“Devaneio entre Cascais e Lisboa. Fui pagar a Cascais uma contribuição da patrão Vasques, de uma casa que tem no Estoril. Gozei antecipadamente o prazer de ir, uma hora para lá, uma hora para cá, vendo os aspectos sempre vários do grande rio e da sua foz atlântica. Na verdade, ao ir, perdi-me em meditações abstractas, vendo sem ver as paisagens aquáticas que me alegrava ir ver, e ao voltar perdi-me na fixação destas sensações. Não seria capaz de descrever o mais pequeno pormenor da viagem, o mais pequeno trecho do visível. Lucrei estas páginas, por olvido e contradição. Não sei se isso é melhor ou pior do que o contrário, que também não sei o que é.
O comboio abranda, é o Cais do Sodré. Cheguei a Lisboa, mas não a uma conclusão.”
“Livro do Desassossego” – Fernando Pessoa (Bernardo Soares)
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