Aqui está um jovem casal que se instala no meu compartimento: a mulher é loira pintada; usa grandes óculos escuros, lê o Paris-Match; tem um anel em cada dedo e cada unha de ambas as mãos está pintada de cor diferente das unhas vizinhas; a do dedo médio, mais curta, dum carmim pesado, indica grosseiramente o dedo da masturbação. Daqui, do encantamento em que me mantém este casal do qual não consigo desviar os olhos, surge-me a ideia de um livro (ou dum filme) onde não haveria senão estes traços de sexualidade secundária (nada de pornográfico); aí se apreenderia (tentar-se-ia apreender) a “personalidade” sexual de cada corpo, que não é nem a sua beleza nem o seu ar “sexy” mas, sim, a forma como cada se oferece imediatamente à leitura; porque a jovem loira de unhas grosseiramente colorias e o seu jovem marido (de nádegas moldadas e olhos doces) traziam a sua sexualidade de casal na botoeira, com uma legião de honra (sexualidade e respeitabilidade provêm do mesmo cartaz) e essa sexualidade legível (tal qual Michelet a teria certamente lido) enchia o compartimento, por uma metonímia irresistível, muito mais seguramente do que uma série de garridices.”
Na página 16 escrevi a seguinte nota: “prefiro a viagem. o encontro entre as pessoas que se movimentam nos lugares e nos acontecimentos.”
Fragmentos de Leitura
"Roland Barthes por Roland Barthes"- 40
(pag. 16, 2 de 2)
Edição portuguesa - Edições 70
Na página 16 escrevi a seguinte nota: “prefiro a viagem. o encontro entre as pessoas que se movimentam nos lugares e nos acontecimentos.”
Fragmentos de Leitura
"Roland Barthes por Roland Barthes"- 40
(pag. 16, 2 de 2)
Edição portuguesa - Edições 70
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