quinta-feira, junho 3

Fragmentos de Leituras

"A moranguina

O sabor do bom vinho (o sabor direito do vinho) é inseparável da comida. Beber vinho é comer. Com pretextos dietéticos, o dono do restaurante T. fornece-me a regra desse simbolismo: se bebermos um copo de vinho antes da refeição, ele quer que o acompanhemos com um pouco de pão: que se crie um contraponto, uma concomitância; a civilização começa com a duplicidade (a sobredeterminação): não será o bom vinho aquele cujo sabor se desprende, se desdobra, de tal maneira que o gole efectuado não tenha exactamente o mesmo sabor do gole iniciado? No trago de bom vinho há, como na abordagem do texto, uma torsão, uma gradação: há um acamado, como uma cabeleira.

Ao relembrar as pequenas coisas de que tinha sido privado na sua infância, encontrava aquilo de que gosta hoje: por exemplo, as bebidas geladas (cervejas muito frias), porque nesse tempo ainda não havia frigoríficos (a água da torneira, em B., nos verões intensos, estava sempre morna)."

"Roland Barthes por Roland Barthes" -15
(Fragmento 2 de 3, pag. 8)

Edição portuguesa: "Edições 70"

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