Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
domingo, maio 1
A Bíblia Sagrada
Os meus avós maternos no monte do sítio de Sinagoga, Santo Estevão, Tavira, tinham em casa um único livro e lembro-me bem dele.
Esse livro de casa dos meus avós está hoje encadernado e parece novo brilhando viçoso na estante perto do meu assento de predilecção. Garatujo as escritas e espreito a informação na net sob o seu olhar atento.
No seu interior, amarelecida pelo tempo, descobri uma carta de caligrafia irrepreensível que dá testemunho de um acontecimento de época lembrando a juventude de minha mãe, nascida em 1916: “Santo Estevão de Tavira. Setembro de 1931. Minha prezada amiga: Pedindo-te antecipadamente mil perdões por não ser esta a forma porque o devia fazer venho por este meio participar o meu casamento que se deve realizar no dia 16 do mês corrente...”
Reparei, mais tarde, que o livro é uma edição de 1867 impressa, em Lisboa, pela Typographia Universal, de Thomaz Quintino Antunes, Rua dos Calafates - 110.
É a Bíblia Sagrada: “O Novo e o Velho Testamento traduzida em portuguez segundo a vulgata latina por António Pereira de Figueiredo”.
Noutros tempos foi um livro grosso para o meu olhar juvenil. Mais de mil páginas, a duas colunas, letras miúdas e bem arrumados em capítulos e começa assim:
“1. No princípio creou Deus o Ceo e a Terra. 2. A terra porém era vã e vazia: e as trevas cobriam a face do abysmo: e o espirito de Deus era levado sobre as águas. 3. E disse Deus: faça-se a luz; e foi feita a luz.”
Este livro é o sinal de uma cultura e civilização a cuja matriz fundadora não pude escapar.
REVOLTA - NOTAS AUTOBIOGRÁFICAS (3 de 10)
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