quarta-feira, maio 19

5 MESES DE ABSORTO

Neste dia em que o absorto faz 5 meses de vida aqui deixo o tributo ao grande poeta português Fernando Pessoa reproduzindo o poema "Tabacaria" do seu heterónimo Álvaro de Campos. Logo nos primeiros versos Pessoa se aproxima de uma reflexão intemporal que, paradoxalmente, ou talvez não, tem tudo a ver com a realidade do ser solitário face ao desconhecimento de nós próprios. "Tabacaria" é um exercício poético que tem muito a ver com a ideia de criação do "absorto". A edição que trago comigo é de bolso, modelo popular, da ITAU, foi-me oferecida e tem uma dedicatória: "23 de Maio 81 (Feira do Livro) Um beijão do bus."

TABACARIA


Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
...

15-01-1928

A versão integral de "Tabacaria" pode ser lida aqui