mas quando um ano acaba e outro vem,
Embora a minha fronte e os meus cabelos
Envelheçam na marcha para o fim
E um sabor de renúncia e de cansaço
Vibre, cantando, aqui, dentro de mim,
Rebenta-me no peito uma esperança
Tão lúcida, tão viva, e tão ungida
Na fé que ponho erguendo a minha prece -
Que peço a Deus do fundo da minha alma
Que a todos os que sofrem neste mundo
Dê o conforto de uma vida calma.
António Botto
Aves de Um Parque Real
As Canções de António Botto
Editorial Presença
1999
terça-feira, setembro 13
Viragem à Esquerda na Noruega
Jens Stoltenberg, líder do Partido Trabalhista.
O país mais rico da Europa (e do mundo?), com os mais elevados padrões de bem estar, “vira à esquerda”. Desculpem lá qualquer incómodo mas deu-me um prazer infinito verificar que a “esquerda socialista” é um dos partidos vencedores. Saudosismo!
Veja os resultados aqui. A “esquerda socialista” está identificada com a sigla SV.
(A partir do Tugir ao qual agradeço o destaque nos links.)
segunda-feira, setembro 12
NA MORTE DE MARILYN
Fotografia de Marilyn Monroe - Playboy (1953)
Morreu a mais bela mulher do mundo
tão bela que não só era assim bela
como mais que chamar-lhe marilyn
devíamos mas era reservar apenas para ela
o seco sóbrio simples nome de mulher
em vez de marilyn dizer mulher
Não havia no fundo em todo o mundo outra mulher
mas ingeriu demasiados barbitúricos
uma noite ao deitar-se quando se sentiu sozinha
ou suspeitou que tinha errado a vida
ela de quem a vida a bem dizer não era digna
e que exibia vida mesmo quando a suprimia
Não havia no mundo uma mulher mais bela mas
essa mulher um dia dispôs do direito
ao uso e ao abuso de ser bela
e decidiu de vez não mais o ser
nem doravante ser sequer mulher
O último dos rostos que mostrou era um rosto de dor
um rosto sem regresso mais que rosto mar
e toda a confusão e convulsão que nele possa caber
e toda a violência e voz que num restrito rosto
possa o máximo mar intensamente condensar
Tomou todos os tubos que tinha e não tinha
e disse à governanta não me acorde amanhã
estou cansada e necessito de dormir
estou cansada e é preciso eu descansar
Nunca ninguém foi tão amado como ela
nunca ninguém se viu envolto em semelhante escuridão
Era mulher era a mulher mais bela
mas não há coisa alguma que fazer se certo dia
a mão da solidão é pedra em nosso peito
Perto de marilyn havia aqueles comprimidos
seriam solução sentiu na mão a mãe
estava tão sozinha que pensou que a não amavam
que todos afinal a utilizavam
que viam por trás dela a mais comum imagem dela
a cara o corpo de mulher que urge adjectivar
mesmo que seja bela o adjectivo a empregar
que em vez de ver um todo se decida dissecar
analisar partir multiplicar em partes
Toda a mulher que era se sentiu toda sozinha
julgou que a não amavam todo o tempo como que parou
quis ser atá ao fim coisa que mexe coisa viva
um segundo bastou foi só estender a mão
e então o tempo sim foi coisa que passou.
Ruy Belo
Transporte No Tempo
Editorial Presença
Marilyn Monroe veja biografia aqui
domingo, setembro 11
11 DE SETEMBRO
Fotografia de Margarida Delgado, in Sabor a Sal
Retenho na memória os corpos filmados num ângulo estranho e os ritos de espanto e pavor que se estampavam nos rostos. As correrias desgovernadas e os nomes dos desaparecidos escritos em papéis. As velas acesas e as preces. As vozes roucas de surpresa e de medo.
Tinha sido dado início aos quatro anos mais terríveis da minha (nossa) vida. Coincidência? As cinzas que cobriram os sobreviventes também nos cobriram a nós. Ainda nos estamos a erguer do chão para reiniciar a caminhada.
Os fundamentalistas de todas as religiões hão-de ser isolados e vencidos. Mas continuam nos postos de comando. As comunidades que os geraram hão-de destruí-los. Como? Através da livre escolha ou pela força da violência? Vencerá a liberdade ou a tirania? A paz ou a guerra? O bom senso da maioria dos povos triunfará?
É absolutamente necessário que as instituições multinacionais – ONU, UE, … – se não desprestigiem e, pelo contrário, se fortaleçam. É essa a única esperança que resta aos homens e mulheres de boa vontade.
SALVADOR ALLENDE
EM MEMÓRIA DE SALVADOR ALLENDE
"(...) Trabajadores de mi Patria, tengo fe en Chile y su destino. Superarán otros hombres este momento gris y amargo en el que la traición pretende imponerse. Sigan ustedes sabiendo que, mucho más temprano que tarde, de nuevo se abrirán las grandes alamedas por donde pase el hombre libre, para construir una sociedad mejor. ¡Viva Chile! ¡Viva el pueblo! ¡Vivan los trabajadores! Estas son mis últimas palabras y tengo la certeza de que mi sacrificio no será en vano, tengo la certeza de que, por lo menos, será una lección moral que castigará la felonía, la cobardía y la traición."
Salvador Allende, 11 de septiembre de 1973, del mensaje a los ciudadanos transmitido por Radio Magallanes a las 9,03 de la mañana.
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