Cadernos de Camus - 7
Estes são os últimos sublinhados do Caderno nº5 para os Cadernos de Camus. Neste conjunto de excertos acrescentei um único texto não sublinhado na minha leitura de juventude. É exactamente o que encerra o Caderno n.º5. Acrescento uma remissão para LUKÁCS, referido no conjunto anterior, para quem estiver interessado em o conhecer ou revisitar.
""O que existe na Rússia é uma liberdade colectiva "total" e não pessoal. Mas que é uma liberdade total? É-se livre de alguma coisa - em relação a. Visivelmente, o limite é a liberdade em relação a Deus. Vê-se então claramente que essa liberdade significa a sujeição ao homem.""
"Peça Dora: Se tu não amas ninguém, isso não pode vir a acabar bem."
(Mais uma vez a peça "Os Justos", assim como nalguns excertos que surgirão a seguir.)
""Quantos eram os membros da "Vontade do povo"? 500. E o Império Russo? Mais de cem milhões.""
(Sublinhei somente "500")
""Vera Figner: "Eu devia viver, viver para ser julgada, pois o processo coroa a actividade do revolucionário.""
""Peça. Dora ou outra: "Condenados, condenados a serem heróis e santos. Heróis à força. Por isso não nos interessa, compreendem, não nos interessam nada os sórdidos negócios deste mundo envenenado e estúpido que se pega a nós como visco. - Confessai, confessai-o, que o que vos interessa são os seres e o seu rosto... E que, pretendendo procurar uma verdade, não esperais no fim de contas senão amor.""
"É o cristianismo que explica o bolchevismo. Conservemos o equilíbrio para não nos tornarmos assassinos."
"Formas e revolta. Dar uma forma aquilo que é informe, é o fim de toda a obra. Não há apenas criação, mas correcção (ver mais acima). Daí a importância da forma. Daí a necessidade de um estilo para cada assunto, não de todo diferente porque a língua do autor é sempre sua. E é justamente esta que fará quebrar não a unidade deste ou daquele livro mas a da obra inteira."
"Retirei-me do mundo não porque tivesse inimigos, mas porque tinha amigos. Não que eles não me fossem prestáveis como é habitual, mas julgavam-me melhor do que sou. É uma mentira que eu não posso suportar"
"Para os cristãos, a Revelação está no início da história. Para os marxistas, está no fim. Duas religiões."
(Coloquei ? no fim da frase)
"Pequena baía antes de Tenés, na base de uma cadeia de montanhas. Semicírculo perfeito. Ao cair da noite uma plenitude angustiada plana sobre as águas silenciosas. Compreende-se então porque é que os Gregos formaram a ideia do desespero e da tragédia sempre através da beleza e do que nela há de opressivo. É uma tragédia que culmina. Ao passo que o espírito moderno produz o seu desespero a partir da fealdade e do medíocre.
É o que Char quer dizer talvez. Para os Gregos, a beleza é o ponto de partida. Para um europeu, é um fim, raramente atingido. Não sou moderno."
"Verdade deste século: À força de vivermos grandes experiências, tornamo-nos mentirosos. Acabar com tudo o mais e dizer o que tenho de mais profundo."
Extractos, in "Cadernos" (1964-Editions Gallimard), tradução de António Ramos Rosa, Colecção Miniatura das Edições "Livros do Brasil", Caderno nº5 (Setembro de 1945/ Abril de 1948).
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