Deixar uma marca no nosso tempo como se tudo se tivesse passado, sem nada de permeio, a não ser os outros e o que se fez e se não fez no encontro com eles,
Editado por Eduardo Graça
terça-feira, abril 12
Os Paraísos Artificais
Jorge de Sena
Na minha terra, não há terra, há ruas;
mesmo as colinas são de prédios altos
com renda muito mais alta.
Na minha terra, não há árvores nem flores.
As flores, tão escassas, dos jardins mudam ao mês,
e a Câmara tem máquinas especialíssimas para desenraizar as árvores.
O cântico das aves - não há cânticos,
mas só canários do 3º andar e papagaios do 5º.
E a música do vento é frio nos pardieiros.
Na minha terra, porém, não há pardieiros,
que são todos na Pérsia ou na China,
ou em países inefáveis.
A minha terra não é inefável.
A vida na minha terra é que é inefável.
Inefável é o que não pode ser dito.
Jorge de Sena
"Pedra Filosofal" (1950)
Incluído em Poesia I,
Moraes Editores2ª edição, 1977.
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